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All Boys na seleção

Ahumada no All Boys

Apenas cinco jogadores do Club Atlético All Boys foram utilizados pela Seleção Argentina na história em jogos oficiais, e oito no geral. O mais recente, no último Superclássico das Américas: ao substituir ontem o volante Francisco Cerro aos 42 minutos do segundo tempo do jogo contra o Brasil na Bombonera – e, assim, estrear aos 30 anos de idade pela seleção -, o também volante Óscar Ahumada, ex-River (onde será sempre recordado negativamente como aquele que declarou que o Monumental sofre de “silêncio atroz”, na eliminação vexatória para o San Lorenzo na Libertadores de 2008…), também fez um pouco de história.

O clube do bairro portenho da Floresta tem pouca expressão mesmo comparado com outros clubes menores da Grande Buenos Aires – não ajuda ter como principais rivais o Nueva Chicago, com frequência maior na primeira divisão desde os anos 80, e, sobretudo, o Argentinos Jrs; inclusive, seu torcedor mais ilustre, o ex-volante Sergio Batista (titular da seleção nas Copas de 1986 e 1990), até defendeu-o em fim de carreira, mas não só também defendeu exatamente os dois rivais também como foi melhor avaliado neles do que em “casa”.

Ainda que pertencendo à elite desde 2010, após um improvável triunfo sobre o Rosario Central nos play-offs de acesso (após empate na capital federal, impôs um 3-0 em pleno Gigante de Arroyito), o All Boys ainda é mais famoso no exterior por ter sido o primeiro time de Carlitos Tévez, que esteve nos juvenis do Albo quando ainda usava o sobrenome materno Martínez.

A relativa atrofia se deve ao fato de o Albo (trocadilho entre a cor branca e o próprio nome All Boys) ter sido um dos clubes que, inicialmente, permaneceram no campeonato argentino amador após 1931 – ano em que as principais equipes, aderentes do profissionalismo, se desvincularam da associação argentina (ainda amadora, na época) para organizar um campeonato próprio. A permanência no associação amadora não se deveu exatamente por idealismo, pois já nos anos 20 sabia-se que todos praticavam algum nível de profissionalismo tolerado a vista grossa; o que houve é que a própria liga profissional só aceitava os clubes que fossem financeiramente rentáveis em bilheteria.

Dos times desprezados naquele momento pelos profissionais, somente o Banfield conseguiria se tornar membro assíduo. Almagro, Sportivo Barracas, Defensores de Belgrano e o próprio Nueva Chicago, assim como o All Boys, acabariam se acostumando com o patamar da segunda divisão ou abaixo quando as duas ligas se reunificaram, já em 1935 – mas, até lá, enquanto a associação argentina não se rendia à liga profissional, deu-se a brecha para que diversos times pequenos tomassem as convocações da seleção. Muitas vezes, emplacaram seus primeiros ou mesmo únicos jogadores nela até hoje.

À esquerda, All Boys de 1931: Baglietto é o primeiro em pé, Patrignani o goleiro e Irurieta, o terceiro agachado. À direita, figurinha de Medina

Em 1932, ano em que os alvinegros terminariam na quarta colocação do certame amador, alguns de seus jogadores foram aproveitados pela Argentina. Foram em dois jogos contra o Uruguai, em Montevidéu, nos dias 15 e 18 de maio, que serviram para reatar as relações argentina e uruguaia no futebol, rompidas por conta dos incidentes da final do mundial de 1930. Como os organizadores eram os comitês olímpicos de cada país, pois o Uruguai igualmente vivia um racha inicial com gigantes aderentes ao profissionalismo e nanicos desprezados, apenas amadores foram chamados.

Três dos cinco blanquinegros na Albiceleste jogaram pela Argentina naquelas partidas, uma vitória por 2-0 e uma derrota por 1-0: o goleiro Atilio Patrignani, o centromédio Aquiles Baglietto e o centroavante Juan Carlos Irurieta. Só este já havia defendido a seleção, como jogador do Estudiantes de La Plata em uma partida em 1923 (foi um dos principais pincharratas na era amadora) e em dois jogos da campanha vitoriosa na Copa América de 1925, quando pertencia ao Argentino de Quilmes. Naquele 1932, foi artilheiro do campeonato amador, com 23 gols. Ainda houve um amistoso não-oficial no feriado de 25 de maio, contra o Atlético Tucumán, vencido em casa por 1-0. Irurieta era o único albo na ocasião.

Patrignani, pouco após o jogo, foi jogar na liga profissional, pelo Ferro Carril Oeste, destacando-se como um arqueiro seguro e correto. Também apaixonado por automobilismo, competiu por 25 anos na Turismo Carretera, categoria mais popular deste esporte na Argentina – seu primeiro grande prêmio, em 1938, foi igualmente o primeiro de um jovem Juan Manuel Fangio.

Em 15 de abril de 1933, a seleção argentina oficial, ainda representada só por amadores, enfrentou o Flamengo no estádio do Sportivo Barracas e ganhou por 2-0. Os representantes do bairro da Floresta em campo eram o meia-esquerda Francisco Sponda e o ponta-esquerda Salvador D’Alessandro, sem parentesco com o craque colorado.

Tal como Patrignani, eles logo rumaram aos profissionais do Ferro. D’Alessandro, inclusive, viria depois ao Rio de Janeiro, sendo figura de destaque no título carioca de 1934 do Vasco, ainda que logo fosse repatriado em 1935 pelo Argentinos Jrs. Em 1934, nos dias 18 e 19 de março, a seleção visitou Córdoba, empatando em 0-0 com o Talleres e em 3-3 com o Argentino Peñarol. Em ambos os jogos figurou o ponta-esquerda Plinio Giribaldi, que na liga profissional defenderia Atlanta e Racing. E então vieram as longas décadas do All Boys como um time de segunda divisão da liga profissional, após a reunificação em 1935.

Osvaldo Pérez, último antecessor de Ahumada – à direita, com um Maradona estreante na seleção

O alvinegro seguinte seria justamente um dos pouquíssimos jogadores que a seleção usou de uma equipe de segunda divisão. Tal como Ahumada, ele também entrou no decorrer de um jogo contra o Brasil: foi o veloz ponta-esquerda Luis Medina, que em sua única aparição participou dos últimos 16 minutos de um 0-0 amistoso em 1965, em substituição a Mario Chaldú, do Banfield (e futuro ídolo no San Lorenzo). Medina só jogaria a primeira divisão por Huracán, Colón, Platense e até no Los Andes, pois o All Boys seria equipe ausente da elite até 1973. Veio então sua maior frequência nela, até o rebaixamento em 1980.

Depois de Medina e antes de Ahumada, somente um Albinegro foi convocado pela Argentina: Osvaldo Pérez, El Japonés (curioso apelido oriundo do seu pai, que era chamado de El Chino, “O Chinês”, gíria comum no Rio da Prata a quem tenha olhos puxados, normalmente por ancestralidade indígena) famoso como único profissional a jogar nos dois lados das duas mais prestigiadas rivalidades do país: esteve nos dois lados do Superclásico, no River entre 1970-74 e no Boca em 1983; e também nos dois lados do Clásico de Avellaneda, pelo Independiente entre 1977-80 e pelo Racing entre 1981-82. Em meio ao quarteto, esteve do segundo bimestre de 1975 até a maior parte do ano de 1977 no bairro da Floresta.

El Japonés Pérez foi usado pela seleção no início de 1977, em amistosos contra o clube marplatense Aldosivi em 7 de fevereiro (1-0) e contra o Deportivo Roca, time da Patagônia, em 2 de março (2-1). Ele também esteve no banco de reservas na noite histórica que marcou a estreia de Maradona pela seleção, em amistoso contra a Hungria, em 27 de fevereiro daquele mesmo ano – sem chegar a entrar em campo. Não voltou a ser chamado depois daquele período, mas teve vitrine para emplacar no fim do ano sua transferência ao Independiente, a tempo de ser titular do elenco campeão do Torneio Nacional daquele 1977.

Porém, nem sempre Pérez, Sponda, D’Alessandro e Giribaldi são considerados na estatísticas, por suas partidas não terem sido contra outras seleções nacionais. Ahumada vem sendo visto mais frequentemente como o primeiro jogador do Albo na Albiceleste desde Medina mesmo. O que só engrandece o feito do volante.

Atualização em 23-01-2022: nos 70 anos de Osvaldo Pérez, publicamos este Especial sobre a curiosa carreira do ex-Boca, ex-River, ex-Racing e ex-Independiente… que só chegou à seleção como jogador do All Boys.

Superclássico
Ahumada seguindo Ignacio Scocco e Juan Manuel Martínez na comemoração de um dos gols argentinos, ontem

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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