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Há 25 anos, o Vélez saía do Morumbi com a sua Libertadores

Roberto Trotta, Marcelo Gómez, Mauricio Pellegrino, Héctor Almandoz, José Luis Chilavert, Flavio Zandoná e José Basualdo; Christian Bassedas, José Flores, Omar Asad e Raúl Cardozo

Já contamos quando os pênaltis em uma final de Libertadores em vermelho, preto e branco praticamente encerram o ciclo no Newell’s de Bielsa para lançar a fase mais brilhante do São Paulo. Esse período glorioso dos comandados de Telê Santana se encerrou com roteiro parecido há exatos 20 anos: perdeu fora de casa por 1-0, devolveu o placar no Morumbi e foi aos penais, frente a um clube argentino que lutava para sair do médio porte. E em 31 de agosto de 1994 foi a vez dessa parte da história sorrir. A história de um gigante dos hoje tão cultuados anos 90, o Vélez Sarsfield.

Se as conquistas em série naquela década, retomadas sob o comando técnico de Ricardo Gareca (2009-13), tornaram o Fortín tão prestigiado, na época era um clube de só dois títulos argentinos (mesma quantidade do rival Ferro Carril Oeste, hoje sumido) em vez dos dez atuais – e que acabava de sair de uma fila de 25 anos. Seu primeiro título argentino foi em 1968, com Carlos Bianchi sendo uma jovem promessa a atacante. La V Azulada seguiu forte até o início dos anos 70, mas as taças não vieram mais. Passou a entrar na contramão de sua tradicional receita, que era aproveitar os jogadores da base, algo natural para um clube de apelo restrito basicamente a seu bairro de Liniers e arredores – herança da gestão longeva de José Amalfitani, presidente austero que priorizava sócios, fazendo do Vélez um dos clubes sociais mais atrativos da capital federal, do que o departamento de futebol.

Nos anos 80, o Vélez buscou voltar às cabeças contratando medalhões: Omar Larrosa, Daniel Killer e Norberto Alonso, todos campeões da Copa 1978, não tiveram êxito, assim como outros que, embora não tenham jogado a Copa, fizeram parte da seleção pouco antes do mundial (casos dos defensores Osvaldo Piazza e Vicente Pernía, pai do ex-seleção espanhola Mariano Pernía). Na virada para os anos 90, essas tentativas prosseguiram, com outro campeão de 1978, o goleiro Ubaldo Fillol, vindo se aposentar em Liniers. 

Cenas da estreia, em que o Vélez, mesmo em casa, foi inferior ao Boca. Mas ao fim, o gigante vizinho seria lanterna e os azarões, os líderes. À direita, Esteban González, que trocou de clube ao fim das oitavas-de-final

Oscar Ruggeri, campeão em 1986, veio também, assim como Ricardo Gareca (assumido torcedor velezano desde antes, sendo na época um grande atacante com passagens por Boca, River e seleção, longe de imaginar em fazer sucesso na seleção do Peru) e o homem que fizera os gols decisivos para o River vencer em 1986 sua primeira Libertadores, Juan Gilberto Funes. Destes, só Alonso e Ruggeri defenderam a seleção como fortineros

Bianchi regressou como técnico no início de 1993, mesmo precisando deixar a família na França, com apenas a esposa Margarita fazendo a longa ponte aérea. Ainda misturando involuntariamente espanhol rio-platense com o francês com o qual estava há anos acostumado, o novo treinador recebeu um mimo raro para a época: um contrato de 3 anos que lhe deu tranquilidade para retomar a fórmula original em aproveitar as revelações das categorias inferiores misturadas com compras baratas.

El Virrey explicaria: “quando entrei em contato com a gente do Vélez, o primeiro que lhes disse é que minha inquietude era poder trabalhar a longo prazo com um projeto que emoldure o seguimento do jogador desde as divisões inferiores. Porque, por exemplo, um marcador de ponta ou certos postos, o clube os tem que formar e não sair a busca-los afora. O Vélez tem divisões inferiores muito boas e não tem que investir somas de dinheiro nestes postos”. De fato, dos treze que entraram em campo no Morumbi há duas décadas, só quatro não se iniciaram na base velezana: nenhum campeão de Libertadores usou tantos pratas-da-casa no jogo do título – nove, que viram dez se considerarmos o técnico.

Antes de marcar o gol argentino na final, contra o São Paulo, Omar Asad vazara também o Palmeiras. O “Turco” também deixou o dele contra o Cruzeiro

As exceções eram o lateral Roberto Trotta, ex-Estudiantes e o zagueiro Flavio Zandoná, ex-San Lorenzo, nomes baratos, e outros com mais renome, mas em baixa: o volante José Basualdo havia ido à Copa 1990 e chegou após passagem não muito frutífera no Racing. Em Liniers, foi exatamente com Bianchi que El Pepe deixou de cumprir obrigações só defensivas e ganhou liberdade para se distribuir mais. Acabaria voltando à seleção e indo à Copa 1994. O outro era o jogador mais decisivo da história do Vélez.

Bianchi não tinha o que fazer em relação ao titular entre as traves: “não me perguntes o nome dos outros 4, porque não os sei, mas estou certo de que hoje Chilavert está entre os 5 melhores do mundo”. O goleirão paraguaio havia feito sucesso no San Lorenzo e fora adquirido do Real Zaragoza, que o reprimira: Chila, que adorava tentar seus gols, fora proibido de chutar penalidades após comemorar demais um gol seu e, no reinício da partida, sofrer um do meio de campo por conta das metas ainda estarem sem ele de volta. Após ser o herói principal naquela Libertadores, enfim pôde marcar seu primeiro gol de falta pelo Vélez, em outubro de 1994, mas só começaria a se consagrar como goleiro-artilheiro a partir de 1996.

Na conquista continental, Chilavert ainda se resumiria a mostrar seu (imenso) talento apenas entre as traves. Seria o bastante. A fanfarronice dele era perdoada com a fome de glória de um verdadeiro “líder positivo”, para usar a expressão empregada por Bianchi – cujo cuidado com os egressos da base também importava em limar a influência perigosa de quem sinalizasse a mínima mistura de estrelismo com acomodação. Assim, o técnico aprovou a negociação dos veteranos Gareca e Ruggeri, bem como do prata-da-casa Alejandro Mancuso, também visto sob declínio.

Decisões por pênaltis virando rotina e dando casca para o Morumbi: fotos contra Defensor (esquerda) e Junior (direita)

Os frutos foram colhidos imediatamente: logo no primeiro torneio sob Bianchi e já sem os astros renegados, veio a conquista do Clausura 1993, encerrando jejum de 25 anos. “Esse vestiário era terrível, todos vencedores. (…) Havia muito temperamento, muita raça, por isso é mais meritório ainda o careca, que havia que manejar esses leões”, declarou sobre Bianchi o corpulento atacante Omar Asad, outro homem decisivo: foi quem fez o gol da vitória sobre o São Paulo no jogo de ida.

Contra o descrédito geral, havia mesmo muita autoconfiança entre o plantel. Era preciso: afinal, La Copa começou em um grupo duríssimo com Boca, o grande Palmeiras da época e o Cruzeiro. Ainda que três se classificassem, o palpite geral era de que a lanterna sobraria aos novatos. A ponto de o empate em casa contra o Boca, na primeira rodada, ser até comemorado como trunfo: era 13 de fevereiro e os auriazuis, com mais ritmo de jogo por terem participado dos tradicionais torneios de verão, abriram o placar em pleno Liniers.

“Quase nos ganham”, admitiria Bianchi. A nove minutos do fim, então, veio um golaço de José Turu Flores, atacante que sabia unir habilidade e potência como poucos: encobriu desde o ângulo esquerdo da grande área Carlos Navarro Montoya com um toque sutil endereçando a bola no ângulo oposto. O jogo seguinte só se daria em 9 de março e, até lá, o Fortín já vinha com melhor fôlego: o Apertura 1993 havia se interrompido em dezembro, deixando-se as quatro rodadas finais entre fevereiro e março de 1994 – com o Vélez, inclusive, disputando o título. Perdeu de 1-0 para o Mandiyú em 26 de fevereiro e, em casa, ficou no 1-1 com o Rosario Central em 9 de março. Bianchi, para incredulidade geral (sem esses pontos, o Vélez veria o River ser campeão por um pontinho a mais), apostava demais na Libertadores. 

Valderrama e seu Junior de Barranquilla: adversário visto como mais indigesto na campanha

Enfim veio a segunda rodada da Libertadores e o treinador, admitiria, sentiu um balde de água fria na confiança quando o fenômeno Ronaldo abriu com apenas 20 segundos o placar para o Cruzeiro no Mineirão. Asad, então, começou sua rotina de carrasco de brasileiros, trazendo o 1-1 de Belo Horizonte ao driblar em velocidade Dida antes de concluir quase sem ângulo pela direita aos 43 do primeiro tempo. A imagem deixada era boa, mas o time sentia o desfalque do volante Walter Pico, vendido para fazer bom caixa. “Testamos substitui-lo primeiro com Rentera e depois com Camps. Até que tentamos com Compagnucci. Lhe demos obrigação de marcação e liberamos Bassedas. Aí encontramos o mecanismo perdido”, explicaria Bianchi.

Asad também marcaria nos três jogos seguintes – primeiramente, um cabeceio de costas entre Biro e Cléber sobre o Palmeiras, aos 14 minutos sobre o time que havia acabado de golear o Boca por 6-1 e cuja derrota em Liniers por 1-0 seria enganosa: “poderia ser, tranquilamente, 3-0. Nessa noite, tudo nos dava certo. O Turco Asad fez o gol, da cabeça, e depois perdemos uns sete mais”. Para o reencontro contra o Boca, o Fortín já tinha a classificação no horizonte, mas – como ressaltaria Bianchi – vencer o vizinho renderia uma liderança valiosa, permitindo-lhe escapar de novos brasileiros até uma hipotética decisão.

O treinador soube jogar com a pressão em cima do time treinado por César Menotti e apostou nos contra-ataques. Asad, em toque colocado cara a cara com Navarro Montoya aos 2 minutos do segundo tempo, fez o primeiro dos visitantes na Bombonera. Nos quinze minutos finais, contudo, os velezanos precisaram se virar com um a menos, pelo vermelho de Compagnucci. Nas palavras de Bianchi, “e assim foi, quase nos acréscimos, quando eles nos rodeavam o rancho, saímos rapidamente pelo Negro Gómez, cruzou ao Pepe [Basualdo] e veio a definição com uma frieza repugnante. Antes dessa partida, havia prometido aos volantes seis garrafas de champanhe francês se um deles metesse um gol. As paguei com gosto”. 

Imprensa brasileira reconhecendo irregularidade a favor do São Paulo nos 4-3 sobre a Unión Española. Registros da Folha de S.Paulo, Tribuna da Imprensa e Jornal do Commercio

No 2-0 no Cruzeiro em casa, o capitão Trotta abriu o marcador aos 14 minutos com um pênalti indefensável até para Dida, forte e no alto, antes do Turco Asad galopar em contra-ataque para desferir chute cruzado aos 29 e exibir novamente sua característica dancinha. Aos 37, Raúl Cardozo foi expulso, mas os argentinos souberam manter o resultado, que garantia de vez a liderança por antecipação. Assim, o pessoal de Liniers enviou seus reservas na derrota de 4-1 para o Palmeiras, com Roberto Pompei descontando em golaço de falta já após a expulsão de Esteban González. Mas Libertadores só começa nas oitavas, como pregaria outro pupilo de Bianchi, o ainda impúbere Riquelme. E ali Chilavert começou a brilhar, ao passo que no Clausura 1994 (desenrolado de março a agosto) o futuro campeão da América se desleixava propositalmente (a ponto de perder até o clássico com o Ferro Carril Oeste), terminando entre os três últimos, embora sob a tranquilidade do bom promedio.

O líder do grupo da morte teve vida mais complicada do que poderia supor contra o Defensor, contra quem Bianchi queria vitória mesmo dentro de Montevidéu, para prevenir um adversário retrancado demais em Liniers. De carrinho, o zagueiro Héctor Almandoz até abriu o placar, “mas depois nos desordenamos e nos igualaram. A revanche se deu tal como eu havia pensado. Eles trataram de se refugiar atrás, tentando só alguma réplica. Nós não tivemos uma de nossas melhores noites”, escreveria o próprio Bianchi. Ficou-se no 0-0 em Buenos Aires, forçando uma decisão por pênaltis. Chilavert pegou a a penúltima cobrança uruguaia, de Guillermo Almada, mas Esteban González, artilheiro do título argentino de 1993, perdeu a chance de classificar os colegas na última – e, com soberba já desaprovada do Bianchi, El Gallego logo terminaria negociado com o San Lorenzo, que em troca cedeu o beque Zandoná, desejado para suprir uma inoportuna lesão no cão de caça que era Almandoz.

Chilavert logo compensou a cobrança desperdiçada de González ao pegar também o chute visitante seguinte, de Rubén dos Santos. Turu Flores, ordenado a não fazer gracinhas (“era capaz de chutar de letra e não estávamos para sustos”, cornetou Bianchi), selou a classificação. A vida seria mais fácil contra o Minervén, após pausa de três meses: 0-0 na Venezuela e 2-0 em casa, em chute de fúria do Turu Flores na cara do gol aos 40 minutos, onde a bola ainda bateu no travessão antes de entrar, e do parceiro Asad aproveitando aos 16 do segundo tempo o rebote de um pênalti desperdiçado por Trotta – comemorando dessa vez à la Bebeto, simulando embalar seu recém-nascido filho Yamil, que também viria a defender o Fortín (ainda que sem êxito).

Sobre São Paulo x Olimpia: mais à esquerda, relatos de O Pioneiro (acima) e Folha de Hoje (abaixo). Ao centro, dois relatos do Jornal dos Sports. À direita e na chamada superior, as ironias de Zagallo ao Jornal do Commercio

Quem não teve a mesma tranquilidade naquela fase foi o São Paulo, contra uma cascuda Unión Española. O empate em 1-1 em Santiago pareceu fazer os tricolores esnobarem os chilenos no Morumbi, onde ganharam por um sufocante 4-3… no qual abriram o placar irregularmente. No lance, Palhinha fez um golaço por cobertura, mas após usar as mãos para dominar a bola, algo observado na narração do próprio Galvão Bueno e apontado também pela Folha de S.Paulo (“com um toque de mão –não marcado pelo juiz–, ele passou por Lucca e encobriu o goleiro Rabajda”), bem como pela Tribuna da Imprensa (“um gol ilegal. Palhinha, aproveitando passe de cabeça de Müller, levou vantagem sobre o zagueiro chileno colocando a mão na bola”), pelo Jornal do Commercio (“Palhinha disputou com González e pareceu levar vantagem com as mãos”) e ainda pelo Jornal dos Sports (“Palhinha recebeu lançamento, trombou com um zagueiro (neste lance pareceu que havia colocado a mão na bola”, avançou e chutou forte”).

Quanto ao Vélez, o grande teste veio mesmo na semifinal. Os colombianos tinham uma geração de ouro na década, ou de prata: o Atlético Nacional seria o vice para o Grêmio na Libertadores 1995; o América de Cali, para o River na de 1996; e o Deportivo Cali, para o Palmeiras em 1999. O principal expoente cafetero, Carlos Valderrama, não só estava naquele time do Junior como foi tietado pelos próprios velezanos ao ser casualmente encontrado no dia seguinte ao jogo, em um shopping por lá – segundo confissão feita em 2010 por Bassedas, que também ressaltou a obviedade de que Bianchi não ficara sabendo na época.

Em Barranquilla, o oponente Iván Valenciano vazou duas vezes Chilavert antes de meia hora de jogo, mas Flores soube insinuar-se na zaga colombiana e descontar aos 21 do segundo tempo. Asad ainda teria gol anulado, corroborando a impressão de derrota injusta. Mordidos, os argentinos, em apenas doze minutos, abriram 2-0 em casa: no primeiro, com o talentoso volante Christian Bassedas cabeceando no canto um cruzamento preciso de Pompei; depois com a habilidade de Flores – na jogada, Cardozo lançara Asad, que na área ajeitou de cabeça para o colega ter tempo de, na frente do goleiro, dominar com uma coxa e chutar com a outra perna. Mas o Fortín não liquidou (“criamos doze situações claras, não entrou nenhuma!”, suspiraria Bianchi)… e Valenciano, de tiro livre, voltou a vaza-los. O novo 2-1, agora para os argentinos, forçou nova disputa por pênaltis, onde os fortineros iam decisivamente se aprimorando. Mas não sem enorme susto, outra vez. Pois, em uma das noites mais emocionantes já presenciadas no estádio José Amalfitani, o Vélez esteve muito perto da eliminação.

Todos de ambos os times foram convertendo: Trotta, Valenciano, Chilavert, Mendoza, Zandoná, Valderrama, Pompei e Mackenzie. Na quinta e última cobrança da casa na série inicial, o herói Turu Flores teve seu arremate no lado direito espalmado por José Pazo. Se o Junior convertesse, eliminava o Fortín em pleno Liniers. Os vídeos do Youtube (acima, um) só mostram os instantes das cobranças e não os 3 minutos de silêncio nas tribunas e apreensão que se passaram entre o erro de Flores e a cobrança colombiana seguinte, com discussões entre Chilavert, o árbitro e o técnico adversário. O paraguaio não se abateu, foi na mesma direção e encaixou a cobrança de Héctor Méndez, não soltando a bola nem para beija-la e explodir a euforia velezana, forçando às cobranças alternadas. Basualdo, no meio do gol, não comprometeu.

A responsabilidade se voltou contra os colombianos e Ronald Valderrama, irmão de Carlos, acertou a trave direita – Chila fora naquela mesma direção. E o Vélez, que até dois anos antes lutava pelo meio da tabela, estava meteoriamente em uma final de Libertadores. Segundo Bianchi, nesse dia “Chilavert foi maior do que nunca. Pensei no injusto que era o futebol se nos eliminasse essa equipe: nas duas partidas, havíamos demonstrado ser mais (time) do que eles. O silêncio era absoluto, o pessimismo se palpava com a mão. Estávamos todos mortos… menos Chilavert. Se atirou à sua direita e deteve o disparo de Méndez. Aí soube que ganharíamos. Entrávamos na história grande pela porta grande”.

A final era uma realidade, mas pela frente haveria o campeão das duas últimas edições. Mas que vinha sob certo declínio. Uma declaração de Telê Santana de que “este Vélez é uma das piores equipes da Copa. Muito pior do que Unión Española ou Olimpia. Ganharemos por 3 ou 4 gols de diferença” surpreendeu a própria imprensa argentina. Na edição pós-título, a revista El Gráfico assim apurou: “raro de Telê, uma pessoa não muito afeita a frases explosivas. Mas os jornalistas paulistas descobriram um conceito do treinador em seu círculo de confiança. Através dessas frases, tratou de motivar estes jogadores. Este São Paulo é o pior dos últimos 5 anos…”. Bianchi não perdeu tempo a usou como igual motivação, tratando de obter diversas fotocópias das palavras atribuídas ao mestre brasileiro.

Outro ângulo do gol da América no jogo de ida em Liniers, nesse arremate de Asad

Com efeito, em suas semifinais, contra o Olimpia, o outro finalista precisara de novo auxílio arbitral. Curiosamente, em outro lance envolvendo Palhinha, que cavou um pênalti para poder arrancar o gol do empate no Morumbi, no qual os tricolores conseguiriam posterior vitória de virada. A hemeroteca digital da Biblioteca Nacional permite colher registros de O Pioneiro (“o São Paulo empatou com um pênalti inexistente”), de Folha de Hoje (“o árbitro uruguaio, Jorge Nieves, errou marcando pênalti em favor dos são-paulinos. O zagueiro paraguaio carrinhou a bola e na extensão do lance, a queda de Palhinha”) e do Jornal dos Sports (“aos 37 minutos, Ramírez de um carrinho (na bola), Palhinha caiu e o juiz deu pênalti, que o próprio apoiador cobrou e marcou” e, em análise à parte, Palhinha “cavou bem o pênalti, que converteu, e deu tranquilidade à equipe para virar a partida”).

Na transmissão televisiva global, até Arnaldo Cézar Coelho vociferou: “não foi nada, o Palhinha se jogou! Cavou o pênalti, que não houve! O juiz se acovardou” e o próprio jogador reconheceu, na entrevista pós-jogo à emissora, que “eu acho que não foi pênalti, porque na hora que eu vi que o rapaz ia dar o carrinho eu só tirei a bola dele e joguei o corpo, aí o juiz caiu”. Mas Galvão Bueno aplaudiu a bola na rede: “é o mérito do Palhinha, malandro, cavou o pênalti. Com categoria, bateu e saiu para o abraço”.

Em Assunção, a equipe de Telê perdeu de 1-0, mas teve o mérito de segurar o abafa paraguaio e de, mesmo desperdiçando primeiro uma cobrança na decisão por pênaltis (com Palhinha, por sinal), virar o marcador. Zagallo, ao Jornal do Commercio, aproveitou para desentalar críticas ao suposto futebol “feio” da seleção recém-tetracampeã comumente feitas por partidários de Telê Santana: “A seleção teve um padrão de jogo mais bonito. Às vezes, não se pode jogar como se pensa. O São Paulo atuou muito fechado e passou um grande sufoco. No futebol atual, é difícil falar em beleza. A realidade é muito diferente da utopia”. 

Raúl Gámez como barrabrava enfrentando os hooligans em 1986. Em 1994, era cartola do Vélez e teria intimidado o juiz no Morumbi

No bairro de Liniers, embora sofresse um gol de Müller anulado (“corretamente”, avaliou o Jornal do Brasil) por impedimento no início, La V Azulada não tomou conhecimento das listras verticais tricolores em Buenos Aires. Em contra-ataque, Cardozo lançou a Pompei, que cruzou pela esquerda ao centro da área. A bola não parecia perigosa, mas a zaga são-paulina se atrapalhou no corte e praticamente forneceu assistência ao oportunista Turco Asad (que já havia colocado nas redes por cima do travessão uma tentativa de meia bicicleta), livre com tempo para ainda dominar a bola antes de soltar um tiro cruzado para deslocar Zetti aos 35 minutos – e vitimar pela terceira vez um clube brasileiro na competição. Já o segundo tempo foi morno. O São Paulo não jogou bem e se satisfez com a derrota mínima.

Os argentinos também se preocuparam mais em manter a vantagem do que ampliá-la, mas foram reconhecidos por Telê Santana: “o Vélez venceu a primeira com todos os méritos. Não podemos repetir os erros do jogo anterior”. Ao Jornal dos Sports, o mestre tampouco teve pudor de atribuir o mau resultado aos pupilos: “qualquer explicação deve ser pedida aos jogadores. Só o Zetti se salvou”. Mas a derrota não arrefeceu os pachecos: o Jornal do Brasil não se inibiu em escrever que “se o Independiente, campeão argentino, não é adversário para o São Paulo, calculem o Vélez, penúltimo [sic] colocado. Que venha o Milan”, em alusão ao campeão europeu de 1994. Público e crítica da Argentina tampouco estavam satisfeitos: “a mínima diferença alcançada no encontro de ida havia regado de pessimismo os 40 mil torcedores do Vélez, que só despediram com tímidos aplausos seus jogadores. O descontentamento do plantel com o que eles interpretaram como pouco reconhecimento à campanha realizada se converteu em outra fonte geradora de motivação”, reconheceu a revista El Gráfico.

Bianchi detalharia em outra edição especial da revista, após o título mundial, relembrando sobre o jogo de ida contra o São Paulo que “a prioridade absoluta era ganhar. Por qualquer margem. Isso da diferença de gol era secundário. Primeiros ganhemos, depois pensemos nos gols. Eles sentiam nosso pressing e estavam afixados no fundo. Não podiam sair: quase todas as jogadas arrebentavam a tribuna. Não parecia o São Paulo bicampeão do mundo. Claro, insistimos, insistimos, mas não pudemos meter outro gol. Por isso, quando faltavam 15 minutos, colocamos a partida no freezer. Preferimos assegurar a vitória e não arriscar. Qualquer coisa, menos sofrer um empate. O pessoal notou essa atitude e nos despediu friamente. Creio que não merecíamos, não pensavam que o fundamental já se havia conseguido. Nessa noite fui conformado com o resultado, embora muito triste com a reação do pessoal”.

A solidão dos expulsos Cardozo (agachado, rezando) e Bianchi, acompanhados pelo cartola Gámez (de paletó e gravata) e do goleiro reserva Docabo enquanto os pênaltis começavam. À direita, comemoração do treinador junto com bigodudo médico Ricardo Coppolecchia e com o lesionado Sotomayor

Ao longo da semana Bianchi teve a cautela de fazer treinos com as linhas de campo do estádio velezano ampliadas para as mesmas dimensões do Morumbi, maiores. Mas sofreu um golpe duro: o beque Víctor Sotomayor sentiu o menisco esquerdo e ficaria de fora da revanche. Vale transcrever novas palavras da El Gráfico pós-Libertadores: “os rostos mudaram. O que vinha sobre trilhos descarrilou. O cordobês era um homem de poucas palavras, mas com um grande reconhecimento da parte de seus companheiros. Na defesa do Vélez, era praticamente insubstituível: sua velocidade mental e física para os choques e seu aporte no cabeceio são argumentos mais que respeitáveis. No lado humano, uma anedota o pinta de corpo inteiro. Mimado por todo o plantel e integrante da delegação que viajou ao Brasil, se aproximou de um dirigente e lhe sussurrou ao ouvido: ‘não sei se me dou um tiro, irmão. Estive sempre e venho ficar de fora justo agora…’. Quando o dirigente girou a cabeça, notou as lágrimas que escorriam nas bochechas do defensor. Descartado Sotomayor, Bianchi optou rapidamente por incluir cinco defensores no esquema titular. Pellegrino era o substituto do cordobês e Almandoz, que vinha com uma partida e meia após uma artroscopia, retomou a titularidade. O tema era saber por quem entrava”.

O desenho defensivo era claro: Trotta livre no fundo, Almandoz e Pellegrino adiantados aos pontas, Zandoná tapando o setor direito, Cardozo pressionando Cafu. A indecisão de Bianchi era mais à frente, entre barrar da titularidade o meia Roberto Pompei ou o habilidoso tanque Turu Flores: “com aquele assegurava uma maior presença no meio e saída pela lateral-esquerda. Com o Turu, podia apostar em alguma genialidade. (…). Optou por relegar Pompei. A explicação era simples: ‘eles não vão sair loucamente. Tocam, tocam, chegam cinco vezes e fazem dois gols. Talvez se metermos algum susto de entrada vão pensar melhor, sem arriscar tanto”, analisou a El Gráfico. El Virrey já buscava de antemão consolar quem ficasse de fora. Nas palavras do próprio técnico, “aqui são doze jogadores. Um vai sair. Mas lhes digo uma coisa: esse que sai, no segundo tempo vai nos fazer ganhar a partida”. Não seria exatamente no segundo tempo, mas as palavras seriam ainda assim proféticas…

Com a confiança maior dos brasileiros (a El Gráfico pós-título reconheceu que até o experiente José Basualdo, “um lutador com duas Copas do Mundo nas costas”, não pôde “pregar o olho na noite da terça-feira”, véspera do último jogo), o Morumbi teve uma centena de milhares de espectadores naquele 31 de agosto de 1994. Chilavert era quem mais transparecia confiança: “vamos nessa, que são uns galinhas”, bradava no túnel de acesso ao gramado. O Vélez, assumidamente, buscava defender-se, e foi muito bem: os tricolores dominaram o jogo ofensivamente, mas não achavam espaço para concluir bem. Precisaram de autossabotagem de Almandoz, cujo braço buscou a cara de Euller na grande área, em pênalti claro assinalado pelo uruguaio Ernesto Filippi e prontamente convertido por Müller, aos 32 minutos.

Carma ou não, Chilavert salvou o pênalti justamente de Palhinha. À direita, coluna do Jornal do Brasil enfatizando como o São Paulo “foi o grande beneficiado” pela arbitragem nas fases anteriores da Libertadores

O que teria enfurecido verdadeiramente os visitantes seria algum excesso de cartões amarelos da parte de Filippi no primeiro tempo. “Quando o árbitro começou tirando três amarelos, quis morrer. Isso condiciona a equipe. Me parece que Filippi foi muito parcial”, desabafou o jornalista Jorge Guinzburg. Então vice-presidente velezano, Raúl Gámez, antigo barrabrava do clube nos anos 70 e que não tivera medo de ir às vias de fato contra os hooligans nas arquibancadas de Argentina x Inglaterra na Copa 1986, tinha desde os tempos de mero espectador o apelido de El Pistola. Convertido em cartola, então, gritou em alto e bom som no intervalo enquanto o juiz se dirigia ao vestiário: “nunca havia visto um uruguaio cagão, Filippi. Você é o primeiro!”, no que o árbitro teria respondido: “agora no segundo tempo vais ver se tenho colhões ou não”.

As aspas acima são todas da El Gráfico pós-título, que assumiu que na etapa complementar “não puniram o Vélez uma claríssima mão de Gómez na área. Filippi não a viu ou agiu motivado por aquele entrevero com Gámez?”. Mas até mesmo o Jornal do Brasil não perdoou o próprio São Paulo: já havia destacado os muitos passes errados e atuações de “piores dias” de Müller e Euller no jogo de ida e criticou a não-titularidade de Juninho Paulista no da volta (ele entrou já nos quinze minutos finais, no lugar do lateral Vítor, única substituição de Telê), registrando ainda que “quanto às queixas da arbitragem, gostaria de lembrar que nos jogos anteriores o São Paulo foi o grande beneficiado”.

Do lado brasileiro, a partir de determinado momento a armação de jogadas pelo meio deu lugar ao desespero dos chuveirinhos, tamanha a concentração defensiva dos argentinos – ou “mesquinharia” defensiva, na crítica de Telê prontamente contra-atacada por Bianchi. Vale transcrever a aula do Virrey, um técnico não exatamente retranqueiro, mas que sabia fechar a casinha quando o contexto pedia… e deixou lição que lembra o ônibus que Mourinho pontualmente se viu necessitado de estacionar naquele Barcelona x Internazionale pelas semifinais europeias de 2010: “alguns falam da obrigação de jogar um futebol que faça o povo feliz. Me parece bem. Eu trabalho para o Vélez. Portanto, tenho que procurar que o povo do Vélez se sinta feliz. No Morumbi, conseguimos que o São Paulo jogasse como queríamos nós e não como queriam eles. Isso não dizem. E não sabem que nas condições que estávamos, não podíamos ganha-lo nunca. Por isso o Vélez não jogou de igual para igual. O fez da melhor maneira que podia fazer naquela noite”.

Chilavert vibra com seu gol na decisão por pênaltis, Bianchi e Bassedas seguram a taça

O relato, dado na mesma edição pós-título da El Gráfico, então prosseguiu explicando os motivos para a tática defensivista: “três dias antes de uma partida tão decisiva, uma lesão nos ligamentos do joelho deixou de fora Sotomayor, que é o homem mais rápido que tenho na linha de fundo. Marcelo Gómez jogou anestesiado por causa de uma torsão no tornozelo. Basualdo entrou com uma contratura muscular e teve que sair, e Almandoz acabava de jogar sua terceira partida depois de uma inatividade de três meses. Nessas condições e sua casa, saímos para enfrentar o campeão do mundo”. De fato, o veterano Basualdo aguentou até os 10 minutos do segundo tempo, quando então deu lugar ao talismã Tito Pompei.

Bianchi então concluiu: “além disso, os que falam não viram como o São Paulo jogou suas partidas de mandante. Ganhou da Unión Española de 4-3. Como ganhou, poderia ter perdido. Não dominou o Olimpia nunca e precisou que lhe presenteassem um pênalti. Com o Palmeiras, chegou ao outro arco em cinco oportunidades. O que tudo isso me dizia? Que o São Paulo é muito perigoso quando encontra ou lhe dão espaços. Baseia seu ataque em jogadas rápidas porque tem jogadores muito levezinhos como Cafu, Palhinha, Axel, Euller e Müller. Nenhum deles chega aos 80 quilos de peso, por isso são rápidos, precisam de espaços. No Vélez nunca puderam entrar por baixo e terminaram atirando bolas por cima, que era o que nós queríamos. Por isso, aceito as críticas mas não as compartilho. Eu vi Beckenbauer dar chutão quando era necessário. E vi grandes craques bater sem piedade no atacante contrário”.

Na mesma ocasião em 2010 na qual revelou ter corrido para se fotografar com Valderrama, Bassedas foi enfático: “o (elenco) da Libertadores de 1994 reflete como nenhum a identidade do Vélez”, algo já notado na El Gráfico pelo seu longevo redator Juvenal em 1995, onde ele comparava os clubes argentinos campeões no ano; a nota avaliava, além do Fortín, também o River (Apertura 1993, só finalizado em março de 1994, e Apertura 1994) e o Independiente (Clausura e Supercopa). No quesito “fibra combativa”, entendeu-se que prevaleceram os campeões da Libertadores: “os três souberam jogar e quando foi necessário meter, não ficaram atrás. Porém, nessa matéria o Vélez foi um expoente de garra excepcional. Nesses jogos decisivos, em que não se pode perder de nenhuma maneira, ainda jogando mal, demonstrou ser um autêntico herdeiro da estirpe batalhadora e brava daquele arquétipo do Fortín que se chamou Victorio Spinetto”, em referência ao mais longevo comandante velezano, o treinador que tirou da segunda divisão em 1943 um time à beira da extinção.

Com 30 anos recém-completados, Chilavert iniciaria sua melhor fase. A fama internacional criada com a Libertadores pesaria para fazê-lo ser em 1995 pela primeira vez eleito o melhor goleiro do mundo, algo que só ele conseguiu atuando na América do Sul

Essa postura só fez aumentar após a expulsão de Raúl Cardozo, El Pacha, figura mais antiga no elenco (defendeu ininterruptamente o Fortín desde a fase mediana, em 1986, até 1999), por jogo brusco aos 19 minutos do segundo tempo. Segundo Asad, o medo maior não veio quando Müller empatou o placar agregado, de pênalti, ainda no primeiro tempo, e sim nesse cartão vermelho: “nos cagamos quando expulsaram o Pacha e faltavam 30 minutos. Bianchi tirou o Turu e eu tive que correr de um lado para o outro: era uma guerra de empurrões, cotoveladas, pisadas”, explicou El Turco. A rigor, quem ordenou a substituição de um pouco inspirado Turu Flores (embor craque, o atacante foi considerado o pior velezano naquele jogo, levando nota 4) foi o assistente Carlos Ischia: é que o próprio Bianchi, por reclamações pela expulsão de Cardozo, foi expulso também, aos 20 minutos. Flores deu lugar a Claudio Husaín já formalmente no minuto 22.

Segundo o próprio Bianchi, as palavras exatas dirigidas a Filippi para que acabasse expulso teriam sido “que não apitasse como seu compatriota Nieves, que três semanas atrás inventou um pênalti para que o São Paulo pudesse ganhar do Olimpia. Por isso me expulsou. Fiquei no túnel que leva ao gramado, mas uma grade me impedia de me aproximar do campo do jogo. Ali estava Gustavo Cima, trabalhando para a Rádio Continental. Lhe pedi os auriculares e passei os últimos 20 minutos mastigando a transmissão e olhando o piso. Quando faltavam 12 minutos, pedi para Cima um papel e escrevi os nomes que tinham que chutar caso se chegasse à definição por pênaltis. Coloquei Trotta, Chilavert, Zandoná, Almandoz e Pompei, nessa ordem. Se necessário, Pellegrino seria o sexto a chutar. Quando terminou a partida, chegaram Ischia e o doutor Coppolecchia chorava para buscar a lista. Coppolecchia chorava. Raúl Gámez apareceu no túnel quando faltava muito pouco”.

O 1-0 prevaleceu e os argentinos, bastante confiantes em Chilavert, comemoraram desde logo – até mesmo Bianchi, em sua solidão: “sentia uma confiança enorme. Chilavert, seguramente, estava encantado de ser o centro das atenções. Ele cresce nessas ocasiões. E eu tinha uma fé cega nele”. Mais supersticioso, o goleiro reserva Juan Carlos Docabo deixou o gramado para juntar-se ao expulso treinador (“contra o Defensor e o Junior eu estava a seu lado. Quer que eu fique aqui?”, no que foi autorizado a permanecer do outro lado da grade). Chila pegou “só” um tiro, justamente de Palhinha, o primeiro tricolor a bater, logo após Trotta ter iniciado a série convertendo o seu. Na sequência, o próprio paraguaio também acertou a sua cobrança. Ninguém mais errava: André Luiz, Zandoná, Euller, Almandoz e Gilmar antecederam a quinta cobrança argentina, a de Pompei. O reserva que, segundo aquela profecia de Bianchi, daria o título…

Entre Bassedas e Cardozo, Asad beija a taça. O talismã Pompei, deitado no gramado, exibe às lágrimas a medalha. Husaín (o outro ao lado de Bassedas) e Basualdo (deitado, sem camisa) foram os jogadores que iriam a Copas do Mundo

O jogador detalharia: “pensei em atirar devagarzinho em um canto. Mas quando girei a cabeça e vi meus companheiros rezando, decidi pegar forte e para cima”. Ausente da reconquista argentina de 1993 por estar emprestado ao modesto Talleres de Escalada, regressara à casa por ordem de Bianchi e acertou um belo chute em que a bola ainda roçou o travessão antes de entrar. “Então, por um instante, o Portão 18 se converteu na porta giratória da [Avenida] Juan B. Justo, a Rua Nelson Hungria na Avenida Rivadavia, o inexpugnável Morumbi no querido Amalfitani… uma parte de Liniers fazia escala em São Paulo”. 

Por ter sido expulso, Bianchi precisou dar uma volta olímpica particular, junto ao cartola Juan Carlos González, justamente o primeiro dirigente a convida-lo nos fins de 1992 a sair do conforto francês para treinar o Vélez. Mas, segundo Chilavert, haveria ainda mais festa: “se não fores, perderás ver o Vélez campeão do mundo”, diria ao referido jornalista Jorge Guinzburg, torcedor fortinero assumido que acabaria de fato autorizado pelos campeões a dar a volta olímpica com eles em Tóquio. Nada sutil, o goleiro daria em 2007 opinião condizente também àquela declaração de Bassedas e daquela avaliação da El Gráfico: “foi épico. O motorista nos levou por onde estava a torcida organizada do São Paulo e nos atiravam de tudo, mas esse time do Vélez podia ter jogado no Vietnã em guerra que saía estufando o peito”.

Bianchi tampouco estava conformado com o título no Morumbi, já tratando de “prosseguir o caminho iniciado. O futebol é um eterno recomeçar e um eterno reconfirmar” foram suas palavras assim que os ânimos se acalmaram. No calor do momento, emocionado ao ouvir através da Rádio Continental as lágrimas da filha Brenda (“ficou em Paris porque já começaram as aulas”), ele, ainda misturando castelhano com o francês que tão habitualmente usava nos antes, vociferava: “da América, da América, merde. Essa equipe tem colhões, papai. Agora começa o que eu realmente gosto. Vamos a Tóquio, merde!”.

Os nomes, se a legenda da imagem estiver ilegível: Carlos Compagnucci, Marcelo Herrera, Roberto Trotta, Flavio Zandoná, José Basualdo, Víctor Sotomayor, Omar Asad, Roberto Pompei, Walter Verón e Cristian Acevedo; massagista Roberto Molina, médico Carlos Damiano, Fabián Fernández, Sandro Guzmán, Claudio Husaín, Fernando Pandolfi, Juan Carlos Docabo, Federico Domínguez, Christian Bassedas, Guillermo Morigi, José Luis Chilavert, Mauricio Pellegrino e fisioterapeuta Carlos Leoni; José Luis Sánchez, Raúl Cardozo, Martín Posse, assistente Carlos Ischia, técnico Carlos Bianchi, preparador físico Julio Santella, Héctor Almandoz, José Oscar Flores e Marcelo Gómez
https://twitter.com/Velez/status/1167795511858016256
https://twitter.com/Velez/status/1167633516475179008
https://twitter.com/JoseLChilavert_/status/1167809265186344962
https://twitter.com/Libertadores/status/1167633355854082048
Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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