“Não quero terminar como Sánchez”, suspira Isidoro Gómez em carta à mãe, no vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro de 2010, O Segredo dos seus Olhos. Adiante, outrem explica: “seguramente está se referindo ao goleiro Ataúlfo Sánchez, eterno suplente do grande Negri. Jogou somente 17 partidas entre 1957 e 1961”. O elogiado em questão era Osvaldo Jorge Negri, um dos maiores ídolos do Racing. O ex-arqueiro, que após a carreira dedicou-se à odontologia, faleceu na última segunda-feira.
Ele estava a menos de dois meses de completar 80 anos – nasceu em 3 de junho de 1933, em Buenos Aires. O início no Racing lhe reservou situação parecida com a que iria impor ao mencionado Sánchez. Chegou ao clube de Avellaneda em 1956, após ter ganho no ano anterior a terceira divisão, com o Colegiales (que lhe homenageou com uma placa há um ano e meio). Sua estreia, na 13ª rodada (derrota em casa por 3-2 para o Argentinos Jrs, então um time distante até mesmo do porte ainda modesto da atualidade), foi sua única partida pelo novo clube no campeonato argentino daquele ano. Pudera: não bastasse o resultado pouco auspicioso, Negri concorria com o goleiro titularíssimo da seleção, Rogelio Domínguez.
Com efeito, Domínguez se consagraria campeão da Copa América realizada no início de 1957, seu trampolim para reforçar em seguida nada menos que o Real Madrid de Di Stéfano. Com isso a vaga ficou enfim livre para Negri, mas veio junto com a pressão. Inclusive, foi o tal Ataúlfo Sánchez quem primeiro atuou dentre os reservas de Domínguez, na 6ª rodada.
Negri reestreou a partir da 10ª rodada de 1957 e é recordado que seu início foi vacilante, onde nem ele mesmo possuía confiança em si, o que acabava transmitindo a companheiros, técnico e torcedores. A incerteza durou mais do algumas rodadas, pouco lembrando a impressão final de ter sido um goleiro sério e seguro.
Ele fechou o ano de 1957 já com 21 aparições naquela edição da liga argentina, contra uma única de Ataúlfo Sánchez (e oito de Domínguez, antes da transferência) e o clube, em terceiro. Estava gestado o elenco que, no ano seguinte, voltou a ser campeão depois de sete anos – o que, para a gloriosa Academia da época, já era uma enormidade. Pobre Sánchez: não entrou em campo uma vez sequer, com Negri figurando em todas as 30 rodadas, mesmo com o título vindo sob antecipação.
No embalo da taça, nada menos que nove racinguistas defenderiam a Argentina na Copa América, meses depois, em março de 1959: Negri, o zagueiro Juan Carlos Murúa, o meia Vladislao Cap, o ataque inteiro (Omar Corbatta, Juan José Pizzuti, Pedro Manfredini, Rubén Sosa e Raúl Belén) e até o treinador, José Della Torre, que como jogador estivera na final da Copa do Mundo de 1930 e defendera o America-RJ em 1935. Na Copa América, nos cinco primeiros dos seis jogos os hermanos venceram por ao menos dois gols de diferença: 6-1 no Chile, 2-0 na Bolívia, 3-1 no Peru e no Paraguai e 4-1 no Uruguai, todas com ao menos meio Racing representado. A sexta partida seria então o encontro contra o Brasil, que havia vencido quatro jogos e empatado diante do Peru, o que daria aos hermanos a vantagem do empate.
O 1-1 com os canarinhos recuperou um pouco, na época, a honra argentina após a decepção de 1958: ausente de Copas do Mundo (por opção, frise-se) desde a Copa de 1934, a Albiceleste havia vencido Copas América em série nos anos 30, 40 e 50, ao passo que o vizinho, não raramente goleado mesmo em seus domínios no período, só vencera a de 1949 – quando jogara em casa. Confiante após aquela Copa América vencida em 1957, a Argentina caíra na Suécia ainda na primeira fase, após seu pior resultado, a derrota de 6-1 para a Tchecoslováquia… ao passo que os canarinhos conseguiam a taça.
Negri, presente em 25 partidas pelo Racing vice-campeão da liga argentina de 1959 contra cinco de Ataúlfo Sánchez, terminou 1959 titular também na segunda Copa América realizada no ano, no Equador – que teve novamente ele, Murúa, Pizzuti, Sosa e Belén, além do zagueiro Norberto Anido, como jogadores provenientes do gigante de Avellaneda. O título, porém, ficou com o Uruguai, que venceu por 5-0 o clássico. O revés foi seguido por um 4-1 no Brasil, a última partida de Negri pela Argentina.
Se a estadia na seleção foi curta, protegendo as metas de outra equipe alviceleste, as do Racing, ela duraria até 1963. A vaga cativa, é verdade só duraria mais duas temporadas, com 28 jogos em 1960 (Sánchez jogou três e o time ficou a quatro pontos do campeão) e 27 em 1961; Sánchez, por sua vez, jogou duas nesse ano. Ainda houve espaço para ambos serem curiosamente expulsos no mesmo jogo, nada menos que um Clásico de Avellaneda pela penúltima rodada. O rival Independiente empatou a onze minutos do fim em 1-1 e quis buscar a bola nas redes para acelerar o reinício, irritando-se com a atitude do racinguista Juan Carlos Mesías em segura-la. A discussão desencadeou as famosas “cenas lamentáveis” até mesmo entre as duas diretorias em plena tribuna. Após 38 minutos de paralisação, os dois goleiros do Racing estiveram entre os diversos expulsos e o dérbi foi retomado com apenas seis jogadores de cada lado, com o atacante Pizzuti improvisado no gol de La Acadé.
Em 1962, Ataúlfo Sánchez rumou ao México; voltaria ao Racing para mais míseras oito partidas entre 1969 e 1971, já na reserva para Agustín Cejas, para em 1973 chegar a ser técnico interino do rival Independiente na liga argentina enquanto os principais nomes estavam em Honduras para a Copa Interamericana. Negri, em paralelo, foi titular na na Libertadores, a primeira disputa pelo clube, eliminado ainda na duríssima fase de grupos – somente o líder avançava e foi o Nacional. Já na campeonato argentino, perdia lugar para José Toledo, recém-contratado junto ao Estudiantes: atuou em apenas nove vezes na liga contra as 14 deste e uma do ainda iniciante Cejas.
Em 1963, quem atuou somente uma vez já foi o próprio Negri, na rodada inaugural, derrota de 2-1 em visita ao Vélez; a titularidade terminou com o novato Luis Carrizo, vindo do All Boys, até que Cejas futuramente se firmasse nas temporadas seguintes. O fim de ciclo no clube também marcou o fim da carreira de quem já passava dos 30 anos, idade elevada para a época.
No período em que permaneceu no Cilindro, Negri venceu também o campeonato argentino de 1961, o que fez da Academia (simplesmente líder em todas as rodadas) a maior campeã nacional naquele momento, com 14 taças entre amadoras e profissionais – pouco lembrando a decadente instituição corroída meio século depois, onde só ganhou outras duas vezes o campeonato. “Negri no arco, Anido e Mesías; Blanco, Peano e Sacchi; Corbatta, Pizzuti, Mansilla, Sosa e Belén”, como também é recordado em O Segredo dos Seus Olhos, era o time de 1961.
As máquinas caça-níqueis são um dos jogos de casino mais preferidos do mundo, tanto no…
Até a Recopa 2025, a ausência de qualquer duelo que não fossem dois amistosos revela…
Com agradecimentos especiais à comunidade "Coleccionistas de Vélez Sarsfield", no Facebook; e aos perfis HistoriaDeVelez…
Originalmente publicado nos 25 anos, em 01/12/2019 - e revisto, atualizado e ampliado O ícone…
"Porque isto é algo mais do que uma simples partida, bastante maior do que uma…
As apostas no futebol estão em franco crescimento no Brasil, impulsionadas pelo aumento das casas…
This website uses cookies.
View Comments