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Familiares na Seleção Argentina – Parte 1: os Brown

Jorge*, Alfredo*, Alberto, Diego Hope, Carlos*, Ernesto* e Eliseo*; Tomás, mãe Elisa (com Eduardo), pai Diego (com Guillermo), Jessie e Juan (outro, sem ser o primo). As filhas Grace e Elisa não aparecem na foto.

Adequadamente para esta época natalina, o Futebol Portenho deixou preparada nova série de especiais, destinada aos familiares que já passaram pela Seleção Argentina. Apropriado então que este primeiro aborde os pioneiros, que também são, ainda hoje, os mais expressivos, em quantidade e importância: os da família Brown.

As origens dos Brown estão na primeira leva de imigrantes escoceses que aportaram na Argentina, cerca de duzentos que chegaram no país em 1825, dentre os quais um certo James Brown. Do casamento de um dos filhos que ele teria na nova terra, Diego, com Elisa Gibson, nasceram nada menos que quatorze crianças, sendo onze meninos e três moças. Sete dos garotos jogaram futebol, embora cinco tenham sido os que entraram para a história, multicampeões no Alumni (a mais importante equipe no país na primeira década do século passado e objeto deste outro especial do FP) e pilares dos primórdios da Albiceleste.

Tomás e Diego Hope Brown foram as exceções entre seus pares, tendo jogado mais pela equipe B do Alumni, em jogos da segunda divisão, e sem ter chegado a defender a seleção. Vamos aos demais:

Jorge Gibson Brown foi o mais velho deste clube dos cinco (nasceu em 3 de abril de 1880, na cidade bonaerense de Jeppener) e também o mais emblemático, verdadeiro primeiro símbolo da seleção, ficando conhecido inclusive como El Patriarco. Respeitado pelo senso de colocação, velocidade e cavalheirismo em campo, começou a participar dos campeonatos argentinos na edição de 1897. Não pelo Alumni, que não competiu ali, e sim no Lanús Athletic (sem ligação com o atual Lanús), onde o jovem inside forward jogou 24 vezes e marcou 11 gols ali, até 1899.

Em 1900, passou a atuar no então English High School Athletic Club, o time escolar que se renomearia Alumni no ano seguinte. Ficaria na equipe até a dissolução da mesma, em 1911, participando ativamente dos dez títulos que o clube obteve no campeonato argentino. À medida que os anos passavam, ele, que chegou a ser artilheiro dos campeonatos de 1902 e 1903, passou a jogar mais recuado – no fim da carreira, já era um full back.

Esteve entre os ex-jogadores do Alumni que, após a saída de cena do clube, passaram ao Quilmes. Contudo, não atuou na campanha do título cervecero de 1912. Parou de jogar ali, em 1914. Dois anos depois, certos adolescentes da cidade de Posadas, na província de Misiones (noroeste argentino), fundassem o Club Social y Deportivo Jorge Gibson Brown, atualmente no Torneio Argentino C  (equivalente à quinta divisão).

Na seleção, Jorge Brown foi o recordista de presença até 1910, totalizando 23 partidas (17 delas, como capitão) entre 1902 (a partir do jogo que muitos consideram como o primeiro da Argentina) e 1913, marcando quatro gols. À exceção de uma partida contra o Chile, em 1910, todas as demais foram diante do Uruguai. Ele, que passara a dedicar-se ao críquete, faleceu em 3 de janeiro de 1936, em San Isidro.

Carlos Carr Brown, dois anos mais novo e também nascido em Jeppener, é, dentre os cinco irmãos, o mais obscuro. Não pela falta de qualidade: quando foi estudar na Escócia, em 1905, este zagueiro chegou a receber ofertas para tornar-se jogador profissional (o futebol argentino se manteria na essência amador até, oficialmente, 1931). Sua ida à terra das raízes abreviou sua carreira e lhe deixou mais esquecido nos registros históricos no futebol argentino.

O ano de 1905 acabou sendo justamente o único em que todos os irmãos estiveram juntos no Alumni. Na seleção, o máximo que houve foram três irmãos juntos: uma delas se deu em 1903, com ele (estreante), Jorge e Ernesto. Ali, a Argentina contou ainda com os gêmeos Eugenio e Juan José Moore (também jogadores do Alumni), no que foi até hoje sua partida mais “familiar”. Chegaram a haver quatro Brown em campo em partidas futuras da seleção, mas na reunião de três dos irmãos com o primo Juan.

Carlos Brown esteve também no jogo seguinte da Argentina, que só veio a ocorrer em 1905. Suas duas partidas foram contra o Uruguai, ambas em Buenos Aires, com os rivais arrancando uma vitória na primeira e um empate na segunda. Entre a falta de mais detalhes de vida dele, está o fato de ter sido o único dos cinco irmãos sem ligação comprovada com a maçonaria.

Carlos também foi o único deles a não ter vencido nem marcado gols pela seleção, além de não ter defendido propriamente a Albiceleste (a Argentina só adotaria as listras alvicelestes em 1908); e, ainda, o primeiro destes a falecer, em 26 de agosto de 1926, em Buenos Aires.

Ernesto Alejandro Brown foi o filho do meio entre os cinco, nascendo em 7 de janeiro de 1885, em Buenos Aires. Ficaria conhecido como El Frío e El Pacífico pelo comportamento sereno e tranquilo, por vezes parecendo indiferente, em campo. Entre as linhas, era um jogador versátil no ataque, chegando a passar também pela seleção como left halfcentrehalf centreforward, e dono de um forte arremate, sendo natural executor de tiros livres.

A exemplo de Jorge, esteve presente nos dez títulos do Alumni entre 1900 e 1911, possuindo apenas quinze anos no primeiro. Estreou na seleção com dezessete, em 1902 (junto com Jorge e ainda antes de Carlos, três anos mais velho), por insistência do colega Carlos Buchanan, mas só passaria a atuar regularmente a partir de 1908, marcando seu único gol pela Argentina exatamente nessa reestreia.

Somou pela Argentina quatorze aparições, as duas últimas em 1912. Nestas, fora já como jogador do Quilmes, onde somou naquele ano seu décimo primeiro título argentino particular. Nenhum outro jogador foi tão vezes campeão argentino quanto ele (já que o irmão Jorge não participou da campanha de 1912); quem mais chegou perto foi Leonardo Astrada, decacampeão no River Plate – a maior parte, vale frisar, na época de dois campeonatos anuais. Ainda nos tempos de um torneio por ano, o mítico Ángel Labruna, também pelo River, alcançou nove troféus.

Ernesto Brown, que também praticava remo, golfe e críquete, faleceu em 12 de julho de 1935, em Buenos Aires.

Alfredo Carrow Brown, nascido em 1 de dezembro de 1886, em Jeppener, se notabilizou por ter feito o gol da vitória daquele que é tido como o primeiro grande triunfo internacional do futebol argentino, em jogo do Alumni contra a seleção do Cabo (a principal das colônias britânicas que formariam em 1910 a África do Sul). Esta excursionou pela Argentina em 1906 e alguns de seus integrantes permaneceriam no país, sendo que dois deles também viriam a jogar pelo selecionado dos sul-americanos: Hector Henman (que passara a defender o próprio Alumni) e Charles Whaley (que entrara no rival Belgrano Athletic).

Oportunista atacante do flanco direito, Alfredo Brown, como Jorge, foi outro a ter se sagrado artilheiro do campeonato argentino, em 1904 – logo no ano em que, ainda com 17 anos, firmou-se no Alumni (debutara em sua única participação na campanha do ano anterior).

Na seleção, estreou em 1906 e por ela jogou até 1911, uma delas como goleiro: José Buruca Laforia, com quem jogava também no Alumni, lesionara-se em partida contra o Uruguai em agosto de 1907 e Alfredo ocupou os arcos no segundo tempo, sofrendo um gol – os argentinos, ainda assim, terminaram vencendo.

Ao todo, realizou nove partidas, quatro como capitão, marcando quatro vezes. Todas elas foram contra o Uruguai, onde ele faleceria em 30 de agosto de 1958, na capital Montevidéu.

Eliseo Brown foi o mais novo dos cinco: nasceu em 29 de outubro de 1888, em Buenos Aires. Enquanto Alfredo ocupava o flanco direito, Eliseo jogava no esquerdo, no ataque. El Cortapasto ficou assim conhecido por seus chutes, rasantes e potentes.

Ele chegou a jogar também como centreforward, sagrando-se, como os irmãos Jorge e Alfredo, artilheiro do campeonato argentino. No caso de Eliseo, isto se deu seguidamente entre os torneios de 1906 e 1909. Nestes, o Alumni só não foi campeão em 1908.

Apenas dois jogadores foram goleadores máximos em mais torneios: Domingo Tarascone, quatro vezes pelo Boca Juniors e outra no General San Martín, esta no desvalorizado campeonato amador de 1934 (a última edição amadora). O outro foi um jovem do Argentinos Juniors chamado Maradona (cinco vezes pelo time de La Paternal). Eliseo Brown foi ainda igualado por outros ilustres goleadores do futebol argentino: Alberto Ohaco (suas quatro, no Racing), José Sanfilippo (as quatro, no San Lorenzo) e Luis Artime (duas pelo River Plate e outras duas no Independiente), não por acaso presentes entre os ídolos máximos dos referidos times.

Na seleção, em que estreou pouco antes dos dezoito anos, Eliseo jogou nove vezes e marcou seis, todas contra o Uruguai, entre 1906 e 1911. O mais jovem dos irmãos Brown foi justamente o mais longevo, embora ironicamente seja a data de morte dele a desconhecida; ele, que chegou a lutar nas tropas britânicas na Primeira Guerra Mundial, foi fotografado para uma reportagem da El Gráfico na década de 70 (imagem mais à direita).

Juan Dodds Brown, primo destes irmãos, foi outro representante da família no Alumni e na seleção. Sua carreira traz semelhanças principalmente com a de Jorge, com quem formou justamente a primeira célebre pareja do futebol argentino: começou como centreforward e terminou como defensor e passou ao Quilmes após o Alumni deixar o futebol. Encerrou a carreira após o rebaixamento dos cerveceros, em 1916, ano em que também despediu-se da seleção.

Já como Eliseo, El Cachorro também nasceu em 1888 e estreou pela Argentina em 1906. Foi o Brown que mais jogou pela Albiceleste – foram 35 partidas -, detendo justamente o recorde de aparições pela seleção até 1923. Ainda detém a marca de quem mais enfrentou o Uruguai, com 32 jogos, 19 deles, consecutivos (outro recorde).

Além dos uruguaios, jogou ainda duas partidas contra o Chile e foi o único daqueles Brown que chegou a enfrentar o Brasil, em partida pelo Sul-Americano de 1916; fora exatamente também o único entre eles que chegou a disputar o torneio (a edição de 1916 foi justamente a primeira), atual Copa América. Seus dois gols pela Argentina vieram exatamente nela, ao acertar dois pênaltis contra os chilenos (foi o primeiro na seleção a converter duas penalidades máximas).

Juan Brown, doze vezes capitão da Albiceleste, ainda é o recordista de partidas pelo selecionado como jogador do Quilmes (dezesseis vezes). Ele faleceu em 1931, na cidade de Mármol. Como pelo menos quatro dos cinco acima, também era maçom.

A imprensa escocesa relembrou tal famíla em 2008, às vésperas da partida entre Argentina e Escócia que marcou a estreia de Maradona como técnico da Albiceleste. Houve quem afirmasse que o zagueiro José Luis Brown fosse outro descendente de James Brown.

De técnica limitada, mas raçudo, passou pelos grandes Boca Juniors e Racing, mas o clube com o qual mais se identificou foi o pelo qual torce e iniciou a carreira, o Estudiantes de La Plata (cujo uniforme, por sinal, foi inspirado no do Alumni). Pelos pincharratas, foi bicampeão argentino em 1982 e 1983, melhor momento do time entre o elenco tricampeão da Libertadores nos anos 60 e o renascimento proporcionado por Verón a partir de 2006. Já na seleção, o zagueiro tornou-se herói ao abrir o placar na final da Copa do Mundo de 1986 (justamente seu único gol pela Argentina), decisão esta em que chegou a atuar com um polegar quebrado.

Apesar dos referidos relatos da mídia britânica, o recente livro Quién es Quién en la Selección Argentina (que fala da trajetória de todos os que passaram por ela entre 1902 e 2010), refutou expresamente, no texto destinado a El Tata, qualquer parentesco com os Brown acima. De fato, há fontes que afirmam que os antepassados que lhe transmitiram o sobrenome eram irlandeses, e não escoceses.

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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