Exterior

Um deus chamado Sórin

Falar de Sórin não é fácil, ainda mais num momento como o de ontem, quando se despediu do futebol com as camisas de Cruzeiro e Argentinos Juniors. Desta maneira, nada melhor do que uma cruzeirense descrever o que é Jumpi para a nação azul de Minas Gerais. Por isso,  o Futebol Portenho pediu a jornalista Nathália Mendes, repórter do Jornal de Brasília e colunista do blog do Cruzeiro na GloboEsporte.com, para passar esse sentimento a todos que viram ou não viram um dos melhores laterais argentinos de todos os tempos. Desfrute

SórinAdeus

Mineirão, 12 de maio de 2002. É a última das 111 partidas que Juan Pablo Sorín faria pelo Cruzeiro entre 2000 e 2002. Jogando com a cabeça enfaixada após o quarto corte profundo na região em dois anos e meio, o guerreiro vê Ruy rolar a bola na grande área em sua direção. Segundo tempo, 0 x 0. “Não sei o que faço senão ir além do sonho da despedida e não há tempo para pensar. Com três dedos e meio esquisitos de prima, com a sempre canhota bendita e a rede se mexe, é o mundo que explode, vem o delírio, a festa… Não pode ser real”, escreveu ele quatro meses depois, quando já defendia a Lazio.

Mineirão, 04 de novembro de 2009. Nem parecia que o Mineirão fora palco de um jogo entre equipes de Brasil e Argentina. Nada de catimba, de respirações suspensas, olhares provocativos. Na noite de ontem, 62 mil cruzeirenses estenderam o tapete verde mineiro para a intersecção da maior rivalidade do futebol, um homem capaz de unir os países hermanos em torno de uma bola de futebol. Entregamos-lhe com gosto a camisa que nunca deixou de ser de Sorín – o número 6 cravado nas costas, pingando de seu próprio suor e sangue e que está entranhada na pele dele.

A relação entre cruzeirenses e Sorín é transcendental: não bastasse ser o consenso de craque das últimas décadas da história do time azul, o argentino transcendeu a idolatria e beira o endeusamento. Sorín é o deus de sangue azul. Quando oramos para o deus Sorín, invocamos um ínfimo da sua infinita raça, rogamos para que nossos jogadores de hoje incorporem o espírito do acreditar em todas as bolas, pedimos para que ele conceda a graça de multiplicar o escasso dom do amor à camisa, e, silenciosamente, pedimos uma benção do argentino mais cruzeirense que há.

FotoDivulgação/VIPCOMM
FotoDivulgação/VIPCOMM

Não bastasse a obstinação suprema pela vitória, Sorín ainda era extremamente técnico. Não dá para dizer que Sorín era apenas mais um lateral: como no jogo de ontem, o cruzeirense acostumou-se a ver Juampi mais atacando do que defendendo. Sorín tinha gana por gols e um leque incrível de maneiras de chegar lá. A explosão de seu futebol feriu-lhe os joelhos, que acabaram abreviando a carreira do jogador. Sorín não apenas ensinou o cruzeirense a admirar o estilo de jogo argentino, como também deixou lições eternas de que futebol se joga com o coração.

O último jogo de Sorín, 33 anos, como profissional, haveria de ser pelo Cruzeiro. Ao Argentino Juniors, coube poucos minutos de gratidão, justificável porque Juampi é profundamente apaixonado pelo time de Minas Gerais. Ele sobe as arquibancadas do Mineirão, tem as letras dos cantos de torcida na ponta da língua e tinha como hábito comemorar gols cruzando os braços sobre a cabeça, tradicional gesto da torcida Máfia Azul. “Finalmente, recebo a Copa tão desejada. É bonito ser campeão. É grandioso ser capitão do Cruzeiro e ser campeão”, vaticinou Sorín naquele 2002. Este amor romântico que torcida e o ex-lateral-esquerdo comungam é o que fundamenta toda esta história, totalmente avessa aos padrões e convenções de que brasileiros e argentinos, necessariamente, são imiscíveis.

Sorín não se retirou do futebol, embora ele mesmo insista em dizer, em seu portunhol enrolado. O craque da lateral está vivo porque deixou alma por onde passou. Quando era pequena, lembro-me que sempre que me perguntavam quem era meu ídolo, dizia sempre que era o Sorín. As meninas, fãs incontestáveis do queridinho Leonardo DiCaprio ou do unânime Brad Pitt, reclamavam do meu mau gosto quando eu lhes mostrava um argentino descabelado como objeto da minha devoção. Hoje, sei que o motivo de Sorín ser o meu ídolo há anos era um só: quando eu crescesse, queria ser tão cruzeirense quanto o Sorín é.

Da Redação

Perfil utilizado para colunistas convidados a escrever no site FutebolPortenho.com.br

One thought on “Um deus chamado Sórin

  • Ernesto

    Grande Sorín!

    Um cara apaixonado pelo futebol, e foi o capitão da seleção argentina que mais gostei, a do loco Bielsa que lamentávelmente fracasou no mundial.

    Além de grande jogador, Sorín sempre se envolveu com a realidade do pais. A seleção da que ele era capitão, sempre apresentavam nos jogos bandeiras defendendo aos maestros de escola em luta, e outras lutas do nosso pais.

    Dentro do futebol, ele e Jorge Valdano são as pessoas que mais respeito me merecem.

    Ainda não escutei ele falando o portunhol enrolado. Neste ponto eu não quero me parecer a ele, espero que minha mensagem não ganhe esse conceito.

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