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Matías Almeyda solta o verbo no River. Ele está com a razão?

Almeyda ficou em silêncio. Depois soltou o verbo… E só falou bobagens

Após a derrota para o Belgrano, na estreia pelo Torneio Inicial, e retorno à elite argentina, o técnico Matías Almeyda pareceu não aguentar a pressão e soltou o verbo: “River é um clube que vive constantemente contaminado. Há muitos interesses por aqui…”. O técnico tenta segurar a pressão, mas sente o peso da corda apertando cada vez mais o seu pescoço.

Tudo estava preparado para uma festa. E por que tinha de ser assim? Por que não poderia ser apenas uma partida normal em que a festa fosse mais pelo reencontro com a elite do que com quaisquer outras coisas? Só que interesses mais uma vez rodearam o River e prejudicaram tudo. Primeiro, o interesse da TV, que queria um jogo simbólico para começar as transmissões da temporada argentina. Então, o rival do Millo precisava ser o Belgrano, nenhum outro. E o cotejo seria em Núñez, o mesmo palco do histórico rebaixamento.

Soma-se a isso o interesse político dos dirigentes que fazem do River Plate uma plataforma social e política. Por isso, não se impuseram ao fato de ter o Belgrano como o rival da estreia. Nisso há muito de arrogância, como a baixa ou nula previsibilidade sobre um possível fiasco diante dos torcedores. Nisso, há até mesmo um grau profundo de inconsequência que deveria gerar responsabilização criminal aos dirigentes. Afinal, quem se importa com as consequências do que aconteceu no embate com o Pirata cordobês?

O mesmo interesse político foi o responsável pela distribuição gratuita de ingressos a milhares de torcedores. Uma atitude demagógica e que estaria a serviço de uma lotação do Monumental de Núñez. Você, torcedor que está lendo este post (torcedor do River ou não), acha mesmo que precisava dessa “forcinha” à torcida? Quando foi que os fanáticos e fiéis hichas millonarios não lotaram a cancha mesmo quando a equipe estava na segunda divisão?

Como efeito imediato do que aconteceu, o técnico Matías Almeyda pareceu não aguentar e falou: “ O River é um clube que vive constantemente contaminado. Há muitos interesses por aqui…”. Todos sabem das ressalvas que mantenho sobre o Pelado como o comandante do banco millonario. Porém, se há algo incontestável é que ele está sozinho nos momentos de segurar a bronca no clube.

Passarella nunca desejou contar com os serviços de Almeyda. Só o contratou porque precisava de um ídolo do clube no banco de reservas. Relevante seria se esse ídolo fosse um antigo jogador, recém-aposentado. Ele poderia até ser o Ortega, se “el Burrito” não fosse incontrolável. Para Almeyda, assumir o comando do Millo era mais do que um prêmio; era a melhor maneira de transitar das luzes que o focalizavam, no campo, para o repentino anonimato que marca a primeira morte na vida de um futebolista: o fim de sua carreira profissional.

Nesse sentido, Almeyda se encaixava no esquema, pois elevaria o prestígio de Passarela e ainda ficaria caladinho diante dos absurdos desse dirigente para com o futebol. O episódio com “el Chori” Domínguez e Cavenaghi diz muito sobre isso. O técnico seria demitido por Passarela em dezembro. Foi então que os dois jogadores foram à sala do presidente e propuseram partir juntos com o Pelado. Foi isso. Só isso que fez Almeyda chegar ao fim da B Nacional no comando do River. E como Almeyda pagou a conta? Deixou-se usar por Passarella para se livrar dos dois jogadores ao fim da temporada.

E por que Almeyda foi mantido no banco, após a B Nacional? Porque todo mundo falou em uma seleção, em um dream team millonario. Só que quando os dirigentes caíram na real, perceberam que não podiam contratar tanto assim. Ora, uma seleção seria comandada por um técnico de ponta; um time meia-boca, por Almeyda.

Após a derrota para o Pirata, o técnico não aguentou: “Eu estou aqui pelos resultados, trato de não me enganar em relação a isso e de levar a campo a melhor equipe possível. Porém, é complicado trabalhar em uma atmosfera tão negativa; uma atmosfera onde somos culpados por tudo”. Foi a primeira vez que Almeyda deixou de ser o boneco de Passarela para criticar o dirigente abertamente.

Mas terá apoio dos seus jogadores? Que jogadores do elenco ficarão ao seu lado, se a sua cabeça for solicitada pelos torcedores e cartolas de Núñez? Trezeguet? O francês entendeu que a neutralidade suíça é o melhor remédio a tomar para dispor de uma vida longa no River. Ponzio? O meia deu demonstrações de pender para um lado ou para outro, a depender daquele que está mais forte no momento. Dos garotos? Eles não vão revelar, mas estão furiosos com o técnico e até Villalba de profunda identificação com o clube pediu para ser negociado.

“Todos vocês sabem qual é o ambiente contaminado de que falo. É difícil estar em um lugar em que a todo instante estão procurando pelo em ovo”. E para finalizar esse raciocínio, o treinador foi extremamente infeliz ao dizer: “Aqueles que torcem pelo River, que torçam pelo River; aqueles que não torcem, que nem apareça por aqui”, disse o Pelado, perdendo a oportunidade de ficar quieto ou a de revelar quais são os “elementos” que circulam no clube e que são potencialmente destrutivos para o seu ambiente.

Uma das hipóteses para as declarações de Matías Almeyda pode está relacionada aos visíveis vacilos que ele tem cometido no comando da equipe. Muitos perguntaram por que Funes Mori foi quem bateu o pênalti contra o Belgrano. “foi o quarto jogador que perdeu um pênalti; sou um técnico que dá liberdade e deixa os atletas decidirem quem vai bater”, disse o Pelado. Tá errado! No momento em que nem mesmo Trezeguet busca a pelota para cobrar o penal era o momento de o técnico deixar de ser omisso e determinar que um determinado jogador fosse para a cobrança.

Outro evento é o da presença de Vega no arco, uma vez que o clube fez um enorme esforço para contratar Barovero. “Eu treino todos os dias e sei quem transmite mais confiança. Barovero chegou depois de Rojas e Bottinelli. Para trocar o goleiro eu tenho de estar completamente convencido, e ainda não estou. Eu olho para o lado humano, Vega foi um dos grande responsáveis pelo acesso, defendendo bolas fundamentais. Sempre há um momento correto para se trocar um goleiro”, disse o técnico, considerando que nem a falha de Vega, no primeiro gol do Belgrano, é suficiente para que ele entenda que o momento dessa troca talvez já exista.

Se Daniel Vega é o arqueiro de confiança do treinador, por que então ele pediu Barovero? Será que as performances dos dois porteiros nas últimas temporadas não são suficientes para o treinador determinar quem deva ser o titular da camisa do River? Para muitos, não há comparação entre os dois porteiros, mas para Almeyda, ao menos no atual momento, Vega é superior. E a pergunta não esgota: por que então foram buscar o guardametas fortinero?

A partida contra o Belgrano foi muito parecida com algumas disputadas pelo River na B Nacional. Após estar em desvantagem, a equipe corria atrás do prejuízo e, em muitos casos, conseguia reverter o placar no final. Ontem, não aconteceu isso. Estaria a sorte abandonando o clube na sua volta à elite? Da mesma forma, o técnico millonario soltou o verbo justamente após o primeiro resultado negativo. Estaria o técnico esgotado e sentindo-se incapaz de continuar a ser o “boneco” de Passarela?

São muitas interrogações. Mas da mesma forma que a desastrosa atuação do árbitro Germán Delfino não é necessária para o River, todo o contexto de coisas nebuloso que o cerca também não é. A dívida não é das menores, mas se instabilizou; a base é excelente e há bons valores para quase todas as posições. Reforços são poucos e, embora fracos, também se encaixam à necessidade de formar um time.

Em outras palavras, a crise é muito menor do que aquela que todos insistem em pintar. Alguns dirigentes do próprio clube parecem deseja-la. Alguns meios também. O técnico, mesmo sem o desejar, contribui para isso. No entanto, o clube é forte e poderoso e, por isso, ainda torna esse cenário algo totalmente administrável. Mas até quando? Os esforços em prol do abismo são muitos e se eles continuarem é bem possível que o clube realmente se afunde.

Joza Novalis

Mestre em Teoria Literária e Lit. Comparada na USP. Formado em Educação e Letras pela USP, é jornalista por opção e divide o tempo vendo futebol em geral e estudando o esporte bretão, especialmente o da Argentina. Entende futebol como um fenômeno popular e das torcidas. Já colaborou com diversos veículos esportivos.

3 thoughts on “Matías Almeyda solta o verbo no River. Ele está com a razão?

  • Lucas Castro de Oliveira

    Todo apoio ao Almeyda. Comete erros mas ele é o mais sóbrio no River.

  • Elsio Limoeiro Filho

    O River precisa de uma mudança administrativa radical, mas confesso que não estou bem interado sobre como isso seria possível. O certo é que vi alguns fantasmas de 2011 assombrando o time e a torcida logo na primeira rodada. Haja coração!

  • Mauricio

    Acho que também andei vendo alguns fantasmas. Não gostei nada. Ah, mais uma vez parabéns por essa matéria, sensacional.

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