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Há 30 anos: Estudiantes bicampeão em um semestre

Festejado por Gottardi (abaixo) e Ponce, o zagueiro Brown comemora seu gol no título do Metropolitano. Faria também na final da Copa 1986

Por motivos óbvios, os semestres mais especiais para o Estudiantes referem-se às suas numerosas conquistas internacionais, mais até do que muitos clubes argentinos mais graúdos. Ainda assim, o primeiro semestre de 1983 também foi dos mais festejados pelo Pincha: nele, o alvirrubro de La Plata conseguiu dois títulos argentinos. Um dos integrantes era o atual técnico da Argentina.

Até então, o clube conseguia ter mais títulos no exterior do que no próprio país – nele, o único era o Metropolitano de 1967. Como vice do Nacional daquele mesmo ano, os pincharratas chegaram à vitoriosa Libertadores de 1968, retratada recentemente (aqui). Ela os levou à vitoriosa Intercontinental de 1968 e também os garantiu nas semifinais da Libertadores seguinte, também conquistada. O título desta, por sua vezes, os colocou na mesma fase da Libertadores posterior, igualmente vencida.

O ciclo daquele Estudiantes encerrou-se após nova final da Libertadores, a de 1971, desta vez perdida (para o Nacional) – tanto que, em 1972, a equipe lutou contra o rebaixamento e, na maior parte da nova década, foi apenas sombra daquele incomum surto de grandeza. O clube chegou a ser simplesmente o maior vencedor da América, até o Independiente superá-lo em 1973. E foi justamente o Rojo de Avellaneda o vice do Pincha naquele bicampeonato.

O primeiro título, na verdade, foi o Metropolitano de 1982, só finalizado em 14 de fevereiro de 1983. A seguir, o Estudiantes obteria também o Nacional de 1983, há exatamente três décadas, em 10 de junho daquele ano. O tempero extra para a torcida alvirrubra foi comemorar as taças enquanto o rival Gimnasia y Esgrima amargava a segundona.

Bilardo, de jaqueta vermelha, à esquerda. O senhor de azul mais acima no canto direito é Ricardo Echeverría, preparador físico que acompanharia Bilardo na seleção, indo às Copas de 1986, 1990 (e até mesmo para a de 1994, já no ciclo de Alfio Basile)

O Metro de 1982 iniciou-se em meados de julho, após a Copa do Mundo. Semifinalista do Nacional de 1982, o clube começou arrancando no torneio seguinte: quatro vitórias nos quatro primeiros jogos (1-0 no Racing de Córdoba fora e no Huracán em casa, 2-0 no Rosario Central fora e 1-0 no Platense em casa), até derrota para o Boca na Bombonera (0-1). Foi o primeiro dos apenas três reveses que os platenses tiveram nas 36 rodadas do torneio.

Outra das derrotas, também para o Boca, no returno, foi a única que sofreram em La Plata. Dos triunfos, destaques para um 3-0 no Nueva Chicago em casa (11ª rodada), 4-0 no Unión em casa (17ª), 2-1 no Vélez fora (18ª), 3-1 no Huracán fora (21ª), 3-1 no Rosario Central em casa (22ª), 2-0 no Argentinos Jrs fora (32ª), 3-1 no Racing fora (34ª), 2-0 no Unión fora (36ª) e no Talleres, também fora, na 38ª e última rodada: o jogo do título.

O Independiente, desde cedo, seguiu colado no Estudiantes, também vencendo seguidamente nas (três) primeiras rodadas. Se os diablos, também só com três derrotas na campanha, se valeram de grandes goleadas no caminho (como 5-0 no Ferro Carril Oeste, 4-0 no Instituto de Córdoba e 6-1 no Argentinos em casa, e 4-2 no Central fora), pecaram por alguns empates bobos em Avellaneda (2-2 contra Racing de Córdoba, 1-1 contra Huracán e Nueva Chicago, 0-0 contra Sarmiento de Junín).

Nos confrontos diretos do Independiente contra o campeão, 0-0 em La Plata e 1-1 em casa. O campeonato foi decidido em Córdoba: na rodada final, o Estudiantes enfrentou lá o Talleres e o Rojo, o Racing local. Apesar da menor margem de erro, o Pincha, que tinha uma vitória a mais (20) e um empate a menos (12), em época onde a vitória valia 2 pontos, corria risco nada desprezível de perder a taça: isso ocorreria se saísse derrotado e o concorrente vencesse.

Brown, Bertero, Agüero, Russo, Camino e Herrera; Trobbiani, Gurrieri, Trama, Ponce e Sabella: os titulares de exato 35 anos atrás, contra o Independiente em Avellaneda

Hipótese afastada já aos 8 minutos de jogo, quando o placar contra o Talleres foi aberto de pênalti (Sabella fora derrubado) pelo zagueiro José Luis Brown. Não muito depois, aos 24, a partida teria seus números finais, com o gol de Gottardi: 2-0, após receber de Marcelo Trobbiani, ganhar a corrida contra dois adversários e driblar o goleiro. Nem a sua parte o Independiente conseguiu fazer, ficando no 2-2 em outro canto de Córdoba. O técnico campeão era um remanescente dos pincharratas supervencedores da Libertadores: o ex-meia Carlos Salvador Bilardo, que foi logo chamado para assumir a seleção argentina.

No lugar de Bilardo, outro antigo integrante daquela equipe dos anos 60: o zagueiro Eduardo Luján Manera. Os alvirrubros estrearam no Nacional em 12 de março, cerca de um mês após vencerem o Metro. O Nacional não costumava ser tão valorizado pelos clubes portenhos, em parte pelas fórmulas cada vez mais complicadas. Naquele, oito grupos de quatro cada classificavam os três primeiros de cada para uma segunda fase, onde estes seriam redivididos em outros oito grupos.

Por fim, os dois primeiros destes avançavam às oitavas-de-final, em mata-matas que se sucediam até a decisão. Os comandados de Manera mantiveram o ritmo. Terminaram líderes em ambos os grupos pelos quais passaram (uma derrota em 6 jogos, contra Racing de Córdoba, Unión de Santa Fe e Unión de San Vicente; o grupo seguinte foi com Vélez e Instituto de Córdoba). Nas oitavas-de-final, não tiveram maior trabalho contra um surpreendente Nueva Chicago: 2-0 em La Plata e 1-0 no bairro portenho de Mataderos. As fases seguintes foram mais complicadas.

O Estudiantes foi avançando conforme abria boa vantagem em casa e a aproveitava fora: 1-0 no Ferro em La Plata, 2-2 no bairro de Caballito nas quartas; 3-1 no Racing em La Plata, 1-2 em fora; 1-1 em casa contra a grande surpresa do torneio, o nanico Temperley, novo 1-1 fora e 2-0 na prorrogação; por fim, as finais contra o Independiente: os 2-0 em La Plata (Gottardi, trombando com a defesa adversária em lançamento de Ponce; Trama fez o segundo ao disparar pela ponta-esquerda após receber de Sabella e fuzilar Goyén), onde poderiam ter vencido por mais (tiveram um gol mal anulado e uma bola na trave) permitiram aos pinchas saírem campeões após saírem derrotados em Avellaneda por 1-2.

Já experiente no River e na Inglaterra, o então cabeludo Sabella chegou à seleção por conta daquele Estudiantes (a Argentina ganhou do Brasil, depois de treze anos)

Giusti abriu o placar, aos 14, aproveitando lançamento de Bochini e levando a melhor contra dois marcadores. Trama empatou aos 44, aproveitando rebote de Goyén, pego no contrapé em falta cobrada por Ponce que desviou na barreira. Trossero, aos 25, recolocou os anfitriões à frente com um chutaço de fora da área no ângulo de um adiantado Bertero, mas não bastou: os visitantes impunham o segundo vice. Mesmo em suas melhores épocas, o Pincha nunca foi bicampeão argentino seguido. Aquele período 1982-83 foi um oásis para o Estudiantes, a novamente decair em poucos anos até ser rebaixado em 1994. Entre os anos 90 e os 2000, viu o Gimnasia regularmente brigar pelos títulos, só invertendo a situação após Verón chegar em 2006.

Aquele elenco tinha simplesmente três enganches: “ter a bola (era a chave da equipe). Carlos (Bilardo) foi um adiantado ao colocar a mim com Ponce e Sabella, algo parecido ao que faz o Barcelona com Xavi, Iniesta e Cesc. Era muito difícil que nos tirassem a bola, por isso o mote de que o Estudiantes não jogava é mentira, dávamos baile em todas as outras equipes”, afirmou o meia Trobbiani. Um time que não deixava de lado a face aguerrida: um mês depois, em 8 de julho, o jogo contra o futuro campeão Grêmio pela Libertadores virou “A Batalha de La Plata”. O próprio Trobbiani recebeu amarelo antes do início. Até os 31 minutos do segundo tempo, o Pincha perdia por 1-3 e tinha 7 jogadores em campo. Empatou.

Dentre os bicampeões há 30 anos, quatro teriam maiores destaques: Bilardo ofereceria na seleção as primeiras chances dos meias Julián Camino, Miguel Ángel Russo e Sabella e do zagueiro José Luis Brown, levado à Copa do Mundo de 1986 junto de Trobbiani quando já estava no Atlético Nacional de Medellín (Colômbia), enquanto Trobbiani estava na segunda divisão espanhola (Elche). Os dois se destacariam na final: Brown abriu o placar, em seu único gol pela Argentina, e Trobbiani foi colocado em campo para ganhar tempo, nos últimos minutos, e seu único lance foi um toque de calcanhar. Sabella e Russo, candidatos àquele mundial mas que ficaram de fora, destacaram-se como técnicos.

Os adversários Trossero e Brown posam antes das finais; e a capa após a vitória da ida, com este e Gottardi erguendo Russo

O atual treinador da Argentina chegou lá após seu bom trabalho no próprio Estudiantes: sob El Pachorra, o clube de Verón voltou a vencer a Libertadores, em 2009, sobre o favorito Cruzeiro no Mineirão, e também ganharam o Apertura 2010. Como jogador, começara no bom River dos anos 70 (participou da final perdida para o próprio Cruzeiro na Libertadores de 1976) e chegou ao Pincha vindo do futebol inglês, onde foi um dos primeiros argentinos. Bilardo conseguiu convencer os dirigentes do Leeds United a liberar o meia sob 2 mil dólares, sustentando que a crise econômica argentina não permitia mais.

Russo tirou o time da segunda divisão em 1995 (com o mesmo Verón, então iniciante) um ano após a queda, e treinou o Boca na última Libertadores vencida por este, em 2007 (Trobbiani, ex-jogador do clube, era o ajudante). Também é o técnico que recolocou neste 2013 o Rosario Central na elite depois de três anos. Já os torcedores do rojo, atualmente desesperados (o clube pode cair hoje, pela primeira vez, à segundona) não ficariam sem consolo naquele 1983, após dois vices seguidos. Contaremos o porquê em alguns meses. Abaixo, ficha dos jogos que valeram o bi.

Talleres: Baley (Comizzo); Festa, Galván, Oviedo, Riquelme; Lucco, Bustos, Guerini (Taborda); Ariel, Moreno, Reinaldi, Coleoni. T: Daniel Willington. Estudiantes: Juan Carlos Delménico; Camino, José Luis Brown, Ángel Landucci, Abel Herrera (Claudio Gugnali); Miguel Ángel Russo, José Ponce, Marcelo Trobbiani; Guillermo Trama, Alejandro Sabella (Miguel Lemme), Hugo Gottardi. T: Carlos Bilardo.

Independiente: Carlos Goyén; Néstor Clausen, Hugo Villaverde, Enzo Trossero, Mario Killer; Ricardo Giusti, Claudio Marangoni, Jorge Burruchaga, Ricardo Bochini; Gabriel Calderón, Carlos Morete. T: Nito Veiga. Estudiantes: Carlos Bertero; Julián Camino, José Luis Brown, Rubén Agüero, Abel Herrera; Miguel Ángel Russo, José Ponce, Alejandro Sabella, Marcelo Trobbiani; Guillermo Trama, Sergio Gurrieri. T: Eduardo Luján Manera.

Outro destaque daquele Estudiantes, Trobbiani (outro vencedor da Copa 1986) presenteia o técnico do segundo título, Eduardo Luján Manera, com a camisa que usou
Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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