Se na década de 1980 a polêmica entre os defensores dos estilos Menottista e Bilardista de jogar futebol polarizaram as opiniões na Argentina, isso em breve começaria a mudar. Nos anos 1990, algumas novidades começaram a modificar o cenário.
Primeiro, os sucessivos fracassos profissionais dos próprios Menotti e Bilardo. Endeusados por seus seguidores, ambos começaram a perder parte de seu encanto à medida em que o tempo passava e seus trabalhos deixavam de ser bem sucedidos. Bilardo não conquista um título desde o mundial de 1986. Menotti não leva um clube a um título desde a Copa do Rei de 1983 com o Barcelona (essa história não acabou: no momento, Bilardo faz suas trapalhadas na coordenação de seleções nacionais e Menotti fracassou como manager do Independiente).
O fato de os chefes supremos dos dois grupos acumularem insucessos em seus trabalhos ajudava a enfraquecer a força dos argumentos de lado a lado. Afinal, nenhum argumento seria melhor para os contendores do que as conquistas de seus líderes. Como isso não acontecia, surgia espaço para questionamentos a ambos. E isso não demoraria a acontecer.
Logo surgiria um terceiro estilo de jogo, no qual treinadores como Daniel Passarella e Marcelo Bielsa conseguiriam grande sucesso. Esse estilo consiste basicamente na marcação adiantada por pressão. Os times que jogam nesse estilo marcam a saída de bola do adversário, tomam a bola ainda no campo de ataque. Portanto, embora sejam calcados na marcação e no contra-ataque, são muito ofensivos, já que têm a bola nos pés o tempo todo, e perto do gol inimigo.
Esse estilo não era totalmente original. Nele, se encontram facilmente influências do estilo holandês de 1974, que também abusava da pressão no campo adversário. Tampouco é exclusivo dos argentinos, já que não difere muito das vitoriosas equipes do Barcelona campeão europeu em 2006 e 2009 ou da seleção espanhola campeã da Euro-08 e o Mundial-10.
No entanto, a Argentina é o único país onde o sistema é utilizado de forma regular. A própria seleção nacional o utiliza com frequência, em especial nas partidas em casa. E é um sistema que dificilmente se adequa às concepções menottista e bilardista. A força da marcação e do contra-ataque o aproximam do estilo da seleção de 86, mas o grande volume de jogo e o enorme percentual de posse de bola remetem ao selecionado de 78.
Para complicar ainda mais o quadro, apareceu o grande sucesso de Carlos Bianchi, que em 10 anos conquistou 7 títulos argentinos e 4 libertadores, por Vélez Sarsfield e Boca Juniors. Bianchi tampouco construiu sua carreira a partir da fidelidade aos modelos menottista ou bilardista. O treinador se celebrizou pelo equilíbrio de suas equipes e por extrair o máximo possível de seus jogadores.
Distribuía seus jogadores em campo de forma simples: quatro defensores, uma linha de três volantes, um mais marcador pelo centro e dois que defendem e atacam pelos lados, um enganche que centraliza a armação da equipe, e dois atacantes.
Na postura dos times de Bianchi, talvez tenhamos a melhor ilustração para o novo cenário, em que as duas antigas escolas não dominam mais o quadro sozinhas. El Virrey sabia plantar suas equipes de forma solidamente defensiva para explorar os contra-ataques, mas também conseguia alternar esse estilo com outras possibilidades, como a marcação mais avançada.
Hoje, menottismo e bilardismo ainda são reconhecidos como formas rivais de ver futebol, e ainda suscitam debates apaixonantes. No entanto, não há mais um quadro em que todos se sintam obrigados a abraçar de forma conclusiva uma ou outra corrente. E há os que não vêem mais grande mérito em nenhuma das duas, preferindo se declarar “bielsistas”, “bianchistas” ou afiliados de outro treinador qualquer.
Nesse país onde discutir ardentemente questões táticas faz parte da experiência dos apaixonados por futebol, a oposição radical entre duas formas de ver o futebol talvez fosse mesmo pouco. O quadro mais amplo e variado que existe hoje provavelmente faça mais justiça à imensa riqueza tática do futebol argentino.
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