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A Batalha de Santiago

Há 20 anos acontecia uma das partidas mais controvertidas da história da Libertadores: o jogo de volta da semifinal envolvendo Colo-Colo e Boca Juniors. O jogo terminou em uma batalha campal, e em certo sentido o confronto ainda não terminou, já que cada lado conta ainda hoje uma história muito diferente.

Comandado por Oscar Tabares e tendo Gabriel Batistuta como principal jogador, o Boca Juniors tinha um belo time, que já havia eliminado River Plate, Corinthians e Flamengo daquele torneio.  E nas semifinais enfrentou o Colo-Colo, então treinado pelo croata Mirko Jozic, que tinha Marcelo Barticcioto como jogador mais famoso.

As coisas começaram a se complicar já antes da primeira partida, na Bombonera. O motorista do ônibus do clube chileno “se perdeu” (até hoje os chilenos têm certeza de que aconteceu de propósito), conduzindo o veículo para o local onde se concentravam os barras bravas xeneizes, levando a delegação do Colo-Colo a receber uma chuva de pedras.

No vestiário, só havia água quente. Jorge Vergara, dirigente do Colo-Colo chegou a avisar à imprensa que sem água gelada seu time não entraria em campo. Ao fim a partida se realizou, e o Boca venceu por 1 a 0, gol de Gracián, cobrando pênalti sofrido por Batistuta (clique aqui para ver o gol).

Mas os chilenos esperaram pela revanche, que aconteceu no dia 22 de maio de 1991, há exatamente 20 anos. Logo de cara era óbvio que havia algo errado. O goleiro xeneize Navarro Montoya observou ao árbitro (o brasileiro Renato Marsiglia) que havia um número excessivo de repórteres: “são mais de 300, assim não é possível jogar”, disse o goleiro colombiano.

Mas a partida começou, e tudo parecia correr normalmente. O primeiro tempo terminou sem gols, mas aos 19 minutos do segundo tempo, Ruben Martinez aproveitou bela jogada de Barticcioto para colocar os Albos em vantagem. Dois minutos depois, jogada de Pato Yañez, gol de Barticcioto. A equipe chilena naquele momento estava classificada.

Mas o Boca jamais se entregaria facilmente, e aos 29 minutos do segundo tempo, após boa jogada de Batistuta, Diego Latorre cabeceou para descontar. O resultado levaria a partida para os penaltis (naquele tempo o gol marcado fora de casa não valia como critério de desempate), mas muita coisa ainda aconteceria no Estádio Nacional. O clima de guerra aumentou quando “Gambetita” Latorre comemorou o gol ostensivamente em frente ao zagueiro Novillo, que o ameaçou: “te voy a cagar a patadas”.

Aos 37 minutos, Martinez fez grande jogada, tabelou com Yañez e marcou o gol da classificação do Albo. Foi a senha para que finalmente se tornasse claro porque haviam tantos jornalistas em campo: na verdade eram torcedores do Colo-Colo, colocados dentro de campo disfarçados pela direção do clube. Navarro Montoya havia pedido várias vezes a Renato Marsiglia para mandá-los parar de usar o flash quando a bola estava na área xeneize, o que levantava suspeitas.

O que acontece a partir do momento em que o Colo-Colo marca o gol da classificação é algo que até hoje é discutido. O fato concreto é que houve uma briga generalizada, em que muitos se feriram, incluindo o treinador xeneize, o uruguaio Oscar Tabarez. O jogo passou para a história como “a Batalha de Santiago”, um dia negro para o futebol sul-americano.

Clique aqui para ver os gols da partida, e aqui para ver os incidentes após o terceiro gol chileno.

O que decretou o fim da partida foi uma mordida recebida pelo goleiro Navarro Montoya de um cão policial. No ano seguinte, o cão morreu em um acidente, foi enterrado com honras e até hoje seu túmulo é visitado pelos hinchas albos

 

Tiago de Melo Gomes

Tiago de Melo Gomes é bacharel, mestre e doutor em história pela Unicamp. Professor de História Contemporânea na UFRPE. Autor de diversos trabalhos na área de história da cultura, escreve no blog 171nalata e colunista do site Futebol Coletivo.

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