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Disparos e dois mortos; a barra brava do Boca em guerra civil

Di Zeo (sem camisa) quer recuperar o poder
Di Zeo (sem camisa) quer recuperar o poder

Desde Buenos Aires – A violência no futebol argentino não é uma triste exclusividade de apenas um clube em particular. Assola todas as divisões do país e muda a forma com que se apresenta dependendo da categoria e quantidade de dinheiro que o time em questão é capaz de movimentar. E se esse time for o Boca Jrs, a disputa pelo poder paralelo nos famosos “paravalanchas” cobra muito caro: vidas.  Ontem cobrou novamente.

San Lorenzo e Boca jogariam no Nuevo Gasómetro às 18h30, uma partida amistosa válida pelo Torneio de Inverno. Mas muito antes disso, por volta das 12h00, uma facção denominada pela imprensa argentina como “barra não oficial” (por mais absurdo que isso possa parecer), chegou às portas da entrada visitante no estádio do Ciclón. Era o grupo de Rafa Di Zeo, quem comandou a barra Xeneize até ser preso em 2007, e agora quer recuperar o seu poder. Composta basicamente pelo seu fiel grupo da localidade de Lugano e também de Lomas de Zamora, o plano era chegar cedo para ocupar o centro da arquibancada visitante.

Longe dali, na Bombonerita, o grupo principal que atualmente comanda a barra brava se preparava para sair em caravana até Bajo Flores, bairro onde aconteceria a partida. Com Mauro Martín e Maximiliano Mazzaro presos,  La 12 está nas mãos de Cristian Fido Desbaux, homem de confiança dos chefes detidos. Cristian partiu com o seu grupo e durante o trajeto foram escolatos por homens da Gendarmería Nacional (uma espécie de polícia militar especializada no patrulhamento das fronteiras do país).

Barras de ferro afiadas foram encontradas no lugar do confronto
Barras de ferro afiadas foram encontradas no lugar do confronto

No momento da chegada o confronto já era inevitável. Ao perceber as intenções do grupo “não oficial”, o bando que vinha escoltado decidiu descer dos ônibus e enfrentar os rivais que vestiam as mesmas cores e o mesmo escudo. Voavam pedras e garrafas de ambos os lados. Ao mesmo tempo, surgiam homens armados com barras de ferro e pontas afiadas. Os dois grupos se enfrentavam a metros do estádio e quatro horas antes do horário previsto para o apito inicial. No meio de toda a confusão, disparos e dois mortos: Marcelo Carnevale, 35 anos e do grupo de Cristian Desbaux, e Angel Díaz, 45 anos e homem importante para Di Zeo.

Depois do tiroteio, as duas facções dispersaram e finalmente a polícia conseguiu estabelecer um pouco de ordem em um cenário que não lembrava o futebol. Um corpo sem vida esparramado no chão simbolizava, da forma mais trágica, a guerra civil que vive a barra brava do Boca Jrs. Os organismos de segurança não apresentaram as garantias necessárias e a partida foi cancelada.

Com o escândalo estampado em todos os canais de televisão durante o que restava do domingo, era hora de dirigentes e membros dos órgãos de segurança trocarem acusões e responsabilidades. Sérgio Berni, Secretário de Segurança da Nação, foi direto e disparou contra tudo e contra todos: “Esse é um problema que possui vários fatores, onde existem muitos interesses. Não devemos fingir que estamos distraídos. Não tenho dúvidas de que sem a cumplicidade dos dirigentes, isso não seria possível. Alugam os ônibus, dão ingressos, participam das vendas dos cambistas… Eu não estou dizendo nenhuma novidade, é uma questão econômica que não aconteceria sem cumplicidade”.

O presidente do Boca, Daniel Angelici, saiu em defesa própria: “Lamentamos muito tudo isso. Estou surpreso com as declarações do Secretário de Segurança, responsabilizando os dirigentes de que existe conivência. Cada vez que acontece alguma coisa, (ele) aparece na imprensa e procura culpados, mas nunca faz nada”.  E foi além; “Temos que parar com essa hipocresia, as leis devem ser mais claras, devemos combater os flanelinhas. A polícia não pode apenas observar como eles cobram dos sócios por estacionarem o carro”.

Enquanto as duas partes apontam o dedo em riste uma para a outra, pouco se fala em soluções e como diminuir a influência das barras bravas nos clubes de futebol. A única medida já confirmada por Berni, é que os jogos continuarão sem a presença de público visitante: “Sigo determinado com a minha decisão de que se jogue sem público visitante. Vou me reunir com a AFA e a Província para que uma medida seja adotada”.

Leonardo Ferro

Jornalista e fotógrafo paulistano vivendo em Buenos Aires desde 2010. Correspondente para o Futebol Portenho e editor do El Aliento na Argentina.

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