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Elementos em comum entre São Paulo e Talleres

Julio Buffarini: para as duas torcidas, um esforçado

São Paulo x Talleres abre a temporada de duelos “brasentinos” nas competições sul-americanos de 2019. Hora de relembrar os elementos em comum entre o Tricolor e La T.

Ambos se gabam de reunir na sua cidade a maior quantidade de troféus internacionais, algo marcante nos anos 90. Em 1999, o time de Córdoba obteve a última edição da Copa Conmebol, em boa fase que culminaria ainda em sua primeira (e única, até agora) participação na Libertadores, em 2002. Já a década do São Paulo dispensa apresentações: além do bi mundial e da Libertadores, uma taça cada na Supercopa, na Recopa, na própria Copa Conmebol e na Copa Conmebol Master pararam no Morumbi.

Se os anos 90 trouxeram prestígio internacional, os 70 marcaram os dois times nacionalmente e aí reside a coincidência mais incrível, relativa ao torneio nacional de 1977 nos dois países: tanto no Brasil como na Argentina, ele só foi finalizado no início do ano seguinte. Representou ao São Paulo seu primeiro título brasileiro, e, para o Talleres (que continua sem títulos na elite), o mais perto que chegou de uma conquista argentina – perdeu na mais épica final doméstica que o país já viu.

A boa fase foi reconhecida na Copa do Mundo ocorrida meses depois: cada time cedeu três jogadores. O São Paulo (com Zé Sérgio, Chicão e Valdir Peres) foi o mais representado nos canarinhos, ao lado de Ponte Preta e Palmeiras. Já o Talleres foi o segundo na Albiceleste, junto de Huracán e Independiente. A turma de Luis Galván, José Daniel Valencia e Miguel Oviedo ainda teve Humberto Bravo riscado no último corte e só foi menos numerosa que os cinco do River.

Até então, as maiores façanhas da dupla se resumiam aos campeonatos paulista e cordobês, inclusive por força de circunstâncias alheias ao poderio da dupla: foi só a partir de 1968 que equipes de Córdoba passaram a ser autorizadas em torneios argentinos – que, apesar do nome, ainda eram restritos de modo oficial à Grande Buenos Aires, La Plata, Rosario e Santa Fe; e só em 1959 é que surgiu um primeiro torneio nacional de clubes no Brasil (calhando ao São Paulo atravessar larga fila entre 1957 e 1970, quando os Estaduais eram classificatórios).

Nesse contexto de muita valorização dos certames regionais, ambos foram campeões nos torneios paulista e cordobês em 1945, 1948, 1949, 1953 e 1975. O outro único ano a render taça oficial a ambos foi o de 1998, com os tricolores levantando o Estadual no clássico com o Corinthians e os tallarines vencendo de modo especial a segunda divisão argentina, também em clássico, com o Belgrano (rivalidade que reúne a maior quantidade de dérbis realizados no país).

Aos tricolores que rumarem a Córdoba, uma dica: no peculiar sotaque local, a sílaba reforçada é a anterior, se houver, à sílaba que a gramática castelhana determina como tônica (um exemplo é a pronúncia “cordôbes” para cordobés); e o dígrafo LL não é lido como os sons portugueses de “j” ou “dj”, característicos do sotaque portenho; tampouco com o som de “lh” ordenado pela academia espanhola; e sim como “i” – fazendo com que a grafia Taieres, lida como “Táieres”, não raramente seja usada em textos informais para designar o Talleres (que significa “Oficinas”, seção da ferrovia cujos trabalhadores formaram o clube, sendo falso o cognato com o termo talheres).

Gustavo Albella, dos anos 40 e 50, é o grande ídolo em comum das duas torcidas

Passemos, enfim, a quem esteve nos dois:

Gustavo Albella: era admirado por um jovem Che Guevara no Sportivo Alta Gracia, no interior cordobês, quando foi incorporado ainda aos 17 anos pelo Talleres. Tornou-se tallarin em abril de 1943 e em duas temporadas marcou 29 gols em 36 jogos oficiais. Campeão cordobês em 1944, ano em que o time também chegou às semifinais da Copa de la República (uma Copa Argentina da época), destacou-se naquele ano sobretudo ao desequilibrar um amistoso mesmo: foi contra o Boca, campeão argentino naquele mesmo ano, mas surrado por 7-3 em outubro – com o jogo ainda em 2-2, Albella marcou o terceiro e o quarto de La T, nos dez minutos finais do primeiro tempo.

Assim, El Atómico terminou contratado no ano seguinte pelo próprio Boca, mas não sobrepujou o concorrente Jaime Sarlanga, já estabelecido como ídolo ali – Sarlanga, afinal, foi o segundo maior artilheiro profissional boquense no século passado. Albella só veio a ganhar destaque no campeonato argentino como jogador do Banfield: é o maior artilheiro desse clube e com ele quase foi campeão de 1951 (a equipe terminou empatada com o Racing e perdeu o jogo-extra, ficando muito perto de furar o oligopólio estabelecido de 1930 a 1967 em que só os “cinco grandes” argentinos venciam o campeonato). Ele e seu colega Nicolás Moreno foram então contratados pelo São Paulo. Moreno não vingou, mas Albella engatou boa dupla com Gino.

Albella, como tricolor, também acumulou mais de meio gol por jogo (47 em 81) em passagem que durou de 1952 a 1954 – incluindo um no jogo decisivo pelo Estadual de 1953, na vitória de 3-1 sobre o Santos; curiosamente, o triunfo teve também outro gol argentino (nacionalidade que também pertencia ao treinador, Jim Lopes), de Juan José Negri.

Julio Buffarini: o lateral nasceu em Córdoba e é torcedor tallarin, estreando no futebol adulto ainda aos 17 anos, em 2006, vindo da base albiazul. Muito jovem, foi poupado de maiores críticas e reconhecido pelo esforço demonstrado em meio ao primeiro rebaixamento de La T à terceira divisão argentina, em 2008. Prosseguiu a carreira gradualmente por Atlético Tucumán e Ferro Carril Oeste até ser pinçado por um San Lorenzo ameaçado de rebaixamento e ali ficar no ciclo redentor – que começaria na fuga épica da queda (em salvação que custou a vaga do Instituto de Córdoba, por sinal – onde estava o jovem Paulo Dybala), no emocionante título de 2013 e na primeira Libertadores vencida pelos azulgranas.

Seu técnico na conquista continental era Edgardo Bauza, que, seis meses após chegar ao São Paulo, o traria ao Tricolor, embora a estreia do lateral ocorresse precisamente no último jogo de Bauza antes do treinador assumir a seleção. Em um ano e meio no Morumbi, o esforçado Buffarini não virou ídolo e tampouco comprometeu, cavando no fim de 2017 uma transferência do Boca. Bauza também fez dele o primeiro são-paulino convocado pela seleção, embora Buffa não tenha chegado a entrar em campo.

Joao Rojas: o equatoriano é uma ponta terrível para conclusão de jogas, mas ótimo para servir colegas. Foi essa a tônica de sua passagem pelo Talleres, exatamente na temporada que devolveu La T à Libertadores, no torneio de 2017-18. Estava emprestado pelo futebol mexicano e foi em seguida redirecionado ao São Paulo. Uma séria lesão, porém, comprometeu sua afirmação. Ainda sem poder atuar, não enfrentará os velhos colegas.

Clique aqui para relembrar os argentinos do São Paulo, em nota de 2017. E aqui para conhecer o cenário futebolístico de Córdoba, cidade onde os grandes também são quatro – ou cinco, dependendo do ponto de vista.

O ponta equatoriano Joao Rojas integrou a campanha que pôs o Talleres nessa Libertadores, mas, lesionado há meses, por hora não fará valer a “lei do ex”

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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