No dia em que Michael Jordan, o principal jogador da história do basquete, completa meio século, dedicaremos um especial ao baloncesto argentino, relacionando-o com o futebol. Afinal, alguns dos principais clubes da bola no pé também escreveram histórias estufando-a não só em redes de traves, mas também de aros. E, se Jordan foi o Pelé das quadras, hoje se equivalem Lionel Messi e Kobe Bryant (fã de futebol: cresceu na Itália vendo Van Basten), que inclusive já estrelaram comercial juntos.
Como no Brasil, para nossos vizinhos o básquet é dos esportes coletivos mais populares depois do fútbol. Tanto que alguns dos mais célebres futebolistas argentinos, antes de profissionalizarem-se, chegaram a dar arremessos em vez de chutes: Ángel Labruna, o ex-vascaíno Edgardo Andrada, Osvaldo Ardiles, Gabriel Batistuta, Rodrigo Palacio (nativo de uma das capitais argentinas da bola laranja, a cidade de Bahía Blanca, que também pariu o astro Manu Ginóbili) e Esteban Cambiasso foram alguns que tiveram de decidir entre os dois esportes.
Algo parecido se dera com o gigante goleiro José Soriano ainda em sua pátria peruana natal antes de virar ídolo no River. Quem não pôde decidir foi um xodó no San Lorenzo e no Boca pela raça até desmedida, o ex-volante Blas Giunta, pois só largou à força os aros: ainda juvenil, pegara suspensão de simplesmente 99 anos após agredir um árbitro e então focou-se só no futebol…
Cambiasso, o jogador argentino mais vezes campeão no futebol (23 títulos oficiais), ironicamente sequer imaginava-se nele: cresceu no Gimnasia y Esgrima de Villa del Parque, tradicional clube de basquete ligado a sua família. Em longa entrevista dada em 2011 à El Gráfico, relembrou: “eu não queria saber nada com o futebol, gostava de basquete e me saía bem no Gimnasia (…), mas Ramón [Maddoni, seu técnico no Argentinos Juniors] me via correr e dizia que eu tinha pinta de jogador de futebol”. Daí, começou a praticar futsal no Parque, clube vizinho do GEVP – ambos são do bairro portenho de Villa del Parque, ao lado do bairro do Argentinos, o de La Paternal.
Os pais acreditavam que o ambiente das quadras era “mais saudável” que o dos gramados, mas El Chuchu acabou escolhendo este último cenário: “eu tinha uma paixão enorme por basquete, começava a ver a NBA com Jordan, também a Liga Nacional, mas ao arrancar nas inferiores do Argentinos tive que me decidir porque jogávamos domingo de manhã, no mesmo horário do basquete”, explicou ele, que ainda jurou: “posso te dizer que, quando saí, jogava melhor o basquete do que o futebol. Os que me viam jogar basquete me aconselhavam a não deixa-lo”.
Quem teve uma indecisão mais larga foi Raúl Madero. No basquete, chegou a ser campeão argentino juvenil com o Racing. Dotado de talento no piano, também não descartava uma carreira musical. Acabou optando já aos 17 anos por tentar o futebol, mas sem descartar uma formação em… medicina. Virou o único campeão do mundo como jogador e como médico: era lateral no Estudiantes campeão de tudo entre 1967 e 1968, incluindo volta olímpica em pleno Old Trafford sobre o Manchester United. Madero pendurou as chuteiras cedo, como campeão da Libertadores em 1969, exatamente para focar-se de vez na medicina, ao contrário de um de seus colegas igualmente formado na área, o então volante Carlos Bilardo.
El Narigón Bilardo seguiu no futebol para virar treinador. Assumiu a seleção em 1983 e prontamente levou El Doctor Madero consigo para ser o médico da Albiceleste nas Copas de 1986 e 1990. Curiosamente, outro na comissão técnica bilardista era mais um integrante daquele Estudiantes dos anos 60, o também ex-volante Carlos Pachamé, convertido em assistente técnico enquanto era também treinador das seleções juvenis e olímpica. Pacha teve seu destaque juvenil no basquete registrado em seu perfil no livro Quién es Quién en la Selección Argentina, a apontar que ele fora outro que precisou cedo decidir entre qual esporte focaria, na época em que entrava no sub-19 do Estudiantes.
Outros até puderam jogar os dois esportes em competições adultas, casos de dois ex-goleiros do Independiente, um dos primeiros clubes a adotar a criação de James Naismith: Pedro Isusi, integrante dos primeiros títulos argentinos do Rojo, em 1922 e 1926, também esteve no quadro pentacampeão invicto de basquete entre 1927 e 1931 do clube de Avellaneda; e Fernando Bello, também bicampeão no futebol (1938 e 1939), jogou basquete pelo Argentino de Pergamino, sua cidade-natal. Curiosamente, chegaram a participar de um mesmo campeonato argentino de seleções regionais, em 1928: Isusi pelo time da Província, que na verdade albergava as cidades da região metropolitana de Buenos Aires (a capital federal, por sua vez, tinha equipe própria) e terminou campeã, e Bello pela da federação do norte da própria província de Buenos Aires – combinado que juntava jogadores de Pergamino, Junín e San Nicolás.
Além do ouro olímpico em 2004, obtido em inapelável 89-64 na Itália no mesmo dia em que Tévez & cia venciam o Paraguai na final de futebol, os melhores resultados da seleção foram o título na primeira Copa do Mundo, a de 1950, sediada em Buenos Aires – dentre os campeões, jogadores de Rosario Central (Hugo Del Vecchio), Racing (Leopoldo Contarbio), River Plate (Vito Liva e Alberto López) e Sportivo Barracas (Juan Carlos Uder). O capitão, Ricardo González, membro do hall da fama da FIBA, jogava no Palermo, clube que participava dos campeonatos de futebol na época amadora (venceu a segundona de 1921) e ainda ativo como clube social, tendo contado no futsal com o jovem Higuaín; e o vice na Copa de 2002, perdida na prorrogação para a maior campeã, a penta Iugoslávia.
Os tradicionais EUA foram batidos nas três referidas campanhas: em 1950, por 64-50, na final (em visita dos Harlem Globetrotters em 1952, seu astro Marques Haynes disse que os argentinos eram os jogadores mais capazes física e tecnicamente que viu fora dos EUA); na primeira fase de 2002, em plena Indianápolis, por 87-80, na primeira vez que uma seleção local só com atletas da NBA perdeu; em Atenas, Allen Iverson, LeBron James e Dwyane Wade caíram nas semis por 89-81. Estas duas últimas vitórias pertenceram à chamada geração dourada do técnico Rubén Magnano (hoje, treinador do Brasil), com alguns integrantes também surgindo de clubes ligados ao futebol.
O basquete, recentemente, completou um século de presença oficial no país: foi trazido de Pittsburgh em 1912 junto com o vôlei (que não se popularizou tanto) pelo estadunidense Philip Paul Phillips, que ensinou ambos na Associação Cristã de Jovens de Buenos Aires. Vinte anos depois, a Argentina seria a única nação sul-americana fundadora da FIBA. Pouco antes, em 1930, o Boca Juniors já registrava uma equipe juvenil sua na Confederação Argentina de Basketball, fundada no ano anterior. É dessa época que atuou a pessoa que por mais tempo jogou pelo clube, Beatriz Marichalar: foram duas décadas de serviços pelo basquete feminino xeneize.
O Boca sempre teve seus títulos no básquet, mas só a partir dos anos 90, a partir da presidência do polêmico Mauricio Macri, foi que chegaram às conquistas na Liga Nacional (1997, após mais de vinte anos sem troféus oficiais, 2004 e 2007), implantada em 1985. Entre 2002 e 2006, ainda emendaram um penta seguido na Copa da Argentina. No mesmo período, entre 2004 e 2006, foram tri sul-americanos seguidos, sendo vices em 2007.
Martín Leiva foi o mais notável participante do grande ciclo boquense do início deste século, integrando a Argentina quarta colocada nas Olimpíadas de 2012. No clube, também despontaram o ala-pivô Gabriel Fernández e os armadores Armando Montecchia e Rubén Wolkowyski, os três, dourados em 2004.
O Boca também contou, entre 2007 e 2008, com outro membro da geração dourada, o ala-pivô Leonardo Gutiérrez, maior campeão nacional (nove vezes); e, entre 2000 e 2002, com o maior cestinha da Liga Nacional, Héctor Campana, atual vice-governador da província de Córdoba. Campana também jogou pelo River Plate, pelo qual foi eleito o melhor jogador da Liga em 1989 e 1990. Ele foi hepta nacional, mas nenhuma vez pelos millonarios.
Além dos auriazuis, atualmente apenas o Lanús (clube atual do mencionado Gabriel Fernández), dos clubes de futebol, compete na elite da Liga Nacional; curiosamente, o basquete era o esporte de origem praticado pelo preparador físico do primeiro elenco lanusense campeão da primeira divisão argentina de futebol, no Apertura 2007 – Vasily Bogdanov, natural do Turcomenistão (!). Na mesma cidade, há o Club Social Lanús, que, quando ainda chamava-se Gimnasia y Esgrima, venceu a terceira divisão de futebol de 1929, ficando em 4º lugar na segundona do ano seguinte. Já na atual segundona de basquete, o único clube também dedicado ao futebol é o pequeno Sarmiento de Resistencia, que na AFA está na quarta divisão.
Fora o Boca, outros clubes de futebol chegaram a finais do Sul-Americano de basquete: San Lorenzo (1958), River Plate (1984), Gimnasia y Esgrima La Plata (2003), nenhum deles com sucesso próximo ao do Ferro Carril Oeste. San Lorenzo, River e GELP ficaram no vice, respectivamente para os uruguaios do Defensor, também clube de futebol, os brasileiros do Sírio e os venezuelanos do Delfines de Miranda. O FCO, por sua vez, também tem, como o Boca, três taças e um vice continentais em sua galeria.
Os logros verdolagas vieram nos seus dourados anos 80, época também dos seus dois únicos títulos no futebol de elite. Como explicamos aqui, o time de basquete do Ferro, além de ter torcida organizada própria, inspirava o técnico do próprio elenco futebolista, Carlos Griguol. León Najnudel, o patrono da bola-ao-cesto lá, foi o homem por trás da criação da Liga Nacional. Aliás, Griguol (técnico dos dois títulos) só chegou ao clube por indicação do judeu Najnudel, que o conhecera no Atlanta, clube ligado à comunidade judaica e tradicional na elite de futebol até os anos 70.
Outro dos auxílios de El Rey León a Griguol foi recomendar-lhe o preparador físico Luis Bonini, que chegaria a ser convidado por Marcelo Bielsa quando este chegou ao comando da seleção de futebol. Najnudel foi o técnico do bi sul-americano do Ferro seguido em 1981 e 1982, sobre respectivamente os brasileiros do São José e o compatriota Obras Sanitarias. A terceira taça continental do FCO veio em 1987, sobre os brasileiros do Monte Líbano, que o havia derrotado na final anterior.
Najnudel faleceu em 1998. Sua última obra é também a última glória do hoje decadente básquet do Ferro: foi ele quem, em 1996, lançou Luis Scola, um dos maiores expoentes argentinos do esporte. Presente no ouro olímpico de 2004, o sósia de Loco Abreu é o único argentino cestinha de uma Copa do Mundo, o que ocorreu no mundial de 2010, apesar na queda nas quartas-de-final, para a Lituânia.
Também do clube do bairro de Caballito, saíram o mesmo Gabriel Fernández de Boca e Lanús, o ala-pivô Federico Kammerichs (que passou há pouco pelo Flamengo) e o mesmo Leiva do Boca. Kammerichs, que como Leiva esteve nos Jogos de 2012, foi bronze em 2008. Fora a geração dourada, seu principal jogador é Miguel Cortijo, mais vezes melhor do país (1980, 1981, 1982, 1986 e 1987; só Scola também foi cinco vezes) e eleito o melhor armador da Copa do Mundo de 1986. Também defendeu o Boca.
Outro da geração dourada a passar por um clube ligado ao futebol foi o armador Carlos Delfino, que esteve no Unión de Santa Fe (time campeão do campeonato argentino de básquet de 1943). Torcedor do Tatengue, jogou por ele na temporada 1999-2000. O rival Colón, o Instituto de Córdoba, Platense, Estudiantes de La Plata, Newell’s Old Boys, Olimpo de Bahía Blanca e Deportivo Madryn são outros clubes que chegaram a competir na bola-ao-cesto. Dois dos mais tradicionais da bola laranja, os rivais Peñarol e Quilmes de Mar del Plata, também já buscaram gols. Considerada a quinta força cordobesa, o General Paz Juniors – vice no futebol em 1943 da Copa da República (espécie de Copa Argentina da época) e campeão da terceira divisão em 2000 – teve até um timaço de basquete nacionalmente reconhecido nos anos 60, apelidado de Estrellas Blancas.
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