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Roberto Ferreiro: bem mais que o técnico do primeiro Mundial do Independiente

Comemorando com o goleiro Santoro a vitória sobre a Internazionale no primeiro jogo do Mundial Interclubes de 1964. Mas os italianos levariam a melhor. Ferreiro, já como treinador, e Santoro estariam juntos quando esse título enfim veio, em 1973

Foi só na quarta tentativa que o Independiente, já àquela altura o maior vencedor da Libertadores, enfim saboreou um título Mundial. A honraria de ser o comandante na façanha coube a Roberto Oscar Ferreiro, que hoje faria 85 anos. O que seria suficiente para alçar El Pipo no panteão do clube foi só a cereja do bolo de quem já era ídolo de antemão, tendo sido um firme lateral-direito com dez anos de serviços prestados, entre 1958 e 1967 – período em que seu sempre fino bigodinho arqueou sorrisos por três títulos argentinos e as duas primeiras Libertadores do Rey de Copas, a lhe credenciaram para a titularidade da Argentina no Mundial de 1966. Além do mais, venceu La Copa igualmente como técnico do Rojo, na quinta conquista (contra o São Paulo), sendo o comandante mais querido da torcida na famoso tetra seguido logrado nos anos 70.

E pensar que ao ser promovido oficialmente da base para o time adulto, em 12 de novembro de 1958 (vitória fora de casa sobre o San Lorenzo, pela 22ª rodada), a atmosfera em Avellaneda era de um jejum de dez anos longe de ser resolvido por um time que terminaria só em oitavo pelo segundo ano seguido – enquanto a taça, naquele ano, iria ao vizinho Racing. De início, concorria com David Acevedo, mas logo firmou-se como o rude marcador do flanco direito da defesa. Em tempos em que só os laterais brasileiros se projetavam ao ataque, Ferreiro se limitava a ser marcador dos pontas adversários; nunca fez um só golzinho em seus 346 jogos oficiais distribuídos entre os 241 pelo Independiente e o restante pela seleção e ainda pelo River.

Ele minimizava esse fato, conforme declarou já em 2004: “eu era um jogador importante na marcação e chegava até três quartos [do campo], porque em minha época não se costumava ir buscar o gol com os defensores. Além disso, eu era marcador de ponta-esquerda e havia um montão de pontas-direitos perigosíssimos, os principais pontas iam por esse lado, desde [Oscar] Corbatta até [Raúl] Bernao, passando por [Luis] Cubilla, assim não podia me distrair. Era muito consciente das minhas limitações. E ainda sem meter nunca um gol me senti muito respeitado por meus companheiros”.

A famosa imagem de Ferreiro saudando a torcida argentina no Maracanã em 1964. Ao meio e à direita, ele nos vestiários do estádio: comemorando o triunfo sobre o Santos e cumprimentado pelo cavalheiro Pelé

A seca nacional do clube enfim terminou em 1960. Outrora exigente de um futebol vistoso, a torcida aceitou um futebol pragmático para terminar à frente de quem realmente encantou naquele certame, os Bichos Colorados do Argentinos Jrs, na única vez que esse time postulou o título antes dos anos 80. Os doze anos gerais de jejum ainda são a maior seca que o Independiente já teve, mas o encerramento abriria uma década das mais vitoriosas. Não de imediato na Libertadores: na edição de 1961, o clube caiu logo no primeiro duelo (o torneio já começava em mata-mata na época), derrotado nos dois jogos contra o Palmeiras. “Disputa-la nesse momento era outra coisa, como um torneiozinho mais. Depois da comoção que o Boca produziu [em 1963], todos se motivaram a ganha-la. Era a obsessão, o grande passo para jogar o Mundial”, declarou ele em 2014, ao ser reunido com velhos colegas pela revista El Gráfico na comemoração dos 50 anos do primeiro título do clube e do futebol argentino em La Copa.

A ressaca pelo desjejum de 1960 ainda parecia ser alta e o time despencou para sexto em 1961, vendo o Racing ser o campeão. O Independiente teve um morno quarto lugar em 1962, mas o tecnicamente limitado Ferreiro pôde enfim ser contemplado com uma estreia pela seleção, em 1-1 amistoso contra o Chile dentro de Santiago em 7 de novembro. Em 1962, o lateral também enfrentou pela Albiceleste o Boca, em amistoso não-oficial em 18 de dezembro que festejava o recente desjejum auriazul na liga (oito anos, em disputa direta com o “inimigo” River), antes de ser confirmado para a Copa América a se realizar em março de 1963 na Bolívia. A Argentina não foi campeã e sim a anfitriã, mas Ferreiro trouxe dos Andes um amuleto local do qual não se separaria.

Em abril, o lateral deu-se ao gosto de vencer o Brasil por 3-2 em São Paulo pela Copa Roca e ao fim do ano ele e colegas de Independiente reconquistaram o torneio argentino, concorrendo com o River. Focado na caminhada rumo à final da Libertadores, o Boca só foi cuidar-se no torneio quando enfrentou o arquirrival na reta final e venceu-o mesmo fora de casa, permitindo que o Rojo disparasse e, adiante, terminasse campeão. Não foi mesmo fácil, pois houve até troca de técnico no terço final da campanha, com Armando Renganeschi (outrora ídolo de Fluminense e São Paulo) caindo após 4-0 sofrido no Clásico de Avellaneda e dando lugar a Manuel Giúdice. Seria só mais um título se não catapultasse o clube, enfim, à posição de Rey de Copas. O Independiente não apenas venceu a Libertadores em 1964 como também emendou um bi seguido em 1965, derrotando a dupla Nacional e Peñarol nas respectivas finais.

Pela Argentina antes do jogo contra a França em 1965 (Rattín, Ramos Delgado, Ferreiro, Roma, Albrecht e Marzolini; Luna, Rendo, Willington, Rojas e González) e celebrando a vaga nos mata-matas da Copa de 1966

Mas o grande momento talvez tenha sido virar para 3-2 no Maracanã a partida que era perdida por 2-0 para Santos – então detentor da taça e cujo técnico, Lula, não questionou a vitória argentina, linha adotada também pela própria imprensa brasileira, que preferiu criticar a grande apatia santista. Nessa reviravolta, El Pipo exibiu enormemente uma de suas qualidades: a velocidade com que se recompunha nas raras vezes em que sua perna forte não brecava um avanço adversário. Foi quando, atraído por Almir, descolou-se de Pepe, a quem a bola foi servida pelo “Pernambuquinho”. O técnico rojo Manuel Giúdice já lamentava um certeiro canhão de Pepe quando Ferreiro apareceu subitamente para tapar o chute, com a El Gráfico exaltando que a impressão era de que Ferreiro ainda estava junto de Almir e “um irmão gêmeo seu” é que neutralizou Pepe.

Ao fim, o lateral personificou como poucos o triunfo histórico, em fotografia em que ele e sua icônica camisa 4 saúdam a plateia visitante no Maracanã. Ele também mostrou uma versatilidade no jogo da volta, sem comprometer como zagueiro central após a expulsão de Guzmán: “[o ponta Raúl] Savoy foi [recuando] para a volância e El Negro Acevedo passou ao meu lugar, como lateral-direito, para marcar Pepe, um ponta-esquerda que tinha muita potência para chutar a gol”, descreveu em 2014, acrescentando que “o bom desse Independiente foi que, em sua maioria, éramos nascidos no clube e torcedores do Rojo. A maioria havia jogado nos juvenis e existia um grande respeito pelos mais velhos. Quando comecei a jogar no time adulto, Ernesto Grillo era a figura. Resultava tal minha devoção por Grillo que quando foi jogar na Itália, comprei sua casa com meus primeiros pesos porque quis viver onde havia morado meu ídolo”.

Ferreiro foi o único componente do setor defensivo a atuar em todas as partidas do bicampeonato na Libertadores, presente em todos os minutos da campanha de 1964 e também na de 1965. Miguel Ángel Santoro, goleiro titular absoluto em 1965, só assumiu a vaga de Osvaldo Toriani exatamente a partir das finais de 1964; Tomás Rolán, o lateral-esquerdo absoluto de 1964, sofreu uma lesão gravíssima da qual nunca se recuperou direito, fazendo com que em 1965 a vaga rodasse entre Ricardo Pavoni, Raúl Decaria e José Paflik. Por fim, a dupla de zaga de 1964 viu Ezequiel Bellavigna, Juan Carlos Guzmán e Héctor Zerilo se revezarem em uma das vagas enquanto a outra foi de modo absoluto do capitão Jorge Maldonado, que logo pendurou as chuteiras; para 1965, esse miolo foi sempre ocupado por Guzmán e por Rubén Navarro, que não pudera jogar em 1964 em função de uma fratura. Tanto em 1964 como em 1965, o Rojo sucumbiu no Mundial frente a Internazionale, mas o bicampeonato recolocou Ferreiro na seleção após passar todo 1964 ausente.

A volta olímpica carregando Osvaldo Brandão em 1967 foi o ato final de Ferreiro como jogador do Independiente. No River, chegou diversas vezes perto de nova volta, sem êxito

El Pipo voltou em um 0-0 com a França em Paris em junho de 1965, um mês e meio após o bi na Libertadores. No mesmo mês, também manteve a invencibilidade contra o Brasil no Maracanã, em novo 0-0 antes de atuar em três das quatro partidas da Argentina nas eliminatórias. Mesmo com uma sucessão de duas mudanças de técnico, Ferreiro foi confirmado para a Copa do Mundo de 1966, sendo titular absoluto em uma defesa notável: o outro lateral, Silvio Marzolini, seria eleito o melhor de sua posição na Copa, enquanto o miolo de zaga tinha Roberto Perfumo e José Albrecht, um dos dez maiores zagueiros-artilheiros do futebol. A Albiceleste vinha de duas eliminações seguidas na fase de grupos, em 1958 e em 1962, após boicotar politicamente o torneio desde a obscura participação em 1934. Assim, o avanço aos mata-matas na Inglaterra foi muito bem visto, a despeito da polêmica queda para os anfitriões.

O detalhe é que os hermanos, jogando com um a menos desde a controversa expulsão do capitão Antonio Rattín, só caíram nos dez minutos finais, quando sofreram o gol de Geoff Hurst, que também deveria ter sido expulso mais cedo, após falta forte exatamente em Ferreiro. A eliminação em Londres foi a involuntária despedida do já veterano (31 anos) lateral-direito pela Argentina. O ano de 1966 também marcou o fim do domínio do Independiente na Libertadores, perdendo para o River a vaga em nova decisão. Se em 1964 o Rey de Copas ainda foi vice-campeão argentino, o foco excessivo na Libertadores custou-lhe um horroroso 13º lugar em 1965 e um morno sexto em 1966 – enquanto o Racing era campeão no embalo de 39 jogos seguidamente invicto, então um recorde no profissionalismo.

Em 1967, o vizinho não só venceu a Libertadores como tornou-se o primeiro time do país a ganhar o Mundial – justamente sobre o time campeão europeu sobre La Grande Inter, o Celtic. Em tempos sadios da rivalidade, o primeiro clássico iniciou com pompa solene do Rojo em homenagem ao rival, que então teve as faixas impiedosamente carimbadas. Era a rodada final do Torneio Nacional e Ferreiro e colegas, treinados pelo brasileiro Osvaldo Brandão, ganharam de 4-0 para assegurar um título histórico: o aproveitamento de quase 88% nunca foi superado no profissionalismo. A volta olímpica carregando Brandão nos ombros foi também o ato final de Ferreiro como jogador do Independiente. Com 32 anos, não teve o contrato renovado e estendeu a carreira no River, que somava já o pior jejum de sua história na era profissional: desde 1957.

Independiente na virada de 1973 para 1974, anos dos títulos sob Ferreiro: Pavoni, Martínez, Giuliano, Merlo, Otero, López, Bertoni, Gay, Garisto e Ferreiro; preparador físico D’Ascanio, Mendoza, Santoro, Arispe, Bochini, Galván, González, Palomba e Sá; Saggioratto, Cabezal, Commisso, Maglioni, Raimondo, Balbuena, Semenewicz e massagista Las Heras

Em 1968, o clube esteve duas vezes no páreo, mas caiu nas semifinais do Metropolitano para um San Lorenzo também histórico (treinado por outro brasileiro, Tim, o Ciclón tornou-se o primeiro campeão invicto no profissionalismo) e teria vencido o Nacional se um gol não fosse evitado em cima da linha pela mão de um zagueiro do concorrente Vélez, que terminaria pela primeira vez campeão da elite. El Pipo tinha assinado por um ano, mas agradou e o vínculo se estendeu por mais dois. Mas a má sorte em Núñez seguiu de modo incrível: por mais que desse liga, o time deixava a taça escapar de algum jeito. Em 1969, o Millo voltou ao páreo tanto no Metropolitano como no Nacional. No primeiro semestre, eliminou o Boca nas semifinais, mas perdeu a decisão por 4-1 diante do modesto Chacarita, campeão pela única vez ali.

Já no fim de 1969, uma bela arrancada permitiu ao River chegar à rodada final com chances de título desde que vencesse em casa o Boca, o que forçaria um jogo-extra com o rival. Começou perdendo de 2-0 e, por mais que buscasse o empate, a igualdade propiciou a volta olímpica dos auriazuis (ironicamente treinados pela lenda Alfredo Di Stéfano) em pleno Monumental. Ferreiro seguiu até meados de 1970, quando a amargura foi perder o título do Metropolitano por um mísero gol a menos nos critérios de desempate exatamente para o Independiente. O lateral então fez um breve pé de meia no Millonarios de Bogotá antes de voltar para casa. Ingressou na comissão técnica do Independiente, assumindo a direção dos juvenis, e aproveitou o passado no River para cooptar dois ex-colegas millonarios para o Rojo: Francisco Sá e Miguel Ángel López virariam pilares em Avellaneda.

El Pancho Sá, inclusive, viria a ser o jogador mais vezes campeão da Libertadores. O bom olho do Pipo detectou ainda um jovem Daniel Passarella, tratando de assegurar-lhe verbalmente para os juvenis do Independiente antes que se constatasse que o período de inscrições já havia se encerrado. Assumiu o time principal pela primeira vez em 1972, inicialmente como interino na 11ª rodada do Metropolitano, em 16 de abril – quando uma escalação com seus juvenis levou de 6-0 do Rosario Central ao passo que os titulares bem como o real treinador, Pedro Dellacha, trabalhariam dali a apenas 48 horas pelas semifinais da vitoriosa Libertadores. O título continental viria ao fim de maio e o técnico Dellacha acabaria seduzido por proposta do Celta de Vigo, permanecendo apenas até um 2-1 sobre o rival Racing em 8 de julho, pela 22ª rodada. Na 23ª, Ferreiro já assumia a prancheta e foi efetivado.

Com o Independiente na Indonésia em 1975, entre Eduardo Commisso e Ricardo Pavoni, e em outro clube onde ficou adorado, o Nueva Chicago campeão da segundona em 1981

Inicialmente, o ídolo parecia verde. O time outra vez teria o baque de um vice-campeonato no Mundial Interclubes, em setembro, e fez uma campanha medíocre no Torneio Nacional, acomodado com a vaga automática que teria na Libertadores de 1973 como detentor do título. Mas o período serviu para Ferreiro pinçar para o time o desconhecido ponta Daniel Bertoni, então na segundona pelo Quilmes; e, diante da venda do pulmão José Omar Pastoriza ao Monaco, firmar o juvenil o volante Rubén Galván – ambos futuros campeões da Copa de 1978, na qual Bertoni inclusive marcou o último gol. Mas para disputar novamente a Libertadores, a diretoria contratou Humberto Maschio e recolocou Ferreiro na direção do time sub-19. Maschio, como jogador, fora ídolo do Racing (tal como Dellacha, diga-se) e inclusive vencera o torneio pelo vizinho como ponta na edição de 1967. Terminou fazendo história ao vencer o torneio também pelo Independiente – se tornando inclusive o primeiro a faturar a Libertadores como jogador e técnico.

Mas o passado racinguista impedia Maschio de cair totalmente nas graças do novo clube e terminou saindo pouco após a façanha, indignado ao ser suspenso pelos próprios cartolas ao não se entender sobre locais de treinamento. Assim, a chance de disputar o Mundial caiu (novamente) no colo do Pipo, ainda que a rigor o tira-teima pudesse ser questionado por enfrentar-se o vice europeu ante a desistência do Ajax. A Juventus não se inibiu com a condição de intrusa e deixou claro que também desistiria se o troféu não fosse disputado em jogo único dentro da Itália. “Era isso ou nada. A Comissão Diretiva, então, nos pediu que decidíssemos o que queríamos fazer. Nem duvidamos em aceitar”, lembrou Ferreiro nos vinte anos da conquista, em 1993, descrevendo que “a equipe estava bem equilibrada, tínhamos garotos jovens e jogadores experientes” e que “o que acontece é que a esta equipe só faltava isso. Já havia ganho tudo. E estava muito mentalizada”. 

Uma jogada da dupla dinâmica Bertoni e Ricardo Bochini (firmado de vez entre os titulares a partir da segunda gestão de Ferreiro, após relativa sequência inicial sob Maschio e oportunidades apenas esporádicas sob os antecessores Dellacha) rendeu no único gol comemorado no estádio Olímpico de Roma, onde ninguém da imprensa argentina compareceu ante a descrença generalizada de que a taça escaparia. Taça que teve seu primeiro desfile público no jogo pós-título seguinte: um Clásico de Avellaneda na casa adversária e vencido por 3-1, valendo ressaltar que o gesto não foi visto como provocação no contexto da época; a própria torcida da Academia, retribuindo as gentilezas de 1967, aplaudiu os vizinhos. Detalhe não menor: com aquela vitória, o Rojo passou o rival em número de vitórias no duelo para não mais perder essa dianteira – atualmente acumulada por volta de duas dezenas de triunfos a mais.

Festa de 20 anos da primeira Libertadores do Independiente, em 1984, reproduzindo a icônica saudação do Rojo: Santoro, Bernao, Guzmán, Acevedo, Santiago, Rodríguez, Mori, Zerrillo, Maldonado, Suárez, Paflik, Rolán, Mura, Ferreiro e De la Mata

Tal como em 1972, o Independiente fez uma campanha de meio de tabela no Nacional de 1973. E também no Metropolitano de 1974. Mas agora Ferreiro tinha carta branca para seguir à frente do clube na edição de 1974 da Libertadores, desenrolada no segundo semestre. Triunfando sem dificuldades sobre o belo Huracán do técnico César Menotti e o cascudo Peñarol no triangular-semifinal, o Rojo levou a melhor em outubro contra o São Paulo na decisão, sendo resiliente até contra gás de pimenta usado pela polícia paulistana na intimidação no Pacaembu. Ferreiro não se amedrontou: “as falhas nos custaram caro, mas eles são frouxos atrás. Lá em Avellaneda vamos pisa-los”. Assim, um ano após Maschio, Ferreiro virou o segundo campeão da Libertadores como jogador e treinador. Em novembro, a taça erguida foi a da Copa Interamericana, tira-teima com o vencedor da Concacaf, o Municipal da Guatemala. O Mundial, por sua vez, postergou-se ante à indefinição quanto à participação do Bayern Munique ou não. Finalmente, o vice Atlético de Madrid topou já em fevereiro de 1975. Era a chance da equipe argentina isolar-se à frente de Racing e Estudiantes como bicampeã mundial. Mas em abril, os espanhóis, turbinados inclusive com vários hermanos, venceram.

O “vice contra o vice” e os resultados ruins no Metropolitano custaram o cargo de Ferreiro, com Dellacha regressando para treinar toda a campanha vencedora da Libertadores em 1975 – mas, mesmo duas vezes vencedor do torneio, seu passado racinguista e o de Maschio acabaram por contribuir para que Ferreiro se impregnasse no inconsciente coletivo rojo como o grande comandante no período do tetra seguido em La Copa, embora só tenha efetivamente trabalhado em uma das edições. Ainda em 1975, trabalhou no Belgrano e rodou na elite pelos pequenos Atlanta, Unión, Quilmes e Atlético Tucumán antes de angariar prestígio eterno em outro clube: foi campeão da segunda divisão de 1981 com o Nueva Chicago, colocando pela primeira vez a equipe do bairro de Mataderos na elite profissional (desde 1931 o Torito não enfrentava os principais times do país). Após passar também pelo Deportivo Morón em outra passagem pela segundona, Ferreiro teve em 1985 uma terceira passagem como técnico do Independiente.

Era o retorno mais messiânico possível para a diretoria ante a ida de José Omar Pastoriza (outro campeão no Rojo na Libertadores como jogador e técnico, conseguindo isso exatamente em 1984) para o Fluminense. O toque de Midas não voltou e Pastoriza, desiludido com promessas não cumpridas dos cartolas cariocas, não tardou a acertar seu retorno a Avellaneda. Ferreiro limitou-se às divisões de acesso, ganhando a terceira divisão de 1989 com o Villa Dálmine até ter um último trabalho na temporada 1997-98 pelo Arsenal, ainda uma equipe do “mundo ascenso”. Até chegar em Sarandí, El Pipo teve trajetórias paralelas também por Lanús, Deportivo Armenio, Sarmiento de Junín, Sportivo Italiano, Deportivo Laferrere e Chacarita, que não afastam outra imagem do inconsciente coletivo rojo: a de uma vida inteira dedicada ao clube, onde voltaria no século XXI como membro da mutual de ex-jogadores e coordenador da equipe B, que era inclusive apelidada de La Piponeta tamanho o seu envolvimento. Seu falecimento a cinco dias do 82º aniversário em 2017 foi uma das baixas sentidas em um ano continentalmente festivo como nos velhos tempos.

Em 2008, celebrando os 35 títulos do Mundial: Ferreiro, Santoro, Maglioni, Balbuena, Commisso, Galván, Bochini e Sá. E em 2014, nos 50 anos da primeira Libertadores: Guzmán, Santoro e Ferreiro atrás, Acevedo e Mura à frente
https://twitter.com/afa/status/1254055060255805441
https://twitter.com/Independiente/status/1254143565770502159
https://twitter.com/MuseoRiver/status/855266493059051520
https://twitter.com/NuevaChicago/status/855068938945912832
https://twitter.com/VillaDalmineOK/status/855118536888512512

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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