Elementos em comum entre Lanús e Vélez
Só a presença da dupla Boca e River nas semifinais da Libertadores e um calendário insensível da Conmebol para a Sul-Americana ofuscam um interessante tira-teima que oporá Lanús e Vélez no troféu secundário do continente. Encontro que resgata uma dupla que emergiu nos anos 90 (onde o calendário pouco estratégico até permitiu títulos continentais diferentes em um mesmo dia…) e que também é saudosa da virada dos anos 2000 para a década seguinte – quando não faltaram taças que, sob acompanhamento diário do Futebol Portenho, o dono do Fortín de Liners disputou diretamente contra o mandante de La Forteleza – apelidos que indicam a força caseira tão cara a ambos.
Um primeiro torneio em que a dupla se intrometeu junta no páreo foi o embolado Apertura 1993, onde só três pontos separaram o campeão River do 8º colocado. Recém-campeã do Clausura anterior, o Vélez foi vice e o Lanús dividiu o 4º lugar com Boca e Independiente. No Apertura 1995, quem parecia campeão era o Boca de Maradona, líder invicto até a antepenúltima rodada começar. Mas uma inoportuna derrota de 6-4 em casa para o Racing permitiu que os velezanos tomassem a liderança. E como na penúltima o Boca perdeu outra vez e o Fortín venceu, Dieguito e colegas subitamente se viram sem chances matemáticas. Acabaram ultrapassados pelo próprio Racing e até pelo Lanús, que em arrancada final fechou o pódio liderado por La V Azulada mesmo.
No torneio seguinte, o Clausura 1996, novamente o Boca maradoniano esteve no páreo até duas derrotas seguidas esgotarem as chances ao fim da penúltima rodada. O Vélez foi (pela única vez) bicampeão seguido, logo acima do Gimnasia LP, enquanto El Diez viu-se atrás outra vez do Lanús. Os dois bronzes na temporada 1995-96 classificaram os grenás à vitoriosa Copa Conmebol realizada no segundo semestre de 1996.
Em fase de graça, os comandados do emergente treinador Héctor Cúper conseguiram conciliar um “terceiro terceiro lugar” seguido no Apertura 1996 com a campanha continental. Enquanto isso, o Fortín se permitia desleixar no Apertura enquanto fazia campanha primorosa, com 100% de aproveitamento, na Supercopa, o torneio que reunia apenas campeões da Libertadores. E ambos venceram dos seus modos o continente no mesmo dia em 1996. A imagem que abre a matéria mostra as edições especiais que a revista El Gráfico lançou para cada título – na do Vélez, que acompanha o goleirão Chilavert é o zagueiro Mauricio Pellegrino, atual técnico do clube.
E o ano seguinte quase foi de título em comum também: o Vélez pôde erguer a Recopa, em duelo caseiro transportado para o Japão, sobre o River. E, mesmo já sem Cúper e outras peças que o treinador levava sem cerimônia a seu histórico Real Mallorca, o Granate brigou pelo bi seguido na Conmebol, mas passou vergonha na decisão com o Atlético Mineiro. Já em 1998, o Vélez fechou seus anos dourados ao vencer o Clausura, já com Marcelo Bielsa de treinador. O concorrente principal foi na verdade o forte Gimnasia da década, mas o time de La Plata, vendo o título se assegurar ao concorrente na penúltima rodada, caiu na última e terminou ultrapassado pelo Lanús.
Novo pódio com os dois tardou até o Clausura 2009: o épico confronto direto pelo título entre Vélez e Huracán na rodada final camuflou que os grenás treinados por Luis Zubeldía também concorriam pela taça até a penúltima rodada; eram inclusive os líderes até a 16ª, mas uma sucessão de resultados ruins, inclusive um empate em casa com o Fortín na penúltima, tirou-lhes ali suas chances.
Dois anos depois, lá estavam Vélez e Lanús na luta pelo Torneio Final de 2011. Outra vez, os pupilos de Ricardo Gareca levaram a melhor (curiosamente, o título também veio derrotando o Huracán, mas em outra realidade: com rodadas de antecedência enquanto o oponente despencava rumo a seu quarto rebaixamento) sobre o Granate, àquela altura manejado por Gabriel Schürrer. As duas equipes também foram bem no campeonato seguinte, o Torneio Inicial da temporada 2011-12. La V Azulada fechou o pódio, com dois pontos acima da equipe do Sul do conurbano. Só não tiveram a mesma eficiência de um Boca burocrático, mas certeiro, campeão invicto com doze pontos de vantagem sobre o vice – o Racing, que ainda assim catapultou seu técnico Diego Simeone ao Atlético de Madrid.
Um ano depois, o Vélez ergueu o Torneio Inicial da temporada 2012-13 concorrendo mais contra o Newell’s de Gerardo Tata Martino, que até depois ganhou o Torneio Final, mas acabou derrotado pelo Fortín na superfinal. Mas o Lanús, já sob os gêmeos Barros Schelotto, soube cumprir campanha digna na transição de comando: primeiramente, ficou em quarto no Torneio Inicial em 2012. Outro ano mais tarde foi a vez dos argentinos acompanharem um dos desfechos mais malucos da liga: quatro times tinham chances de título na rodada final, e muito por acaso ela reservou exatamente confrontos diretos. E entre eles estava o Lanús, com o trabalho dos Schelotto mostrando-se sólido a ponto de, em paralelo, os grenás estarem com a Copa Sul-Americana sobre a Ponte Preta ainda fresca na garganta: o segundo título continental grená foi garantido em 11 de dezembro, quatro dias antes do desfecho doméstico.
O Newell’s de Martino havia sido o campeão do primeiro semestre e, mesmo com o treinador saltando ao Barcelona, o elenco seguiu calibrado por uma segunda taça no ano. Mas o empate em 2-2 com o Lanús fez ambos caírem abraçados com 31 pontos, mesma quantidade que o Vélez estacionou ao não sair do 0-0 com o campeão San Lorenzo. As luvas benditas pelo recém-eleito Papa Francisco calçaram bem as mãos do goleiro Sebastián Torrico na reconquista nacional azulgrana após sete anos, prévia da vitoriosa Libertadores de 2014 para Sua Santidade. Ano em que o técnico velezano Gareca encerrou seu belo ciclo para uma passagem inócua no centenário do Palmeiras antes de recuperar o nome à frente da seleção peruana.
O Fortín despencou e até perigou um rebaixamento na sequência de década, só voltando nesse semestre a brigar pelas cabeças – também esteve na briga pela Copa Diego Armando Maradona. O Lanús pôde se sustentar por mais tempo, com um bronze no campeonato argentino seguinte (enquanto deu trabalho o Atlético Mineiro na Recopa) e, já com Jorge Almirón de técnico, a inapelável conquista do torneio de 2016 – apenas a segunda e ainda última do Granate em âmbito doméstico. O time sempre tratou de conseguir um título internacional antes de adicionar novo troféu da elite argentina à galeria: a Copa Conmebol de 1996 demorou até 2007 (no Apertura) para ser acompanhada por uma taça caseira. Depois, a Sul-Americana de 2013 foi sucedida pela conquista de 2016. Será que o curioso roteiro se repetirá?
Vamos, enfim, a quem mais se destacou na dupla:
Pedro Dellacha: já dedicamos este Especial a esse zagueiro histórico do futebol argentino nos anos 50, como emblema de Quilmes, Racing e capitão da seleção na Copa de 1958, como treinador ele consagrou-se mais justamente no outro lado de Avelleneda (venceu a primeira e a última daquelas quatro Libertadores seguidas erguidas pelo Independiente entre 1972 e 1975). Nascido em Lanús, ele assumiu os grenás já na nova carreira, em 1968. Os grenás estavam acostumados a uma realidade mais medíocre; assim, o terceiro lugar no Metropolitano de 1968 eternizou aquele elenco apelidado de Los Albañiles – “Os Operários da Construção Civil”, em espanhol. Era uma referência às paredes (como os argentinos chamam a jogada de tabela) que caracterizavam o estilo de jogo daquele plantel. Dellacha preferia usar um termo igualmente sugestivo para qualificar aquela obra: El Templo del Toque.
Aquele Lanús de Dellacha é ainda mais exaltado pela torcida também pela pontuação alcançada naquele Metropolitano. O Granate ficou em terceiro no grupo e só não se classificou aos mata-matas pelos critérios de desempate – que favoreceram um poderoso Estudiantes, que em paralelo vencia sua primeira Libertadores e o Mundial. Dellacha, curiosamente, teve no rival velezano Ferro Carril Oeste a primeira oportunidade como técnico, virando a casaca em 1974, vindo do Celta de Vigo. E ele deixou sua marca no bairro de Liniers: mesmo já sem o superartilheiro Carlos Bianchi, o Fortín foi líder de seu grupo no Nacional e terminou em terceiro no octogonal final, tendo chances de título até a última rodada. Desempenho que, somado ao título na Libertadores de 1972, avalizaram o retorno dele ao Independiente no segundo trimestre de 1975, a tempo de coordenar toda a campanha de nova conquista em La Copa.
Victorio Spinetto: com V de Vélez e S de Sarsfield, ele é um dos poucos homens capazes de rivalizar com Carlos Bianchi e com o presidente José Amalfitani como maior prócer do clube – seja como volante nos anos 30; como técnico que pegou um time à beira da extinção atolado na segundona para leva-lo ao título dela em 1943 e ao primeiro pódio profissional nove anos depois (ninguém ficou tantos anos seguidos treinando o Fortín); ou coordenando nos anos 80 os juniores, moldando muitos dos futuros campeões noventistas. Já dedicamos este Especial a Don Victorio, cujo papel em Liniers ofusca brilhos que soube ter além da zona: nos anos 70, ele soube ser querido no rival Ferro Carril Oeste e no Argentinos Jrs de Maradona. E, bem antes, foi um digno sucessor de Dellacha nos Albañiles do Lanús.
Spinetto treinou o Grana na campanha de 1969. Embora seus times fossem mais caracterizados pela cautela e eficiência necessária a quadros pequenos do que por um jogo mais vistoso, chegou a bater por 7-1 o futuro campeão Chacarita. Ao fim, os grenás terminaram em 6º em sua chave no Metropolitano, garantindo mais calendário (a colocação na época permitia a vaga final ao Torneio Nacional). Ele então foi requisitado de volta pelo Atlanta, onde já havia feito história nos fim dos anos 50 com a campanha do título da Copa Suécia, principal troféu desse clube. E o Lanús? Sem o mestre, foi rebaixado já em 1970.
Osvaldo Piazza: zagueirão profissionalizado exatamente em meios aos Albañiles daquele Lanús de 1968-69, seguiu no clube até 1972, acumulando 113 jogos nas horas boas e ruins, como aquele rebaixamento de 1970 O Granate voltou imediatamente como campeão da Primera B de 1971 tendo no defensor a principal figura. Ele terminou estreando pela seleção meses depois, em maio de 1972, participando no Brasil da Taça Independência, uma Minicopa que a CBD programou para os 150 anos do grito do Ipiranga. A Argentina não foi campeã, mas aquele defensor forte no jogo aéreo e difícil de ser superado despertou interesse do bicho-papão francês da época, o Saint-Étienne. Os grenás sentiram demais: sem o estandarte da defesa, em dezembro de 1972 estavam outra vez rebaixados enquanto Piazza virava El León de Francia.
Tricampeão seguido com os verts na década e vice da Liga dos Campeões de 1976, teria ido à Copa do Mundo de 1978 mesmo com a política do técnico Menotti em priorizar jogadores do interior argentino acima dos que jogavam na Europa. No fim, apenas Kempes veio do futebol estrangeiro: Piazza estava na concentração, mas optou por voltar à França para acompanhar a evolução clínica da esposa (que permanecera na Europa) após um sério acidente de carro dela. Ele voltou à Argentina repatriado pelo Vélez um ano depois da Copa. Foram 104 jogos pelo Fortín, então um time de um único título na elite (em 1968). Chegou a tempo de ser titular no elenco vice-campeão do Metropolitano daquele 1979, onde o time também liderou sua chave no Nacional, caindo nos mata-matas dali apenas diante do futuro campeão, o River.
O troco veio na Libertadores de 1980: estreante na competição (o time campeão de 1968 abriu mão da vaga na de 1969), La V Azulada, mesmo dividindo grupo com os algozes, terminou liderando a chave em tempos onde só o primeiro colocado avançava. Piazza ainda integrou o time semifinalista do Nacional de 1981 antes de voltar ao futebol francês. Mas foi como técnico que se imortalizou em Liniers. Primeiramente, nos juvenis no início dos anos 90, até suceder de emergência o amigo Carlos Bianchi na reta final do Clausura 1996 (travada quando Bianchi já precisava trabalhar na Roma; ainda assim, o antecessor fez questão de fazer um bate-volta desde a Itália para estar na volta olímpica). Acabou ficando para erguer no mesmo ano aquela Supercopa com 100% de aproveitamento e a Recopa em 1997, última taça continental fortinera.
Horacio Bidevich: criado no Huracán de Arribeños de sua província natal de Entre Ríos, El Ruso veio de lá inicialmente para o tradicional rival lanusense, o Talleres da cidade vizinha de Remedios de Escalada. O lateral-direito virou a casaca em 1986, em tempos de uma nada glamourosa segunda divisão, não escapando de uma ou outra corneta impiedosa. Foram 128 jogos até 1990, ano em que foi titularíssimo da redentora campanha que devolveu o Granate à elite após treze anos. Seguiu o ano reforçando o Vélez e, embora já fosse reserva no desjejum nacional no Clausura 1993 (rumando ao Gimnasia y Tiro de Salta na sequência do ano), pôde até aparecer no pôster do título. Foram 69 jogos pelo Fortín, enquanto que nem sua volta ao Talleres de Escalada em 1996 o queimaram junto aos grenás.
Oscar Ruggeri: já dedicamos esse Especial a um nome histórico do futebol argentino, seja como titular da seleção de 1986 ou por ser o único a defender a Albiceleste como jogador do trio de ferro da capital (Boca, River e San Lorenzo) e também o único campeão nos três. Veio do Real Madrid em 1990 ao Vélez para, como jogador velezano, ser o capitão da Argentina no vitorioso período de 1991 a 1993, marcado por duas conquistas na Copa América – a de 1991 encerrou o pior jejum argentino no torneio, de 32 anos, e a de 1993 segue como a última conquista da seleção principal – e da primeira Copa das Confederações. Mas seu estrelismo não agradava os métodos de Carlos Bianchi, que o liberou do clube exatamente na pré-temporada ao torneio que marcou a reconquista nacional do Fortín.
El Cabezón então seguiu uma carreira consagradora no “neo-rival” San Lorenzo e, prestes a pendurar as chuteiras, foi abrigado pelo Lanús no segundo semestre de 1997. Sempre se declarou grato à acolhida entre os grenás, onde tanto esteve no time vice-campeão da Copa Conmebol daquele ano como também protagonizou a batalha campal na decisão com o Atlético Mineiro.
Miguel Ángel Russo: se como jogador ele defendeu tão somente o Estudiantes e a seleção, como técnico ele rodou o país. E o Lanús, time do seu coração, foi o primeiro a lhe dar oportunidade na nova carreira, em 1989. Russo foi o treinador daquele acesso redentor ao fim da temporada 1989-90 e, mesmo com o imediato rebaixamento, seguiu em La Fortaleza para outro acesso instantâneo, em 1992 (o clube viria a tornar-se uma instituição sólida e nunca mais caiu desde então). E ficou até 1994, despedindo-se para atender o chamado da velha casa – o Estudiantes havia sido rebaixado e Russo levou aos alvirrubros o Toque de Midas, com um título inapelável na segundona de 1994-95. Chegou a voltar ao Lanús na insossa temporada 1999-2000, mas foi após bons trabalhos no Rosario Central que ele apareceu no Vélez em 2005.
Russo também conseguiu idolatria meteórica em Liniers ao também ser campeão por lá logo no primeiro torneio; aquele Clausura 2005 foi especial também por ser a única taça velezana entre 1998 e 2009. Sua saída forçada ao Boca ao fim de 2006 (para variar, brilhou rápido, como campeão da Libertadores de 2007, o que o credenciaria para ser desde o fim de 2019 o atual técnico do clube) lhe queimou com setores puristas da torcida; ele ainda voltou ao Fortín em 2015 e a péssima campanha não ajudou a recuperar uma imagem de mercenário relembrada pelos mais corneteiros.
Leandro Somoza: cria e torcedor do Vélez, El Flaco foi profissionalizado pelo time nas vacas magras de 2001. Volante versátil para marcar, fazer um tampão entre o meio e a retaguarda e também para armar jogo, foi titular daquele título de 2005. Estreou pela seleção em 2006 já como recém-chegado ao Villarreal, mas pelo que havia feito em Liniers, pois não triunfaria na Espanha nem ali e nem no Real Betis. Acabou devolvido ao Fortín em 2008 e quase teve a carreira encerrada ao fraturar a tíbia em outubro. Recuperou-se ao tempo de ser um dos caudilhos do elenco campeão com epopeia do Clausura 2009.
Somoza passou ao Boca no início de 2011, sem a mesma polêmica de Russo ou do nome seguinte: eram vacas magras pelos lados da Casa Amarilla, sem títulos desde 2008. Jejum quebrado com eficiência no segundo semestre, com o último título invicto que o futebol argentino já viu. O temperamental volante também foi vice na Libertadores de 2012 (ano de título na Copa Argentina) e acabou até voltando à seleção após seis anos. Um declínio sensível o fez ser despachado ao Lanús em meados de 2013. El Flaco jogou pouco, mas jogou muito naquele time campeão da Sul-Americana e quase vencedor argentino no mesmo mês, a ponto de somar mais dois jogos pela Argentina no período – é o único a defender a Albiceleste vindo da dupla. Ainda voltou ao Vélez para um terceiro ciclo, já sem o mesmo êxito dos outros. Chegou a permanecer como assistente técnico naquela volta de Russo a Liniers.
Santiago Silva: sempre lembrado no Brasil mas como um bonde do bom Corinthians de 2002, El Tanque uruguaio criou sua fama na Argentina, sobretudo a partir dos gols pelo já decadente Gimnasia em 2006. O bom desempenho em La Plata fez o Vélez contrata-lo em 2007. Silva tardou a se firmar em Liniers, mas seu estrondoso sucesso em 2009 emprestado ao único título do Banfield na elite argentina, tendo a chuteira engraxada por James Rodríguez e não o contrário, mudou o cenário. Em 2010 já protagonizava no Fortín um grande trio ofensivo com Juan Manuel Martínez e Maxi Moralez, a um triz do título do Apertura e que não deixou escapar o Clausura seguinte, já em 2011 – quando La V Azulada esteve a um pênalti desperdiçado pelo carequinha de voltar a uma final de Libertadores.
Aquele infortúnio não chegou a queima-lo aos olheiros europeus, que o importaram para a Fiorentina. Para os velezanos, o problema maior foi Silva, sem triunfo na Europa, voltar rapidamente à Argentina como reforço do Boca para 2012. Teve seus momentos de talismã (como nos mata-matas contra o Fluminense na campanha vice da Libertadores e na final da Copa Argentina), mas sua passagem na Casa Amarilla foi marcada pela irregularidade. Assim, partiu junto com Somoza para o Lanús em 2013. O passado no rival Banfield (para onde chegaria a voltar, em 2016) não foi problema para o uruguaio se tornar o único campeão na dupla do Sul para além das divisões inferiores: fez gols em todos os mata-matas da vitoriosa Sul-Americana, exceto nas finais, embora não mantivesse a fase posteriormente.
Mariano Pavone: outro centroavante do estilo tanque, Pavone ficou marcado mundialmente por ter desperdiçado o pênalti que derrubou psicologicamente o River no jogo do rebaixamento em 2011. Injustiça a quem até chegou à seleção pelo desempenho no Estudiantes de 2006 (mais do que seu gol nos 7-0 no rival Gimnasia, ele também marcou os que forçaram a final com o Boca e ainda a pintura do título). No ajeitado Lanús de 2011-12, um trintão Pavone ainda contribuiu com média razoável de gols, especialmente no dérbi sulista com o Banfield – com direito a um de cobertura em 2011. Mas foi no Vélez que ele recuperou melhor o nome. Foram duas passagens, em 2015 e na temporada 2016-17, onde foi especialmente importante para afastar um risco sério de rebaixamento cheirado pela torcida fortinera.
Outros nomes: diversos outros passaram pelos dois clubes, embora sem estrelas simultâneas pelas duas camisas: o peruano Emilio Reuben, por exemplo, contribuiu com ótimos 37 gols em 97 jogos pelo Vélez entre 1933 e 1936, período em que a casa velezana (então no bairro de Villa Luro) foi reconhecida como um Fortín para visitantes – nascendo assim o apelido do clube, que pôde se intrometer duas vezes entre os cinco primeiros (grande feito em um cenário onde “os cinco grandes” são outros times). Jogaria até no Flamengo, mas seu passo no Lanús em 1942 resumiu-se a quatro gols em 22 jogos na luta contra o rebaixamento.
Outro estrangeiro de La V Azulada, o defensor uruguaio Anastacio Malaquín beirou os duzentos jogos entre 1975-81, enquanto que no Granate só chegou a treze, na segundona de 1982. De anos mais recentes, o ponta Iván Bella e o lateral Gastón Díaz, ambos presentes em praticamente todo o vitorioso ciclo velezano de 2008 a 2012, só registraram respectivamente seis e doze jogos oficiais como lanusenses (em 2014 e na temporada 2011-12, respectivamente).
De modo inverso, Leo Rodríguez, talhado nos tempos de segunda divisão do Lanús entre 1983 e 1988, não foi em sua única temporada no Vélez (1988-89) o jogador talentoso que demonstraria ser nos anos 90 pelo San Lorenzo – foi como azulgrana que ele passou à seleção, indo à Copa de 1994 como ilustre reserva de Maradona. Ainda soube fazer média com os grenás ao voltar para encerrar entre eles a carreira em 2002, logo após ganhar em janeiro daquele ano a Copa Mercosul ainda válida por 2001 pelo Sanloré. Similarmente, o atacante Claudio Enría foi peça importante na Cúperativa do Lanús, time que defendeu na saudosa fase de 1993-98. Reforçou o Vélez para a temporada 2005-06 e só conseguiu cinco gols.
Há ainda gente de certo renome no futebol argentino mais pelo que produziu longe da dupla. O meia-atacante Néstor Canevari, por exemplo, criou fama na campanha que colocou o Colón pela primeira vez na elite argentina, com o título da segundona de 1965 pelo Sabalero. Iniciou a temporada seguinte ainda com a equipe santafesina e no decorrer do ano foi ao Vélez, onde só marcou uma vez em onze oportunidades. Para 1967, já estava de volta a Santa Fe. No Lanús, reforçou o elenco na segundona em 1973 e 1974, descendo degraus ao passar em 1975 ao Almirante Brown.
O técnico Héctor Viera é figura tão carismática que tornou-se querido em duas duplas rivais: Huracán & San Lorenzo, clube que já o elegeu como ídolo máximo na ocasião do centenário, e Boca & River, onde foi o treinador da primeira Libertadores e do único Mundial. El Bambino apareceu no Vélez em 1990 e só teve tempo para promover o talismã Omar Asad ao time adulto, pois logo foi preso, acusado de estuprar um garoto. Já na fase decadente, Veira apareceu no Lanús em 2000, frequentando a metade inferior da tabela.
Outro a passar pela dupla como treinador foi Mario Zanabria, que ainda como jogador personificou o primeiro título argentino do Newell’s (em 1974, marcando o gol do título em pleno clássico fora de casa com o Rosario Central) para depois ser o Riquelme dos dois primeiros títulos do Boca na Libertadores (1977 e 1978, período também do primeiro Mundial auriazul). Marito chegou ao Lanús em 1999 e ao Vélez em 2004. Não chegou a fazer campeonatos ruins, mas não bateu a meta que as ambiciosas diretorias queriam de ao menos classificar-se a algum torneio internacional.
O atacante Mauro Óbolo pertenceu ao time de Liniers de 1999 a 2006, mas sendo sucessivamente emprestado – inclusive ao Lanús, onde foi outro a só alcançar cinco gols (na insossa temporada 2004-05). Foi pelo Arsenal que ele se encontrou no futebol argentino, já entre 2010 e 2011, a ponto de ser recomprado pelo Vélez em 2012 pelo produzido em Sarandí. Mas, outra vez, não se firmou no clube de formação.
Parágrafo pessoal: naquele bom 2013 da dupla, eles em agosto empataram em 0-0 em Liniers naquele Torneio Inicial pelo qual acabariam brigando mais à frente com Newell’s e o campeão San Lorenzo. A partida foi acompanhada nas cabines de imprensa pessoalmente pelo autor dessa nota, que se permitiu espantar o técnico lanusense Guillermo Barros Schelotto (na foto final direita; a da esquerda tem como personagem Ricardo Gareca) ao explicar-lhe que certa atuação do então atacante no Mangueirão em 2003 fez um então adolescente redator tornar-se ateu por dez dias. As fotos nada profissionais abaixo são de autoria dele: