Há 100 anos nascia em Lomas de Zamora, região metropolitana de Buenos Aires, aquele que talvez tenha sido o jogador que melhor atingiu o ideal de ser ídolo de brasileiros e argentinos: Antonio Sastre, ou, simplesmente, “El Cuila”. Talentoso, verstátil e solidário, Sastre foi um dos maiores ídolos da história do Independiente e do São Paulo.
Sastre chegou muito jovem ao Independiente, ainda a tempo de jogar com Raymondo Orsi, futuro campeão mundial pela Itália em 1934. Ao lado do talentoso De La Mata e do grande artilheiro paraguaio Arsenio Erico (ainda hoje o maior artilheiro da história do futebol argentino), El Cuila formou o trio ofensivo da equipe que daria os primeiros títulos profissionais ao clube de Avellaneda, em 1938 e 1939.
Sastre era imensamente talentoso, deu muitos gols a Erico e fazia com que o estádio sempre estivesse lotado para vê-lo. Mas era muito mais do que isso. Não era um atacante típico de seu tempo, pois voltava para ajudar na marcação dos adversários, o que fez com que diversas vezes fosse escalado, tanto no Rojo como na Albiceleste, como volante capaz de desarmar o adversário e iniciar as jogadas ofensivas da equipe. Na verdade sua versatilidade ia bem mais longe. Em duas ocasiões, contra San Lorenzo e Peñarol, chegou a atuar como goleiro do Independiente, sem sofrer nenhum gol.
Em 1942, aos 31 anos, com dois títulos argentinos pelo Independiente e dois sul-americanos pela seleção argentina, Sastre saiu em busca de novos desafios. Desembarcou no Brasil, contratado pelo São Paulo Futebol Clube. Ao contrário do que pode pensar o torcedor atual, a parada parecia indigesta. O tricolor paulista era uma equipe nova, com 8 anos de vida, buscando sem sucesso seu lugar ao sol. Dizia-se que antes de começar os campeonatos, se jogava uma moeda para o ar. Se desse cara, o campeão seria o Palmeiras. Se fosse coroa, o Corinthians levaria a taça. Se a moeda parasse no ar, seria a Portuguesa. O São Paulo? Só se a moeda caísse em pé.
Mas o São Paulo vinha montando uma boa equipe. Tinha trazido Leônidas da Silva, já visto como jogador em fim de carreira. E logo em 1943 o tricolor faria história. Após uma árdua disputa com os dois então gigantes do futebol paulista, o São Paulo chegou à última rodada precisando apenas empatar com o Palmeiras. O jogo ganhou ares de drama quanto Sastre se lesionou logo aos 6 minutos de jogo. Sem poder fazer alterações, a equipe saopaulina viu El Cuila se arrastando pelo campo por 84 minutos, apenas para fazer número. Ao fim de 90 minutos de sofrimento, o jogo terminou 0 a 0. O São Paulo venceu seu primeiro título, para delírio de sua torcida, que desfilou pelas ruas da cidade com um carro alegórico representando uma moeda em pé.
Mas o São Paulo dos anos 1940 não tinha “apenas” Sastre e Leônidas. Havia ainda a lendária linha média formada por Rui, Bauer e Noronha, e atacantes como Luisinho, Pardal e Teixeirinha. O comandante dessa equipe era Sastre, o cérebro da equipe que fez do São Paulo um time grande. Com essa receita, o tricolor chegou aos títulos paulistas de 1945 e 1946. Foi aí que, aos 36 anos, Sastre sentiu que era a hora de voltar.
O River quis trazê-lo de volta. Mas Sastre preferiu um clube mais modesto, um verdadeiro desafio. E topou o convite do Gimnasia y Esgrima, então na segunda divisão. Mas isso logo mudaria. O veterano El Cuila liderou a equipe tripera de volta à primeira divisão naquele mesmo ano. Vencido esse desafio, Sastre finalmente abandonou o futebol.
Campeão argentino de 1938 e 1939, Sul-Americano pela seleção de seu país em 1937 e 1941, paulista em 1943, 1945 e 1946, Antonio Sastre morreu em Buenos Aires, a 23 de novembro de 1987.
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Fantástico texto, Tiago. parabéns por esse belo texto. Só complementando, existe um texto do Oswaldo Brandão, sempre citado pelo mestre Panchatantra da comunidade do Orkut "Futbol Argentino", aonde o famoso treinador diz o seguinte "Sastre ensinou a nós (brasileiros) como jogar futebol".
Saudações fraternas, seu blog 171nalata é muito bom também.
Obrigado Willian. Já ouvi algo sobre essa citação do Brandão, ele teria dito que graças a Sastre os brasileiros aprenderam que o quinteto ofensivo deveria participar do jogo, ou algo assim, ne? Na verdade isso foi inovador na propria Argentina, onde era uma novidade. abraços