“O futebol é um tesouro nacional, portanto é para todos”. Palavras de Cristina Kirchner após desembolsar cerca de R$ 300 milhões pelos direitos de transmissão, mas se encaixaria perfeitamente no cenário recente do Campeonato Argentino, que recomeçará neste fim de semana, com o Clausura 2010. Tanto os campeões quanto os escoltas de 2009 causaram uma sensação de equilíbrio. Tal como se o Barueri tivesse chances de título iguais as do Flamengo. Ou o Paraguai podendo chegar a final contra o Brasil na Copa do Mundo.
Exemplo perfeito se encontra no título do Banfield, o primeiro em 113 anos de existência. No Clausura passado, não passaram de meros figurantes com um modesto 12º lugar, três posições acima do vice Newell’s Old Boys, com quem disputaram o troféu até o fim. Alguns atribuem esta paridade a fórmula semestral aplicada na Argentina, mas se contassemos a temporada inteira de 2009, o campeão seria o Lanús, seguido pelo Colon de Santa Fé na 2ª colocação.
Entretanto, não dá para justificar as zebras pelo mero jargão do “futebol como caixinha de surpresas”. Para chegarem a glória máxima na terra de Maradona, todos os campeões fizeram um trabalho sério de planejamento e reforços cirúrgicos. O Vélez, campeão do Clausura 2009, chegou ao êxito por contratar Ricardo Gareca, um técnico que soube empregar consistência à defesa e eficiência ao ataque da base de um time que fracassou em 2008.
Seguindo essa linha de raciocínio, os dois grandes de Avellaneda sinalizaram estar um passo a frente dos outros candidatos a surpresas. O grande problema para o Racing era contar apenas com Luguercio como atacante de qualidade. Problema que pode se resolver com a chegada dos badalados Claudio Bieler, ex-LDU, e Gabriel Hauche, goleador do Argentinos Juniors.
Já o Independiente manteve a base e o DT Américo Gallego esperando ser mais regular para transformar a 4ª posição do último Apertura num título. Darío Gandín e Ignácio Piatti são as armas de ataque, mas na defesa, Matheu será desfalque por algum tempo, pois se machucou no jogo Argentina 3×2 Costa Rica.
Contudo, para que existam zebras, os favoritos a serem batidos são necessários. Seja por incompetência alheia ou por méritos próprios, Estudiantes e Vélez Sarsfield vão se consolidando como forças maiores na Argentina. E como se não fossem suficientemente superiores, contrataram ainda mais jogadores de respeito.
No clube de Verón e Alejandro Sabella, o ex-San Lorenzo Orion ocupa o vazio no gol deixado por Andujar, além do retorno comemorado do ‘Principito Sosa’, para que la Brujita não seja o único armador entre os Pinchas. Ao passo que o Fortín se aproveitou do fato de ser dono dos direitos federativos de Santiago Silva, artilheiro e campeão do Apertura pelo Banfield para trazê-lo de volta. Contudo, para eles e para os também fortes Newell’s, Colon, Lanus e Banfield, a Libertadores pode dividir a atenção de maneira prejudicial.
Existem também times que podem fazer um bom campeonato, mas podem sofrer por terem perdido jogadores importantes. O Argentinos Juniors se tornou um time bastante competitivo com Claudio Borghi no comando, mas perdeu Hauche para o Racing. A mesma coisa com Jesus Mendez, melhor meia do Apertura pelo Rosário Central, que foi para o Boca. O San Lorenzo não perdeu ninguém, mas pelo clima de desconfiança entre o técnico Simeone e o elenco, se tornam incógnitas.
E quanto a Boca e River? São detentores de 55 títulos nacionais desde o começo da era do profissionalismo, em 1931, mas uma crise recente de desmandos e futebol sem qualidade tirou o monópolio de conquistas das mãos deles.
Os Xeneizes contrataram bem para o meio-campo com Prediguer, ex-Porto, e Jesus Mendez, meia destaque em Rosário. Só que o técnico já não é mais Alfio Basile, e até Carlos Bianchi foi vítima da crise. O ex-eterno interino Abel Alves terá a missão de reparar a defesa sem Cáceres e apaziguar a briga de egos entre Roman e amigos contra Palermo e amigos.
Do lado Millonário, Astrada e o novo presidente Passarella estão animados. Tiveram a sorte de achar joias a serem lapidadas na base para que sirvam de esperança de reviravolta. Villalva e Funes Mori fizeram bonito nos clássicos de recentes contra o Boca. Mas para que a alegria de verão não se torne uma melancolia de inverno, também precisam organizar o sistema defensivo, a fim de comprovarem que a crise é mesmo passado.
E assim se configura o Clausura 2010, mais cedo por conta da Copa do Mundo em Junho. De modo que todos conhecem o equilibrio argentino, seja ele de nível alto ou baixo, a grande surpresa agora será não se surpreender.
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