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11 jogadores para os 110 anos do Estudiantes de La Plata

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“Olhem para cima, busquem uma estrela e ponham-na no peito junto ao escudo do Estudiantes”. Imagem oficial dos 110 anos

1905 foi um marco para o futebol do continente – e, por que não?, mundial. Três dos clubes mais copeiros da história foram fundados há 110 anos, casos do Independiente, do Boca Juniors e do Estudiantes de La Plata, que hoje celebra a nova idade. Trata-se exatamente do trio argentino com mais títulos internacionais. Não sendo considerado sequer grande (não de forma unânime, é bom ressaltar) no próprio país, o “intruso” Pincha já foi o mais vitorioso argentino nas Américas e permaneceu à frente do Boca até a virada do milênio. Mas as glórias não se resumem àquele período de 1967-70.

As origens de um clube tão campeão estão atreladas, por ironia, a um fadado ao sofrimento: o rival Gimnasia y Esgrima, que embora tenha sido fundado em 1887 começou naquele 1905 a buscar gols. O campo onde atuava daria lugar a um campus universitário e assim a dirigência gimnasista optou por fechar o departamento de futebol, que só seria retomado dez anos depois. O grosso do elenco, que naquele ano aplicou a maior goleada já sofrida pelo River Plate em toda a sua história (10-1) não ficou nada satisfeito e decidiu fundar um clube próprio.

Em outra ironia, a maioria daqueles dissidentes era composta exatamente por universitários, razão para a adoção do nome Estudiantes naquela reunião que atravessou a madrugada na sapataria Nueva York. Se reuniram as seguintes pessoas: Jorge Isla, Ricardo Sancet, Antonio Ferreiroa, Alejandro Fernández, Emilio Fernández, Carlos Isla, Jorge Contreras, David Ramsay, Antonio Mouzo, Ismael Schedden, Uberto Vignart, Raúl Salas, Hugo Ferrando, Carlos Sagastume, Horacio Tolosa, Joaquín Sese, Félix Díaz, Alfredo Lartigue e Antonio Moreda, conforme a primeira ata.

Díaz era o dono da sapataria, enquanto Ramsay (goleiro), Moreda, Lartigue (zagueiros) e Tolosa (meia-esquerda) eram sobrenomes de registros das primeiras partidas do Gimnasia. A primeira comissão diretiva foi acertada em 25 de agosto na casa do coronel Miguel Gutiérrez, eleito primeiro presidente ao passo que Moreda ficou de vice enquanto Ramsay, Lartigue e Díaz eram vocais. Mais ironias: a primeira partida, em 22 de outubro, foi justamente contra um Gimnasia y Esgrima, mas o de Chivilcoy. E ela só foi a primeira porque um encontro anterior, marcado para 24 de setembro, foi suspenso por temporal. Teria sido contra o Lobense – o apelido do Gimnasia é Lobo.

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Tamanha era a paixão daqueles dissidentes insatisfeitos com o fechamento do futebol no clube de origem que aquela primeira partida, por eles, não teria se encerrado ao fim dos noventa minutos: perdiam por 2-0, empataram e propuseram que a o jogo prosseguisse depois do tempo regulamentar até que alguém desempatasse. O oponente se negou. Este amor pelo futebol fez com que em menos de um semestre, ao fim daquele ano de 1905, o Estudiantes já contasse com mais de 150 associados. A afiliação à Associação Argentina de Futebol veio logo, em 1906. Inscritos na terceira divisão, os novatos ficaram em terceiro (mais ironia: o campeão foi o Gimnasia y Esgrima de Buenos Aires).

O sócio de número 44 era Jorge Luis Hirschi, emblema pincharrata como poucos: o apelido surgiu da dissecação de ratos praticada por estudantes de medicina, numerosos no clube. Hirschi era um deles e jogou de 1906 a 1915. Seria presidente de 1927 a 1932, quando o número de sócios, permitindo-se também o de mulheres, saltou de 300 para 8 mil, aumento jamais visto em tão pouco tempo em qualquer outra instituição no país. Um campo próprio, ainda sem alambrados, foi delimitado em 1907 na esquina das ruas 1 e 57. Foi a casa do Estudiantes por cem anos, até ser derrubado em 2007. Desde 1970 o Tierra de Campeones se chamava oficialmente Estádio Jorge L. Hirschi.

O uniforme foi adotado por sua vez em 1908, em referência ao grande clube da época, o Alumni, dez vezes campeão entre 1900 e 1911. De início, a camisa era quase toda vermelha, com uma única listra branca vertical, ao centro. 1908 foi também o ano em que o clube passou a participar da segunda divisão (não houve exatamente acesso: as equipes novatas escolhiam jogar na segunda ou terceira) da Associação Argentina de Futebol. As campanhas foram ascendentes, com um terceiro lugar em 1909 e um primeiro empatado com o Racing em 1910. O concorrente levou a melhor no desempate, contudo.

Mas o acesso não escaparia em 1911. Veio sobre outro time de Avellaneda, o Independiente. Se enfrentaram na última rodada e os de La Plata tinham só um ponto a mais. Mas, mesmo fora de casa, não quiseram saber do empate: 3-0, com dois de Ricardo González Bonorino e outro de Oscar Hirschi, irmão de Jorge. Jorge, aliás, foi o vice-artilheiro da campanha campeã, com nove gols. Mas o Independiente também subiu: os platenses, oriundos de dissidência, não se inibiram de em 1912 se desligaram da elite da Associação Argentina para fundarem uma liga própria, a da Federação. Ela chamou para si diversos membros da segundona da Associação, dentre os quais o Rojo de Avellaneda.

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Poletti, Pagnanini (em pé; agachado aparece Juan Ramón Verón) e Brown

Associação e Federação se unificariam em 1915. Em dez anos, o Estudiantes já tinha muita história para se orgulhar: ainda nos tempos de federação, ganhara o campeonato de 1913, rendendo as primeiras convocações à seleção argentina. Foram chamados o fundador Emilio Fernández, Carlos Galup Lanús e Ludovico Pastor. Só os primeiros talentos nacionalmente reconhecidos de uma trajetória inspiradora, com o restante resumida em seus pontos principais pelos eleitos abaixo e pelos numerosos outros Especiais dedicados ao León de La Plata:

GOLEIRO: Carlos Bossio conseguiu defender a seleção enquanto disputava a segundona, em 1994-95, sem se firmar. A Copa de 2014 contou com Mariano Andújar e Agustín Orión, dos últimos títulos, em 2009 e 2010. Mas Alberto Poletti foi bem mais representativo, ainda que para o mal também. Para o bem, foi o arqueiro dos títulos que projetaram o clube para bem além de La Plata: o Metropolitano 1967, a Libertadores e o Mundial 1968. Prosseguiu na Libertadores 1969, sendo fundamental para esfriar o Nacional (na ânsia do primeiro título) em Montevidéu, onde os alvirrubros conseguiram a primeira vitória argentina sobre um uruguaio no Centenário pela Libertadores. Glórias que reluzem mais que a mancha de sua atuação no Mundial 1969, onde desencadeou a confusão generalizada que estigmatizou o time.

LATERAL-DIREITO: Rubén Pagnanini foi mais do que o único alvirrubro do ciclo da Libertadores nos anos 70 (foi titular na última, em 1970) a vencer a Copa do Mundo, em 1978. Foram nove anos de Estudiantes, de 1968 a 1977, participando do primeiro grande momento após aquele ciclo: o vice no torneio nacional de 1975. Saiu para jogar na equipe mais poderosa da época, o Independiente.

ZAGUEIROSJosé Luis Brown era operário como poucos. Foi pilar nos primeiros títulos após a Era 1967-70, o bicampeonato de 1982-83, abrindo inclusive o placar no jogo que garantiu a primeira destas taças. Sua raça foi demonstrada ao mundo na melhor vitrine possível, uma final de Copa onde furou a própria camisa para nela apoiar um polegar quebrado e seguir jogando. Uma final, aliás, onde ele também abriu o placar, para fazer torcedor algum sentir a ausência de Daniel Passarella.

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Madero, Malbernat e Juan Sebastián Verón

Ao lado de Tata Brown, o inconteste Raúl Madero, do tri da Libertadores. Mais técnico, não se limitava a colocar ordem atrás. Fez ou participou de gols essenciais: na duríssima semifinal contra o Platense no Metro 1967, o Estudiantes virou para 4-3 partida que perdia por 3-1 com ele convertendo de pênalti a virada e dando a assistência para o primeiro gol; na final, abriu o placar nos 3-0 sobre o Racing (campeão da Libertadores e do mundo naquele ano) com um petardo de falta; também forneceu os cruzamentos para o gol de Juan Ramón Verón sobre o Manchester United no título mundial em Old Trafford e para o de Flores na segunda final da Libertadores 1969. Autêntico pincharrata, pois parou de jogar com só 29 anos para se focar na medicina. E foi o médico da seleção na Copa de 1986.

LATERAL-ESQUERDO: Oscar Malbernat tinha apenas 24 anos mas era o capitão das horas mais gloriosas do Pincha, o ciclo de 1967-70. Também jogava na outra lateral. El Cacho anulou George Best nos dois jogos do mundial de 1968 (irritado, o norte-irlandês seria expulso no próprio Old Trafford). Com violência? Nada disso. A mídia do Manchester descreveu-o na época como a fine player em meio aos hardestclique aqui e confira.

VOLANTE: Não cabe discussão. Nenhum jogador foi tão preponderante para um elenco campeão do Estudiantes quanto Juan Sebastián Verón, um predestinado: é filho do único com quem concorre a maior craque da história do clube e nasceu em dia de clássico com o Gimnasia (o pai fez gol). Venceu a segunda divisão e recolocou o time do coração entre os temidos nacionalmente e no exterior quando voltou em 2006. O arquirrival há 20 anos era o melhor clube de La Plata, mas murchou com o carrasco. Os alvirrubros foram imediatamente campeões com direito a um 7-0 no clássico, a maior goleada do dérbi; a taça veio mesmo com o invejoso rival perdendo de propósito para o concorrente leonino, o Boca.

Para ser ainda mais de cinema, o Boca foi derrotado de virada em uma final só possível porque perdeu os dois últimos jogos nos quais levaria o título se ao menos empatasse um deles. Claro que não ficou só nisso, com bem sentiram os cruzeirenses na Libertadores 2009. Fez de tudo no setor naquela noite no Mineirão: ninguém roubou tantas bolas naquela noite como La Brujita, que ainda armou as jogadas dos gols do título. Investia salário para aprimorar as instalações pincharratas, abandonou duas vezes a aposentadoria, virou presidente… e até parar de vez, ano passado, só perdeu uma vez o clássico.

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Ferreira, Scopelli e Lauri

MEIAS: Miguel Ángel Russo, Alejandro Sabella e Marcelo Trobbiani compunham o meio refinado do time bi de 1982-83, com um futebol mais bonito segundo críticos que o de 1967-70. Mas Alejandro Scopelli, pela direita, e Manuel Ferreira, pela esquerda, foram muito mais devastadores. Compunham o ataque sensacional Los Profesores, donos de 103 gols em 34 jogos no torneio de 1931 enquanto o campeão Boca marcou só 85. Ferreira, capitão da Argentina na primeira Copa do Mundo, criava as jogadas e as ensaiava nos treinos enquanto Scopelli ia além, fazendo muitos gols (vice-artilheiro do campeonato de 1931. Quando esteve no Racing, fez 44 em 60 jogos) mesmo não sendo centroavante.

Scopelli também foi à primeira Copa do Mundo e deveria ter sido titular nas últimas partidas após lesão de Francisco Varallo, dono da vaga. Varallo era do Gimnasia, recém-campeão argentino (pela única vez) e que motivou diversos torcedores do rival a virem para Montevidéu querendo vê-lo na final. Isto exerceu pressão para que Varallo fosse usado. A rivalidade atrapalhou muito: Scopelli, que ainda defenderia a seleção italiana, só atuou na semifinal, deixando sua marca no melhor jogo da Argentina no torneio: 6-1 nos EUA. Detalhamos na semana passada neste outro Especial.

ATACANTES: na ponta-direita, outro dos Profesores, Miguel Ángel Lauri. O Flecha de Oro passou nove anos no Pincha, de 1928 a 1937 e este velocista cruzador também fez sucesso enorme na França. Não só defendeu a seleção francesa como integrou o último título do superdecadente Sochaux na Ligue 1. Mas e no meio? O Profesor centroavante era Alberto Zozaya, então o maior artilheiro do clube com incríveis 144 gols em 181 jogos. Marcos Conigliaro era a referência entre 1967-70. José Luis Calderón foi colega de Verón no rebaixamento, na subida e nas campanhas redentoras de 2006 (fez três gols no 7-0 no Gimnasia) e 2009, onde a vaga já era de Mauro Boselli.

Para centroavante, ficamos, porém, com Ricardo Infante. Autor de 180 gols pelos anos 40 e 50, foi o único a vazar dez vezes o mitológico Amadeo Carrizo. Já o Gimnasia foi vazado oito, sendo três vezes em um 6-1 em 1948. Infante também conseguiu os melhores resultados profissionais do Pincha até então, dois terceiros lugares e uma Copa Adrián Escobar. Ele é o sexto maior goleador do campeonato argentino, indo à Copa de 1958 apesar de já ter 34 anos. A passagem rápida pelo Gimnasia no fim da carreira não desmerece sua trajetória longeva (quinze anos) pelo lado mais vitorioso de La Plata.

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Infante, o técnico Zubeldía e Juan Ramón Verón

Mas é na ponta-esquerda a disputa mais cruel. Enrique Guaita venceria a Copa do Mundo pela Itália em 1934 e seria o primeiro estrangeiro artilheiro da moderna Serie A, em 1935, pela Roma, mas era visto simplesmente como o menos técnico do quinteto ofensivo dos Profesores! Anos depois, o longevo Mauricio Pelegrina se converteria no máximo artilheiro da história do clube e do clássico de La Plata, com 235 gols. Mas não há como tirar Juan Ramón Verón do time.

Críticos ferrenhos do antijogo da equipe de 1967-70 eram unânimes em apontar Verón pai como o oásis de talento da equipe. E La Bruja realmente desequilibrava. Não era centroavante, mas marcou em cada etapa decisiva da ascensão do clube: nos 3-0 sobre o Racing pelo título argentino de 1967, nas três finais contra o Palmeiras na Libertadores 1968 (no último, driblando o goleiro para fazer 2-0 e matar a partida), o do título mundial sobre o Manchester United em Old Trafford. “Fez” Juan Sebastián, integrou os vices nacionais de 1975 e demonstrou estrela também na Colômbia, liderando como jogador-treinador os primeiros títulos nacionais do Junior de Barranquilla.

TÉCNICO: também não há discussão. Osvaldo Zubeldía foi o homem que transformou o Estudiantes em uma máquina, ao chegar em 1965 a La Plata. Criador de um time diabolicamente irritante, disseminando a linha de impedimento, jogadas de bola parada e muita marcação. Um muricybol eficientíssimo para um elenco sem grandes talentos individuais, mas perfeitos como engrenagens. Jorge Olguín, zagueiro treinado por ele e por Carlos Bilardo no San Lorenzo e campeão mundial em 1978, defende-o da fama violenta daquele time: “Zubeldía era outra coisa. Ele queria que a equipe jogasse. (…) Tudo o que atribuem a Zubeldía, na realidade ocorria com Bilardo: a malandragem, tirar vantagens”.

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Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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