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Um gênio chamado Messi. E seus críticos desocupados

Messi

Inútil dizer que o jogo foi daqueles. Todo mundo viu. Certo é que superou as expectativas até dos mais otimistas, mas há coisas a se ponderar sobre o caso. Uma delas é que quase todos davam o Barça como morto. Difícil assumir agora, mas era o que muitos diziam até a noite de ontem no Bernabéu. E não é só por causa do Barça que sustentam a crença. É também por causa de Messi. Isto porque a equipe de Martino está de tal forma associada a “La Pulga” que basta este não estar em boa fase para sua equipe ser jogada a segundo plano. Disto resulta que o problema do Barça, para muitos, ocorre porque Lionel Messi não está jogando bem. A resposta veio ontem. Numa atuação de gala o craque fez três gols, assistiu a Iniesta, no primeiro, e mostrou para todos que melhor do mundo não tem nada a ver como melhor do ano. Porém… até quando?

Futebol é um esporte fantástico na mesma medida, ao contrário, do senso comum que o cerca. Então, não basta tudo o que fez o Barcelona nos últimos tempos. A crueldade com o Barça – muitas vezes compensada pelos árbitros – não permite que a equipe blaugrana tenha tempo para se recompor, para viver fases de transição, para mudar de técnicos etc. Da mesma forma, seu craque maior, Lionel Messi, não tem direito a viver seus momentos ruins. Todos entendem quando um jogador volta de contusão; ninguém entende quando se trata de Messi. Longe de nós não assumirmos o quanto Cristiano Ronaldo é genial. Mas a perseguição a “La Pulga” vem principalmente daqueles que o julgam inferior ao extraordinário jogador da Ilha da Madeira.

Tanto é assim que para voltar a ser o melhor do mundo, Ronaldo precisou que seu “rival” argentino tivesse um ano marcado por contusões e muitos afastamentos dos gramados. Foi quando o craque português viveu um pouco na carne de Messi. Precisou jogar três vezes mais do que o costume para não perder a eleição para o “nervosinho” Frank Ribery e, mesmo, pasmem!, para um Messi capengando. Ainda assim, não foram poucos aqueles que postularam que o ano de 2013 foi do craque francês e não de Ronaldo. A sensação de algo errado do português, neste caso, foi a mesma que Messi deve viver em relação a Ronaldo, quase sempre. Ribery joga no máximo 30% do que joga Cristiano, assim como este joga os mesmos 30%, no máximo, do que joga Lionel Messi. Podem xingar, mas é verdade.

Perguntado sobre o segredo do Barcelona, seu ex-comandante Pep Guardiola simplificou: “Lionel Messi”. Então, o problema da equipe não passa sobretudo pela mudança de técnico. O mesmo podemos dizer sobre o “estilo Barça” de jogar e tantas outras coisas. Tudo isto conta, é claro! Porém, a resposta do técnico do Bayern resume o problema que vive o conjunto blaugrana: enquanto jogador do Barça, Messi é sua essência; enquanto ele estiver bem a equipe também estará. Vitimado por contusão e afastamento dos gramados, o craque argentino vai assistir a sua equipe das arquibancadas e verá o que todos veem, neste caso: uma equipe estranha. Uma esquadra com craques fenomenais, mas nunca superior a outras potências do futebol, como Real Madrid, Chelsea, City, United, Dortmund e Bayern.

Anos atrás, o “estilo Barça” sustentaria por um tempo mais longo o afastamento temporário de Messi. Hoje não. O fato é que o modelo está em crise. Só que seja por este ou por quaisquer outros modelos o que sempre diferencia mesmo é a presença do melhor jogador do mundo em 2012. O resto de tudo isso é conversa. Na peleja de ontem, em Madrid, foi isto o que se viu. Não foi o Barça do Guardiola; não se viu um predomínio absoluto da posse de bola como em outros tempos. Mas o que fez a diferença foi a mesma coisa de antes: a presença de Messi na equipe catalã.

Contudo, por que o craque argentino não tem apresentado constantemente o mesmo futebol que ontem chocou a torcida do Real, no Bernabéu? Por que desde o ano passado ele não parecia o mesmo jogador da época em que era comandado por Guardiola? E por que mesmo neste ano não tem sido comum vê-lo atuar como no jogo de ontem? Todas as respostas são fáceis para aqueles que têm um pouco de inteligência e conseguem de fugir do senso comum que marca o mundo do futebol. Trata-se do aspecto físico e das constantes contusões a ele relacionadas.

Em 2013, Messi sofria em campo, com dores reais que minimizavam suas atuações dentro das quatro linhas. Sem perspectiva de solução a curto prazo o jeito foi parar e se submeter a tratamentos sérios, além de planejar a retomada do melhor de sua forma física a longo prazo. Todos sabem disso, mas alguns insistem em falar bobagens, pois vivemos num mundo em que, felizmente, a língua de cada pessoa é livre para falar coisas que prestam e para falar todas as bobagens que pensam.

E a lista daqueles que falam asneiras surpreende. Ángel Cappa, treinador expressivo do futebol argentino disse que “vejo Messi apenas cumprindo com sua tarefa profissional. Não vejo paixão e loucura no que faz; de minha parte, prefiro ver um amador, daqueles que sentem o futebol nas suas entranhas”. E continuou: “Vejo Messi como um jogador que perdeu a paixão e a loucura necessárias para se jogar futebol”. Foram muitas bobagens, mas nada além do que recentemente disse César Luis Menotti: “ele tem capacidade de ganhar jogos, mas não faz uma equipe jogar melhor”. Em outra palavras, o técnico campeão em 1978 pela Argentina disse que o craque do Barça não joga para a equipe.

Esses dois críticos, assim como muitos de uma lista que inclui de Pelé a Muricy “retranqueiro e previsível” Ramalho, se esquecem do estado físico do argentino, de suas contusões e de sua recente preparação para uma boa forma física a longo prazo. Para eles, o que importa é o mesmo que para todos os torcedores comuns: os resultados imediatos. São impacientes, desonestos muitas vezes, além de veículos sofisticados de uma fala rasteira que ajuda a construir essas mesmas ideias toscas nas mentes dos torcedores comuns. Nem mesmo a dignidade de Cappa em reconhecer seu erro o liberta das banalidades que disse.

Sem contar com a mesma genialidade anterior de Xavi Hernández e tampouco de parceiro eficiente no ataque, do tipo que entende seu raciocínio primoroso, Messi foi obrigado, contra o Real, a voltar para armar a equipe. Não bastasse essa tarefa, não deixou de cumprir seu papel de falso 9, tão vital para o sucesso do ataque blaugrana. E particularmente nesta função não passa de um ser solitário no ataque, pois Sánchez conclui mal, Pedro tem nas pernas a vitalidade que lhe falta no cérebro e Neymar não entendeu que não está no Barça para atuar pelo mesmo setor do argentino e que se for escalado aberto pelos flancos do campo vai precisar se adaptar rápido a esta função se não quiser esquentar o banco de reservas.

Copa do Mundo do Brasil

Por fim vale recordar fazer notar aos desavisados que após sua última contusão, tanto Messi quanto a comissão técnica do Barcelona concordaram em estabelecer um planejamento para que “la Pulga” chegue ao meio do ano no melhor de sua forma física e técnica. Ou seja, justamente no momento em que será disputada a Copa do mundo do Brasil. em outras palavras, Messi está muito longe do melhor de sua condição física. Ontem isto ficou claro, por exemplo, quando ele desperdiçou a chance de fazer 2×0 para o Barça. jogou a pelota à esquerda do arco de Casillas, numa rara demonstração de como se deve perder um gol.

Contudo, sua explosão muscular, ainda que comprometida, apareceu de forma brilhante quando ele anotou o empate em 2×2. Essas duas situações resumem bem o momento do craque argentino. Ele vai variar de jogo para jogo, assim como de jogada para jogada; nem sempre vai conseguir se superar. Isto porque só estará 100% na Copa do Mundo do Brasil. Até lá nem sempre será o Messi que conhecemos, porém, por se tratar de um gênio, sua marca dificilmente não será notada no chamado jogo grande. Foi assim na noite de ontem. Será em outras pelejas da mesma estatura. E não se trata de uma escolha. Se amanhã jogar mal novamente, as vozes oportunistas serão ventiladas nos quatro cantos. Vozes da desconfiança; vozes da impiedade; vozes da banalidade e do senso comum que impregnam o futebol no mundo inteiro.

Joza Novalis

Mestre em Teoria Literária e Lit. Comparada na USP. Formado em Educação e Letras pela USP, é jornalista por opção e divide o tempo vendo futebol em geral e estudando o esporte bretão, especialmente o da Argentina. Entende futebol como um fenômeno popular e das torcidas. Já colaborou com diversos veículos esportivos.

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