Fundados em 1905, Boca e Independiente são os mais vitoriosos clubes argentinos no exterior, o que apimenta a rixa: lutam pelo posto de Rey de Copas, proclamado pelo Rojo nos anos 70, quando tornou-se o recordista absoluto de títulos na Libertadores. Chegou a ser tetra seguido no torneio, um recorde, e soma sete títulos na competição. O Boca também venceu nos anos 70 (duas) e encostou no novo século; hoje, tem seis, mais recentes, e o ultrapassa se consideradas Copas “menores”: tem duas Sul-Americanas, três Recopas, uma Copa Master, uma Copa Oro. Além disso, tem três Intercontinentais contra duas da metade vermelha de Avellaneda. Daí a “requisição” azul y oro.
Em outra Copa, a Supercopa, que reunia só campeões da Libertadores, ambos se enfrentaram duas vezes na finais, com uma taça para cada: 1989 auriazul, 1994 vermelha (assim como 1995, sobre o Flamengo). Também vinham sendo os únicos jamais rebaixados no país, razão para a queda do Independiente em 2013 ter sido comemorada de forma extra pelo Boca, agora isolado com esse orgulho. Ironicamente, ambos só chegaram à elite, há cem anos, por virada de mesa e não vencendo a 2ª divisão. Falamos aqui. São também os dois clubes do coração de Diego Armando Maradona.
Todos os cinco grandes já passaram por largos jejuns e estes sofreram menos. Os bosteros, por dez anos de 1944-54. Os diablos, por doze entre 1948-60. Não é de estranhar que tenham tantos vitoriosos em comum. A última taça nacional do Independiente, em 2002, foi justamente sobre o Boca. Também estão próximos pela geografia: o bairro de La Boca é vizinho à cidade de Avellaneda. Se no especial anterior (aqui) falamos das interseções de River e Racing, hoje é a vez de seus respectivos rivais, que por sinal se assemelham também por levarem vantagem nos seus respectivos clássicos:
Ernesto Grillo
Falamos dele aqui. Foi o mais talentoso jogador no dito jejum que o Independiente enfrentou entre 1948-60. Ficou de 1949-57, quando foi vendido ao Milan – marcou gol na final da Liga dos Campeões de 1958, sobre o Real Madrid de Di Stéfano. Líder de um ataque único: só o Rojo teve a honra de transportar todo um quinteto ofensivo à seleção, o que ocorreu sete vezes entre 1953-55, onde Grillo fez história contra a Inglaterra (veja aqui). Voltou da Europa ao Boca para, mais recuado, enfim conseguir taças na Argentina: até parar, em 1966, venceu três campeonatos argentinos e foi vice na Libertadores 1963. Seguiu no clube formando por muito tempo talentos nas categorias de base.
Francisco Sá
Um operário na zaga do Independiente tetra seguido na Libertadores, acabou incluso na Copa 1974. Viera do River e mais tarde passou ao arquirrival do Millo. Se deu muito bem no Boca também, integrando os bicampeões de 1977-78 da Libertadores, as primeiras vencidas pelos auriazuis. Pancho Sá é o mais copero do torneio, seis vezes. Recorde que dificilmente será batido.
Claudio Marangoni
Revelado no Chacarita como centroavante, bom meia-armador em um falido San Lorenzo, um dos primeiros argentinos na Inglaterra (Sunderland), veio ao Independiente aos 29 anos, sendo um volante elegante. “Me parecia que tinha todo o tempo do mundo”, disse ele sobre jogar mais recuado após passar por posições mais ofensivas. Integrou quadrado mágico no meio-campo rojo, com Ricardo Bochini, Ricardo Giusti e Jorge Burruchaga. Deles, foi o único ausente na Copa 1986, não por deficiência técnica. Ganhou o Metropolitano 1983 e as últimas Libertadores e Intercontinental rojas, em 1984.
Passou ao Boca em 1988, junto do eterno técnico rojo José Omar Pastoriza, causando revolta na torcida diabla – até hoje, ele não se permite ir ao estádio do ex-time, sobre o qual venceu dentro da Doble Visera a final Supercopa 1989, o mais relevante troféu auriazul no mais longo jejum de taças nacionais boquense, 1981-92. Maranga encerrou no Boca a carreira, em 1990.
Miguel Ángel Brindisi
Símbolo do grande Huracán dos anos 70 e boa exceção na campanha amarga da Argentina na Copa 1974 (marcou no Brasil), chegou veterano ao Boca, em 1981, junto de Maradona, de quem foi um “irmão mais velho” no título do Metro. Há até quem diga que, analisando com frieza, ele, com 16 gols, teria sido mais importante que El Diez para a taça. Já com 33 anos, deixou o clube em 1983. No Independiente, é o atual técnico. Foi incapaz de salvá-lo nos últimos dez jogos para o rebaixamento, tempo que teve: viera sob emergência, lembrado como técnico dos bons momentos rojos nos anos 90. Falamos aqui daquele seu time, campeão argentino e da Supercopa Libertadores em 1994 e da Recopa 1995.
Em comum na seleção…
Fora Grillo, poucos conseguiram. Diego Cagna surgiu no Argentinos Jrs, chegando já pelo Bicho à seleção, em 1992. Foi no Independiente um voluntarioso volante do bom time de Brindisi nos anos 90 e recebeu outras chances na Albiceleste antes da Copa 1994. Chegou em 1996 ao Boca, firmando-se a partir de 1998. Já experiente e menos afobado, foi capitão no supervencedor elenco de Carlos Bianchi; curiosamente, como o próprio Bianchi, era torcedor do River. Ganhou quatro vezes o campeonato argentino, a Libertadores 2003 (havia ido à Espanha e perdera o bi das de 2000-01), duas Sul-Americanas e uma Recopa. Seus últimos jogos pela Argentina foram na Copa América de 1999.
O meia Federico Insúa chegou ao Independiente em 2002. Foi logo campeão do Apertura, ainda a última taça nacional roja (veja). Chegou à seleção já em janeiro de 2003. Chegou ao Boca em 2005, entendendo-se bem com Gago e Palacio no time de Alfio Basile. Ganhou 4 títulos, marcando o gol que garantiu o Apertura 2005. As outras taças foram a Recopa e Sul-Americana 2005 e o Clausura 2006. Basile, ao assumir a seleção em 2006, chamou-o. Em 2007, contra a vontade, foi vendido ao Borussia Mönchendgladbach. Voltou ao Boca em 2009, mas já não era o mesmo. Hoje, está no Vélez.
Oscar Ustari destacou-se muito jovem no Independiente: estreou no time principal em 2005 já campeão mundial sub-20 e um ano depois, desbancou Germán Lux como terceiro goleiro na Copa do Mundo. Embora só tenha estreado pela Argentina em 2007, já no Getafe, fora à Copa ainda como jogador rojo. Chegou ao Boca em 2012 e venceu a Copa Argentina, jogando só a final, contra o antigo rival Racing. No mesmo ano, atuou no Superclássico das Américas, para o qual o técnico Sabella chamou os dois goleiros do Boca: ele e Agustín Orión, de quem passou a ser reserva.
…e em comum em títulos
Fora Sá, Marangoni, Brindisi (como técnico do Independiente), Cagna e Insúa, outros já foram campeões com as duas camisas. Os primeiros foram os atacantes Pablo Bozzo e Zoilo Canavery, dos primeiros títulos da dupla na elite. Bozzo ligou-se mais ao Boca, com 43 gols em 97 jogos, jogando uma vez pela seleção e campeão em 1919, 1920 e 1923. Em 1922, foi colega de Canavery na taça roja. Canavery, do seu lado, era um uruguaio que não só jogou pela Argentina, mas por Boca e River e Racing e Independiente. Só não ganhou títulos no River e se destacou na dupla de Avellaneda (veja).
No Boca, Canavery marcou 12 em 29 jogos, mas na sombra do titular Pedro Calomino, então astro da seleção. Ainda assim, como xeneize recebeu um tango em seu nome de Alfonso Gagliano. No Independiente, começara a carreira em 1912, sendo vice argentino. Foi campeão em 1922 e 1926 como ponta-direita do quinteto com Alberto Lalín, Luis Ravaschino, Manuel Seoane e Raimundo Orsi (campeão mundial pela Itália em 1934), apelidados de Diablos Rojos, depois sinônimo do próprio clube. Foi o primeiro técnico profissional do time. Carmelo Rovito foi seu colega em 1926, ano em que jogou duas vezes pelo Boca. Cada um foi campeão argentino em sua própria liga – haviam duas.
O atacante Ramón Abeledo ficou de 1955-62 no Indepeniente. Esteve na quebra do tabu de doze anos, em 1960, indo até à Copa 1962. Já no Boca, chegou em 1964, jogou só duas vezes na campanha do título daquele ano e saiu em 1966. O zagueiro e uruguaio Alcides Silveyra foi seu colega nos dois: chegou ao Rojo em 1960, após ser campeão e eleito o melhor jogador da Copa América de 1959. Foi ao Barcelona em 1963, mas logo veio ao Boca. Era um marcador duro e temperamental, tachado de mal-intencionado. Bicampeão em 1964-65, chegou a ser jogador-técnico em 1967.
Raúl Savoy era um volante ofensivo de notável condição técnica, de uma canhota elegante. Veio do Chacarita para ser decisivo no início do Rey de Copas: campeão nacional em 1963 e em 1967 (integrando o superofensivo esquema de Osvaldo Brandão – ver aqui) e bi nas Libertadores 1964-65, as primeiras rojas. Esteve na seleção de 1963-68. Passou pelo Boca no fim da década e venceu a Copa Argentina 1969 e os nacionais de 1969 e 1970. Neste, foi colega de Omar Larrosa, que jogou 6 vezes no nacional. Mas foi pouco aproveitado; passou até pela Guatemala antes de enfim triunfar na Argentina.
Larrosa despontou primeiro no bom Huracán dos anos 70, integrando o único elenco quemero campeão da elite profissional, em 1973 (veja). Depois, no Independiente bi nacional de 1977 (falamos aqui) e 1978. Como diablo, chegou aos 30 anos à seleção e foi campeão mundial em 1978. No bi, foi colega de Norberto Outes, quem mais marcou em parceria com a lenda Bochini: 95 gols em 189 jogos. Outes chegou bem ao Boca em 1980, ano difícil ao clube. Mas perdeu lugar em 1981, por hepatite e as vindas de Maradona e Brindisi. Jogou cinco vezes no vitorioso Metropolitano.
Também naquele Metro 1981, jogou Carlos Morete, um dos maiores carrascos do Boca: fez 20 gols nele, a maioria dos tempos de River. O passado no rival o prejudicou a se tornar querido nos auriazuis, assim como ser deslocado de centroavante para ponta em razão de Maradona e Brindisi. Relançou-se no Talleres e, sobretudo (embora torcedor do Racing), no Independiente: artilheiro do nacional 1982 no Rojo, até voltou depois de dez anos à seleção. Foi campeão do Metro 1983, mas já reserva.
Alejandro Barberón foi um ponta lembrado no Independiente mais pelas assistências com Bochini aos gols de Antonio Alzamendi e Outes do que por gols próprios. Substituto de Bertoni (recém-vendido ao Sevilla), foi campeão nacional em 1978 e da Libertadores e Intercontinental 1984. Fanático pelo Boca, foi levado com Marangoni quando o ex-diablo José Omar Pastoriza foi treinar os auriazuis em 1988. Ganhou a Supercopa 1989 e a Recopa 1990, mas não rendeu no time do coração. Foi colega do goleiro Esteban Pogany, que venceu também o Apertura 1992 e a Copa Oro 1993. Mas, nos quatro títulos, não jogou um minuto sequer, na reserva de Carlos Navarro Montoya (futuramente rojo).
Pogany, ex-reserva no Independiente dos anos 70, tem o recorde de jogos no banco do Boca, 207. Chegou a ser técnico interino em 1998. Ex-Racing e San Lorenzo, só não jogou no River dos cinco grandes, assim como Luis Carranza, seu colega no Apertura 1992 e na Copa Oro. Carranza até chegou à seleção vindo do Boca, mas foi um xeneize irregular. No Independiente, foi um reserva dos títulos de Brindisi. Outro reserva ali foi o volante Raúl Cascini, que chegou ao Boca para substituir em 2002 o ídolo Mauricio Serna. Destacou-se como um batalhador que ganhou tudo como um dos líderes do Boca em 2003 (Libertadores, Apertura e Intercontinental). Bateu no Milan o pênalti do título da Intercontinental.
Por fim, o meia-armador Leandro Gracián: nunca se firmou no Boca, embora campeão da Recopa 2008 e dos Aperturas 2008 (jogou sete vezes) e 2011 (só duas). Em meio aos títulos de 2008, ficou conhecido no Brasil ao recusar o Flamengo, afirmando que preferia continuar na luta por uma vaga nos xeneizes. Acabou sucessivamente emprestado, inclusive ao Independiente, onde venceu a Sul-Americana 2010.
Clique nestas outras rivalidades para acessar seus elementos em comum: Boca-Racing, River-Independiente, Independiente-San Lorenzo, Racing-San Lorenzo, Racing-Independiente, River-Racing, Boca-San Lorenzo, River-San Lorenzo, Boca-River I, Boca-River II, Boca-River III e Boca-River IV. No mesmo estilo, também fizemos a da rivalidade San Lorenzo-Huracán.
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