Nenhuma seleção foi tantas vezes campeã mundial de juniores quanto a Argentina. Uma tradição que se iniciou há exatos 35 anos, simbolicamente com Maradona sendo o grande astro. O título veio sobre a campeã anterior, a União Soviética, em um 3-1 com gol dele e do outro grande destaque argentino, Ramón Díaz, artilheiro da edição 1979 do mundial. Antes de se tornar o desbocado técnico mais vezes vitorioso do seu River, treinado novamente por ele até o título no último semestre, El Pelado Díaz era tímido, mas um poderoso atacante.
O primeiro mundial de juniores foi criado em 1977. Foi uma das novidades da gestão empresarial que João Havelange, presidente da FIFA desde 1974, estabeleceu no comando da entidade. Os argentinos, porém, não participaram. Seu futebol estava ainda mais desorganizado institucionalmente do que hoje – para se ter uma ideia, viveu-se um jejum de trinta anos no sul-americano juvenil, entre 1967 e 1977.
Em 1979, a classificação veio como vice dos anfitriões uruguaios no quadrangular final em que a ameaça principal nem foi o Brasil, mas o Paraguai, cujo futebol vivia bom momento – naquele ano, o Olimpia se tornou o primeiro clube de lá a vencer a Libertadores (sobre o Boca, então bicampeão seguido do torneio) e a seleção principal venceu a Copa América, vencendo fora de casa o próprio Brasil. Romerito, bem conhecido no Fluminense, estava nas duas seleções paraguaias e, já naquele mundial, levaria a bola de prata de segundo melhor jogador do torneio. Maradona ficou com a de ouro. Díaz, com a de bronze.
Além de Maradona e Díaz, os outros personagens que vingariam quando cresceram foram os meias racinguistas Juan Barbas, que ficou de fora da Copa 1986 simplesmente por opção de Carlos Bilardo (foi à de 1982), e Gabriel Calderón, único profissional que a seleção convocou tanto do Racing como do rival Independiente – ele, já como jogador do Paris Saint-Germain, iria à Copa 1990. O correto zagueiro Juan Simón também iria a 1990, sendo raro destaque do time pouco brilhante que conseguiu ir à final: só ele, vindo de um Boca em péssima fase, e Maradona jogaram todos os minutos argentinos na Itália.
Dos obscuros, algumas convocações curiosas: os goleiros eram Sergio García, do Flandria, clube que jamais esteve na elite do campeonato argentino, e Rafael Seria, do Central Córdoba, o mais expressivo dos nanicos clubes de Rosario e que só apareceu na primeira divisão em 1959. O atacante Alfredo Torres e o defensor Jorge Piaggio eram do Atlanta, clube dos mais tradicionais na elite mas que começava a experimentar longa decadência – seus dois juvenis foram campeões mundiais semanas após o Bohemio ser rebaixado para só voltar em 1983, cair já em 1984 e desde então jamais retornar outra vez.
O técnico foi o mesmo da seleção principal: César Luis Menotti. Ele já havia dado chance nela a alguns daqueles jovens (Barbas estreara em abril daquele 1979 e Maradona ainda em 1977) e em seguida usaria outros: Calderón e Simón debutaram em 1980 e Díaz teve sua primeira oportunidade apenas cinco dias depois do título que hoje faz 35 anos. Dizia-se que, no papel, a equipe que foi à Copa 1982 era até melhor que a campeã de 1978, por conservar a base campeã somando-a entre os titulares com Maradona e Díaz, autor do gol de honra hermano na derrota para o Brasil. Barbas também jogou naquela ocasião.
Já o mundial de 1979 foi uma competição de tiro-curto. Em duas semanas, a Argentina começou sua trajetória no Japão massacrando a pobre Indonésia por 5-0 e finalizou naquela final frente a URSS. A estreia já indicou os destaques dos campeões: os gols foram de Maradona, que fez dois, e de Díaz, que fez três. Os sul-americanos se deram ao luxo de descansar no segundo tempo, pois marcaram no primeiro todos os cinco. Os outros dois adversários do grupo eram as potências comunistas Polônia e Iugoslávia.
Os iugoslavos, contra quem a Argentina tinha um retrospecto de rigoroso equilíbrio (nove dias depois, as seleções principais se enfrentaram em Belgrado e os europeus venceram por 4-2. Ramón Díaz até marcou ali seu primeiro gol pela seleção principal) deram mais trabalho: perderam só de 1-0, gol do velezano Osvaldo Escudero. “Não me esqueço mais da conversa do Flaco (apelido de Menotti) no intervalo (…). Íamos 0-0, nos haviam dado um baile bárbaro. ‘Para que c%*#lho viemos ao Japão?’, começou, assim que entramos no vestiário. ‘Para jogar dessa forma que ficassem em casa, isso não é o que falamos. Agora saiam e sejam fiéis a uma ideia, me lixo para o resultado”, declarou Simón a respeito.
A bronca parece ter funcionado contra os poloneses, que viviam geração de ouro entre meados dos anos 70 e 80 mas foram surrados, levando de 4-1. Maradona marcou outra vez em grande noite de Calderón, que fez dois – o próprio Simón fez o outro. Maradona e Calderón voltaram a anotar no primeiro mata-mata, contra a Argélia, que com alguns daqueles jovens estrearia em Copas em 1982 (fazendo barulho), mas levou de 5-0. Os outros três gols foram todos do artilheiro Díaz. Novamente, o primeiro tempo, com um gol de cada, praticamente decidiu a sorte da partida. Apenas dois dias depois, vieram semifinais, que seriam um clássico com o Uruguai de Rubén Paz.
O troco pelo vice sul-americano veio com 2-0, e os protagonistas Maradona e Díaz novamente deixaram os seus em uma vitória mais complicada, só obtida no segundo tempo graças a bobagem do obscuro Nelson Alaguich: o defensor tentou sair jogando, teve passe interceptado por Calderón, que serviu a um Díaz desmarcado fuzilar Fernando Álvez. No segundo, Díaz puxou um contra-ataque desde a defesa e em disparada chegou a driblar o goleiro Álvez, mas perdeu ângulo e cruzou para Maradona, sem marcação, fazer de cabeça. Já o roteiro contra a URSS de Oleksandr Zavarov (que jogaria pela Juventus) foi ainda mais difícil: os alvicelestes se viram pela primeira vez atrás no placar.
O obscuro Igor Ponomaryov abriu o marcador aos 7 do segundo tempo, em um potente cabeceio na entrada da grande área. Só que o “científico” futebol soviético não podia com aquele jovem diamante já tão bem polido como Maradona no esplendor dos seus 19 anos e sem nenhuma droga no sangue. Os três gols da virada vieram em espaço de oito minutos, do primeiro ao último: o defensor Hugo Alves, em pênalti assinalado pelo brasileiro José Roberto Wright aos 25; Ramón Díaz virou aos 28 enfileirando vermelhos em linda jogada individual desde antes do meio-campo e chutando cruzado na pequena área. O placar e o torneio foram fechados aos 35 por gol do astro maior, com Dieguito em magistral cobrança de falta.
Além de revelar de vez a joia Maradona ao mundo, aquele título pioneiro foi especial também porque, por relativamente um bom tempo, ser o único da Argentina na categoria. A Albiceleste só se firmaria como potência juvenil a partir de meados dos anos 90, quando o técnico José Pekerman, hoje de sucesso na Colômbia, venceu três dos quatro mundiais realizados entre 1995 e 2001. Não à toa, ele levou diversos ex-comandados à Copa 2006 (Sorín, Riquelme, Franco, Cufré, Samuel, Cambiasso, Placente, Scaloni, Gabriel Milito, Burdisso, Coloccini, Saviola e Maxi Rodríguez), onde por muito pouco o time não eliminou a anfitriã Alemanha e chegou mais longe do que as quartas-de-final. Messi, Gago e Garay foram as revelações da taça de 2005. A sexta e última taça mundial sub-20, no já distante 2007, veio no embalo de Agüero, Romero e Di María. Mas nenhuma das cinco seguintes foi tão histórica como a pioneira – e maradoniana – erguida naquele 7 de setembro de 1979, no Estádio Nacional de Tóquio…
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