Poucas vezes o futebol argentino esteve tão arabizado como nos anos 90, antes dos petrodólares tornarem cada vez mais poderoso o futebol do Golfo. Em 1992, a seleção faturou a edição inaugural da Copa das Confederações, ainda denominada Copa Rei Fahd, o então monarca saudita – e em janeiro daquele ano de 1995 seria vice, em nova edição sediada em Riad. Antonio Mohamed declinava rápido no Boca, mas o Vélez era campeão em série com protagonismo de Omar Asad e depois com Claudio Husaín sendo logo acompanhado pelo irmão Darío. Tudo sobre a presidência popstar de Carlos Menem, que precisara até se converter do islã para assumir o cargo (manchado por dois bombardeios antissemitas) e empolgar a classe média com um poder provisório e ilusório de compra naquele década em que terminou por quebrar o país. Mas coube a dois judeus, naquele abril de 1995, liderarem em Doha as comemorações que deram os primeiros sorrisos públicos a Menem um mês após a devastadora perda de um filho: o capitão Juan Pablo Sorín e o treinador José Pekerman seriam as grandes revelações da conquista sub-20 da Argentina no Qatar. Que merece ser relembrada não apenas por ter sido sobre o Brasil de um João Havelange de riso amarelo na imagem acima.
O protagonista da imagem é Sorín. A braçadeira de capitão não estava com ele por acaso: dos campeões, ele era mesmo o único que já havia estreado pela seleção adulta, embora antes daquele Mundial sub-20 ainda mal chegasse a quatorze partidas pela equipe principal do Argentinos Jrs, onde se profissionalizara. Presente já na primeira convocação do ciclo Daniel Passarella, no fim de 1994, Juampi estreara pela Argentina principal em 14 de fevereiro de 1995, em 4-1 sobre a Bulgária em Mendoza. Em março, estava na equipe sub-23, também treinada por Passarella, vencedora dos Jogos Pan-Americanos. E tão logo ergueu o troféu mundial no Qatar (que nem seria a sede do evento, substituindo de última hora uma Nigéria afetada por pandemia de meningite), reapareceu rápido na principal: dois amistosos em maio de 1995, no 1-1 com a África do Sul em Joanesburgo e no 1-0 no Peru em Córdoba; e quatro partidas pelas eliminatórias entre 1996 e 1997, quando a história já fica mais conhecida…
Em 1996, Sorín conseguiu se dizer campeão simultaneamente da Liga dos Campeões e da Libertadores. É que integrara ainda em 1995 o início da campanha campeã da Liga dos Campeões de 1995-96 com a Juventus, um destino inicial natural a quem brilhara no Mundial sub-20. Mas logo viu-se que mesmo ele não estava tão pronto assim para um sucesso instantâneo no auge do calcio. A equipe italiana repassou a joia ao River na virada para 1996. Incialmente alternando-se com Gabriel Cedrés, a revelação logo foi nome regular na reconquista millonaria em La Copa (só se ausentou de um jogo) e adquirida em definitivo para enfrentar a própria Juve no Mundial Interclubes.
A taça em Tóquio escapou ao River e a Sorín, mas os troféus se amontoariam aos montes na sequência: 15 jogos no Apertura 1996, 17 no Clausura 1997 e 9 no Apertura 1997 – quando o River emendou o último tricampeonato seguido da liga argentina, em paralelo à conquista da edição final da Supercopa (foram 8 jogos dele nessa campanha, última taça internacional do Millo até a Era Gallardo). Não deu para ir à Copa do Mundo de 1998, mas com Marcelo Bielsa aquele jogador habilidoso como lateral, volante ou meia logo virou figurinha carimbada na seleção até a queda com o mentor Pekerman nas quartas-de-final da Copa do Mundo de 2006 – a última partida de ambos pela Argentina.
Já as outras sementes plantadas por Pekerman em 1995 vingariam no máximo a algum razoável nível clubístico, sobretudo Domínguez, Ibagaza e Biagini. Mas desse trio somente os dois primeiros e outros dois, Crosa e Lombardi, chegariam também a jogar alguma vez pela seleção principal… embora mal passassem de cinco partidas – na soma de todos eles. Ainda assim, a conquista, apenas a primeira desde a maradoniana edição 1979, serviu para afastar as desconfianças que haviam sobre Pekerman (um ex-jogador de carreira inexpressiva e quase anônimo ao grande público) e render na pronta renovação do contrato, inicialmente pactuado para um único ano.
Logo viriam safras mais generosas de diversos Pekerman Boys, em ciclo a render frutos mesmo depois que o treinador fora promovido à seleção principal, em 2004: os hermanos conheceram Riquelme, Aimar, Cambiasso, Walter Samuel e até mesmo o atual treinador Scaloni em 1997; Saviola, D’Alessandro, Burdisso e Maxi Rodríguez em 2001; e então um tal Messi, além de Gago e Zabaleta, em 2005, que já tinha um Agüero se moldando para protagonizar a festa em 2007 com Di María, Banega, Papu Gómez e Zárate. A edição 1995, por sua vez, de fato viu o tempo marca-la como de andorinhas solitárias – o japonês Nakata, o australiano Viduka, o costarriquenho Wanchope, o camaronês Geremi, o português Nuno Gomes e o russo Semak foram as sementes que vingaram em suas seleções principais; do Brasil, somente Luizão e Denilson iriam a Copas do Mundo, embora o prêmio de melhor jogador daquele Mundial ficasse com Caio Ribeiro.
A safra seria mais generosa com os espanhóis: Raúl, Morientes, Míchel Salgado, Etxeberria e mesmo De la Peña teriam variados graus de destaque por seus clubes e os dois primeiros saberiam reluzir na Copa do Mundo 2002. De fato, a Espanha era a sensação no Qatar… até levar de 3-0 na semifinal de uma Argentina que viajara ao deserto sem muitos diamantes já renomados: Gallardo, desde novembro de 1994 (aos 18 anos de idade) promovido à seleção adulta após aparições fulminantes naquele ano por um River campeão invicto, padecia mesmo de tendinite. Verón, já utilizado desde a sub-17, tinha exatos 20 anos, mas estava mesmo (arrebentando) na segunda divisão com o seu Estudiantes. Por sua vez, Crespo, também com 20 anos, foi ignorado por já ser visto como uma realidade, embora houvesse estreado na seleção adulta junto com Sorín.
O atacante havia sido uma revelação do Apertura 1993 e Pekerman priorizou polir gente nova. E nisso o grande senão à comissão técnica para 1995 se relacionaria a outro atacante, nascido na França de pais argentinos a trabalho e crescido na Grande Buenos Aires. Não era Higuaín, e sim Trezeguet. Suas cinco partidas por um forte Platense em 1994 ainda faziam dele um diamante bruto na medida para aquele trabalho, que incluía até mais gente do Platense – o zagueiro Cristian Díaz e o atacante Adrián Coria, cortado ainda no Sul-Americano da lista final. De fato, Trezeguet foi logo chamado naquele 1995 para testes em um potente Paris Saint-Germain. Mesmo que só viesse a jogar na França a partir da temporada 1995-96 (no Monaco, após não ser efetivado pelo PSG), à altura de 2012 se indagava por qual razão Trezegol não fora captado por Pekerman.
Logo aproveitado pela seleção da terra onde nasceu, o franco-argentino foi modesto: “ele não falou comigo diretamente, houve uma sondagem de gente próxima, falava-se que eu integrava uma pré-convocação de 40 jogadores. Além do mais, se tratava de uma geração mais velha, porque de fato eu terminei indo ao Mundial sub-20 seguinte, o da Malásia 1997”. A favor de Pekerman, o fato de não haver qualquer polêmica em 1995 quanto a um Trezeguet ainda anônimo enquanto os convocados reuniam não só um novo Maradona como também um novo Fillol. Eis, enfim, um breve perfil dos outros campeões:
Joaquín Andrés Irigoytía: já era do River, ganhando enfim seus primeiros minutos no time adulto após aquele Mundial; após ser premiado como terceiro melhor jogador do torneio, teria mesmo alguma titularidade no segundo semestre de 1995, sobretudo na campanha semifinalista da Supercopa. Chegou a ser apressadamente visto como um sucessor de Amadeo Carrizo (seu próprio protetor nos juvenis) e de Ubaldo Fillol, mas foi relegado por Germán Burgos a uma única partida na Libertadores 1996 – a última da fase de grupos, sobre o Minervén venezuelano, com o Millo já classificado. Logo chegaria Roberto Bonano e uma oferta do futebol da Espanha, cuja seleção sub-20 vira uma atuação nota 9 de El Vasco nas semifinais daquele Mundial, fez Irigoytía pedir um empréstimo para que ganhasse minutos. Segundo contou em 2021 ao Infobae, esse movimento foi mau visto pelos cartolas riverplatenses e deixou-o no ostracismo: simplesmente não foi usado uma vez sequer nas conquistas que se seguiram em Núñez até ser defenestrado em 1999 ao Colón. Na mesma ocasião, explicou que gradualmente perdeu o encanto vendo as sujeiras do mundo da bola e preferiu focar no curso de Direito, pendurando as luvas ainda aos 32 anos para se dedicar às empresas familiares no interior de Entre Ríos.
Sebastián Diego Pena: El Tomatito herdara o apelido do pai, El Tomate Hugo Pena, que defendera River, San Lorenzo e a seleção principal entre os anos 70 e 80, e acabou morto precocemente em um acidente doméstico que o eletrocutara em 1981. Pena, o filho, ainda era um zagueiro do Argentinos Jrs (onde tinha apenas três partidas pelo time adulto antes do Mundial) e seria contratado pelo próprio River para a temporada 1996-97. Mas para ser utilizado duas únicas vezes na liga argentina, ainda no vitorioso Apertura. Ainda conseguiu rumar ao Independiente em seguida, mas tampouco se eternizou em Avellaneda e a partir de 2000 rodou por clubes cada vez menores da Argentina até penduras em 2014 as chuteiras.
Federico Hernán Domínguez: testemunha de luxo do Vélez campeão de tudo entre 1993 (ano em que esteve no Mundial sub-17) e 1994, Fede já tinha quatorze jogos (e até um golzinho, fruto do impulso ofensivo que caracterizaria um dos defensores mais artilheiros do campeonato argentino) pela equipe adulta, embora só viesse a entrar em campo nos títulos velezanos noventistas celebrados após aquela conquista sub-20 – inicialmente, com dois joguinhos no Apertura 1995 e outro no Clausura 1996, seguida de duas aparições nos minutos finais na Supercopa 1996. Raúl Cardozo era desde os anos 80 o dono absoluto da lateral-esquerda e foi igualmente titular na Recopa 1997 e no Clausura 1998, onde as 14 aparições de Domínguez mascaravam terem sido somente quatro como titular. Foi-lhe preciso integrar o Independiente campeão do Apertura 2002 (último título argentino até hoje do Rojo) para ganhar sua única chance na seleção principal, já em 2003. Depois ainda pôde ser titular entre 2005-07 no River do seu coração, mas justamente em meio a um jejum millonario vivido entre 2004 e 2008. Campeão, foi novamente no Nacional uruguaio, em 2009, e no Argentinos Jrs, no terceiro e último troféu colorado na primeira divisão, o Clausura 2010. É o irmão mais velho de Eduardo Domínguez, técnico campeão da Copa da Superliga 2021 com o Colón e vice da Sul-Americana 2015 com o Huracán, onde integrara ainda como jogador o recordado time vice argentino em 2009.
Gustavo Adrián Lombardi: remanescente do Mundial sub-17 de 1991 em que foi colega de Verón, Gallardo e Husaín, já tinha três jogos pela equipe adulta do River antes do Mundial e permaneceu em Núñez até 2002, com direito a alguns empréstimos europeus no período. O problema é que passou a concorrer justamente com Sorín, contratado no início de 1996 para tomar a lateral-esquerda pelo resto de década. Lombardi teve uma única partida na vitoriosa Libertadores 1996 (titular na derrota de 2-1 para o Sporting Cristal, nas oitavas-de-final), seis no Apertura 1996, três no Clausura 1997, quatro no Apertura 1997, zero na Supercopa 1997… mas conseguiu ainda ter duas oportunidades na seleção adulta já em amistosos pré-Copa em 1998; foi como breve jogador do Salamanca, mas no ambiente da paneleira “Riverção” do técnico Daniel Passarella. Acabou não indo à Copa da França, mas serviu-lhe para ter mais chances no Millo: quatorze no título Apertura 1999 e dezesseis no do Clausura 2000. Sorín estava já no Cruzeiro, mas Lombardi optou por pendurar as chuteiras ainda aos 27 anos.
Mariano Alcides Juan: mais um do River, o volante ainda não tinha jogos pelo time adulto. Teria apenas sete depois. O Mundial lhe serviu de vitrine para o Ajax em 1996, quando a equipe holandesa vinha de duas finais seguidas de Liga dos Campeões. Mas não decolou e já em 1998 era repatriado por um Racing decrépito. Mariano Juan mais continuidade em um Huracán de segunda divisão, entre 2003 e 2006. Pendurou as chuteiras aos 31 anos.
Francisco Gabriel Guerrero: já com seis partidas e um golzinho pelo Independiente antes do Mundial, El Pancho até integraria no segundo semestre o Rojo campeão da Supercopa, mas sem chegar a ser utilizado. Teria mais continuidade a partir da temporada 1996-97, irrompendo como um atacante insinuante, vazando o rival Racing e a dupla Boca (em vitória de 1-0 na Bombonera na histórica tarde que rendeu o único duelo entre César Menotti e Carlos Bilardo como treinadores) e River em meio ao vice-campeonato no Apertura e a campanha que teve ainda mais cheiro de título no Clausura, apesar do 4º lugar final. Foi um xodó de hype intenso, mas breve: ainda com seis golzinhos no Apertura 1997, somou apenas dois no ano todo de 1998, unzinho em 1999 e outro em 2000. Seguiu carreira no incipiente futebol suíço, até virando a casaca entre Zurique e Basel, pendurando as chuteiras no Chipre.
Guillermo Carlos Larrosa: El Grillo era um dos mais experientes no elenco, já tendo antes do Mundial vinte partidas pela equipe adulta de um forte Gimnasia – embora esse volante não chegasse a participar do quase título do Lobo no Clausura desenrolado em paralelo ao Mundial sub-20. Foi, sim, titular nos vices seguintes: Clausura 1996 e Clausura 1998. Permaneceu em La Plata até 2003, como um dos ícones de período em que os triperos tinham a melhor equipe da cidade, embora não fosse o suficiente para lhe colocar na seleção principal. Jogou por mais cinco anos, mas nas divisões de acesso.
Carlos Germán Arangio: com quatro jogos pelo time adulto do seu Racing, não iria muito além disso. Seguiu carreira no México e no Chile. Chegou até a ser apresentado pelo Grêmio, em 2005, mas foi avaliado por apenas três semanas, sem chegar a estrear como tricolor; seu único clube brasileiro seria o Resende mesmo, em 2008.
Ariel Miguel Ibagaza: com ainda três partidas pelo Lanús, El Corto virou o “novo Maradona” da vez naquele Mundial e deslancharia a partir dali. Foi mesmo o talentoso maestro do título grená na Copa Conmebol 1996 e no vice-campeonato nela em 1997, em meio a três campanhas seguidas de terceiro lugar do clube nos torneios argentinos. A chamada Cúperativa do promissor técnico Héctor Cúper levaria Ibagaza e outros membros daquele Lanús ao auge do Real Mallorca. Esteve no time vice da Recopa Europeia em 1999, mas apenas em 2004 é que somou seus únicos 26 minutos oficiais pela seleção principal, em derrota amistosa para o Japão (2-1 em Shizuoka); ainda jogaria outra partida, mas não-oficial, contra a Catalunha, naquele mesmo ano. Estava no Atlético de Madrid àquela altura, mas já em 2006 voltava a um Mallorca em declínio. Seus títulos em série viriam na Grécia com o onipotente Olympiacos, entre 2010 e 2014.
Leonardo Ángel Biagini: outro com vivência prévia em Mundial sub-17 (o de 1993), era o mais experiente do grupo. Era o “novo Batistuta”, inclusive por ter se formado no mesmo Newell’s do Batigol, mesmo que só tivesse três golzinhos em 28 jogos (muitos vindo do banco, é verdade) pela equipe adulta. Decisivo na semifinal e final no Qatar, foi uma aposta imediata do Atlético de Madrid para a temporada 1995-96. Esteve assim na histórica dobradinha colchonera, campeã tanto de La Liga (a única entre 1977 e 2014) e da Copa do Rei, mas sem firmar-se na capital; o sucesso espanhol viria a serviço daquele mesmo Real Mallorca no auge, seu clube entre 1998 e 2003, período dourado do time das Baleares. Após praticamente dez anos de Espanha, Biagini ainda adicionou ao currículo o título da Sul-Americana 2007 com o Arsenal, embora com participação praticamente nula em campo pela equipe de Sarandí. Leo pendurou ali as chuteiras profissionalmente, embora seguisse batendo bola nas amadores divisões regionalizadas do futebol argentino.
Gastón Fernando Pezzuti: ainda não profissionalizado no Racing, o goleiro nunca se firmaria em Avellaneda – foram somente dezesseis partidas entre 1997 e 2004, ora concorrendo com Ignacio González (que tinha nível de seleção), ora com Gastón Sessa, ora com Mariano Campagnuolo. Até integrou o elenco que encerrou em 2001 nada menos que 35 anos de jejum racinguista na liga argentina, mas tão somente na rodada inaugural. Teria mais continuidade no Atlético Nacional, seu clube entre 2009 e 2012.
Diego Sebastián Crosa: com quatro partidas pelo Newell’s, Crosa lesionou-se no meio do torneio e precisou voltar mais cedo à Argentina. O zagueiro até disputou uma partida pela seleção, já em dezembro de 2000 (derrota de 2-0 em Los Angeles para o México), em formação experimental em que Marcelo Bielsa promoveu a estreia nada menos que de oito jogadores. Crosa estava àquela altura no Vélez. Não tinha tanta força no jogo aéreo, mas foi reconhecido como um dos zagueiros mais limpos do futebol argentino: foram 69 jogos seguidos sem que recebesse cartão amarelo – oito pelo Newell’s, 47 pelo Vélez e quatorze no Boca, que o repatriou do Real Betis para ser um 12º jogador no título da Libertadores 2003 e reserva de luxo no vice da Libertadores 2004. O rosarino seguiu carreira no Racing, onde chegou a ser vice do Clausura 2005, embora ficasse mais lembrado pelo drible sofrido em antológico gol do adolescente Sergio Agüero em um clássico. Parou no Chacarita, em 2010.
Cristian Fabián Díaz: zagueiro do Platense, já tinha três partidas por um time que, forte, chegara até a brigar inicialmente pelo título do Clausura 1994. Foi exportado em 1997 ao Atlético de Madrid, mas o negócio serviu apenas de trampolim para que ele seguisse carreira por equipes modestas do futebol espanhol, onde pendurou as chuteiras em 2009.
Andrés Miguel Garrone: atacante com já cinco partidas pelo Rosario Central. Naufragou rápido: não chegou a somar minutos no título épico do clube na Copa Conmebol daquele mesmo ano, sobre o Atlético Mineiro e em 1997 (quando foi passado ao Los Andes) já começava a peregrinar pelas divisões de acesso da Argentina e da Itália.
Julio César Bayón: volante já com quatro partidas pelo Rosario Central, El Negro, tal como Garrone, tampouco entrou em campo na conquista da Copa Conmebol de 1995. Outro que cedo precisou de contentar com o mundo ascenso, a partir de sua ida ao Deportivo Armenio em 1998.
Walter Gastón Coyette: meia ainda sem jogos pelo Lanús, acompanhou Ibagaza no título grená na Copa Conmebol em 1996. O Leganés o importou à Espanha em 1997, mas Coyette nunca reluziria como o colega, embora viesse a ter ainda mais dois ciclos pelo Lanús e dois pelo Huracán. Parou no Chacarita, em 2009.
Cristian Raúl Chaparro: atacante do Ferro Carril Oeste, El Chapa não tinha parentesco com um Raúl Chaparro (atacante com passagens por River e San Lorenzo e com brilho nos rivais Instituto e Racing de Córdoba) artilheiro do Metropolitano 1981 e que jogara uma vez pela seleção, em 1982. Já havia estreado em 24 de junho de 1994 pela equipe verdolaga adulta e o título não serviu de vitrine para tira-lo cedo do bairro de Caballito; seguiu no FCO até a temporada final desse time na primeira divisão, em 2000 – chegou mesmo a interromper simplesmente 800 minutos sem marcar gols que o decadente Ferro chegou a acumular em 1999. Chaparro ainda rumou ao Huracán após o rebaixamento do ex-clube, mas só conseguiu rodar por pequenos times andinos até parar na Guatemala (defendeu três equipes daquele país), em 2010.
Com estes dezessete homens mais Sorín, a Argentina começou com um 1-0 arrancado por Garrone já no minuto final contra a Holanda, em 13 de abril. Mas Portugal, então dono dos dois títulos sub-20 anteriores, reforçou essas credenciais: também por 1-0, derrotou em 17 de abril a Albiceleste, gol de Dani, talentoso (seria eleito o segundo melhor jogador daquela edição) mas errático e pouco sério – já era passado quando sua seleção enfim voltou em 2002 às Copas do Mundo. Três dias mais tarde, na atuação da vida de Tomatito Pena, um 4-2 sobre Honduras: o zagueiro abriu logo aos 3 minutos o placar que Ibagaza tratou de ampliar já aos 6. Pena anotou aos 42 um tranquilo 3-0 que os hondurenhos descontaram já no segundo tempo, antes do zagueiro concluir no minuto 27 um hat trick para esfriar a reação.
Em 23 de abril, Guerrero (aos 37) e Coyette (aos 4 do segundo tempo) fizeram os gols das quartas-de-final sobre Camarões e apenas 48 horas depois veio a exibição de campeões: na retaguarda, Irigoytía foi nota 9 para a revista El Gráfico, Lombardi foi 6, Pena e Sorín foram 8 e Domínguez foi 7; no meio, Larrosa foi 8, Mariano Juan levou um 6 e Coyette, um 7; e o ataque teve um Ibagaza nota 7, um Guerrero nota 6 e um Biagini com 8 nos 3-0 sobre os espanhóis – gols do então criticado Biagini logo aos 21 e de Coyette aos 8 do segundo tempo. Um minuto depois do 2-0, Pekerman trocou o atacante Guerrero pelo volante Bayón, também nota 6. Aos 33, quem saiu foi Larrosa para a entrada de Chaparro, que nem nota levou, mas matou o jogo ao anotar dois minutos depois os 3-0.
A decisão, contra o Brasil, servia de oportunidade de vingar a derrota na partida final do Sul-Americano sub-20, também decidido entre as duas seleções, em janeiro. Naquela ocasião, Pekerman obrigara os pupilos a engolirem em seco e aplaudirem os arquirrivais. O zagueiro Fede Domínguez relembrou esse episódio, no mês passado, ao La Nación: “perder final com o clássico rival é muito doloroso. Mas naquela vez aprendi de verdade o que é o fair play. Porque te explicam isso mil vezes, sobretudo nos juvenis, (…) mas em momentos críticos é quando aparece de verdade. E isso aprendi com José, porque tão logo terminou a final, com toda a dor e a raiva de ter perdido, José nos disse que fôssemos cumprimentar e felicitar os brasileiros. E tivemos que nos comportar como dignos perdedores”.
Por aquele 28 de abril de 1995, a El Gráfico já deu a Irigoytía uma nota 7, enquanto Lombardi foi 9, Pena e Sorín foram 8 e Domínguez, 6; Larrosa e Mariano Juan também foram 6 e Coyette, 9; Ibagaza e Chaparro foram outros 6, e Biagini, 8. Bastou contra canarinhos que tiveram no máximo notas 6, casos do goleiro Fábio Noronha e do volante Zé Elias. Biagini abriu o placar aos 26. Quando deu 17 minutos do segundo tempo, Chaparro deu lugar a mais um nota 6, Arangio. Guerrero entrou já aos 38 do segundo tempo e não teve nota, mas matou o jogo aos 41. Pekerman ainda tratou de ganhar tempo premiando a paciência do goleiro reserva Pezzuti, utilizado como a terceira substituição da noite ao substituir Irigoytía aos 43.
Na mesma nota ao La Nación, complementada a seguir pela íntegra de diferentes reportagens (com orientalismo e machismo politicamente incorretos que não caíam mal nos anos 90…) da edição especial pós-título publicada pela revista El Gráfico (com colchetes nossos para eventuais contextualizações), Domínguez resumiu o sentimento geral que todos esperam reviver nesse 2022:
“Me lembro que ambas as semifinais se disputavam no mesmo estádio: primeiro o Brasil ganhou de 1-0 de Portugal, e entramos para jogar nossa semi com a Espanha com muita energia, pilhados, nos inflamamos, sabíamos que se passássemos pela Espanha de Raúl, teríamos a revanche com o Brasil. Havia muita fome e muito desejo. Nessa semi ganhamos de 3-0, muito tranquilos. E na prévia da final, José nos relembrou o Sul-Americano. Nos disse: ‘não nos esqueçamos da dor, o que sofremos ao perder essa final e hoje temos a revanche esportiva contra o mesmo rival, o temos que enfrentar não com raiva, mas sim com coração e futebol’. (…) Temos um grupo de WhatsApp dos jogadores dessa equipe e nos falamos. Creio que deixamos uma linda energia e uma boa imagem do futebol argentino no Qatar”.
OBRIGADO PELO FUTURO – 16 anos depois… o triunfo dos garotos no Qatar reafirma e garante uma verdade absoluta: a Argentina é uma potência futebolística
Ninguém pode presentear nada melhor que o futuro.
Estes garotos da sub-20 acabam de nos obsequiar, pois, o mais belo dos presentes.
O fizeram sem histrionismos, envoltos na simplicidade que costuma facilitar o anonimato. Desprovidos eles e seus condutores das alterações que provoca a maquiagem. Impregnados pela humildade dos que sabem que melhor que prometer é cumprir.
Ainda custa decorar seus nomes, salvo Irigoytía, porque é basco e goleiro; Sorín, porque alterna nos adultos do Argentinos Jrs; Biagini, porque é um “veterano” do Newell’s e nestas seleções, e Tomatito Pena, porque é filho daquele zagueiro de morte absurda.
Ainda falta fixar o rosto de José Néstor Pekerman, o diretor técnico cuja designação assombrou a todos, desagradou alguns e encheu de iras outros, capazes de escrever e dizer sandices.
Estamos celebrando um título impensado e enorme: ARGENTINA CAMPEÃ MUNDIAL JUVENIL, o mesmo que lograra aquela maravilhosa equipe dirigida por César Luis Menotti no Japão 1979 e cuja estrela foi um esplendoroso Diego Armando Maradona, integrante de uma dupla espetacular com El Pelado [Ramón] Díaz.
Saíram entre indiferenças e silêncios.
Voltam entre ruidosas e merecidas consagrações.
Poderia se dizer que comoveram poucos até a partida semifinal, o do crepitante triunfo sobre a Espanha por 3-0. E convenceram definitivamente com o triunfo final ante o Brasil, o traiçoeiro de todos os tempos.
Nesse dia, soaram mais familiares os nomes de Ibagaza, Coyette, Juan, Lombardi, Guerrero… e então nos doeu em todos a dor do rosarino Crosa, que voltou antes, foi operado e gritou os gols desde a sua cama no quarto 209 do Sanatório Americano de Rosario.
Nos emocionou a gestação que vamos contar e mostrar nesta edição através dos textos de Hugo Suerte e das fotos de Alejandro Del Bosco, os enviados especiais de EL GRÁFICO.
Recebemos com os braços abertos os campeões mundiais.
Esta edição é por eles, para eles e para centenas de milhares de argentinos que guardarão este exemplar como o que é: o testemunho fiel de uma vitória maravilhosa e o passaporte para entrar no futuro com fé e alegria.
Sim, senhor, nesta bendita terra a cada dia nasce um craque.
VIRAM? A REVANCHE FOI MUNDIAL
Há imagens que permanecem e que através do tempo vão alimentando o mito da lenda.
Talvez aquela frieza – nos termômetros e também no ambiente – com que José Néstor Pekerman iniciou em 4 de outubro de 1994 seu primeiro treino como diretor técnico da Seleção Nacional Juvenil tenha sido uma das chaves, a impressão digital que marcou a fogo o começo de um novo processo. Surpresa, uma palavra que o acompanharia em todas suas horas. Surpresa, a sensação com que se formou um homem de 47 anos que ia continuar com a vocação que o agarrava desde que havia deixado de ser jogador: nada menos que seguir dirigindo moços, salvo estes que vinham tocados pela varinha mágica e terminariam com 16 anos de escuridão [referência ao jejum argentino no Mundial sub-20, desde o título de Maradona].
A tarefa número um de Pekerman foi organizar seu corpo técnico: primeiro pensou em Gerardo Pascual Salorio, o preparador físico que o acompanhou desde seu passo pelo Argentinos Jrs. Logo se somaria Julio Eduardo Urtasún para ajudar na parte física, e o último a agregar-se foi Hugo Daniel Tocalli, que ocupou o cargo de assistente técnico. Depois de delinear sua apresentação em sociedade, continuou com a preparação dessa estrutura chamada Seleção Juvenil.
A princípio, convocou ao redor de 30 jogadores: Pekerman queria vê-los em ação no prédio que a AFA possui em Ezeiza, mas também se encarregou de esclarecer que nessa primeira convocação não incluiria aqueles que já conhecia ou que tinham experiência na primeira divisão: Leonardo Ángel Biagini, Rubén Alejandro Bernuncio, Guillermo Carlos Larrosa, Andrés Miguel Grande, Federico Hernán Domínguez e Marcelo Daniel Gallardo (quem finalmente, nunca o cederiam).
Eles iam ser a base deste grupo. O objetivo, por enquanto, estava posto nos 3.600 metros de La Paz, na Bolívia, onde se jogaria o 17º Campeonato Sul-Americano sub-20. Se esboçou um plano com essa meta…
Agora, através do tempo, se recordam as planilhas de trabalho que entregava Salorio: continham toda a atividade do dia e a forma de encarar – e vencer – o medo da altura. Para este último item se recorreu, como sempre, ao doutor Bernardo Lozada. O complemento foi perfeito, mas para lograr essa preparação física impecável foi preciso sofrer… um fim de ano longe de casa.
O plantel para o Sul-Americano se foi depurando até chegar em 21 garotos. Com eles, Pekerman trabalhou até os últimos dias: a lista definitiva tinha que estar integrada por 18. Então ficaram fora Walter Cáceres (goleiro do Racing) e Fabricio Fuentes (defensor do Newell’s). Ainda faltava um, mas Pekerman mostrou cautela nesse momento e levou um jogador a mais à Bolívia para o caso de alguém não se adaptar bem.
A configuração levou seu tempo e a equipe deu seu primeiro sintoma de boa saúde em um amistoso jogado na quinta-feira de 22 de dezembro, quando ganhou de 2-1 do Chile em Santiago. Eles, os chilenos, eram um dos máximos candidatos para o torneio que se mostrava no horizonte. Apesar disso, ali também surgiu um primeiro contratempo: o corpo técnico queria viajar diretamente depois do jogo, mas não conseguiram as passagens e a partida atrasou quatro dias.
Já na Bolívia, todos os garotos resistiram bem aos primeiros treinamentos nas instalações do hotel Verolandia de La Paz, somente Rubén Moschella – o homem da AFA encarregado das questões administrativas – havia sofrido as consequências lógicas ante semelhante altura.
Os 10 dólares de vales se consumiam em chamadas à Argentina. Os “olá, mamãe” e “meu amor, como estás?” se repetiam nos tempos que lhe outorgavam para as comunicações.
O pior momento talvez foi a noite de 31 de dezembro. O plantel havia sido convidado para jantar no restaurante de um argentino, que em seguida se apegou ao grupo. Parecia que tudo caminhava bem até que chegaram as 11 da noite, aí as lágrimas travessas começaram a escapar dos olhos jovens. É que na Argentina já havia começado o Ano Novo. Os homens do corpo técnico não conseguiram consolar 19 rostos que afrouxavam…
Aquele jantar serviu para juntar ainda mais esse grupo. A premissa era clara: “se arrebentamos o c… e passamos o fim de ano longe de casa, não podemos decepcionar nós mesmos”.
Desde ali concorreram à Casa Argentina, onde iam viver o único momento de diversão: cantaram e dançaram com os demais argentinos. Ainda não haviam começado a desandar o caminho até o Mundial, que até esse momento se jogaria na Nigéria.
Rumo ao Mundial. Eram candidatos por peso da história, embora houvessem ganho só um Sul-Americano, em 1967. Vários jogadores não se conheciam: o goleiro Irigoytía, Tomatito Pena, Mariano Juan, Ariel Ibagaza… até lá ia a Argentina, para querer chegar ao Mundial. Os objetivos eram claros e estavam bem escritos no pequeno comedor do hotel Verolandia, situado no bairro Cota Cota de La Paz: primeiro, classificar; depois, o campeonato.
Nesta seleção, o jogador número 19 foi Adrián Norberto Coria, o atacante do Platense, quem ficou de fora da lista. A decisão o comunicou Pekerman dois dias antes da estreia contra o Peru, programada para a terça-feira de 10 de janeiro.
Os resultados começaram a se dar e a música de “Vasos Vacíos” que emitiam os Fabulosos Cadillacs [banda de rock das mais populares da Argentina] soava cada vez mais forte no ônibus que os razia de regresso do estádio Hernando Siles. O público pacenho havia se encontrado com uma equipe que ganhava o grupo e, ademais, mostrava um grande comportamento.
O contato dos jogadores com a imprensa se fazia ao dia por meio do salão de jogos do hotel. Ali se consumia a maioria do tempo livre dos garotos. Os maiores preferiam as tigelas de café para harmonizar suas conversas e recordações, porque eles também tinham saudades. Enquanto isso, o doutor Lozada parecia imune à altura e caminhava e caminhava. Segundo os garotos, também comia e comia…
Uma troca de ares. A Argentina queria chegar a Santa Cruz de la Sierra para poder demonstrar seu potencial no nível do mar. Em La Paz, o ar já havia se tornado irrespirável pelos 3.600 metros. A celeste y blanca estava entre os quatro melhores e três países se classificavam para o Mundial.
Os triunfos sobre o Chile – a melhor partida, de longe – e Equador fizeram cumprir o primeiro objetivo. Mas no domingo de 29 de janeiro, o Brasil não deixou alcançarem o segundo. Nesse dia, a cara do Tomatito Pena mostrava a bronca por esse pênalti que lhe havia defendido o goleiro brasileiro Fábio [Noronha], e o sorriso que sempre exibe Mariano Juan aparecia oculto pelas lágrimas de impotência depois de sua expulsão. Nem falar do Juampi Sorín: o segundo amarelo contra o Equador lhe havia impedido de estar na fina. Nesse momento de dor, juraram sua revanche para o Mundial. E a conseguiram…
Agora recordo este diálogo. Antes da primeira partida do Sul-Americano, o Profe Salorio viu o título de EL GRÁFICO para a apresentação do plantel: “à altura dos sonhos”.
-É muito bom – disse -, lembre que vamos fazer cair bem.
Nessa vez se equivocou, porque ficou curto, outra vez a realidade havia superado o desejo e a ficção dos sonhos. Mas hoje, este grupo de garotos e homens é campeão do mundo.
CRESCER DE SÚBITO
“Qatar no problem, Qatar no problem”. As duas frases, repetidas até o desnecessário, começaram a se escutar nesses seres de túnicas brancas desde aquela noite de 9 de abril quando, depois de 28 horas de voo, a Seleção Argentina pisava nos domínios de Alá.
Era a viagem ao desconhecido, mas também a aventura excitante. Era o sonho de noites sem sonho, a vida do outro lado, o mundo de homens dominantes e mulheres submissas. E no meio de tudo, o sonho de uma taça. Entre aquele primeiro dia de olhos cor de espanto até este final de mãos tocando o céu sempre celeste de Doha, a voz amiga que a Seleção encontrou no coração generoso do povo do Qatar: “Qatar no problem” foi a frase fotocópia. “Argentina no problem”, também podemos dizer…
O quinto piso do hotel Ramada se converteu no bunker onde 18 corações acelerados bombearam para um só lado, dispostos a derramar sangue em nome da coragem esportiva. Próximo da celeste y blanca, longe da terra prometida. Nas pequenas histórias haverá que buscar, então, a semente para semelhante colheita. Em moços que se fizeram homens, em garotos que seguiram sendo garotos, em homens que em nome da condução souberam guiar, mas também compreender, na solidão de uns, no sofrimento de outros. Em anedotas de vinte dias inesquecíveis que começamos a espalhar…
O grupo não foi grupo, e veremos por quê. Comecemos por conhecer os papéis: o homem orquestra resultou Gerardo Salorio. O preparador físico é a costela de Pekerman e está a ponto de completar doze anos de trabalho junto ao diretor técnico. Ele repartiu os horários, deu as indicações de rotina, coordenou o trabalho da imprensa e sempre esteve seu vozeirão atrás da observação. Se até se pôde escuta-lo gritando desde o banco… “Não acredite que eu dê indicações, para nada. O único que faço é repetir o que José grita com sua vocecita quase inaudível. Aqui, quem manda é ele, apesar de o verem pouco. Tudo passa por sua decisão, embora às vezes também consulte”, comenta o professor, que nunca dormiu antes das duas e meia da madrugada, depois de efetuar a ronda pelos quartos, mas sempre estava se arrumando às oito da manhã…
Ademais, em seu quarto (o 535), tinha um pequeno quadro-negro… ali, a qualquer hora, aparecia José Pekerman para jogar uma partida imaginária com as fichinhas. Nos dias de jogo, os 18 jogadores se sentavam de frente ao quadro porque nesse lugar também se realizava a preleção técnica.
O lobby do hotel se converteu no pulmão do campeonato e, nas horas livres, quase sempre foi caminhado pelo grupo argentino. Não eram os únicos, claro. A princípio, outras 12 delegações estiveram alojadas mas, à medida que os dias passavam, os garotos focaram ficando sozinhos. Isto não nos impediu de conhecer um par de anedotas. Uma, o censo que os garotos fizeram dessa espécie tão pouco vista no Qatar chamada mulher. “A ver, a que atende na perfumaria, a da recepção, as duas gordinhas espanholas… a verdade é que não dá nem para ariscarmos…” foi a amarga confissão da gangue.
A outra teve como protagonista o pouco amável e quase sempre soberbo Andoni Goikoetxea, o treinador da Espanha, aquele que lesionou Diego Maradona quando jogava no Barcelona. Na segunda-feira de 24 de abril, um dia antes da partida semifinal, cruzou no elevador com o catamarquenho Julio Bayón. O basco, sem sequer cumprimentar, o apurou com um “hoje temos um joguinho fácil com a Argentina”. El Negro, mais saudável que pão integral, não o respondeu. Mas os caminhos voltaram a uni-los depois do 3-0. Então, Bayón tomou coragem, largou um sorrisinho e lhe recordou: “então hoje tinham um joguinho fácil contra nós?”. O algoz de Maradona olhou para outro lado e largou um “¡Hostia!” [o significado literal é a sagrada hóstia, mas na Espanha o termo também serve como palavrão equivalente ao mierda].
Que o campeonato ganharam os jogadores, mas também o corpo técnico, não se pode discutir. Leo Biagini era uma máscara de dor após a estreia contra a Holanda. Porém, o médico Donato Villani e o fisioterapeuta Raúl Lamas atacaram com toda a artilharia. É que vieram preparador a algo grande: em dois enormes baús, trouxeram aparatos de ultrassom, laser, onda curta, ondas diodinâmicas e unas 20.000 dólares em medicamentos. Leo pôde recuperar-se e jogar, mas ao médico ficou um sabor amargo quando se inteirou de que seu colega do River havia declarado que “Gallardo não poderia ter tratado sua tendinite se viajasse ao Qatar”.
O momento mais difícil que suportou a equipe não tem dissidências: todos opinam que foi depois da derrota contra Portugal. As outras duas situações pouco felizes resultaram da lesão de Biagini e a fratura de Diego Crosa, que se viu obrigado a regressar antecipadamente à Argentina.
Cada garoto foi uma história à parte, e assim precisou-se percorre-la. Depois de quase um mês de convivência com moços menores de 20 anos, o corpo técnico chegou a conhecê-los como ninguém e desta maneira atuou, com pautas gerais mas também com “tratamento individualizado”. Então, o mantra foi que para Irigoytía e Biagini “era preciso mima-los e lhes dar carinho nas costas”, a Pancho Guerrero “um palito e um doce”, a Lombardi “um bife para que reaja” e a Chaparrito “nada, é um típico jogador do Ferro Carril Oeste, da escola de [Carlos] Griguol“.
Mas a debilidade do grupo condutor estava no banco. Não, não eram eles mesmos, e sim Gastón Pezzuti, o goleiro do Racing que só jogou os últimos minutos contra o Brasil, quando substituiu o paranaense Irigoytía. Em que pese ter pouca participação, foi o primeiro a pôr o que fosse no ombro, em apoiar, em ajudar o roupeiro. Até tal ponto chegou sua bondade, que um dia se aproximou de Alejandro Del Bosco, nosso repórter fotográfico, e lhe pediu: ‘não poderias me tirar uma foto ainda que seja no banco? Quero levar uma recordação…”.
Dois dias antes da final, um qatariano que parecia não ter problemas de pagar as expensas se aproximou de Gerardo Salorio e lhe disse: ‘gostaria que preparasse fisicamente minha equipe. Quanto quer ganhar?”. Salorio refletiu um minuto e lhe respondeu: “não posso pensar nisso agora. Ademais, tenho contrato na Argentina e sempre trabalhei ao lado de Pekerman, que é como um irmão…”. O qatariano esboçou um “no problem”, mas prometeu voltar à carga.
Os garotos sofreram e muito com os 50 dólares diários de vales que lhes outorgou a AFA. Quase todos gastaram o dinheiro em cartões telefônicos, sobretudo quando se faziam mais largos os últimos dias fora de casa. Igualmente, a AFA lhes proveu dois cartões semanais de 100 riales [a moeda do mundo árabe] cada um (quase 30 dólares), o que lhes permitia falar dez minutos a cada sete dias. Pouquinho, não?
A famosa noite prévia também atacou os garotos, ou se não que fale o doutor Villani, que antes foi médico no basquete e no boxe: “a ansiedade matou todos nós. Ademais, como os garotos treinavam levemente, não estavam cansados e tampouco podiam dormir. Muitos tomaram Dormicum, que é um indutor do sonho”.
O sonho, se lembra, garotos? Aquele que agora se fez realidade…
OS MAIORES GAROTOS DO MUNDO
É a primeira noite sem lua no Qatar. Não importa, que vá mostrar sua saia nas águas do Golfo… é a última noite de estrelas no Qatar. Nem se veem, ficam perdidas entre tantas luzes… é a primeira noite de álcool no Qatar. Que Alá e os árabes se façam de distraídos, que nem todos os dias se festeja uma coisa assim… é a última noite de um ano acariciado no Qatar, e ninguém poderá tirar de nossas vidas o filme inesquecível que nem as lágrimas nem os latidos nem as veias nem o sangue nem as camisetas transpiradas e espalhadas poderão apagar…
A Argentina é campeã do mundo nas terras de Alá e de Aladim, e as duas coisas poderão se associar se deixar-se voar a imaginação.
A Argentina é campeã do mundo por fé própria e porque neste jogo de meninos foi a mais adulta de todas. Fé para crer, ainda quando poucos acreditavam. Homens para ganhar, sem perder a frescura desse moleque de bairro que fez uma viagenzinha de 22.000 quilômetros.
No deserto de Doha, com o Emir olhando sempre a linha de impedimento desde sua onipresente imagem no cartel do estádio Califa, com seu ministro da Defesa na foto do lado, controlando o meio-campo mas desta vez presente em corpo e alma, tomando o chá em jarras de ouro no palco oficial; com os qatarianos de túnicas brancas e vozes amigas; com os torcedores do Bangladesh, fanáticos pela Argentina por obra e graça de um tal Diego Armando, a ponto de coser com suas próprias mãos uma bandeira celeste y blanca e a frase: “Welcome, Argentina”. Com tradições estranhas e não tão estranhas, com a reza das seis, com nativos ricos de capa bordada em ouro e estrangeiros sem Rolls Royce que ainda assim vivem melhor que em sua sofrida terra; com a batucada que persegue qualquer camisa brasileira; com a solidão que agigante a procura; com paixão e sentimento, mas também com futebol, a Argentina termina de conseguir – na noite de um feriado de sexta-feira no Qatar, em um meio-dia de chuva e frio em Buenos Aires – o maior triunfo em Campeonatos Juvenis desde os tempos de Maradona e do Pelado [Ramón] Díaz, ali por 1979. Mas este tem outro sabor: se construiu com menos cartel e desde o silêncio, se soldou desde a solidariedade, cresceu desde a fé, e se fez grande em seu caminho.
A Argentina é Campeã e o sabe todo o mundo, mas na cabeça de seus heróis o globo terrestre tem limites precisos: é o choro infantil de Leo Biagini, é a carinha astuta do Corto Ibagaza, é a pergunta de todos feita canção naquele tema de León Gieco: “como estará meu bairro, ai, ai sim, como estará? O que pensará meu povo, ai, ai, sim, o que pensará?”. Que como está já saberão nesta chamada por telefone, o inesquecível tem a miscelânea das sensações encontradas: quarenta mil amigos graças a uma bola os aplaudem, as luzes começam a baixar, até que a artilharia dos fogos de artifício anuncia ao mundo árabe e ao mundo inteiro que nasceu um novo Campeão. Há um homem chamado José que beija uma medalha: é ouro o objeto e também o personagem; há um capitão que é símbolo, trepado no palco de honra, levantando com suas últimas forças essa taça que 17 sócios esperam bebê-la desde a ordenada espera de uma plataforma de premiação. A Argentina é campeã do mundo, e que ninguém venha agora a levantar-se com o prêmio no púlpito. Se houve uma seleção que saiu sem ruído, se houve uma equipe que carregou suas malas de apuro neste apurado Mundial sub-20, esta foi a Argentina. E ninguém fez ouvir sua voz de “estes vão ser campeões”. Perdão, houve: foram 18 garotos e um corpo técnico. Só que não o declararam.
Vieram ao desconhecido, sem mais forças que não suas próprias forças. Choraram de dor física e choraram porque tinham saudades. Gritaram quando foi necessário e calaram quando havia que escutar. Foram de incredulidade à fé, se abraçaram na derrota, se engrandeceram nos triunfos. E na noite sempre celeste do Qatar, presentearam ao povo futeboleiro a mais maravilhosa música que pode escutar em nome de um país: o hino cantado à capela, o anúncio de “World Champions” na placa, a Glória grande de grandes garotos e de garotos grandes…
O Brasil buscava o tetracampeonato neste sub-20. Há estímulo maior que copiar a conquista de seus colegas em 1994? Sim, há. Se chama sede de vingança e tem camisa argentina. Ninguém pôde esquecer aquela tarde de domingo em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia, a de 29 de janeiro de 1995, quando em ritmo de samba o 2-0 deixou nossos garotos com o sangue nos olhos. Mas a ferida possibilitou ver igual o horizonte, e pronto teríamos de compreender que estes garotos de Pekerman têm um par de virtudes que alguns maiores invejariam: a atitude solidária para o companheiro, o sentido tático para respeitar os tempos da partida.
Aquele triunfo nas semifinais contra a Espanha – lapidário, contundente – ofereceu em definitivo disparo para soltar os Pekerman Boys. O 3-0 frente “a melhor equipe do campeonato” até o momento, segundo opinião quase unânime, fez despertar estranhos e engrandecer próprios. É que – para além do triunfo – o realmente reconfortante havia sido o rendimento, com um presente do céu para quem mais merecia: Leonardo “Bati” Biagini sofreu como ninguém neste Mundial. Suportou quatro injeções diárias durante seis dias, infiltrações, cinesioterapia, imobilidade quando os demais treinavam, dor no corpo e em sua alma, a ponto de se confessar ante o jornalista e lhe dizer: “vivia chorando em meu quarto. Não podia entender como estive tanto tempo esperando um Mundial e vinha me acontecer isto…”. Mas isto tratou o corpo técnico, e Leo se levantou de suas cinzas.
Foi grito de gol contra a Espanha. E foi gritazo no minuto 26 contra o Brasil, quando “meti um canhotaço e, ao ver que entrou, fiquei cego, não sabia para onde correr”. Não teve muito tempo: nove leões de peles listradas cortaram seu caminho. Era o prêmio para o mais perseverante dos perseverantes. Era a Argentina na rota do sonho…
O Brasil se transformava em uma máscara de sua história. Claro, ninguém poderá dizer – na medida justa – quanto disto é assim por sua própria incapacidade ou porque enfrenta uma e-qui-pe que lhe foi fechando os caminhos. Lá estava El Vasco Irigoytía, transitando sua partida mais tranquila do torneio. Aí estão os quatro leões da defesa, onde os rugidos de Lombardi assustam os que se aproximam. Tudo o que lhe tiram ao fundo oficia de aduana. Ninguém passa, tudo volta…
A Argentina transitava o caminho do título com o andar sem sobressaltos. “Garotos, esta não é uma partida para liquidar no ataque ou contra-ataque: é para joga-la”. Assim se pensou, assim saiu…
Pim! Um drible de Ibagaza, “o New Maradona” qualificado pelos qatarianos. Pum!, uma sequência de dribles de Coyette, quem para olhos estranhos é só “o number seventeen”. E um pique de Leo, e outra saída de Larrosa, e a partida que se vai consumindo no meio de um estádio singular. O Brasil tem mais torcedores vindos de sua terra; a Argentina ganhou a simpatia nascida desde aquele grupinho do Bangladesh e ampliada porque “nós gostamos do povo de vocês, conhecemos seu presidente Menem e porque ‘we love Maradona’…”.
Quase quase como no campo do Boca, o estádio Califa foi ganhando a noite e as luzes. As próprias, para fazer de dia o dia mais sonhado; as alheias, nesse grupinho de onze que fazem tac-tac. Não há razões para a dúvida, se aproxima um grande campeão. Não há direito à exigência extrema, pedir a esta equipe espetáculo é admitir loucura. Não resta tempo para o sofrimento, a cinco do final, um Guerrerito entrou o mais Pancho e, de chuva e grito, ajustou a vitória e desatou o carnaval.
Não perguntem nada mais. Escutem esses uivos estranhos que acompanham a estrada ao céu. Observem os que os rodeiam: é um mundo sem mulheres por ordem do Alcorão. Sintam os que pulsam os corações: há inquietação nos nossos sócios do Mercosul, há bombeamento de metralhadora nos próprios, e há uma voz que se escuta porque é, quase, como um delegado de Alá na terra: o Heir Apparent Emir Sheik Hamad bin Khalifa al-Thani parou ante cada um dos heróis e com ele parou todo o estádio. E no momento em que José Néstor Pekerman agacha sua cabeça para que caia a medalha de ouro, o Califa lhe diz: “felicitações, estou muito contente pelo triunfo da Argentina e por seu presidente, Carlos Menem, que é amigo meu. Quero dizer-lhe que o povo do Qatar está muito feliz por esta conquista”.
José, com seu limitado inglês, conseguiu agradecer-lhe antes de voltar a beijar sua nova namorada dourada. Depois, quando o desfile no placo de honra trazia “a cara mais alegria que vi em meu filho em toda a vida”, como disseram mamãe e papai na sala de estar da casa, e as luzes deram passo aos fogos e os fogos aos estrondo e a recordação às lágrimas, 17 garotos começaram o ritual da volta, ao grito de “já se vê, já se vê, é para Diego [Crosa, no caso] que vê pela TV!”. Crosa – o garoto do Newell’s – estava com eles, corria desde sua perna imóvel, cantava desde sua sufocada garganta. Vivia, à sua maneira, a mesma sensação que seus companheiros.
Não podia ser de outra forma. Se ele também foi partícipe do juramento silencioso. “Vamos ganhar por nossas famílias e pela Argentina”. E por vocês, garotos. Por vocês…
A noite campeã seguiu no hotel Sheraton Doha, onde a Coca-Cola organizou o jantar de premiação. Foi o tempo das gratificações continuadas, que começou com a Bola de Bronze para El Vasco Irigoytía, eleito pela imprensa como o terceiro melhor jogador do Mundial. A de Prata levou Dani, atacante de Portugal, e a de Ouro – embora muito questionada –, o brasileiro Caio. Com o troféu sem soltar de sua mão, El Vasco repetia: “a mim me bastava e sobrava em ganhar o Mundial. E agora, isto… digo a meus companheiros que me belisquem, porque não posso acreditar”.
Os que sim acreditavam que o que lhes serviam era a bebida proibida nestas terras foram os garotos argentinos, distribuídos em três meses designadas para a delegação: pela primeira vez em vinte dias no Qatar, provaram uma jarra de vinho. Tinto para mim, branco, os garotos saíram do molde de uma tediosa festa e começaram a cantar: “Argentina é um sentimento/não se explica, se leva bem adentro/É por isso que sigo onde esteja/ Argentino, até que eu morra/Souuuu campeão mundial/Souuuu campeão mundial”…
Depois soltaram uns balões que adornavam o centro da mesa, ataram à plaquinha da Argentina que os identificavam e a largaram ao céu. Quando tomou voo, se escutou o “Ohhh, não vá embora campeão/Quero ver-te outra vez…”. A banda dos Sorín, Ibagaza, Juan, Domínguez, Guerrero encabeçava o festejo. Sempre em um cantinho – porque assim são – Biagini, Pena e Irigoytía só olhavam e às vezes lhes escapavam algum sorriso…
Às onze meia da noite, voltaram ao hotel Ramada, hospedagem de tantas noites de sonho. Mas a madrugada do sábado foi distinta: quase ninguém dormiu, choveram as chamadas desde a Argentina, alguns cruzaram no Dairy Queen, um fast food americano para comer sanduíches, e em outros saiu a alma de criança que ainda têm: às quatro da manhã, o preparador Salorio se aproximou de um quarto porque escutou ruídos: Lombardi, Juan, Ibagaza, Guerrero, Larrosa e Domínguez fizeram “Titãs no Ringue” na cama do Corto Ibagaza! Estavam jogando futebol com uma bola de papel!
Às seis da manhã, todos menos Irigoytía, Pezzuti e Coyette apareceram pela primeira vez na desejada piscina de natação, duas horas mais tarde tomavam café da manhã e às oito e meia o plantel visitava o camelódromo, famoso por ter sido cenário da queda de Javier Alberto Castrilli.
As últimas horas se consumiam em Doha. Era o tempo das compras apuradas, das saudações de despedida, do adeus a esta cidade ontem desconhecida e hoje inesquecível. Saímos do Qatar: alguém escala no… Kuwait. “Outra vez tem que descer, Mosche?”, metralharam Rubén Moschella, do administrativo da AFA.
E foi preciso descer, sem mais, e cinquenta minutos bastaram para o percurso de rotina. Pekerman quis comprar uma televisão de bolso, mas a voz do Pancho Guerrero – “José, não leve isso, já averiguei e pelo sistema não se assiste na Argentina” – o tirou para trás. Já era meia-noite do sábado, as primeiras 24 horas na vida dos campeões mundiais. As seguintes – não havia chances de outra coisa – foram um grande sonho, mas a sério. Os garotos e os adultos caíram fulminados a 11.000 pés de altura, até que o “Bem-vindo a Amsterdã” lhes pôs na terra de seus primeiros vencidos no campeonato.
Era preciso estar 15 horas na cidade, antes de empreender o regresso a Buenos Aires via… São Paulo, porque até ali chegava o voo para depois fazer a conexão que os deixava – ao meio-dia da segunda-feira de 1º de maio – em Ezeiza.
Os garotos não aguentavam mais: entre a noite da segunda-feira que ninguém dormiu, a do sábado acima do avião e esta manhã de chuvisco holandês, muitos ficaram deitados no lobby esperando a saída para conhecer a cidade. “Vamos, garotos, vamos ao bairro da luz vermelha, olhar um pouco de mundo”, incitou o médico Villani. E ali foram todos, às ruas onde os sex shops e a prostituição vendida desde as vitrines é já um lugar turístico por onde passeiam as famílias.
Às 23h20 do domingo de glória, com 17 medalhas penduradas e uma para ser entregue em Rosario, com a taça de mão em mão e o orgulho lhes inflando o peito, embarcava a Argentina até sua terra prometida. Pelos que estivemos e pelos que ficaram à distância, por “nossas famílias e nosso povo”, mas sobretudo pelos autores da dedicatória, simplesmente obrigado.
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