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60 anos do primeiro Perotti, talismã do Boca na Libertadores: Hugo, pai de Diego

Não deve ser com vinho do Porto que o 60º aniversário de Hugo Osmar Perotti será comemorado. Profissional, seu filho Diego Perotti trabalhou buscando a classificação da sua Roma na Liga dos Campeões, até fazendo sua parte ao sofrer o pênalti do solitário gol italiano, sem evitar a queda. Hugo, porém, foi muito mais que o pai de Diego, em uma carreira meteórica mas com boas histórias – os Perotti são inclusive um dos raros casos em que pai e filho defenderam a seleção. El Mono logrou isso mesmo precisando parar de jogar aos 25 anos.

Nascido no interior bonaerense de Moreno e formado na base do Boca, Hugo Perotti começou no time principal como reserva dos reservas, mas levado em conta após aguentar sem reclamar a marcação de Vicente Pernía (jogador de seleção na época e pai de Mariano Pernía, que defendeu a Espanha em 2006) em um treino. Sua estreia na equipe principal foi em 7 de setembro de 1977, na qual o técnico Juan Carlos Lorenzo alinhou José Perarri, Luis Sánchez Sotelo, Héctor Kees, Daniel Silgueiro, Raúl Sala, Hugo Alves, Guillermo Pagnotta, Abel Alves, Armando Husillos, Daniel García e Gerardo Ríos em visita ao Lanús pelo Torneio Metropolitano.

O oponente abriu o placar aos 16 minutos do segundo tempo e quatro minutos depois El Toto Lorenzo mexeu duas vezes, colocando Francisco Cibeyra no lugar de Pagnotta e Perotti no de Ríos. De nada adiantou: a oito minutos do fim, sobreveio o 2-0 e ainda uma expulsão de Abel Alves. A escalação é bastante obscura mesmo aos mais fanáticos torcedores do Boca, com alguma exceção aos irmãos Alves – Hugo chegou a ser pensado para a Copa do Mundo de 1978, aparecendo no álbum da Panini embora jamais defendesse de fato a seleção, enquanto Abel chegou a também treinar o clube em 2010.

Boca de 1978: Roberto Mouzo, Rubén Suñé, Francisco Sá, Mario Zanabria, Vicente Pernía, Hugo Gatti e Miguel Ángel Bordón; Ernesto Mastrángelo, Jorge Benítez, Julio Salinas e Hugo Perotti

Mas dali só Hugo Perotti efetivamente marcaria a história xeneize. Apenas dois dias depois, nova partida pelo Metropolitano, em que uma escalação bastante similar apenas empatou em 2-2 com o Atlanta na Bombonera. Uma das alterações foi o uso de Perotti já como titular, e já ali marcou seu primeiro gol, abrindo o placar. O técnico era Ernesto Grillo.

Afinal, em outras 48 horas depois o Boca entraria em campo pela segunda final da Libertadores, contra o Cruzeiro, no Mineirão. Daí a partida contra o Atlanta ter sido coordenada pelo assistente Grillo, e daí a ausência de nomes mais conhecidos na escalação, focados junto com o técnico Lorenzo na final continental. O Boca venceria pela primeira vez o torneio (em jogo-extra no dia 14), sem que Perotti, ainda com 18 anos, se envolvesse diretamente ainda. Mas conseguiu uma boa sequência de jogos mesmo com o retorno dos titulares aos compromissos do campeonato argentino.

O ponta-esquerda supria a lacuna de Darío Felman, precisamente o homem que cobrou o último pênalti do Boca na decisão por penais necessária contra a Raposa e que dali rumou imediatamente ao Valencia. Após a primeira conquista da América, Perotti ainda foi usado outras quatorze vezes no Metropolitano, sendo titular dez vezes; e em treze jogos do Torneio Nacional. O que não significou nova sequência para 1978: salvo amistosos entre o fim de maio e junho, quando o campeonato foi interrompido para a Copa do Mundo realizada no país, Perotti esteve inativo entre 11 de janeiro e 30 de agosto.

Abrindo o placar na Bombonera pela final da Libertadores 1978

O talismã perdeu, inclusive, as partidas do Mundial Interclubes de 1977, travadas em 21 de março de 1978 na Argentina e em 1º de agosto na Alemanha contra o Borussia Mönchengladbach, partida esta a contar inclusive com o regresso de Felman sob empréstimo apenas para a ocasião. Quando Perotti voltou, porém, foi para valer: titularíssimo no triangular-semifinal da Libertadores de 1978, realizado em setembro com Atlético Mineiro e River, El Mono foi premiado exatamente na decisão em casa, já em novembro. 

O Deportivo Cali tinha consigo dois argentinos de peso: o artilheiro da competição, o ex-gremista Néstor Scotta, e o técnico, ninguém menos que Carlos Bilardo em início de nova carreira. Após o 0-0 na Colômbia, porém, a Libertadores viu a maior goleada de uma final: 4-0 em La Bombonera. Perotti era mais caracterizado por ser bastante veloz e ágil com alguma habilidade e atrevimento mesclados do que por gols em demasia (a despeito de ser tachado de individualista), mas teve a noite da sua vida: coube ao ponta abrir e fechar o placar histórico.

No primeiro gol, completou de primeira um cruzamento rasteiro de Ernesto Mastrángelo pela direita para deslocar o goleiro; no outro, com oportunismo, roubou a bola do distraído zagueiro Henry Caicedo, que acabara de receber do goleiro. Dali a uns meses, em 18 de abril o primeiro Perotti estreava na seleção, primeiramente de modo não-oficial – em amistoso contra o clube Gutiérrez, em Mendoza.

As seis Libertadores do Boca, carregadas por Perotti, Mouzo, Salinas, José Basualdo, Rolando Schiavi e Marcelo Delgado

El Mono substituiu no intervalo o campeão mundial Oscar Ortiz e marcou o último gol dos 5-2. Uma semana depois veio a estreia oficial, em 2-1 amistoso contra a Bulgária na capital federal. No mês seguinte, mais duas partidas: outra não-oficial, contra a seleção cordobesa, repetiu o placar de 5-2 – Perotti entrou aos 20 minutos do segundo tempo no lugar de Félix Orte no dia 9. No dia 25, esteve no 0-0 com a Irlanda em Dublin.

Perotti não chegou a ser mantido para a Copa América, mas renovou sua faceta talismã na Libertadores ao marcar um dos gols no 2-0 na semifinal com o Independiente, o bicho-papão da década no torneio. Na final, porém, o Olimpia desbancou o bicampeão seguido. Até então, Perotti ano a ano não marcara em mais de três jogos diferentes do campeonato argentino entre 1977 e 1979. Os gols aumentaram a partir de 1980. Foram oito, incluindo em dois Superclásicos, um deles sendo o único do jogo. O Boca, porém, continuando enfrentando um ligeiro jejum nacional pendente desde 1976.

A saída foi buscar o empréstimo da revelação Diego Maradona junto ao Argentinos Jrs, que rendeu na imediata conquista do Metropolitano de 1981 – não que tenha sido fácil. O poderio ofensivo se concentrou em Maradona e em outro reforço badalado, o veterano Miguel Ángel Brindisi. Mas Perotti, mesmo com seis gols, deu sua contribuição providencial.

Só seis pais e filhos defenderam a Argentina, incluindo os Verón e os Simeone. E também os Perotti

Afinal, foi com gol do Mono que o Boca garantiu na antepenúltima rodada a suada vitória de 1-0 sobre o concorrente direto, a surpresa Ferro Carril Oeste, que então liderava e terminou ultrapassado: lançado por Maradona, provocou a avalanche na Bombonera após ganhar a corrida do marcador Mario Gómez e completar com um toque sutil suficiente para vencer a saída do goleiro Carlos Barisio, tudo a dez minutos do fim.

O título só seria garantido na última rodada por exatamente um ponto de vantagem. O clube manteve-se no páreo no Nacional e Perotti inclusive marcou um gol no 2-1 nas quartas-de-final com o Vélez, marcadas pela expulsão de Maradona. Com esse desfalque, o time acabou eliminado no jogo da volta. Também sem Dieguito, concentrado com a seleção para a Copa de 1982, o clube morreu ainda na primeira fase do torneio seguinte.

No segundo semestre de 1982, o ponta foi repassado ao Atlético Nacional treinado pelo argentino Miguel Ángel López (ex-defensor daquele Independiente dos anos 70) e que tinha ainda o defensor Miguel Ángel Bordón, ex-colega de Boca. Não se adaptou e voltou em dois meses, reestreando em 8 de agosto de 1982 – havia Libertadores à vista. Mas não foi feliz, sofrendo sua lesão mais séria que lhe custou dois anos de inatividade.

O recordado gol decisivo para o título de 1981, no duelo direto contra o Ferro Carril Oeste

Só voltou a campo em 1984, em cinco amistosos de fevereiro a março e um único jogo oficial, no 0-0 com o Racing de Córdoba em maio. Outro ano inativo depois, tentou retomar a carreira no Gimnasia LP, que voltava à primeira divisão para a temporada 1985-86 após ausência desde 1979. A estreia de Perotti pelo Lobo foi exatamente diante do Boca, em 20 de julho de 1985, pela quarta rodada. Nada auspiciosa: mesmo em La Plata, foi surrado por 6-0 pelos velhos colegas. Bichado, só atuou uma vez mais no futebol, já em 20 de outubro, no 1-1 com o Chacarita.

Com apenas 26 anos, a carreira estava encerrada, sem lembrar a relativa longevidade do filho: integrante da base do Boca, embora depois se formasse no Deportivo Morón, Diego Perotti pôde até defender esparsamente a seleção ao longo de nove anos: como jogador do Sevilla, estreou pela Albiceleste em 14 de novembro de 2009 e jogou outra vez em 2011. Ausente da Copa do Mundo de 2010, Perotti filho inclusive arranjou um empréstimo ao Boca no primeiro semestre de 2014, enfim cumprindo um sonho infantil – em transferência também estratégica para se repor no radar à Copa 2014. Mas não deu: também atrapalhado por lesões, só jogou duas partidas, em que seu tempo em campo, somado, sequer chegou aos 90 minutos.

Já pela Roma, Diego Perotti voltou a ter oportunidades na seleção após seis anos, em 2017, participando de três amistosos na virada para 2018. Porém, continuou de fora de uma Copa. Ainda assim, até a estreia de Giovanni Simeone meses depois, os Perotti seguiam como último caso de pai & filho pela Argentina (após Vicente de la Mata pai e Vicente de la Mata filho; de Juan Ramón e Juan Sebastián Verón; de Eduardo e Santiago Solari; e de Rubén e Luciano Galletti). Que também saibam usar isso para comemorar o dia de hoje!

Outro ângulo do gol no Ferro e o filho Diego: pais e filhos também pelo Boca

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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