AcessoPrimeira Divisão

Sarmiento e Crucero del Norte conquistam acesso para a elite argentina

Jogadores do Colectivero comemoram a goleada sobre o Patronado e a vaga na elite argentina
Jogadores do Colectivero comemoram a goleada sobre o Patronado e a vaga na elite argentina

Somente 25 anos de vida. Eis o Crucero del Norte. Sarmiento de Junín, há dois anos estava na B Metropolitana. Ambos chegam á primeira divisão, enquanto que grandes clubes dos país peregrinam sonâmbulos pelas várias categorias do ascenso. O acesso de ambos surpreendem pela estatura que possuem frente a outros gigantes do país, que ou não conseguem o mesmo resultado ou sofrem até por décadas para consegui-lo. Vejamos com detalhes.

Crucero del Norte

No jogo decisivo, válido pela penúltima rodeada da B Nacional, o Colectivero foi anfitrião para o Patronato de Paraná e precisava vencer para não correr riscos na rodada final, na qual jogaria em San Francisco, contra o Sportivo belgrano, e precisando de reza para ascender. Desta forma, a equipe tratou de ser um péssimo anfitrião para o Patrón. Tornando o jogo fácil, chegou ao primeiro gol, logo aos 17 minutos, com Tomasini. Gabi Ávalos, aos quatro e aos 14 do segundo tempo, tratou de dar números finais ao encontro. Com a vitória, o Colectivero chegava à primeira divisão.

Resumo do caso

O Crucero del Norte foi fundado em 1989, ligado à empresa de ônibus com o mesmo nome e localizada na cidade de Garupá, província de Missiones. A iniciativa ocorreu pelo sucesso da equipe de futsal, que ganhava títulos locais, nacionais e até internacionais. Motivados pela repercussão dessa equipe, a família Koropeski, incentivada por vários diretores da Crucero del Norte, resolveu que fundaria um clube para que funcionários e seus familiares tivessem um local para curtirem a vida. Compraram um terreno e construíram as instalações em tempo recorde.

Uma trajetória impecável e vencedora

Alguns anos depois, em 2003, a equipe de futsal deixa de existir em prol do surgimento de uma outra, de futebol de campo. No mesmo ano, foi ás disputas da Liga Posadeña, levando o caneco com facilidade e se classificando à temporada 2004/5 do Torneio do Interior. Na primeira temporada, a equipe realizou uma campanha histórica, com 9 vitórias, 8 empates e somente uma derrota. Desta forma, foi promovida para o Torneio Argentino B. Entrou me campo contra clubes históricos, como Textil Mandiyú e Chaco For Ever. Também recebeu o San lorenzo para um amistoso no seu estádio, recém-construído.

Após quatro temporadas, no agora chamado Torneio Federal B, o Colectivero chegou ao Argentino A, a terceira divisão do país para os clubes do interior. Disputou a temporada 2009/10. Dois anos depois, em junho de 2012, os missioneros assombravam o interior do país conquistando uma vaga na B Nacional, a segunda divisão do futebol argentino. Na data de 29/11/2013, com o sopapo sobre o Patronato de Paraná, o Colectivero ganharia o direito de jogar ao lado de clubes como Boca, River, Racing, San Lorenzo e Independiente, feito que seria lotérico, não fosse a extrema organização que gira em torno de tudo o que se relaciona com o Crucero de Norte, desde sua fundação, em 1989.

Sarmiento de Junín

O Sarmiento chegou à ultima rodada precisando somente de um empate para ficar com a vaga. Na memória de seus torcedores, ainda estava viva a lembrança do último jogo, em casa. Na ocasião, o Verde vencia o Crucero del Norte até os 40 minutos da etapa final. Então, Gabi Ávalos empatou para o Colectivero e frustrou as expectativas da torcida local. Neste fim de semana, uma simples igualdade resultaria no acesso, mas havia um problema: o jogo era em Santa Fe. E contra o Unión, líder inconteste do zonal. Mesmo assim, quem mandou na partida foi o Sarmiento. Bem plantado dentro da cancha, o visitante soube tirar proveito dos descuidos do Tatengue, que estava nervoso em campo, sentindo-se na obrigação de vencer e sem um plano claro de como enfrentar uma equipe de qualidade como Verde de Junín. Ao fim da partida, o 0x0 não correspondeu ao que foi a partida, toda ela comandada pelo visitante.

Restando somente dois minutos para o fim, a torcida local invadiu o campo para comemorar o acesso do Unión. Laverni preferiu encerrar a partida e todo mundo ficou no lucro. Após 32 anos, o Sarmiento estava de volta à elite argentina. Um feito produzido pelas sérias preocupações de seus dirigentes em organizar o clube, saneá-lo e respeitar os seu torcedores. Um presente para uma comunidade que jamais deixou de apoiar sua equipe.

Enquanto a torcida do Tatengue invadia a cancha para comemorar o acesso, os jogadores do verde também faziam sua festa
Enquanto a torcida do Tatengue invadia a cancha para comemorar o acesso, os jogadores do verde também faziam sua festa

Resumo do caso

O Atlético Sarmeinto foi fundado no dia da mentira, 1º de abril de 1906. A ideia veio de um “bando de desocupados” que vivia a 268 kilômetros a oeste de Buenos Aires. O clube surgiu com espírito competitivo e com a alma voltada para a valorização da face romântica do futebol. Tanto foi assim que apenas em 1953, e após diversos títulos da liga local, o clube aderiu ao profissionalismo. Então, o Verde só levou sopapos de todos os lados. Como um bêbado, o clube circulou pelo ascenso por décadas, até que 1974 vai parar no equivalente hoje à B Metro. Em 1980, chega pela primeira vez na sua história à elite do futebol argentino.

Não deu nem gosto. Caiu dois anos depois e voltou a frequentar as várias categorias do ascenso. Apenas no final da temporada de 1991 que conseguiu retornar à B Metro. A partir daí, começou um processo de ida e volta da B Matro para a B Nacional, ficando bem mais tempo na terceira divisão metropolitana. Ao final da temporada 2011/12, volta definitivamente para a segunda divisão e começa o seu trabalho minucioso para retornar à elite. Neste momento, a organização estrutural já permeava as decisões de seus cartolas e o trabalho no futebol. No fim de semana, na cancha do Tatengue, o Verde conseguiu retornar à elite, após 32 anos. E vem como candidato ficar por muito tempo atuando ao lado do Boca, River, Racing, Rojo e Ciclón.

Torcedores do Verde , no jogo contra o Colectivero.
Torcedores do Verde , no jogo contra o Colectivero.

A organização por trás de Crucero del Norte e Sarmiento de Junín

O trabalho nos dois clubes chega a ser assombroso. Em ambos, as decisões frias e calculadas são um sintoma simples que apenas direcionam ou redirecionam planejamentos severos feitos a priori. Na prática, o Crucero del Norte existe desde 2004, quando começou a jogar a liga regional de Posadas. Estamos falando, portanto, de uma equipe que joga futebol há 10 anos. Ainda assim, o clube chegou à primeira divisão. Hoje, o Colectivero é o maior orgulho de Missiones, algo com o que as pessoas de uma das mais pobres províncias argentinas contam para mostrar para o resto do país que a região agrícola missionera pode simbolizar o melhor do que existe no país. Tudo é muito sério no clube, assim como na empresa da família Koropeski, empresários modernos que consideram o bem-estar de seus funcionários como um elemento vital para a empresa conseguir lucros. Esta mentalidade é antiga e já existia mesmo antes de concluírem que os empregados mereciam ter um clube para sua diversão de find de semana.

Parte considerável desses funcionários é constituída por condutores, seres que passam grande parte de seu tempo dirigindo ônibus e longe de seus familiares. Então, esses familiares precisavam ter algo compensatório. Até hoje essa mentalidade reina no clube, assim como na empresa. Com tempo livre, convém às pessoas que façam uma viagem à Argentina de ônibus, pela Crucero del Norte. Ganharão noções de geografia; verão como se processa a riqueza agrícola do país, verão como que, embora pobre, a província de Missiones preserva a natureza, além de ficarem estupefatos com o serviço de bordo da Crucero, que nenhuma empresa de avião oferece hoje em dia.

O planejamento do clube é sério e não se prostituirá às ilusões de resultados da primeira divisão. Se preciso for, seus cartolas vão preferir retornar para o ascenso do que fazer loucuras típicas de dirigentes irresponsáveis e comprometidos mais consigo próprios do que com as instituições que dirigem.

Quanto ao Sarmeinto de Junín trata-se de uma das mais estruturadas instituições da argentina. Sempre projetos são apresentados para reciclar o clube e colocá-lo na linha de frente do que há de mais moderno no país. Sua categoria de base conta com mais de 500 garotos. Porém, existe um projeto de encaminhamento dos vários jogadores da base, não aproveitados em Junín, a clubes menores do país. Além disso, mais 200 garotos praticam futebol em cinco campos espalhados pela cidade, por iniciativa do projeto “Potreros Organizados”. O lançamento de qualquer jogador na equipe de cima passa por estudo de alguns especialistas e também pela concordância e chancela do treinador principal.

Há três anos, o Palmeiras contratou Facundo, com 17 anos, à época. O clube ficou na pior e não levou nenhum moeda pela transação. O Verdão praticava o básico de qualquer clube brasileiro: vai na base do outro e, se puder, arrebata qualquer jovem atleta para o seu controle. Porém, o argumento de Albaqui para deixar o Sarmiento foi justamente o de que o clube não lhe dava oportunidades. O clube se justificou, mostrando que o atleta já estava incorporado à equipe principal, mas que precisava de mais trabalho para ser um jogador de ponta ou no mínimo um profissional. O Sarmiento tentou impedir a transação, mas foi humilhado por Albaqui e por sua família. Não atendiam telefonemas do clube e se recusavam a receber em sua residência qualquer pessoa ligada ao Verde de Junín.

Jogadores do Verde comemoram acesso à elite.
Jogadores do Verde comemoram acesso à elite.

Pouco tempo depois e a visão do clube se revelou correta em relação à imaturidade futebolística de Albaqui. Ele não foi aproveitado no Palmeiras e precisou retornar ao clube e se submeter ao projeto de seu desenvolvimento futebolístico feito cuidadosamente para ele, anos atrás. Contudo, perdeu lugar na fila, já que das canteiras do Verde sempre saem inúmeros jogadores talentosos.

O sucesso de modelos como os do Sarmiento e Crucelro del Norte é um tapa na cara de grandes clubes espalhados por toda a Argentina. Inúmeros clubes vivem à beira do desaparecimento nas várias categorias do ascenso, assim como a visão da decadência institucional e futebolística faz parte de várias esquadras da primeira divisão. Hoje, um clube pequeno como o Lanús consegue participar de Libertadores, ganhar Sul-Americana e disputar títulos até as últimas rodadas dos torneios locais.

Enquanto isso, Independiente precisa de um “chefão” para se manter na elite e Boca e River não assustam mais ninguém tanto no país quanto em toda a América do Sul. Sarmiento de Junín e Crucero del Norte são clubes como o Lanús, o que qualifica a elite com organização mas que, pouco a pouco, vai encurtando o espaço de clubes mais tradicionais, aproximando-os do ascenso ou deixando-os vegetando e sendo humilhados mesmo que na primeira divisão.

Joza Novalis

Mestre em Teoria Literária e Lit. Comparada na USP. Formado em Educação e Letras pela USP, é jornalista por opção e divide o tempo vendo futebol em geral e estudando o esporte bretão, especialmente o da Argentina. Entende futebol como um fenômeno popular e das torcidas. Já colaborou com diversos veículos esportivos.

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