Em 2002, aos 13 anos, iniciei uma relação de coleção com a Placar, inicialmente no embalo do retorno do meu time do coração, após sete anos, à primeira divisão, algo reforçado pelas conquistas em série do clube ao longo daquele ano – e, claro, do pentacampeonato da seleção em uma Copa memorável pelas quedas precoces das seleções “inimigas” do Brasil.
Em 2005, aderi ao orkut e à comunidade dessa revista, fórum que me desenvolveu uma visão cada vez mais crítica ao conteúdo. Para leitores veteranos, a revista se tornou a “Placaras” (nem sonhavam que a própria Editora Caras viria a adquirir o título adiante!), das reportagens sobre “os óculos do Caio Júnior” e do “xampuzinho” de jogadores metrossexuais, além de uma overdose de capas corintianas nas febres Tévez e Ronaldo. Na comunidade, conheci o site e a revista Trivela, cada vez mais recomendados como o contraponto, aquilo que a Placar havia deixado de ser.
A coleção de Trivela foi iniciada no início de 2008 e conviveu por um ano com a da Placar, cujas compras cessaram ao início de 2009. A comparação de conteúdo estava cada vez mais desfavorável contra a revista que, além de relatos impertinentes da vida extracampo dos personagens do futebol, repetia errinhos apontados diversas vezes pelos leitores em tópicos de orkut lidos e comentados pelo André Rizek (o único membro da Placar que se dignava a dialogar) e que insistia em uma linha criticada de ilustrações com fotos “posadas, na penumbra, com jogadores de braços cruzados e cara de mau”. Aliás, esteja em paz, Bindi e sua repetida corneta sobre o escudo errado do Marília!
As compras da Trivela também viriam a cessar em 2009, mas por conta do encerramento da revista no segundo semestre. A relação durou o bastante para me proporcionar uma primeira imersão no contexto do futebol argentino, sobretudo em perfil da Grande Buenos Aires na seção “capitais da bola” ou algo assim. Fui saber que Independiente, Racing e San Lorenzo eram grandes e o Vélez, não, desfazendo uma imagem de infância (gerada pelos títulos que o clube alternava com Boca e River nos anos 90, além do trio ter o mesmo patrocínio da cerveja Quilmes). Que o San Lorenzo tinha um clássico com o Huracán. Além da importância barrial. Com a sucessora da Trivela, a Revista ESPN, conheci outro veículo saudoso, o site Impedimento.
O acompanhamento da comunidade da Placar no orkut continuava, de todo modo. O ano de 2010 trouxe mais críticas: diferentemente dos anos anteriores, não haveriam edições pós-jogos da revista na Copa do Mundo, com a cobertura sendo online e por meio de um jornalzinho diário. Um dos críticos mais frequentes e com melhor propriedade nas observações, Alexandre Giesbrecht (que, especialista no São Paulo, viraria “consultor” em matérias históricas envolvendo o tricolor), contrapôs a postura da Placar com o da El Gráfico, mostrando o “espetáculo” que era o fato de ela lançar revistas temáticas do torneio e disponibiliza-las na plataforma issuu. Conheci assim a El Gráfico e, viajando naquele mesmo ano (duas vezes) à Argentina, não titubeei em adquirir exemplares regulares e temáticos.
A viagem por si só iniciou uma grande paixão pelo país vizinho, facilitada pelo desencanto com a seleção brasileira desde a falta de comprometimento (de não fazer entender quem, após os 7-1, hoje romantiza aquele time) demonstrada na Copa de 2006 ainda antes de uma (pessoalmente) insossa eliminação para a França – um último espasmo de torcedor canarinho antes da indiferença viria com a final da Copa América no ano seguinte. Em 2010, não sem críticas de gente próxima, caíram mitos pessoais, germinados para além do futebol por conta de certas narrações esportivas.
Parecerá conto de pescador, mas a primeira El Gráfico adquirida (abril de 2010) destacava no interior um tal de Omar Wehbe como herói do primeiro título do Vélez. Em minha segunda viagem, por motivos acadêmicos, dividi uma mesa de debate em uma universidade de Mendoza com alguém portador do mesmo sobrenome incomum, que admite ser sobrinho do sujeito… Àquela altura, comecei a reformular verbetes no Wikipédia de grandes jogadores argentinos e uruguaios. A El Gráfico e suas edições temáticas dos ídolos dos grandes clubes aprofundou ainda mais a imersão histórica no futebol argentino. Assim como os excelentes textos especiais do Futebol Portenho, um site descoberto graças à Trivela, com quem houve uma parceria na época.
Os três veículos, assim como o Impedimento e as edições guardadas da Placar, se tornaram as fontes básicas nas reformulações daqueles verbetes. Alguns tiveram destaque oficialmente reconhecido, ganhando estrela de ouro ou de prata: Maradona, Francescoli, Doval, Guillermo Barros Schelotto (exorcizando um fantasma de adolescência). Também tentei no de Bochini (que sequer conhecia antes da segunda viagem à Argentina), mas faltou um mísero voto. Na época, um vastíssimo acervo pré-2002 da Placar foi liberado pelo google. Também foi usado como fonte wikipédica. Lendo os textos de antigamente e comparando com os atuais, tive a confirmação de que aqueles senhores que malhavam a revista no orkut tinham uma boa dose de razão.
Como os jogadores do passado me interessavam mais como editor do Wikipédia, as matérias do Futebol Portenho mais aguardadas eram as dos Especiais. Uma troca de comentários, de informação e sugestões se desenvolveu naturalmente, sem pretensão, até surgir o convite para integrar o site em setembro de 2011 – curiosamente, às vésperas da primeira vez da seleção argentina em Belém. Na mesma época, iniciava a Copa do Mundo de Rúgbi, e uma revista-guia ilustrada feita pela El Gráfico semeou o interesse pela bola oval, da qual viraria praticante até 2013 e fã até hoje.
Foi justamente com matérias de rúgbi que estreei no Futebol Portenho. Passando ao futebol, a relação com a El Gráfico se estreitou de vez; diversas vezes, usamos o rico acervo de entrevistas disponibilizado no site dela em nossas matérias. De lições mais valiosas, uma fluência em espanhol rio-pratense escrito e falado, aprendido paulatinamente de forma autodidata.
Mas pude notar que sua trajetória vinha tendo mais similaridades do que gostaria com a Placar. Impressão reforçada exatamente com a leitura de textos de edições longínquas, escaneadas em fóruns e blogs de torcedores, transmitindo um jornalismo sem os pachequismos rasos do Olé (a contaminar a jovem guarda do jornalismo local, incluindo na própria El Gráfico). Sério e também poético assinado pelas penas de Borocotó, Chantecler, Juvenal, Frascarita, Osvaldo Ardizzone ou Dante Panzeri – aquele que, crítico da Copa de 1978 morto às vésperas do torneio, havia escrito um livro intitulado “Dirigentes, Decência e Pontas” por serem aquilo em que a Argentina seria carente (“pontas” no significado da posição de jogador mesmo: no título original é Wines, o plural de Wing no jargão futebolístico argentino).
Aos curiosos na qualidade e estilo de texto da El Gráfico “das antigas”, recomendo esta nota, sobre o título de 1973 do Huracán, feita com base em trechos de reportagens da época. Ainda assim, após quase oito anos de imersão na história futebol argentino, conhecendo-o mais que a do paraense (longe de ser isso um grande orgulho), foi grande a lamentação interna pelo fim da El Gráfico, ainda que não comparável à do público argentino.
Foram diversas as manifestações encontradas no twitter de uma parte de infância de alguns que se ia. De gente que desenvolveu seu vocabulário com os bons textos da revista. Das lembranças afetivas “da rodada do fim de semana que acabava apenas na quarta-feira”, quando a revista, em sua fase semanal, saía. Da alegria que era ver na capa um jogador do próprio time, especialmente dos clubes menores, cada vez menos frequentes – ao contrário do que ocorria até o início dos anos 60, antes do romântico radical Panzeri ir embora.
Passemos enfim às capas, então. Assim como o texto, a escolha foi pessoal. Priorizou aleatoriamente fotos plásticas de movimento, belos tributos singelos talvez não perceptíveis ao olho leigo, fatos que denunciam outros tempos e muitas saídas a campo – inspiração de uma nota memorável (infelizmente, hoje fora do ar) do Impedimento comparando-as a um bebê entrando em parto, ouvindo ainda nos vestiários o som da multidão ainda abafado até a audição ficar estrondosa ao sair do escuro do túnel. Uma descrição mais ou menos assim observava a capa pós-título do Chacarita de 1969. Não pude concordar mais e com o tempo até adquiri a preço módico o exemplar, mais velho do que minha mãe…
A El Gráfico nasceu como uma revista social. Como uma proto-Playboy, chegou até a ter seções eróticas. Sua primeira capa esportiva foi a terceira. Nada de futebol, e nada de homens: foi pelo campeonato argentino feminino de tênis. O futebol apareceu pela primeira vez na quinta edição, de 26 de julho de 1919, com o mote de um duelo entre as seleções da Argentina e do Uruguai. Clique aqui para ver a capa inteira; a escalação argentina ainda refletia alguma herança do pioneirismo da comunidade britânica no país: há os irmãos Harry e Ennis Hayes, ainda hoje os maiores artilheiros do Rosario Central, além de um A. Cilley.
Só três anos depois, em julho de 1922, porém, um jogador de futebol seria o personagem único da capa. Foi o goleiro Américo Tesorieri, do Boca. Até então, canoagem, tênis e rúgbi tinham igual espaço na página principal. Mas os anos 20 viriam com a primeira geração dourada do futebol argentino, trazendo cada vez mais multidões aos estádios, conforme apontado pelo historiador Esteban Bekerman (um dos contatos que viraram amigos pessoais nessa trajetória). A revista então virou exclusivamente esportiva e com foco primordial no futebol.
Vamos às capas (subjetivamente) escolhidas, em ordem cronológica. A escolha maciça por edições anteriores aos anos 70 não foi casual; as capas foram mais “limpas” até essa época, com os anos 70 aos 90 concentrando chamadas com letreiros pouco harmoniosos. Também não foram levadas em conta as capas com personagens brasileiros, às quais dedicamos este Especial de ontem.
A plasticidade de lances de rúgbi, esporte bretão bastante popular na Argentina, em duas edições do início dos anos 20. Na terceira, o olhar forte de dois veteranos símbolos dos primórdios da seleção argentina, ainda dominada pela comunidade britânica: os primos Juan e Jorge Brown, que na ocasião tiraram do armário as camisas do extinto futebol do Alumni (o bicho-papão dos anos 1900, até hoje só superado em títulos exatamente pelos “cinco grandes”) para uma demonstração.
Uma capa de futebol feminino, nos anos 20! Foi antes da modalidade, que enchia estádios britânicos, se atrofiar por conta do retorno dos campeonatos masculinos com o regresso dos soldados (em tempos de alistamento compulsório) da Primeira Guerra. Ao meio, a plasticidade de Alberto Helman, em capa que prestigiava um jogador do discriminado futebol do interior (Santiago del Estero). Ele conseguiu ser convocado às Olimpíadas de 1928, mas não foi usado.
À direita, um demonstrativo de um futebol já combativo ainda nos anos 20, entre um River quando o River tinha como camisa principal a tricolor listrada (hoje tradicional camisa reserva) e um Sportivo Barracas quando o clube (atrofiado no profissionalismo e hoje na quarta divisão) ainda era potência, capaz de vencer o Barcelona na Espanha naquela época.
A disputa de um já ferrenho clássico de La Plata em 1931, quando o Estudiantes teve um ataque assombroso mas sentiu falta dos pontos perdidos contra o Gimnasia. Gimnasia que ao meio aparece saindo do túnel na campanha marcante de 1933 – o jogador do meio, semi-encoberto, é José Echevarrieta, dono da melhor média de gols da história do Palmeiras e estrangeiro com mais gols no Verdão. Quem segura a bola é José Minella, nome do estádio de sua Mar del Plata natal sede da Copa 1978.
À direita, uma capa de Boca e River. O jogador millonario é Bernabé Ferreyra, por vinte anos uma contratação recorde mundial, comprado por valor superior ao dobro do recorde anterior – o que só seria repetido em 2017, com a ida de Neymar ao PSG. Bernabé justificou com mais de um gol por jogo pelo River e três títulos, popularizando nacionalmente um time que até então tinha uma única conquista na elite. A capa, de 1932, está aqui na verdade por um detalhe: talvez a legenda seja imperceptível, mas afirma que Boca e River fariam o Clásico de La Boca. Ou seja, uma rivalidade reconhecida, mas ainda local (pois o River também surgiu no bairro de La Boca e lá ficou até nove anos antes), sem receber ainda o apelido de Superclásico.
Quando Boca x River ainda não era o Superclásico, quem melhor competia no início dos anos 30 em expressão talvez fosse o de La Plata, com Gimnasia e Estudiantes frequentando o pódio reiteradamente entre 1929 e 1933. Essa capa da época reúne exatamente os maiores artilheiros da dupla. O alviazul Arturo Naón ainda é dono da marca e jogaria no Flamengo. O alvirrubro Alberto Zozaya (também artilheiro do primeiro campeonato argentino profissional) seria ultrapassado, mas ainda é o segundo maior.
Ao meio, um cabeceio plástico de Roberto Basílico, do sumido Atlanta. E à direita, a pessoa que mais defendeu em campo a camisa do Boca. Não era do futebol. E nem um homem. Era a capitã Beatriz Marichalar, de duas décadas no basquete xeneize.
Mais plasticidade. À esquerda, José Manuel Moreno, descrito como o maior jogador argentino na primeira metade do século XX, dono de um recorde de títulos nacionais em países diferentes em um tempo não-globalizado. Ao meio, Carlos Peucelle em uma capa que não era qualquer: publicada ao fim de 1941, era o tributo à aposentadoria anunciada na época do jogador, um dos criadores de La Máquina do River, que, ao compra-lo em 1931 (Peucelle havia marcado gol na final da Copa de 1930), recebeu o apelido de Millonario.
À direita, a imagem mais conhecida do maior artilheiro do futebol argentino, o paraguaio Arsenio Erico, do Independiente.
À esquerda, o miolo do celebrado ataque La Máquina, com o mencionado Moreno, Adolfo Pedernera (com quem rivaliza como maior jogador da época; Di Stéfano preferia Pedernera) e Ángel Labruna, em capa de 1942 na época em que o apelido do ataque surgiu.
Ao meio, Vicente de la Mata, o maior jogador do Independiente na primeira metade do século XX, em 1945 – quando era a estrela solitária do time. E um Di Stéfano plástico em 1947, ano em que se firmou no River.
Nova capa plástica de Moreno, esta em 1947, mesmo fator para esta rara capa de um jogador do Tigre. À direita, Mario Boyé, ídolo no Racing. Uma espécie de Rivellino argentino, havia marcado poucos gols em 1951 em relação aos anos anteriores, mas fez o único da final argentina. Final que assegurou ao time de Avellaneda o inédito tri seguido no profissionalismo. É a capa do título.
À primeira vista, uma foto simples de cinco atacantes da seleção argentina. Mas os cinco são de um mesmo clube, algo inédito. Eram do Independiente (Carlos Cecconato, Rodolfo Micheli, Carlos Lacasia, Osvaldo Cruz, campeão brasileiro de 1960 no Palmeiras, e Ernesto Grillo, vice com gol na final de 1958 da Liga dos Campeões pelo Milan) e na ocasião fizeram a Argentina vencer pela primeira vez a Inglaterra, e quando os ingleses eram visto informalmente como os senhores do futebol – é de 1953.
Ao meio, um jovem José Sanfilippo saindo do túnel com um colega. O temperamental atacante viraria o maior artilheiro do clube e jogaria no Brasil por Bangu e, com destaque, no Bahia. À esquerda, uma bela capa de um disputado clássico de Avellaneda. O jogador do Independiente é Grillo.
Plasticidade em uma capa de rúgbi por um duelo entre as seleções de França e Argentina e em um encontro auriazul entre Boca e Rosario Central sem a FIFA para atrapalhar no uso dos uniformes principais. À direita, edição de 1956 relembrando proporcionando uma imagem colorida da final da Copa do Mundo de 1930.
A última capa do Platense na revista El Gráfico é de 1956. Hoje conhecido como um raro clube marrom no mundo e que revelou David Trezeguet, na época o time ainda era o único pequeno ainda não rebaixado. O jogador é Jorge Maldonado, que depois seria o capitão do primeiro título argentino na Libertadores, pelo Independiente de 1964.
Ao meio, sai do túnel Juan José Pizzuti, técnico do primeiro título mundial do futebol argentino, no Racing de 1967. O feito ofusca o notável jogador racinguista que fora nos anos 50, sendo ainda o segundo maior artilheiro profissional da Academia. Na soma jogador e técnico, não há pessoa como ele no clube. À direita, um River x San Lorenzo, mas no basquete.
A vibração de Di Stéfano no Real Madrid bem captada. Ao meio, uma capa do fim dos anos 50, mas “retroativa” aos anos 30, de outra vibração de gol, de José Manuel Moreno contra o Racing. À direita, nova capa retroativa, dos anos 60. Nela aparece Ernesto Grillo e a lembrança do seu gol naquela mencionada vitória contra a Inglaterra em 1953.
À esquerda, Eliseo Mouriño, participante da Copa do Mundo de 1958, em poética capa que passa despercebida a quem desconhece que foi publicada imediatamente após a sua morte em acidente aéreo, a matar ele e todos os colegas do time chileno Green Cross em 1961. Uma saída de túnel do Huracán. E uma de Bobby Charlton perto da Copa do Mundo de 1962 – este que vos escreve carregou essa imagem no Wikipédia em 2011 e ela foi eleita a melhor a representar o craque, que elogiou a imagem em 2012.
Uma capa de 1962 que parece mostrar um jogador do River daquela época, certo? Mas na verdade a foto é dos anos 40 e mostra Antonio Báez. Era um talentoso reserva em La Máquina que viria a ser melhor reconhecido no Millonarios de Di Stéfano. Essa foi a última edição supervisionada pelo radical Dante Panzeri, já de aviso prévio de demissão, e em misto de trollagem com os empregadores e em homenagem ao craque, quis fazer “justiça a um esquecido” (legenda da capa), pois Báez, apesar de reconhecido, jamais havia sido capa da revista.
Ao meio e à direita, festa nos vestiários do Independiente. Ao meio, pelo título argentino de 1963, que lhe deu vaga à vitoriosa Libertadores de 1964. Após o título continental, a revista não publicou uma imagem da partida do Peñarol e sim da comemoração interna no Maracanã após a vitória sobre o Santos de Pelé na semifinal. Foi a primeira capa em duas páginas (aqui aparece só a metade). Clique aqui para vê-la por inteiro.
A da esquerda celebra o retorno aos gramados, e com braçadeira de capitão, do ídolo sanlorencista Victorio Casa, que 45 dias antes havia perdido o braço em uma imprudência de um vigia da marinha argentina (“bom dia à vida. Ninguém fez tanto por tantos. Amanhã é hoje”, celebra a legenda). Casa e a ausência de seu braço também podem ser identificados na capa da outra ponta, sendo o jogador do San Lorenzo mais à direita, que vê o colega Narciso Doval (ele mesmo, o ídolo de Flamengo e Fluminense, ainda de cabelos curtos) marcar o gol da vitória sobre o Boca na Bombonera. O Boca seria o campeão e aquela foi a única derrota que sofreu em casa na campanha.
Entre as duas capas, uma de rúgbi mostrando o calor dos jogadores após um scrum. Celebrava o feito da seleção argentina, que em excursão à África do Sul ganhou pela primeira vez da seleção B local. Nessa excursão e com essa vitória nasceu o apelido Los Pumas.
À esquerda e à direita, belas imagens de dois clássicos. A da esquerda registra pela primeira vez a rivalidade Huracán x San Lorenzo em ação (o dérbi havia sido capa antes, mas em fotos posadas). Na da direita, um Racing x Independiente em um auge conjunto dos dois lados, no fim dos anos 60, últimos anos de equilíbrio em Avellaneda. Ao meio, as lágrimas de emoção de Alfio Basile e Juan Carlos Cárdenas no primeiro título mundial do futebol argentino, do Racing. Basile está de paletó pois foi expulso no início da partida. Cárdenas, por sua vez, fez o gol do título.
À esquerda, a capa favorita do escritor, a simbolizar o único título do Chacarita na primeira divisão, em 1969. Ao meio, o grito de Héctor Yazalde ao marcar no fim o gol da vitória de virada do Independiente no clássico com o Racing. O gol valeu bem mais, pois o triunfo na última rodada deu o título nacional ao Rojo. Yazalde depois seria o primeiro argentino chuteira de ouro na Europa (pelo Sporting Lisboa!). O outro único argentino a consegui-la foi Lionel Messi. À direita, Los Pumas se preparam para mais uma batalha.
À esquerda, a vibração de Antonio García Ameijenda capta bem o San Lorenzo histórico de 1972, primeiro time a ganhar no mesmo ano os dois principais campeonatos (na época, Metropolitano e Nacional). Ao meio, o Superclásico com um lance plástico de um jogador tosco: Carlos Morete, espécie de Martín Palermo do River e um dos maiores carrascos do Boca.
Se nos anos 70 o Independiente cansou-se de vencer Libertadores (quatro seguidas), a capa que melhor ilustra a dominância é a do título de 1974, com o xerife uruguaio Ricardo Pavoni. Desde 1965 no time, participando já ali de outro título na competição, ele e a taça são legendados como “dois velhos amigos” na capa.
O êxtase de um título inédito (e ainda único) no profissionalismo para o Quilmes foi vibrantemente captado à esquerda, nessa de 1978. Duas de 1981, com uma produção em torno dos reforços boquenses Miguel Ángel Brindisi e Marcelo Trobbiani. Brindisi faria só um gol a menos que Maradona na campanha que de fato rendeu título. Maradona chegou logo depois e em reação o River buscou o único argentino na época equiparável em frisson, Mario Kempes (capa da direita).
Ao meio, o modesto Ferro Carril Oeste campeão argentino pela segunda e última vez, após aplicar 3-0 em pleno Monumental sobre o River em meia hora de final mata-mata, superando contundentemente as reiteradas críticas de jogar de modo chato e pouco vistoso.
As outras são de rúgbi e ambas retratam o abertura Hugo Porta, o maior jogador argentino neste esporte. Na da esquerda, ele conduz a entrada da seleção da América do Sul (os Jaguares) que, composta inteiramente por argentinos, venceu a seleção principal da África do Sul, triunfo extra-oficialmente visto como primeira vitória hermana sobre os Springboks. O logo da El Gráfico aparece nas cores da bandeira, em plenos dias nacionalistas de Guerra das Malvinas. Porta fez todos os pontos sul-americanos na vitória por 21-12. Só em 2015 os argentinos viriam a conseguir a primeira vitória oficial como Pumas sobre os Boks.
Na da direita, Porta personifica outro resultado inédito: a única vez em que a Argentina não foi derrotada pela potência-mor Nova Zelândia, em empate de 16-16 em 1985. Porta fez novamente todos os pontos. Seria eleito o melhor jogador do mundo pela imprensa especializada, antes da existência do prêmio oficial da federação internacional. É o único sul-americano a conseguir. Saiba mais.
Um gol de bicicleta já é belo por si só. Imagine que ele dá a vitória ao seu time. Que ela veio nos acréscimos do segundo tempo. E que até dez minutos antes seu time perdia por 4-2! Foi esse o roteiro cinematográfico que nenhuma produção nunca conseguiria fazer parecer verossímil que Francescoli, autor de três gols no triunfo de 5-4 em amistoso com a seleção polonesa (bem forte na época), protagonizou hollywoodianamente no início de 1986 sobre os “malvados comunistas”. Contamos aqui.
A do meio também é de 1986 e celebra o jogo de número 500 da carreira do maior ídolo e campeão do Independiente, o meia Ricardo Bochini, dono de cinco Libertadores e dos dois Mundiais do time. “Bochini, tão grande como o futebol”, diz ela sobre El Bocha, que também venceu naquele ano a Copa do Mundo. À direita, ele, promovido em 1972, ainda letal em 1990.
Muitos abraços ainda que adiante nenhuma dessas equipes, devido a pênaltis, tenha conseguido o que queria. A Argentina de Maradona e Goycochea celebra a classificação contra a Iugoslávia na Copa de 1990 uma semana antes de Andreas Brehme converter o penal que daria a taça aos alemães. Em 1991, o Boca, havia dez anos em jejum nacional, embala na dupla formada por Diego Latorre e o jovem Gabriel Batistuta, o que se volta contra o time: eles são convocados pela seleção à Copa América justamente no período em que as duas finais contra o Newell’s serão realizadas.
O oponente, treinado pelo iniciante Marcelo Bielsa, levaria a melhor na decisão por pênaltis, em plena Bombonera. A capa da direita não retrata essa façanha e sim o bom momento mantido em 1992. “O país fala do Newell’s”, diz a capa sobre a boa campanha do time do então zagueiro Eduardo Berizzo (o jogador mais à esquerda) na Libertadores, onde os leprosos chegaram na final. Onde caíram nos pênaltis para o São Paulo. Berizzo, aliás, fez de pênalti o gol da vitória leprosa no jogo de ida, mas perdeu (junto com Fernando Gamboa) a sua cobrança na decisão de penais na volta.
A emotiva capa de tributo póstumo ao pugilista Carlos Monzón, espécie de Mike Tyson argentino pelos títulos mundiais e currículo prisional. Ao meio, escolheram retratar Héctor Veira como símbolo do San Lorenzo campeão da elite após 21 anos. Veira (que jogou no Corinthians) havia brilhado como camisa 10 do clube nos anos 60, mas era displicente e já estava fora de forma e na reserva na única vez em que fora campeão como jogador. E chegara a depois jogar e se dizer torcedor do rival Huracán. Voltava à velha casa para superar também uma estadia na cadeia, condenado por estuprar um garoto – acusação da qual sempre se declarou inocente. No ano do centenário do time, em 2008, foi votado o maior ídolo da história.
À direita, o técnico Passarella com Batistuta e Caniggia sorridentes na seleção em 1996. Isso mesmo! Desmistifica um pouco a implicância do treinador com Caniggia, que, em grande fase pelo Boca, não deixou de ser chamado. Meses depois, Cani veria a mãe se suicidar e o trauma o fez tirar um ano sabático, responsável maior por afasta-lo da Copa de 1998 do que os cabelos compridos. Pois Bati foi à França com os fios longos (ainda que aparados em comparação à cabeleira exibida em 1994). A legenda “a história jamais contada” acaba caindo bem.
Caniggia não foi o único jogador do Boca a tirar a temporada 1996-97 como sabática. Maradona fez o mesmo, para se tratar das drogas. A capa da esquerda celebra seu promissor retorno em julho de 1997, com direito a gol de falta na reestreia. Mas logo se desconsola: “por que, Deus?”, pergunta após o astro ser pego novamente no exame antidoping, logo após a primeira rodada do Apertura. Melhor para o River, campeão por um ponto para os festejos em pirueta de Santiago Solari.
“Se acha Deus?”, indaga a revista em rara capa com um árbitro, em 1998. Trata-se de Javier Castrilli, polêmico também na terra natal e não só com os torcedores da Portuguesa. No fim da década, Boca e River voltaram a lutar entre si pelos títulos, rotina que não se via com frequência desde os anos 60. “O clássico vive na rua”, diz a da direita. Nelas aparecem o adolescente Saviola, Schelotto (na do meio), Schelotto novamente, Cagna, Juan Pablo Ángel e Gallardo (na da direita).
Na quarta Copa do Mundo de rúgbi, em 1999, a Argentina enfim avança da primeira fase e o capitão Agustín Pichot estampa a capa com um Maradona a vestir a camisa dos Pumas. Ao meio, a contínua festança noventista do River ilustrada por Aimar, Berizzo, Saviola e Coudet (caído). À direita, uma pose de matador de Gabriel Batistuta, então no auge pela Roma.
Três capas sobre a campanha redentora do Racing em 2001, campeão argentino após 35 anos. As duas primeiras, com a euforia incontínua da incomum série de vitórias tornando o título mais perto. Na última, “o povo parou tudo” em meio aos violentos protestos contra os desmandos econômicos do governo. A crise paralisou o campeonato, mas o time pôde festejar em 27 de dezembro.
Cambiasso festeja seu gol em uma rara vitória elástica do River na Bombonera: 3-0 em 2002, após oito anos sem vencer o rival na casa dele, ainda que o lance mais recordado seja o “da vaselina de Ricardo Rojas”. Mas a capa também é histórica por ser a última da El Gráfico semanal. A revista não passou incólume à crise de 2001 e, após um mês sem ir às bancas, retornaria em periodicidade mensal, mantida até o encerramento em janeiro de 2018.
Ao meio, uma bela capa com o Racing bem de vida após a primeira fase da Libertadores de 2003 (ano do centenário racinguista), onde o time do trio retratado Adrián Bastía, Diego Milito e Mariano González foi invicto. À direita, uma que com Batistuta aparentemente comum. Mas ali no canto a chamada “o craque desconhecido” refere-se à primeira reportagem na grande imprensa argentina sobre Lionel Messi. Ela saiu ainda em agosto de 2003. A nota serviu para a AFA adiante descobrir o juvenil do Barcelona, se encantar e providenciar de imediato uma partida para impedir que ele fosse desperdiçado para a seleção espanhola.
Em julho de 2003, corintianos e santistas estavam de cabeça quente com as revelações D’Alessandro e Tévez, retratados naquele mês. Ao meio, uma bela pose de Ginóbili, o maior jogador argentino de basquete. E Simeone em pose de craque no fim da carreira, quando desejou jogar pelo Racing, time do coração.
Futebol-champanhe, elogia a revista sobre a elegância de Fernando Gago quando ele ainda parecia ser o novo Fernando Redondo, em 2006. Ao meio, uma bela pose de Mauro Boselli no embalo da participação quase vitoriosa do Estudiantes no Mundial de Clubes de 2009.
E, por que não?, uma capa desenhada, na bela ilustração a misturar Aragorn (o ator Viggo Mortensen era o torcedor do San Lorenzo mais ilustre antes de Jorge Bergoglio virar o Papa Francisco), Romagnoli, o Papa e outros ícones azulgranas. Detalhe: essa capa é de 2013 e de início foi pé-fria, pois em seguida o time perdeu a Copa Argentina para o Arsenal. Mas dali virou profética, com o título dramático no Torneio Inicial ainda naquele ano e com a inédita Libertadores em 2014.
A El Gráfico antes da Copa de 2014 restaurou fotografia antiga do técnico Sabella ainda como jogador da seleção. Ficou uma bela capa relembrando a carreira de um camisa 10 talentoso que não teve o sucesso merecido como jogador da Albiceleste. Ao meio, o desgosto bem retratado pela terceira final perdida em anos seguidos, após a Copa América Centenário. Por fim, a celebração da seleção de tênis campeã pela primeira vez da Copa Davis, coroando o ano iluminado do reerguido vice olímpico Juan Martín del Potro.
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Excelente ,muito bom.........e nós agora até sem Placar.....que coleciono desde 1975............você expressou tudo:quem via as reportagens de "futebol" na imprensa passada e lê hoje,fica um vazio abissal;podem falar que é saudosismo,mas você,Caio,conteporâneo de meu primoênito,experimentou esta decepção ,principalmente com PLACAR,que coleciono com saudades das antigas edições