O ameaçadíssimo Club Atlético Independiente, após perder para o River no último domingo, neste sábado terá outro confronto de gigantes na Argentina: receberá às 15h10 em Avellaneda outro dos cinco grandes do país, o San Lorenzo. Precisa vencê-lo e torcer por resultados alheios; um empate já será suficiente para condenar o Rojo à segundona, pela primeira vez. O duelo poderia ter ainda maior magnitude, pois o San Lorenzo (clube do coração de Ricardo Bochini, maior ídolo da história do Independiente) também sofreu dessa ameaça na temporada.
Quem pode fazer (com o perdão do trocadilho) o CAI cair é justamente o primeiro grande clube do país a sofrer o descenso, situação já vivida pelo San Lorenzo, em 1981. A comoção foi tão grande que reinstaurou, para a temporada em que os cuervos retornaram, em 1983, o uso dos famigerados promedios (a média dos pontos da temporada atual com anteriores: antes uma, hoje duas) como sistema de rebaixamento, a fim de oferecer proteção aos grandes. Naquele mesmo ano, o River foi salvo por isso, mas o Racing, arquirrival do Rojo, condenado. O River, enfim, sofreria o efeito reverso em 2011, mesmo após uma boa temporada.
Independiente e San Lorenzo são afastados principalmente pelo fator Libertadores: quem pode cair hoje é simplesmente um símbolo da competição. Os diablos foram os primeiros argentinos a vencerem-na, a conseguirem um bi e um tetra seguidos (este recorde é exclusivo seu) e ainda são quem mais venceu o torneio (7). Já os sanlorencistas são zombados exatamente por torcerem pelo único grande que ainda não venceu a competição – a sigla CASLA, de Club Atlético San Lorenzo de Almagro, é satirizada para Club Atlético Sem Libertadores da América.
Mas é justamente o sem-Libertadores que pode rebaixar o recordista, além de dar um troco 50 anos depois de um episódio vergonhoso do encontro: em 1963, o Rojo foi campeão argentino metendo um 9-1 no rival de hoje, em dia de polêmica arbitragem, que motivou os próprios cuervos a, sob protesto, se deixarem vencer – até marcaram um gol contra propositalmente. O CASLA também terá pela frente ídolos do seu maior rival, o Huracán; casos do meia Daniel Montenegro e do técnico Miguel Brindisi. Vamos aos que se destacaram em ambos os adversários de logo mais:
Rubén Insúa
O antigo meia foi justamente um dos rebaixados poupados pela torcida cuerva em 1981 por conta de sua identificação com o clube. Confiança que ele retribuiu na campanha que, já em no ano seguinte, devolveu o San Lorenzo à elite, uma volta personificada nele: foi de Insúa o gol, de pênalti, na vitória que garantiu o acesso. Falamos aqui daquela segundona de 1982.
Tão logo voltou à elite, o San Lorenzo brigou pelo raro bicampeonato de emendar o título da segunda divisão com o da primeira: foi vice do Metropolitano de 1983, a ficar exatamente com o Independiente, por 1 ponto – outro troco que pode ser devolvido hoje. Insúa foi o motor daquele desempenho e chegou naquele 1983 à seleção. Depois de uma experiência na Espanha, aportou em Avellaneda.
No Rojo, El Gallego foi uma das peças-chave do time campeão da temporada 1988-89, no último campeonato vencido pelo maior ídolo do Independiente – Ricardo Bochini, com quem Insúa fez dupla no meio-de-campo para abastecer os gols de Carlos Alfaro Moreno. Destacou-se também no Equador: vice-campeão da Libertadores pelo Barcelona em 1990 e vencedor como técnico em 2008 pela LDU. O San Lorenzo conseguiu sua maior glória continental exatamente sob comando dele, no título da Sul-Americana de 2002, retratado aqui.
Claudio Marangoni
El Maranga veio ao San Lorenzo em 1976, pouco após a fase em que o clube mais dominou o país (1968-74). O clube não soube administrar o auge e Marangoni foi um oásis de talento na decadência vivida ao fim da década. Ainda é considerado um dos melhores meias a passar pelo CASLA. 1979 foi um ano de perdas. A principal foi a do estádio Gasómetro, por conta das dívidas – a equipe deixou seu reduto no bairro de Boedo depois de mais de 60 anos e só nos anos 90 voltaria a ter casa própria. Já Marangoni foi vendido ao Sunderland.
Era a época em que o futebol inglês recrutava seus primeiros argentinos: Alberto Tarantini no Birmingham City, o atual técnico da seleção, Alejandro Sabella, no Leeds United, e Osvaldo Ardiles e Ricardo Villa no Tottenham Hotspur, todos com vitrine após a Copa de 1978, o que não era o caso de Marangoni. Após uma temporada, voltou à Argentina, desejando o San Lorenzo, que o negou. Parou justamente no rival Huracán, onde também se fez querido.
Após um ano no Huracán, foi trazido ao Independiente, a equipe onde melhor rendeu. Fez grande meio-de-campo com Bochini, Jorge Burruchaga e Ricardo Giusti, sendo o único do quarteto ausente da Copa de 1986 (não por falta de talento). Venceu o Metro 1983, chegando à seleção, e as últimas Libertadores e Intercontinental conquistada pelo Rojo, em 1984. Insúa foi contratado exatamente para suprir a ausência dele, transferido em 1988 ao Boca, onde também fez sucesso.
Andrés Silvera
El Cuqui surgiu em outro CAI, a Comisión de Actividades Infantiles, de sua Comodoro Rivadavia natal, na Patagônia. De lá, chegou ao arquirrival sanlorencista, o Huracán, em 1998. Após passo pelo Unión, apareceu em 2001 no Independiente. O Rojo fez péssima temporada e começou a de 2002-03 ameaçado de rebaixamento, como agora. Silvera quase foi devolvido, mas seguiu e foi o maior destaque do título do Apertura 2002, o último nacional que o clube venceu – falamos aqui. Foi o artilheiro (16 gols) do campeão de melhor ataque da década (48 gols em 19 jogos).
Com mais técnica do que potência (“Em Comodoro, me ensinaram a estar frio na área e buscar o canto mais longe do goleiro. Não sei pegar forte”, confessou), chegou em 2006 ao San Lorenzo. Já veterano, foi considerado o melhor reforço do clube no período. Foi determinante no vitorioso Clausura 2007 (retratado aqui), com 7 gols, e deixando satisfatórios 37 em 90 partidas pelo CASLA. Ele retornou ao Independiente em 2009, participando também da conquista da Sul-Americana de 2010. Silvera é exatamente o único presentes nos títulos obtidos por ambos nos últimos dez anos.
Em comum na seleção…
Apenas um defendeu a Argentina a partir de ambos. Trata-se do defensor Jorge Olguín, um dos integrantes daquele vitorioso San Lorenzo do início dos anos 70. Ele prosseguiu no clube no início da decadência e foi um dos únicos cuervos convocados para a Copa de 1978 (o outro foi o goleiro Ricardo La Volpe), e único titular. Foi outra peça que o clube teve que se desfazer em 1979, além do Gasómetro, de Marangoni e de Narciso Doval, ídolo dos anos 60 que recém-voltava de passagem de sucesso por Flamengo e Fluminense. Foi um zagueiro-artilheiro: 18 gols em 79 jogos. .
Olguín, quem mais jogou pela seleção vindo do CASLA (36 vezes), seguiu carreira no Independiente, pelo qual foi à Copa de 1982. A equipe só seria campeã em 1983, mas a zaga titular era formada por Enzo Trossero e Hugo Villaverde. Acabou vendido ao Argentinos Jrs (um dos concorrentes do Rojo ao descenso: se empatar em casa hoje, o Independiente cai mesmo que vença), perdendo as conquistas de 1984 dos de Avellaneda. Mas não se arrependeu: foi grande peça do melhor Bicho da história. Com ele, o Argentinos foi bicampeão em 1984 e 1985, ano em que também venceu a Libertadores.
… e em comum nos títulos
Além de Insúa, Silvera e Olguín, os seguintes jogadores foram campeões pelos oponentes de hoje: Juan Manuel Baigorria, Oscar Ortiz, Lucas Pusineri, Juan Serrizuela e Eduardo Tuzzio. Cabe destacar ainda uma dupla de irmãos, um campeão em cada clube.
Baigorria foi um zagueiro que atuou no San Lorenzo entre 1931-34. Apenas em 1932 foi titular; começou alternando-se com Luis Castañares e depois perdeu o posto para Cipriano Achinelli. Sua trajetória em Boedo foi de altos e baixos; jogou dez vezes no título de 1933, o primeiro do clube na era profissional. No Independiente, também integrou o primeiro quadro profissional campeão, em 1938.
Vicente de la Mata, um dos maiores craques argentinos, chegou ao Independiente após a Copa América de 1937 – menor de idade (seu pai precisou representa-lo no contrato), fizera os dois gols do título sobre o Brasil. Seu trio ofensivo com Antonio Sastre (ídolo são-paulino) e Arsenio Erico (maior artilheiro do futebol argentino, com 293 gols) rendeu os primeiros títulos profissionais do Rojo, no bi de 1938-39. Sem eles, esteve presente ainda no de 1948. Seu filho, também chamado Vicente, integrou os bicampeões da América de 1964-65; os De la Mata foram o primeiro caso de pai e filho na seleção.
Na época de Vicente pai, Francisco de la Mata defendia o San Lorenzo e foi campeão pelo CASLA em 1946. Era o veloz e driblador ponta-esquerda do celebrado ataque Armando Farro-René Pontoni-Rinaldo Martino, o Terceto de Oro. “É um ponta de coisas raras. Pensa uma coisa e realiza ou lhe sai outra. Há que reconhecer, porém, que com essa modalidade desconcerta o rival”, um jornalista da época relatou. Mas nunca alcançou a dimensão do irmão.
Ortiz, como Olguín, integrara o grande San Lorenzo do início dos anos 70. Também foi titular na Copa de 1978, mas já pelo River, onde também foi ídolo. Este ponta-esquerda driblador, como Marangoni, esteve no Huracán em 1982 e de lá chegou ao Independiente em 1983. Mas não fez sucesso em Avellaneda. Integrou o time campeão do Metro, mas na reserva, e aposentou-se ali mesmo, com apenas 30 anos.
Pusineri (volante), Serrizuela e Tuzzio (zagueiros) integraram outra grande fase do San Lorenzo, no início dos anos 2000. Foram campeões do Clausura 2001, quando o time embalou na maior sequência da vitórias do campeonato argentino (13). Tuzzio, reserva no título no Clausura 1995, acabou vendido ao Olympique de Marseille. Pusineri e Serrizuela seguiram no CASLA e também venceram a Copa Mercosul, sobre o Flamengo – falamos aqui. Mas, destes dois, só San Lucas realmente agradou a torcida, sendo considerado um dos pilares do elenco.
A Mercosul foi decidida no início de 2002, e naquele mesmo ano Serrizuela e Pusineri foram titulares do Independiente campeão nacional, e ali Pusineri também teve maior destaque, vital ao marcar o virtual gol do título, no final do jogo contra o Boca na penúltima rodada: o Boca era o concorrente principal à taça e conseguia igualar-se na liderança ao estar vencendo por 1-0 fora de casa. O 1-1 permitiu que a confortável vantagem de três pontos fosse mantida para os de Avellaneda, que garantiram o título em um 3-0 sobre o… San Lorenzo, com San Lucas novamente marcando.
Já o raçudo Tuzzio, comentado, como Ortiz, no especial sobre Rojo e River (aqui), é um dos antigos sanlorencistas a enfrentar o clube hoje – outros são Osmar Ferreyra, Claudio Morel Rodríguez, Jonathan Santana e Cristian Tula. No San Lorenzo (que hoje tem o ex-rojo Ignacio Piatti), Tuzzio fez de quase tudo, atuando como zagueiro, volante, lateral-direito e até ponta. Crucificado (ainda que exageradamente) pela decadência do River, chegou ao Independiente em 2009 e foi uma das principais peças dos campeões na Sul-Americana de 2010. Foi ele quem bateu o pênalti decisivo contra o Goiás.
Clique nestas outras rivalidades para acessar seus elementos em comum: Boca-Racing, River-Independiente, Racing-San Lorenzo, Racing-Independiente, River-Racing, Boca-Independiente, Boca-San Lorenzo, River-San Lorenzo, Boca-River I, Boca-River II, Boca-River III e Boca-River IV. No mesmo estilo, também fizemos a da rivalidade San Lorenzo-Huracán.
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