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Elementos em comum entre Boca e Talleres, finalistas da Copa Argentina

Boca x Talleres é um duelo com sua história ao futebol. Maradona estreou oficialmente com a camisa azul y oro enfrentando La T, curiosamente seu primeiro oponente também na estreia pelo Argentinos Jrs. Aquela partida de 1981 ainda serviu de rodada inaugural do único título argentino de Dieguito, também o único troféu nacional boquense entre 1976 e 1992. Mas, fora esse dado, a quantidade de duelos decisivos é seleta; a final da Copa Argentina representará apenas a terceira vez em que estiveram juntos no páreo por um título. Em 2000, não houve como deter no Apertura um Boca campeão do continente e do mundo. Em 2004, ninguém riu em um Clausura erguido pelo River. Como será dessa vez?

Parte de ausência de mais títulos em disputa se explica pela própria história da liga argentina, restrita de modo oficial à Grande Buenos Aires, La Plata, Rosario e Santa Fe ao longo do século XX; os demais times do país adentro precisavam contentar-se com ligas regionais. A cordobesa teve sua primeira edição em 1913 e logo se viu basicamente duopolizada entre Belgrano e Talleres, campeão local em 1915, 1916, 1921, 1922, 1923, 1924, 1934, 1938, 1939, 1941, 1944, 1945, 1948, 1949, 1951, 1953, 1958, 1960 e 1963 (em negrito, anos em que o Boca foi igualmente campeão, no torneio argentino) até uma intervenção ditatorial na AFA notar a importância de dar um lugar ao sol ao pessoal do interior.

Assim, em 1967, o campeonato argentino foi adequadamente renomeado para “Metropolitano” e passou a dividir calendário com o nascente Torneio Nacional, a reunir os melhores do Metro com os sobreviventes de uma seletiva de campeões das demais partes do país. Até então, os encontros entre Boca e Talleres foram bem raros e sempre em amistosos – o primeiro, em 1920, no feriado nacional de 9 de julho (1-1 em Córdoba). O segundo tardou até 1944 e o Boca até venceu em 18 de março, por 2-1. Mas, em revanche ainda naquele ano, os alviazuis surraram por 7-3 em 12 de outubro. Dois de seus atacantes seriam imediatamente incorporados pelos xeneizes: o futuro ídolo são-paulino Gustavo Albella, autor de dois gols, e Jorge Campos Capdevila, que fizera três.

Com o advento do Torneio Nacional, os duelos enfim ganharam frequência. La T estreou na edição de 1969, na esteira de seu primeiro título cordobês desde 1963. Levou de 6-0 no primeiro encontro “oficial” contra o Boca, campeão daquele Nacional e também da edição inaugural da própria Copa Argentina naquele ano. Mas logo um relativo equilíbrio pautaria o histórico – considerando amistosos (que incluem um em 1973 recordado pelo uso emprestado de Kempes e Ardiles, futuros vencedores da Copa 1978 e ambos emprestados pelo vizinho Instituto de Córdoba aos alviazuis; Kempes até marcou o único gol), são 34 vitórias do Boca, 24 do Talleres e 27 empates. Depois de 1969, o clube do bairro Jardín só recuperou o cetro cordobês em 1974, quando deu largada à fase mais brilhante de sua história. Treinado pela lenda máxima riverplatense, Ángel Labruna, a equipe logo brilharia no Nacional daquele ano: liderou um grupo com o Newell’s (então campeão argentino anterior) e o próprio River para então terminar em 4º no octogonal final, à frente de Independiente e Boca.

Maradona, em sua estreia oficial pelo Boca: 4-1 no Talleres na rodada inaugural do vitorioso Metropolitano 1981

Em 1975, mesmo perdendo para o River três peças-chave, novamente o Talleres liderou sua chave – embora murchasse no octogonal para 6º. Em 1976, Maradona estreou no futebol adulto precisamente contra os cordobeses, e perdeu: 1-0 em Buenos Aires para a grande força do interior, novamente líder de seu grupo. Dessa vez, os classificados se pegariam em mata-matas e La T (a fazer de Luis Ludueña o artilheiro do certame) quase fez ali uma final com o Boca. Mas, na própria Bombonera, usada como campo neutro, caiu na semifinal diante do River. O técnico era o ex-atacante botafoguense Rubén Bravo, que faleceu em pleno exercício do cargo em agosto de 1977, em excursão à África. Mesmo sob luto, os pupilos saltaram mais um degrau, travando a final do Nacional de 1977 contra o Independiente – até hoje, a mais épica final argentina.

A seleção de 1978 deu-se assim ao luxo de abrir mão dos jogadores do Boca, a despeito do recente primeiro título auriazul na Libertadores, mas não dos tallarines: foram três convocados, além de Humberto Bravo, que acompanhou Maradona nos três cortes finais – o outro foi de Víctor Bottaniz, do Unión. Apenas o River teve mais representantes na primeira conquista mundial argentina. Sem deixar a peteca cair, o Talleres foi líder de seu grupo pelo quarto Nacional seguido na edição de 1978 (onde o alviazul José Reinaldi abocanhou a única artilharia a escapar de Maradona nos seis torneios argentinos travados entre 1978 e 1980), embora novamente o Independiente aguasse o sonho, agora nas semifinais.

Em 1979, veio ao Talleres um recordista hexacampeonato cordobês – e uma quinta liderança de grupo seguida no Nacional, ironicamente no mesmo grupo do futuro campeão River; o futuro vice, o Unión, é quem encerrou o sonho do bairro Jardín, ainda nas quartas-de-final. Em todas essas campanhas marcantes dos anos 70, contudo, apenas na primeira o país foi contemplado com um duelo direto entre Boca e Talleres, no octogonal final (vitória alviazul por 2-1). Nas seguintes, nunca calharam de estarem no mesmo grupo ou num mesmo mata-mata. Também em 1979 foi criada a Lei 1309, que parecia um verdadeiro prêmio a La T. Mas que a longo prazo pareceu atrofiar sua força.

Pela lei, o time interiorano que se classificasse a dois mata-matas consecutivos ou a três alternados seria contemplado com uma vaga no Metropolitano. As duas opções eram cumpridas pelo Talleres, que até sondou seriamente o reforço de Maradona, oferecendo-lhe mais dinheiro que o próprio Barcelona já se dispunha. O negócio não saiu, mas os novatos entraram em grande estilo no Metro enquanto deixavam para trás a liga cordobesa: fecharam o pódio da edição 1980 (contra o Boca, foram dois empates: 1-1 e 0-0), onde ironicamente o vice foi o Argentinos Jrs maradoniano, então a colocação mais alta da história do primeiro clube de Diego. É de se imaginar como poderia ter sido se a junção de forças ocorresse.

Em 1982, teve troco tallarin: 4-0, com três gols do cabeceador Morete, que havia sido despedido do Boca. O outro que sobe é Juan José López, a fazer o caminho inverso em 1983

Mas a nova rotina de incessantes viagens à capital federal em contraste com as fórmulas de tiro curto do Nacional pareceu cansar os estreantes. No Nacional, voltaram a cair na primeira fase – embora registrassem um 4-1 no Boca. Assim, o renome tallarin era altíssimo para a rodada inaugural do Metropolitano de 1981, a render o jogo mais histórico entre os finalistas da Copa Argentina. Ali Maradona estreou oficialmente pelo Boca, em uma imediata devolução à torcida da casa na Bombonera: quem sofreu os 4-1 sobre foram os cordobeses, que ainda pareciam atordoados com os novos hábitos; mesmo conservando em forma muitos dos craques dos anos anteriores e com o reforço do brasileiro Júlio César “Uri Geller”, escaparam do rebaixamento por um só ponto. No Nacional, seus craques terminaram apenas em 4º em um grupo de sete times.

Para 1982, então, a reação foi trazer de volta o técnico Labruna e rechear o elenco envelhecido com muita gente com quem o comandante trabalhava nos tempos de River. Deu certo em curtíssimo prazo: La T foi semifinalista do Nacional, agora travado no primeiro semestre. O grande momento? Um 4-0 no Boca. Pelos anos seguintes, a tônica de um longo Metropolitano ser custoso demais aos interioranos (11º em 1982, 13º em 1983, sofrendo no processo um 5-2 do Boca, e 9º em 1984) enquanto se davam melhor nos piques dos Nacionais (foram até as oitavas-de-final em 1983 e até as semis em 1984) se repetiu. O Torneio Nacional foi disputado pela última vez em 1985 já com uma participação morna dos alviazuis, que completaram a década sem fazerem sombra ao temor que despertavam pelos dez anos anteriores.

Ainda em 1985, o calendário da elite argentina adotou uma fórmula nos moldes europeus, com pontos corridos iniciados no segundo semestre e finalizados no primeiro do ano seguinte. O bairro Jardín se viu na lanterna da temporada 1987-88, embora o rebaixamento se afastasse pelo promedio razoável. O 6º lugar na temporada seguinte foi um espasmo final de honra; lanterna no Clausura 1991, o promedio já não salvou após nova lanterna no Clausura 1993. A volta cordobesa foi imediata, mas novo rebaixamento também, na temporada 1994-95 (lanterna no Apertura incluso). Novo retorno veio de modo marcante na temporada 1997-98, com direito a triunfo em final contra o arquirrival Belgrano. O time fez grande papel no segundo semestre de 1999: 5º no Apertura e título na Copa Conmebol.

Um ano mais tarde, e Talleres e Boca brigaram pela única vez por um título, ao menos na maior parte do Apertura da temporada 2000-01. La T terminou em 4º lugar, enquanto os xeneizes, por apenas quatro pontos a mais (três deles, em vitória por 2-0 no duelo direto já pela 15ª rodada, na foto que abre essa matéria. Foi o último jogo do time de Carlos Bianchi antes do embarque a Tóquio), puderam festejar a tríplice coroa semanas após o Mundial Interclubes. O desempenho alviazul colocou Córdoba pela primeira vez na Libertadores, na edição 2002. Mas o time já chegou desmontado ao continente, vindo de uma lanterna no Clausura 2001 e de uma vice-lanterna no Apertura 2001.

“Faltam só 5 rodadas, mas ninguém se resigna”: no Apertura 2000, o Boca riu por último ao fim da perseguição do Talleres (e do Gimnasia, do San Lorenzo e do River)

Pelos anos seguintes, o bairro Jardín só se levantou tarde demais: no Clausura 2004, chegou a brigar novamente pelo título contra o Boca, que triunfou por 3-1 no encontro válido pela 8ª rodada (no jogo em que Guillermo Barros Schelotto chegou ao seu centésimo gol na elite). Mas nem o bronze um ponto abaixo da azul y oro (a taça seria do River) evitou o rebaixamento via promedios; a queda também anulou uma classificação em campo para a Sul-Americana daquele ano. Foi preciso aguardar até 2016 para a primeira divisão rever o Talleres, que até chegou chegando – seu 2-1 na temporada 2016-17 foi apenas sua quarta vitória dentro da Bombonera. Mas também foi o último triunfo cordobês: nos cinco duelos travados desde então, foram quatro vitórias boquenses e um empate.

A longa descrição serve para contextualizar de modo geral a presença tallarin de muitos dos nomes a seguir. A ideia foi listar apenas nomes que brilharam por pelo menos um dos dois finalistas da Copa Argentina:

Gustavo Albella e Jorge Campos Capdevila: os donos daquele recordado 7-3 amistoso de 1944 não tiveram espaço em um Boca bicampeão argentino em 1943-44. Dono de 29 gols em 37 jogos por La T, Albella (admirado por um jovem Che Guevara quando ainda defendia no interior cordobês o Sportivo Alta Gracia) estreou primeiro no Boca, em amistoso de 1º de abril de 1945, em 3-1 no Racing. Foram apenas cinco jogos e dois gols, diante da concorrência de El Atómico com o ídolo Jaime Sarlanga; seria no Banfield que ele despontaria nacionalmente antes de triunfar no São Paulo.

Campos Capdevila, por sua vez, vestiu a azul y oro a partir de 24 de junho de 1945, em 1-0 no Independiente pela Copa Britânica. Foram apenas sete jogos e três gols ao longo de três temporadas desse meia-esquerda. Sua maior contribuição ao Boca seria como preparador físico juvenil a partir de 1958, lapidando por anos a fio futuros ídolos boquenses – chegando a trabalhar do time adulto pontualmente.

Adolfo Pedernera: talvez o mais perto de um ídolo em comum na dupla, embora o brilho pelos dois clubes se ofusque pelo que representou ao River como um atacante revolucionário dos anos 30 e 40, atuando como espécie de falso 9 daqueles tempos (Di Stéfano dizia que Pedernera fora o maior jogador que vira). Como treinador, em 1962 fizera papel honroso na Copa do Mundo com a estreante Colômbia para então fazer o Gimnasia brigar pelo título, em campanha que criou o apelido de Lobo ao time de La Plata. Assim, chegou em 1963 ao Boca como espécie de manager: era a principal cabeça da comissão técnica, embora nas súmulas o cargo de treinador nomeasse Aristóbulo Deambrossi, como na final da Libertadores contra o Santos. Ele enfim assumiu diretamente como treinador boquense em janeiro de 1965 e ficou até outubro de 1967, levantando a liga argentina de 1965 e lançando muitos juvenis ao time adulto – foi em sua gestão que construiu-se o centro de La Candela.

Albella, ídolo no São Paulo. O já treinador Pedernera, como jogador um ídolo de Di Stéfano

No Talleres, coube a Pedernera a missão de substituir Labruna (seu ex-colega daquele River apelidado de La Máquina) em 1975. Cumpriu com sobras: ganhou o título cordobês de 1975 e o 6º lugar no Nacional mascara que Don Adolfo ainda é o segundo técnico com melhor aproveitamento com o clube na primeira divisão nacional, com apenas quatro derrotas em 45 jogos. Já dedicamos este Especial à lenda, que ainda voltaria ao River como técnico juvenil a tempo de polir garotos feitos Andrés D’Alessandro.

Alberto Tarantini: como muitos nomes dessa lista, ele também esteve no River. Inclusive, é quem a seleção argentina mais aproveitou de modo equilibrado da dupla de gigantes; prata-da-casa do Boca, estreou no time adulto em julho de 1973 para ser o sucessor de Silvio Marzolini na lateral-direita. Deixou o clube em novembro de 1977, pouco após participar do primeiro título xeneize na Libertadores; estava rompido pessoalmente com o presidente boquense Alberto Jacinto Armando, acusando-o de insensível após a perda paterna, e foi o mais perto que o Boca teve de um representante na Copa de 1978 – sagrou-se campeão mundial constando oficialmente como jogador sem clube.

Após vencer a Copa, El Conejo rumou à Europa: anunciado no Barcelona, fechou com o Birmingham City mesmo. Mas naqueles tempos era mais fácil estar no radar da seleção jogando a liga cordobesa do que a inglesa. Ao fim da temporada europeia de 1978-79, virou tallarin a tempo de participar do hexa cordobês de La T e de nova campanha destacada no Nacional, e é o único que a seleção argentina aproveitou tanto do Boca como do Talleres. Há quem sustente que o negócio foi apenas uma fachada para que não aportasse diretamente no River; fato é que já em 1980 o defensor passou aos millonarios. Lhe dedicamos este Especial.

Tarantini com Trobbiani no Boca. Chegou da primeira divisão inglesa ao Talleres em 1979, assim como Guerini, que vinha do Real Madrid

Carlos Guerini: o Boca contratou-o junto ao Belgrano, pelo qual brigara pela artilharia do Nacional de 1972. Esse ponta ficou no clube basicamente apenas no primeiro semestre de 1973 mas foi muito bem: 16 gols em 27 jogos, além de estrear pela seleção a marcar o gol da classificação à Copa do Mundo de 1974. Ironicamente, não foi ao Mundial, talvez prejudicado por transferir-se ao Málaga – clube que, por outro lado, lhe serviu de trampolim ao Real Madrid. Três títulos espanhóis depois, foi repatriado em 1979 pelo Talleres. Coube a ele assegurar o hexa cordobês, convertendo a cobrança decisiva na decisão por pênaltis contra o Racing de Córdoba. Permaneceu no bairro Jardín até 1983 e o mundo girou: perdeu sua cobrança em outra decisão contra aquele Racing, na eliminação nas oitavas-de-final do Nacional. El Chupete voltou ao Belgrano para sedimentar-se como um dos raros vira-casacas queridos pelas duas maiores torcidas de Córdoba. Já lhe dedicamos este Especial.

José Berta: volante do Newell’s campeão argentino pela primeira vez (Metropolitano de 1974), Berta teve dois ciclos no Boca, ambos infrutíferos. Estreou em fevereiro de 1979 em uma equipe que vinha do bicampeonato seguido na Libertadores. Mas desavenças com o treinador Juan Carlos Lorenzo lhe tolheram de espaço, que recuperou em 1980 naquele Talleres bronze como estreante no Metropolitano. Em 1981, seu Racing também fizera um Metropolitano decente e ele foi recontratado em 1982 pelo Boca. Dessa vez, desentendeu-se com todo o vestiário.

Carlos Morete: prata-da-casa do River, era daqueles atacantes que fediam a gol mesmo sendo toscos. Foi dos ídolos mais xingados que o time de Núñez já teve, embora saísse em alta, como artilheiro e campeão do Metropolitano de 1975 – quando o Millo encerrou seu pior jejum (dezoito anos). Iniciou longa carreira no futebol espanhol até o Boca repatria-lo em 1981. Ironia: El Puma é um dos maiores carrascos que o Boca já teve, somando 20 gols sobre a azul y oro. Mas não rendeu por lá, prejudicado por ser improvisado na ponta diante da ótima fase de Maradona e Miguel Brindisi no título do Metropolitano de 1981. Foram apenas quatro gols em 26 jogos e ele recuperou-se reencontrando o mestre Labruna no Talleres semifinalista de 1982. A ponto de ter anotado três vezes naquele recordado 4-0 de La T sobre o Boca na campanha…

Juan José López e Morete não chegaram a ser colegas no Boca. Mas sim no River e no Talleres, onde brilharam em 1982 (e López, como treinador em 2004)

Morete torcia pelo Racing, mas não titubeou em aceitar proposta do Independiente, credenciada por aquela recuperação em Córdoba. E ainda teria estrela como um reserva útil no Argentinos Jrs campeão de quase tudo entre 1984 e 1985. Já lhe dedicamos este outro Especial.

Pablo Comelles: aquele histórico Talleres quarto colocado no Nacional de 1974 teve Comelles na lateral-direita e Héctor Ártico na zaga. Eles e o técnico Labruna então rumaram ao River para fazerem história no desjejum de dezoito anos em 1975. Permaneceu em Núñez ao longo do vitorioso ciclo 1975-81. Com espaço gradualmente perdido, reforçou o Boca na pré-temporada de 1982, estreando em 4-1 amistoso no Racing em 30 de janeiro. Inicialmente, não permaneceu; foi repassado para o San Lorenzo, onde terminou 1982 como campeão da segunda divisão. Assim, voltou ao Boca para apenas em 1983 estrear em jogos oficiais, mas não se saiu bem – em 1984, já voltava a Córdoba, mas para defender o Belgrano. É o único a jogar nos três principais clubes da maior cidade argentina e nos dois principais da segunda maior cidade.

Juan José López: prata-da-casa do River revelado no ciclo do técnico brasileiro Didi, foi figurinha carimbada do ciclo Labruna. Em 1981, o meia já era outro ídolo sem o espaço de outrora e assim acompanhou Labruna naquele Talleres de 1982, trabalho que lhe credenciou passar pelo Boca em 1983: Jota Jota virou a casaca justamente a partir de um duelo contra o River, em amistoso em fevereiro. Não virou ídolo xeneize, despedindo-se em dezembro ao fim de um ano sem glórias, mas teve seu desempenho reconhecido pelas arquibancadas. Seria colega de Morete também naquele Argentinos Jrs de 1984-85 e ainda viraria outra vez a casaca ao chegar em 1986 ao Belgrano.

El Negro construiu uma carreira de treinador concentrada em Córdoba, trabalhando em todos os principais clubes da cidade. No Talleres, era o comandante do agridoce 2004, em que La T tanto fechou o pódio do Clausura como também terminou rebaixada por conta dos promedios – ele é inclusive o quarto técnico tallarin com maior aproveitamento na elite (54,23% dos pontos). Mas, para o resto do mundo, a rica trajetória dele se resume à pecha de ser o treinador do River no dia do rebaixamento, em 2011 (contra o Belgrano, aliás). Injustiça que destacamos no Especial dedicado a López.

O zagueiro Cuciuffo, titular na Copa do Mundo de 1986. Os treinadores Pastoriza (ex-Fluminense) e Saporiti (ex-Atlético Mineiro) se cumprimentam antes da final de 1977

José Luis Cuciuffo: principal revelação do nanico Huracán de Córdoba, o zagueiro foi logo contratado pelo Talleres, embora inicialmente precisasse ser emprestado ao Chaco For Ever (em 1980) para jogar continuamente. Foi um dos raros destaques da campanha pobre de 1981, a ponto de terminar vendido ao Vélez. Acabou chegando à seleção e virou o único a vencer uma Copa do Mundo como jogador velezano. Serviu o Boca de agosto de 1987 até março de 1990, erguendo no período a Supercopa de 1989 e a Recopa de 1990, os principais títulos que o time teve ao longo de seu pior jejum argentino (os doze anos entre o Metropolitano 1981 e o Apertura 1992). Outro vira-casaca dessa lista, mas por ter defendido no fim da carreira o Belgrano do coração, em 1993. El Cuchu foi o primeiro vencedor de Copa do Mundo pela Argentina a falecer, em um tolo acidente com arma em 2004. Já lhe dedicamos este outro Especial.

Roberto Passucci: como Maradona e Morete, foi outro reforço que o Boca adquiriu no início de 1981, adquirido junto ao Huracán (o principal, de Buenos Aires). Passucci era volante, mas atuou em tudo quanto foi posição ao longo da uma estadia lembrada mais pela garra do que pela técnica. O ídolo icônico que soube ainda assim ser na Bombonera, a ponto de virar nome de blog voltado à paixão boquense, não conseguiu ser em Córdoba: foi tallarin apenas na péssima temporada de 1987-88, em que o promedio livrou do rebaixamento o time que em campo foi o lanterna da tabela.

Roberto Saporiti: jogador sem brilho por Independiente e até Atlético Mineiro, Saporiti consagrou-se no futebol como o assistente técnico de César Menotti na Copa do Mundo de 1978. Ele conciliou o cargo com o papel de técnico do Talleres vice-campeão do Nacional de 1977, até hoje o mais perto que um time cordobês esteve perto do título argentino. E foi acompanhando Menotti que ele chegou inicialmente ao Boca, no início de 1987. O trabalho da dupla estava bom: fizeram o time saltar do 14º lugar a uma liderança provisória naquela temporada 1986-87, embora perdessem fôlego na reta final. Alegando problemas pessoais, Menotti optou por sair e Saporiti foi inicialmente efetivado para substituir o mestre. Só durou cinco jogos, entre agosto e setembro. Uma goleada de 6-0 sofrida para o Racing determinou sua saída precoce. Teve depois outros ciclos em La T (1988-90, 1995, 2006, 2009), mas longe do brilho do primeiro.

José Omar Pastoriza: era ele o técnico do Independiente que no finzinho arrancou sobre o Talleres o épico título de 1977. El Pato é o maior técnico da história do Rojo, com diversas passagens de técnico entre os anos 70 e 2000, o que ofusca que o Talleres é outro clube onde mais teve ciclos diferentes – o primeiro, naquele glorioso ano de 1980, onde comandou os novatos do Metropolitano. No Boca, a temporada 1987-88, marcada pelo início desastroso sob Saporiti, viu Pastoriza ser contratado como bombeiro. Ele chegou tarde para fazer o time brigar pelo título, mas colocou-o no páreo na temporada seguinte, perdida justamente para o Independiente.

Gareca recebendo Juan José López no Boca e orientando como treinador os alviazuis na final da segunda divisão de 1998. Villarreal esteve nela e no Boca campeão da Libertadores em 2001 e 2003

O vice-campeonato argentino na temporada 1988-89 foi o último trabalho de relevo de Pastoriza; o Boca campeão sobre o próprio Independiente na Supercopa 1989 já era comandado por Carlos Aimar. Dentre seus outros trabalhos no Talleres, foi tanto o bombeiro em vão no primeiro rebaixamento do time, em 1993, como comandante em parte da campanha de acesso na temporada 1997-98. Esteve como bombeiro também no pobre ano de 2003, decisivo para o rebaixamento consumar-se já com Juan José López, embora ainda pudesse dali retornar em 2004 ao seu Independiente. Já dedicamos ao Pato este outro Especial.

Marcelo Trobbiani: ele conseguiu estrear na seleção argentina adulta ainda como jogador juvenil do Boca. Foi em 23 de setembro de 1973, na decisiva vitória em La Paz sobre a Bolívia pelas eliminatórias, dois meses antes de debutar no time xeneize principal. Teve idas e vindas entre Boca, o Estudiantes e o Elche espanhol; em 1981, era anunciado no mesmo pacote de estrelas com Maradona e Morete para um segundo ciclo na Casa Amarilla. Reserva da seleção argentina de 1986 (só tocou uma vez na bola naquela campanha, mas para dar de calcanhar uma quase assistência na decisão…), ainda sabia ser decisivo como veterano: liderou o Barcelona de Guayaquil vice da Libertadores de 1990 (a primeira final do futebol equatoriano). Mas já era 1993 quando ele chegou ao Talleres e, como Pastoriza, não pôde evitar o rebaixamento.

Ricardo Gareca: prata-da-casa do Boca, estreou ainda em setembro de 1978 no time adulto, em uma formação reserva enquanto a titular se focava na fase decisiva do bicampeonato na Libertadores. Só começou a firmar-se justamente após o maradoniano Metropolitano de 1981, pois passara aquele torneio emprestado ao Sarmiento de Junín, estreante na primeira divisão. Destacou-se a ponto de ser um raro xeneize aproveitado pela seleção em meio à pior crise institucional do clube, que quase fechou as portas em 1984. E virar a casaca para reforçar o River em 1985 foi eternamente imperdoável à torcida azul y oro. Ao Gareca jogador, já dedicamos este Especial.

Gareca pendurou as chuteiras em 1994 como um bom reserva no Independiente e teve no Talleres o primeiro trabalho de grande identificação como treinador: em 1997, era o comandante quando La T encerrou em alto estilo seu pior jejum no dérbi com o Belgrano, um 5-0 após quatorze anos sem triunfos no Clásico Cordobés. Após curta passagem pelo Independiente, El Tigre voltou a Córdoba a tempo de triunfar sobre o arquirrival em outro clássico dos mais recordados, o da final da segunda divisão de 1997-98. E era Gareca, sobretudo, o treinador tallarin na epopeia da Copa Conmebol de 1999, principal conquista do clube e do futebol cordobês.

Serna no Boca de 1999 e enfrentando o ex-time no Clausura 2004, outra disputa de título entre os dois clubes. A ironia é que o Talleres foi ao mesmo tempo rebaixado

Javier Villarreal: volante revelado pelo Talleres em 1996, viveu os momentos recordados da Era Gareca, exceto justamente os de 1999 – quando calhou de defender justamente o rival Belgrano. De Córdoba ele partiu ao Córdoba, o clube espanhol da cidade de mesmo nome e do qual foi repatriado pelo Boca no início de 2001. Villarreal vinha para substituir Gustavo Barros Schelotto (vendido ao… Villarreal) como opção recorrente de banco ao trio sólido de volantes que carregavam o piano para os recitais de Juan Román Riquelme.

Ele foi premiado com a titularidade nas finais da Libertadores 2001 e, após passar 2002 lesionado (e também escanteado por Oscar Tabárez), recuperou prestígio com o retorno de Bianchi em 2003. Encerrou o ciclo no Boca após o vice na Libertadores 2004 e pendurou as chuteiras em uma volta honrosa ao Talleres: campeão da terceira divisão em 2013.

Mauricio Serna: o volante colombiano chegou ao Boca em meados de 1997 para virar um dós ícones da Era Carlos Bianchi – das principais conquistas do ciclo mais vitorioso da história azul y oro, só não participou da Libertadores 2000, no semestre em que esteve lesionado (embora figure nas fotos da volta olímpica); no Apertura 1998, no Clausura 1999, no Mundial 2000, no Apertura 2000 e na Libertadores 2001 ele marcou presença sólida naquele trio de volantes legendário com Diego Cagna (depois Sebastián Battaglia, o atual técnico boquense) e José Basualdo. Ficou até 2002 e voltou em 2021 como técnico do time B.

Em Córdoba, Chicho foi uma das peças daquele contrastante Clausura 2004, onde o bronze e classificação à Sul-Americana nos gramados foi convertido em rebaixamento. Não ficou para a Primera B, acertando o retorno ao seu Atlético Nacional.

Juan Cruz Komar: zagueiro central vindo das inferiores do Boca, estreou em 2 de novembro de 2014 mas não se firmou – foram apenas oito jogos e em janeiro de 2016 ele rumou ao bairro Jardín, inicialmente sob empréstimo. Pois Komar virou um dos ícones do renascimento alviazul, festejando ao fim daquele mesmo semestre o retorno à primeira divisão após doze anos. Adquirido em definitivo, segue no Talleres (que soube conciliar a campanha finalista dessa Copa Argentina com o oferecimento de concorrência mais longeva ao título do River no campeonato argentino desse 2021) desde então.

Komar já pôs toda a responsabilidade sobre o Boca pela final. Buffarini não praticará a lei do ex por pouco: saiu em maio

Cristian Pavón: prata-da-casa do Talleres, onde chegou aos oito anos e foi profissionalizado aos 17, na segunda divisão de 2013-14 – após já ter disputado o Mundial sub-17 com a seleção argentina da categoria. Com apenas 20 jogos e quatro gols no time adulto, mas já visto como promessa, o ponta-direita foi logo comprado pelo Boca, ainda que os auriazuis inicialmente o repassassem emprestado ao Colón para a segundona transicional de 2014. Recém-rebaixado, o Sabalero foi imediatamente promovido à elite como líder do Grupo A e Pavón foi logo reintegrado pelo Boca, vivenciando as conquistas nacionais em série – e os dissabores internacionais – que marcaram os anos recentes boquenses. Foi o único jogador do clube que veio a ser aproveitado pela Argentina para a Copa de 2018.

Julio Buffarini: o lateral nasceu em Córdoba e é torcedor tallarin, estreando no futebol adulto ainda aos 17 anos, em 2006, vindo da base. Muito jovem, foi poupado de maiores críticas e reconhecido pelo esforço demonstrado em meio ao primeiro rebaixamento de La T à terceira divisão argentina, em 2008. Prosseguiu a carreira gradualmente por Atlético Tucumán e Ferro Carril Oeste até ser pinçado por um San Lorenzo ameaçado de rebaixamento e ali ficar no ciclo redentor que culminou no inédito título da Libertadores, em 2014. Chegou ao Boca já em janeiro de 2018, vindo do São Paulo, e ficou até maio de 2021. Ganhou duas ligas argentinas, mas faltou aquela Libertadores 2018…

Faixa bônus: Maradona, que diante do Talleres fez a primeira partida adulta da vida e a primeira oficial pelo Boca, trilhou seu ciclo mais exuberante no futebol argentino (1976-82) justamente em meio ao auge de La T. Se não chegou a ser contratado em 1980, El Diez virou admirador confesso do clube: tinha em casa a sua própria camisa alviazul, trocada com José Daniel Valencia, o camisa 10 tallarin, com quem desenvolveu elo familiar mesmo que Valencia fosse ironicamente um dos meias que “roubaram” a vaga de Diego na seleção de 1978.

Maradona reconheceu na época que La Rana vivia mesmo fase ainda melhor e tornou-se padrinho de uma das filhas dele. E, em 2000, entrou em campo com o uniforme do Talleres para prestigiar o amistoso festivo de despedida do amigo. Contamos neste Especial dedicado a Valencia.

Admirador do Talleres, Maradona usou uma foto com a camisa do clube para celebrar o dia das mães em 2016. Em 2000, vestiu o uniforme alviazul na despedida do compadre José Daniel Valencia, o craque que havia lhe presenteado com aquela camisa

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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