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Dante Pertini, o tio de Di Stéfano, também defendeu a seleção e foi multicampeão no… Boca

Um dos grandes símbolos do River, Alfredo Di Stéfano não deixava de admirar o Boca. Sua carreira fantástica como jogador inclusive ofusca que “A Flecha Loira” ainda é o único técnico campeão argentino pelos dois gigantes, e saiu-se primeiro com a azul y oro – e, precisamente, em histórico duelo direto em pleno Monumental de Núñez contra o rival, em 1969. Em 2008, indagado a respeito, respondeu que “eu me sinto riverplatense, mas como tinha toda a família em La Boca, sou meio boquense, e não lhes tenho inveja, nem ciúme, nem ódio, nem nada, é um clube extraordinário” e confessou que “toda quarta-feira” assistia treinos do Boca nos anos 30, pois seu avô vivia “a 30 metros do campo”. As razões familiares que o aproximam dos xeneizes se estenderam também a um tio, que hoje faria 120 anos: Dante Santiago Pertini. Que, como o sobrinho, também vestiu a camisa de River e seleção!

Ponta-esquerda, Pertini não chegou a virar exatamente um ídolo histórico no Boca, apesar de totalizar 42 gols em 87 jogos, incluindo-se partidas amistosas, e figurar nos elencos campeões argentinos de 1920, 1923 e 1924; da Copa Honor de 1920 – realizada apenas em 1923, era um tira-teima do campeão argentino com o uruguaio; da Copa Ibarguren de 1923, por sua vez tira-teima entre o campeão da liga rosarina com o do torneio argentino, que apesar do nome só admitia times da Grande Buenos Aires e La Plata; da Copa Competencia de 1925 (embrião da Libertadores, com times uruguaios, rosarinos e portenhos); e da Copa Estímulo de 1926, torneio que se dava em pausas no campeonato argentino ocorridas para realizações de Copa América e assim mantinha os clubes ativos esportiva e financeiramente sem que se prejudicassem na liga com os desfalques.

Com o tempo, ele ficou mesmo mais associado ao parentesco ilustre com Di Stéfano. O próprio pai da lenda madridista, igualmente chamado Alfredo Di Stéfano, defendera uma única vez o time adulto do Boca, em amistoso de 1914 contra o Argentino de Quilmes. Luis Pertini, por sua vez irmão de Dante, foi vice-presidente boquense de 1947 a 1953. Mais abaixo, se insere a lista de partidas de Dante Pertini pelo Boca, colhidas no perfil dele no primoroso site estatístico Historia de Boca. Salvo quando especificado, as partidas são válidas pelo campeonato argentino.

Pertini como último agachado em seu breve passo por um River sem faixa diagonal

O hiato de jogos entre 1920 e 1922 deve-se a uma profunda crise institucional no Boca, que, a despeito de vir do bicampeonato de 1919 e 1920 (seus dois primeiros títulos argentinos), não era ainda um clube sustentável: viu seu quadro social se encurtar a 600 devotos e uma ordem de evicção foi a gota d’água para a dissolução da junta diretora, substituída por outra sob uma eleição emergencial em janeiro de 1921. Pertini, Juan Bautista Anglese e duas figuras particularmente históricas do clube, casos de Alfredo Garasini e Américo Tesorieri, rumaram ao Sportivo del Norte, o atual Colegiales, antes de eventualmente regressarem à camisa azul y oro.

Em meio a esse hiato é que Pertini também defendeu brevemente o River, tempo em que o rival ainda era um time também do bairro de La Boca e tinha na camisa tricolor (em listras brancas e vermelhas grossas separadas por finas listras pretas, hoje um tradicional manto reserva) a principal, e não a de faixa diagonal. Uma visão atenta à lista também poderá notar a irônica ausência de duelos contra River e também contra Racing, Independiente ou San Lorenzo: é que entre 1919 e 1926 o Boca esteve em uma liga separada desse quarteto, a ponto de os encontros com o Huracán serem o Superclásico dos anos 20.

Pertini, inclusive, marcou um dos gols das finais que esses dois clubes travaram já em 1924 pelo torneio de 1923, no qual terminaram igualados na co-liderança. Foram precisos quatro jogos após cada um vencer os dois primeiros sem haver critério de saldo de gols e empatarem o terceiro e tamanha expectativa fez com que árbitros uruguaios fossem solicitados para oferecer a maior imparcialidade possível no quarto confronto.

O Boca “europeu” de 1925: Pertini é o antepenúltimo dos agachados/ajoelhados. A seu lado, ao meio, aparece o autor do primeiro gol olímpico, Cesáreo Onzari

A lista, por outro lado, é repleta de times que a era profissional oficializada em 1931 levaria ao ostracismo ao não inclui-los, levando à extinção de muitos (Eureka, Del Plata, Sportivo Palermo, Alvear, Argentino de Banfield…), à decadência nas divisões de acesso (Sportivo Barracas, Dock Sud, El Porvenir, Argentino de Quilmes, Temperley e, em menor grau, o Nueva Chicago) e até a quem ainda existe, mas focado em outros esportes – caso do Porteño, campeão argentino de 1912 e 1914 e que voltou-se ao rúgbi; ou como um elitista clube meramente social, como o Palermo (não confundir com o Sportivo Palermo, também enfrentado por Pertini e extinto), onde Higuaín daria chutes infantis no futebol de salão.

Dentre os amistosos, curiosidades: o duelo contra os uruguaios do Nacional em 1924, no qual inclusive marcou o segundo gol, serviu de inauguração do primeiro estádio que o Boca ergueu no mesmo terreno em que hoje existe La Bombonera (aberta, por sua vez, apenas em 1940). Naquele mesmo ano, ele enfrentou pelo clube duas vezes a seleção paraguaia, gerando uma ironia extra: enfrentou países mais vezes pelo Boca do que pela própria seleção, pois oficialmente só defendeu a Albiceleste uma única vez – além de contabilizar uma outra aparição, não-oficial.

Em seu único jogo oficial pela Argentina, no feriado de 25 de maio no ano de 1924, Pertini sofreu uma derrota de 2-0 para o Uruguai pelo troféu binacional Copa Newton, no Gran Parque Central, estádio do Nacional. No mês seguinte, em, 22 de junho, esteve na derrota de 1-0 para o Plymouth Argyle (o clube da Cornualha excursionava pelo Rio da Prata e Pertini também o enfrentaria pelo Boca dali a mais alguns dias), no estádio do Sportivo Barracas. Outra ironia é que, também pelo Boca, ele não só enfrentou como até gol marcou sobre a própria seleção argentina, em amistoso de 1925.

Pertini como último agachado no Almagro de 1927. Curiosamente, o amigo argentino do Grêmio (dada a similaridade dos uniformes) fora seu primeiro adversário pelo Boca

E, sobre 1925, uma histórica excursão europeia fez mesmo o Boca não disputar o campeonato argentino daquele ano. Pertini, inclusive, esteve em triunfo de 1-0 sobre o próprio Real Madrid que tanto se ligaria ao ilustre sobrinho. Em 1926, quem já não atuou na liga argentina foi o próprio Pertini, que em 1927 passou então a defender o Almagro (curiosamente, seu primeiro adversário a serviço do Boca, ocasião em que também marcara seus primeiros gols xeneizes).

Ele só não viveu para ver o sobrinho coroar-se no Boca, em 1969. O perfil de Pertini no livro Quién es Quién en la Selección Argentina, onde o autor Julio Macías lista todos os que a defenderam oficialmente entre 1902 e 2010, informa que ele faleceu ainda em 1964, sem especificar a data. E que, naqueles tempos de amadorismo do futebol argentino, conciliava os gramados com a profissão de veterinário. Eis, enfim, a listagem de todos os seus jogos e gols pelo Boca:

4 de abril de 1920, 2-2 Almagro, 2 gols
11 de abril de 1920, 2-0 Eureka
30 de maio de 1920, 0-1 Del Plata
27 de junho de 1920, 0-0 Huracán
15 de agosto de 1920, 1-1 Estudiantes (Copa Estímulo)
19 de setembro de 1920, 0-1 Banfield (Copa Estímulo)
5 de dezembro de 1920, 0-2 Del Plata
29 de outubro de 1922, 3-1 Estudiantes
5 de novembro de 1922, 1-3 Argentinos Jrs, 1 gol
11 de novembro de 1922, 2-1 Universal-URU (amistoso)
19 de novembro de 1922, 1-2 Boca Alumni
3 de dezembro de 1922, 1-0 Huracán
24 de dezembro de 1922, 3-2 Sportivo Palermo (amistoso), 1 gol
21 de janeiro de 1923, 3-3 La Continental (amistoso)
4 de março de 1923, 4-0 Porteño (amistoso)
11 de março de 1923, 6-3 Sportivo del Norte
18 de março de 1923, 5-2 Dock Sud, 2 gols
29 de março de 1923, 0-0 Platense
1º de abril de 1923, 1-1 Estudiantes
13 de maio de 1923, 3-0 Argentino de Banfield, 2 gols
27 de maio de 1923, 5-0 San Fernando
31 de maio de 1923, 4-1 Del Plata, 1 gol
3 de junho de 1923, 3-0 Progresista, 1 gol
17 de junho de 1923, 4-0 El Porvenir
1º de julho de 1923, 1-1 Huracán
29 de julho de 1923, 4-1 Nueva Chicago
5 de agosto de 1923, 3-1 Porteño
15 de agosto de 1923, 2-0 Boca Alumni, 1 gol
20 de setembro de 1923, 2-0 Universal-URU (Copa de Honor válida por 1920), 1 gol
7 de outubro de 1923, 3-0 Palermo, 1 gol
14 de outubro de 1923, 2-0 Sportivo Barracas (amistoso), 1 gol
21 de outubro de 1923, 3-0 Alvear, 2 gols
4 de novembro de 1923, 3-0 Urquiza, 1 gol
16 de dezembro de 1923, 3-0 Progresista
23 de dezembro de 1923, 9-0 Boca Alumni, 4 gols
30 de dezembro de 1923, 4-1 Del Plata
24 de fevereiro de 1924, 2-2 El Porvenir (amistoso), 1 gol
16 de março de 1924, 3-0 Huracán (primeira final do campeonato de 1923), 1 gols
30 de março de 1924, 0-2 Huracán (segunda final do campeonato de 1923)
6 de abril de 1924, 0-0 Huracán (terceira final do campeonato de 1923)
13 de abril de 1924, 5-0 Boca Alumni, 2 gols
20 de abril de 1924, 6-1 Nueva Chicago
27 de abril de 1924, 2-0 Huracán (quarta final do campeonato de 1923)
29 de maio de 1924, 1-0 Argentino de Banfield
1º de junho de 1924, 3-1 Platense, 1 gol
8 de junho de 1924, 1-0 Rosario Central (Copa Ibarguren de 1923), 1 gol
15 de junho de 1924, 3-1 Sportivo Barracas, 1 gol
6 de julho de 1924, 2-0 Nacional-URU (amistoso), 1 gol
9 de julho de 1924, 0-0 Plymouth Argyle-ING (amistoso)
20 de julho de 1924, 1-1 Sportivo Baradero (amistoso)
27 de julho de 1924, 2-0 Argentinos Jrs, 1 gol
3 de agosto de 1924, 5-2 Palermo
10 de agosto de 1924, 6-0 Del Plata
15 de agosto de 1924, 3-0 Libertad de Concordia (amistoso), 2 gols
17 de agosto de 1924, 5-0 seleção de Concordia (amistoso)
24 de agosto de 1924, 2-0 Huracán
31 de agosto de 1924, 4-0 Porteño, 1 gol
7 de setembro de 1924, 3-0 Dock Sud
14 de setembro de 1924, 1-1 Huracán (amistoso), 1 gol
5 de outubro de 1924, 4-1 El Porvenir
19 de outubro de 1924, 1-2 Nobleza Argentina (amistoso)
9 de novembro de 1924, 4-0 San Fernando, 1 gol
11 de novembro de 1924, 0-0 seleção do Paraguai (amistoso)
15 de novembro de 1924, 3-1 seleção do Paraguai (amistoso), 1 gol
23 de novembro de 1924, 1-1 Temperley, 1 gol
30 de novembro de 1924, 1-0 Sportivo del Norte
7 de dezembro de 1924, 7-0 Urquiza
14 de dezembro de 1924, 2-0 Argentino de Quilmes
21 de dezembro de 1924, 3-1 Alvear
28 de dezembro de 1924, 5-0 Sportsman
12 de março de 1925, 3-0 Deportivo La Coruña-ESP (amistoso)
15 de março de 1925, 1-0 Deportivo La Coruña-ESP (amistoso)
22 de março de 1925, 1-0 Real Madrid-ESP (amistoso)
29 de março de 1925, 1-0 Sociedad Gimnástica-ESP (amistoso)
2 de abril de 1925, 0-4 Real Irún-ESP (amistoso)
3 de maio de 1925, 2-0 Espanyol-ESP (amistoso)
24 de maio de 1925, 2-0 seleção de Frankfurt-ALE (amistoso)
27 de maio de 1925, 2-0 Eintracht Frankfurt-ALE (amistoso)
26 de julho de 1925, 1-0 seleção de Rosario (amistoso), 1 gol
2 de agosto de 1925, 1-1 seleção da Argentina (amistoso), 1 gol
9 de agosto de 1925, 0-2 seleção de Rosario (amistoso)
6 de setembro de 1925, 1-0 Porteño (Copa Competencia)
10 de outubro de 1926, 2-3 Del Plata (Copa Estímulo, jogo posteriormente anulado)
17 de outubro de 1926, 3-2 Newell’s (amistoso), 1 gol
24 de outubro de 1926, 3-1 Argentino de Quilmes (Copa Estímulo), 1 gol
7 de novembro de 1926, 1-2 Del Plata (Copa Estímulo)

Di Stéfano, à direita, comemorando como técnico do Boca o título argentino de 1969 – em pleno Monumental, em pleno Superclássico…

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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