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Uma joia escondida em Buenos Aires

No filme “O Segredo de seus olhos” existe uma tomada aérea que tira o fôlego de quem o assiste, seja pela grandiosidade ou pelo espanto que um estádio de futebol lotado provoca. Depois das pistas reveladas por um borracho fanático por futebol, Benjamin Esposito, vivido por Ricardo Darín, vai procurar pelo seu suspeito num jogo do Racing, clube pelo qual o suspeito torce.

E então me lembrei que, sempre que se ouve falar de estádios de Buenos Aires, invariavelmente somos remetidos a dois lugares: a mítica Bombonera ou o imponente Monumental de Núñez. Seja pelo fato de sediar os jogos dos dois maiores clubes argentinos ou por ter uma estrutura que seja capaz de receber bem os turistas, esses dois estádios foram ao longo dos últimos anos se convertendo em passeios quase que obrigatórios para quem estiver a passeio pela capital argentina e gostar de futebol.

Mas existem outros templos do futebol local que poderiam ser considerados numa visita a Buenos Aires. Como, por exemplo, o Nuevo Gasómetro, de propriedade do San Lorenzo. Ou então o José Amalfitani, palco de tantas vitórias do Vélez e que foi utilizado por 3 vezes na Copa do Mundo de 1978. Se sairmos da cidade de Buenos Aires em direção à cidade de Avellaneda, nos deparamos com os quase colados Presidente Perón (El Cilindro) do Racing e o novíssimo Libertadores da América, do Independiente. Mereceriam uma visitinha só pelo fato de serem clubes tão rivais e com estádios tão absurdamente próximos.

Porém há um estádio em Buenos Aires que chama a atenção tanto pelo estilo arquitetônico quanto pelo seu tamanho. Falo do Tomás Adolfo Ducó, campo onde o Huracán manda suas partidas. É esse o estádio onde Benjamin Esposito vai à captura de seu suspeito, num jogo onde o Racing enfrenta o time da casa. Na narração do jogo é possível escutar nomes como Carlos Babington (hoje presidente do Huracán), o excepcional Miguel Ángel Brindisi e René Houseman, jogadores que marcaram época tanto no Huracán quanto na seleção da Argentina.

A construção do Ducó (presidente do Huracán nos anos 30 e 50) começou em 1941. Em 1947 foi disputado ali o primeiro jogo (vitória contra o Boca Juniors por 4 a 3) e dois anos depois a construção do estádio foi finalizada. Nada mais natural, portanto, que a fachada principal do estádio ostente uma influência dos anos 40, com grandes janelas, um pórtico central que lembra a entrada de um museu e os letreiros “Huracán” posicionados verticalmente em cada uma das laterais da fachada. Abaixo, os portões, as bilheterias e alguns bares estão pintados em vermelho e branco, cores do time da casa. É um estádio de fácil acesso, já que o bairro onde está situado (Parque Patricios) fica próximo do centro portenho.

Uma vez no estádio percebe-se sua imponência pelo tamanho (comporta mais de 48 mil pessoas sentadas) e pela acústica, que é favorecida pelo formato totalmente fechado do estádio. Não por acaso é conhecido como “O Palácio” e é um dos lugares favoritos das bandas de rock argentinas, que frequentemente escolhem o Ducó para gravar shows ao vivo. Nas arquibancadas que ficam atrás dos gols, é possível notar o grande espaço entre o início das bancadas e o alambrado, uma característica pouco usual na maioria dos estádios argentinos.

Sem dúvida alguma o Ducó foi determinante para que o Huracán conseguisse seu único título da era do profissionalismo, o Campeonato Metropolitano de 1973. Comandado por César Luis Menotti, o time contava com o talento dos já mencionados Brindisi, Houseman e Babington, além de Basile, Larrosa, Avallay, Chavay e Carrascosa.

No mesmo ano, o Santos foi convidado a realizar um amistoso para inaugurar o sistema de iluminação artificial do estádio. Ainda que o Huracán contasse com todos esses bons jogadores, o time da Vila Belmiro não tomou conhecimento dos craques locais e goleou por 4 a 0, com Pelé, Clodoaldo e companhia limitada.

Apesar dos elogios colhidos ao longo do tempo, o Ducó foi palco de uma das últimas brigas do futebol argentino: minutos antes do clássico contra o grande rival San Lorenzo, a torcida do Huracán mostrou uma bandeira roubada da torcida do time visitante. Esse fato desencadeou uma feroz reação da torcida do San Lorenzo, que entrou em confronto com a polícia. A briga resultou em 21 pessoas feridas e o fechamento provisório do estádio, que havia sido liberado pela prefeitura havia pouco tempo. Felizmente, depois de quatro dias o estádio foi liberado novamente.

Mesmo com esses problemas, o Tomás Adolfo Ducó é um estádio razoavelmente conservado para sua idade. Como todo estádio antigo, o Ducó teve de passar por algumas reformas para obter a autorização da prefeitura de Buenos Aires no que diz respeito à segurança. Embora ainda necessite de mais reformas, é muito elogiado pelos torcedores e jornalistas, pois permite uma visualização por completo do campo de jogo de qualquer lugar. E ainda assim é um dos estádios mais charmosos da Argentina.

Texto publicado no blog do autor (‘Um Tal Futebol‘) no dia 23 de março deste ano

Alexandre Leon Anibal

Analista de sistemas, radialista e jornalista, pós-graduação em Jornalismo Esportivo e Negócios do Esporte. Neto de argentinos e uruguaios, herdou naturalmente a paixão pelo futebol da região. É membro do Memofut, CIHF, narrador do STI Esporte (www.stiesporte.com.br ) e comentarista do Esporte na Rede, programa da UPTV (www.uptv.com.br ).

5 thoughts on “Uma joia escondida em Buenos Aires

  • Ernesto

    Muito boa a materia. Só queria comentar um erro sutil. Quando se diz ‘bonaerense’ refere-se a provincia de Buenos Aires e não à cidade. Na materia deveria dizer ‘portenho’.

    Parabens pelo trabalho.

    Abraços,
    Ernesto.

  • Alexandre Anibal

    Olá Ernesto, boa tarde!

    Já corrigi o erro. Muito obrigado pela observação e pela audiência.

    Um abraço,
    Alexandre

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