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Nos 30 anos sem o Muro de Berlim, relembre os jogadores argentinos de origem alemã

Walter Kannemann foi o primeiro que a seleção argentina importou do Grêmio – por sinal, um clube cujos primórdios foram fomentados pela comunidade alemã

A data de 9 de novembro de 1989, há exatos trinta anos, marcou o século XX. Exatos 51 anos depois da trágica Kristallnacht (e cerca de 66 depois do Putsch da cervejaria), a preceder a carnificina-mor na guerra que terminou dividindo a Alemanha, era a vez de celebrar a queda do infame Muro de Berlim. Sob esse gatilho, vale relembrar os numerosos jogadores argentinos com ancestrais alemães, no sentindo abrangente do termo, sem descartar os possivelmente provenientes pelo caminho entre a Áustria e o velho Império Russo (cujos chamados “alemães do Volga” também emigraram em peso à Argentina), a título de exemplo.

A lista abaixo é (salvo casos expressos especificados na descrição) assumidamente especulativa, tal como matérias similares a escoceses, a irlandeses, a ingleses, a franceses, a húngaros, a bascos, a catalães, a croatas, a árabes e até aos diversos povos da antiga União Soviética – região que, além dos tais alemães do Volga, também continha ancestrais de alguns outros sobrenomes germânicos do futebol argentino, de judeus asquenazes (emigrados em demasia tamanha dos pogrons que a expressão El Ruso tornou-se comum na Argentina para designar judeus); para eles, já dedicamos este Especial próprio. Como com todos esses povos, os alemães não deixarem de se miscigenar com nativos, podendo-se notar na lista uma boa variedade de jogadores com fenótipo mais indígena do que “ariano”, especialmente nos que atuaram dos anos 60 em diante (basta um Google Imagens nos Leeb ou em Fischer, Albrecht, Dreyer, Houseman, Müller, Goltz, Kranevitter…). Uma ironia histórica quando se sabe da triste acolhida que criminosos nazistas tiveram no mesmo país que tanto abrigou de igual modo a judeus e Oskar Schindler.

Sobre os confrontos entre a Argentina e a Alemanha, também já publicamos um Especial à parte, destacando o curioso retrospecto geral favorável à Albiceleste ao passo que nas Copas a freguesia se inverte (inclusive em favor da antiga Alemanha Oriental também); há ainda o que relembrou os 25 anos da final de 1990 e o que listou os argentinos que já defenderam o clube alemão que melhor apostou em hermanos; é o Hamburgo, o que inclui os argentinos mais adaptados à Bundesliga: Sergio Zárate, irmão mais velho da família de atacantes do Vélez, e, principalmente, o meia Rodolfo Cardoso, que soube defender a seleção vindo não só dos Dinossauros como também do rival Werder Bremen.

Se o vizinho Uruguai teve no extinto Deutscher (depois Teutonia e por fim Montevideo) um dos clubes fundadores de seu campeonato, na Argentina o clube mais proeminente com alguma influência alemã nos primórdios é o Newell’s, cujas cores negra, vermelha e branca remontam à antiga bandeira do Império Alemão – pátria natal de Anna Jockinsen, esposa do educador britânico Isaac Newell homenageado no nome.

Atualização em 25-03-2021: nesse dia, pela primeira vez um argentino defendeu uma seleção alemã, com a estreia do cordobês Mateo Klimowicz pela equipe sub-21 da Mannschaft. Ironicamente, esse meia-atacante não tem origens germânicas e sim polaco-ucranianas, mas herdou a cidadania alemã que seu pai, o ex-atacante Diego Klimowicz, adquiriu por tempo de residência contínua entre Wolfsburg, Dortmund e Bochum.

Vamos, enfim, a alguns nomes chamativos do futebol argentino, alguns provavelmente já narrados pelo locutor Mariano Closs, sinônimo de transmissões da Libertadores:

Gottlob Weiss: veloz ponta-direita do Alumni, o bicho-papão do futebol argentino na primeira década do século XX. Até hoje, só os cinco grandes (Boca, River, Racing, Independiente e San Lorenzo) superaram os dez títulos dos alvirrubros que inspiraram o uniforme do Estudiantes. Weiss participou dos primórdios da seleção, em trajetória que durou de 1903 a 1910, iniciada ainda como jogador do Barracas Athletic. Seu filho Haroldo teve certo renome no tênis nos anos 40 e 50, casando-se com outra tenista prestigiada: Mary Terán de Weiss, afinal, nomeia a quadra usada pela delegação nacional nos jogos em casa da Copa Davis (recebendo em 2018 também as Olimpíadas da Juventude), homenagem póstuma a quem suicidou-se após severos boicotes a todos os esportistas com imagem atrelada a Perón.

Marius Hiller: único a defender as seleções de Alemanha e Argentina e um dos dois únicos no futebol a jogar antes por uma seleção europeia e depois em uma sul-americana (a nível de seleções principais); o outro foi o ítalo-uruguaio Roberto Porta. Nascido próximo a Stuttgart, jogou três vezes pela Mannschaft entre 1910-11 antes de emigrar à Argentina. Artilheiro do campeonato argentino de 1916 em um dos últimos torneios de futebol disputados pelo seu Gimnasia y Esgrima de Buenos Aires, foi então usado duas vezes oficialmente pela Albiceleste. Uma delas rendeu um recorde no clássico com o Uruguai, abatido por 7-2. Em dois jogos, o alemão anotou quatro gols, tendo junto da lenda Guillermo Stábile (de oito gols em quatro jogos, todos na Copa de 1930) a melhor média absoluta da história da Argentina! Passaria ainda por All Boys e River e se radicaria no país, falecendo em Buenos Aires em 1964.

Adolfo Heisinger: nascido em Tigre em 30 de maio de 1898 e falecido lá em 31 de outubro de 1976, El Alemán conciliava os esportes náuticos tão populares naquela zona como, é claro, o futebol como um hábil e bastante veloz ponta-direita do clube de mesmo nome – ainda sediado naquela cidade antes de mudar-se em 1935 para a de Victoria. O Tigre foi seu único time em uma trajetória dilatada no amadorismo argentino, em ligação que permaneceu como técnico, dirigente e depois como caseiro do estádio. Pôde estrear na seleção quando ainda tinha 18 anos, em plena edição inaugural da Copa América, em 1916.

Ernesto Kiessel: El Alemán teve uma das mais meteóricas histórias de superação na Argentina. A primeira partida oficial desse goleiro histórico do Huracán foi no campeonato argentino de 1919: levou de 7-0 do Boca, mas já em fevereiro de 1920 fazia sua primeira e única aparição na seleção (e sem sofrer gols, vencendo por 1-0 um amistoso com o Uruguai), algo ainda inédito a um goleiro huracanense. Defenderia o arco do Globo até 1923, participando dos dois primeiros títulos argentinos do time do bairro de Parque de los Patricios.

Weiss no Alumni. O alemão Hiller pela seleção argentina. Heisinger, o faz-tudo do Tigre. E o goleiro Kiessel, do primeiro Huracán campeão

Heinrich Theelen: oficialmente, é o único alemão a jogar profissionalmente na Argentina (Hiller o fez no amadorismo). Marinheiro sobrevivente da batalha do Rio da Prata, a primeira grande batalha naval da Segunda Guerra Mundial (ainda em 1939), ele e diversos colegas aportaram primeiramente em Montevidéu enquanto seu navio Graf Spee era afundado pelos britânicos. Com passagem pela base do Borussia Mönchengladbach, não perdeu tempo e se alistou no Unión, que faria sua estreia na liga argentina exatamente em 1940 (na segunda divisão), após toda uma história restrita à liga municipal da Santa Fe – cujas estações de trem receberam 200 alemães só em 29 de março daquele ano, alguns possivelmente ancestrais de outros nomes do futebol santafesino nessa lista. Fez seu primeiro jogo inclusive em amistoso contra o River. Seu nome foi até castelhanizado para Enrique Thellen (com dois L ao invés de E), mas a dura barreira linguística e uma lesão inoportuna impediram que somasse mais de um único jogo oficial, justamente o primeiro do Tatengue na liga argentina. Embora tenha falecido em Colônia, na Alemanha Ocidental, em 1973, havia se radicado na Argentina (inclusive tendo um filho exatamente em 1945), trazendo após a guerra sua família para morar no novo país, onde residiu em diversas províncias.

Juan Hohberg: filho de um estancieiro alemão que se fincara em Córdoba, ele cresceu em Rosario após a precoce perda paterna, começando no Central Córdoba (clube rosarino, apesar do nome) antes de despontar no Rosario Central. Foi importado em 1948 pelo Peñarol, onde se consagrou pelos doze anos seguintes, despedindo-se dos aurinegros pouco após levantar a primeira edição da Libertadores, em 1960. Sem poder ser naturalizado a tempo pelo Uruguai para a Copa de 1950, pôde ser aproveitado pela Celeste na de 1954 – protagonizando seu momento mais célebre, ao marcar dois gols que forçaram prorrogação contra a temível Hungria, emoção que até lhe desacordou após um infarto (!). Já dedicamos este Especial a El Verdugo. Ele se estabeleceu depois no Peru, onde faleceu e cuja seleção foi defendida por um neto, Alejandro Hohberg, de feições já mais incas do que teutônicas.

Ángel Schandlein: volante ou lateral que, revelado no Boca, teve seus melhores momentos no Gimnasia LP dos anos 50. Pelo time de La Plata, serviu a seleção especialmente no primeiro semestre de 1957, quando foi titular na seleção vencedora da Copa América. Antes, em 1956, El Pocho já havia participado da primeira vitória da Albiceleste sobre o Brasil dentro do Maracanã. Estenderia depois a carreira pelo México, ganhando as Copas de 1964 e 1965 pelo América.

Juan Carlos Schneider: volante ou lateral de boa aplicação defensiva e repasse de bola ao ataque, calhou de pegar logo os três primeiros anos de jejum que o River vivenciaria – defendeu a Banda Roja de 1958 a 1961, jogando no período uma vez oficialmente pela seleção (em um 4-0 sobre o rival Uruguai na Taça do Atlântico de 1960). Se destacaria ainda no Huracán e no Platense, seus clubes seguintes.

O alemão Theelen no Unión. Hohberg pela seleção uruguaia na Copa de 1954. Schandlein pela Argentina campeã da América de 1957. Schneider no River

Ramón Müller: volante formado no Newell’s, desenvolveu a carreira adulta na França, integrando entre 1963 e 1966 os dois primeiros títulos franceses do Nantes – e também a primeira final desse clube na Copa da França e um título também na Copa da Liga Francesa. O meia Oscar Müller, seu filho, acabaria criado entre os canários e venceu três vezes a Ligue 1, além da primeira Copa da França do clube, entre 1977 e 1983.

Félix Leeb: El Gato era daqueles atacantes instáveis. Teve seus momentos no San Lorenzo, onde esteve de 1960 a 1962 sem conseguir se firmar, sendo repassado em 1963 ao Estudiantes. Ainda defenderia o Racing, além de camisas menores, sendo lembrado com carinho em especial no Quilmes do fim dos anos 60 – no elenco cervecero que tinha os jovens Ubaldo Fillol, Ricardo Villa (ambos campeões da Copa de 1978) e Juan Carlos Touriño, que defenderia Real Madrid e seleção espanhola.

José Rafael Albrecht: um dos maiores zagueiros-artilheiros do futebol a nível mundial, simplesmente, especialmente nas bolas paradas. Um dos seus gols catalogados foi anotado na final da última edição da Copa da República, a de 1959 (finalizada só em 30 de janeiro de 1960), entre os clubes campeões regionais, ignorados pelo campeonato argentino – que, apesar do nome, se restringia de modo oficial à Grande Buenos Aires, La Plata e Rosario. Seu Atlético Tucumán terminou campeão e Albrecht seguiria carreira inicialmente no Estudiantes, indo à Copa de 1962. Mas seria no San Lorenzo (que para tê-lo trocou-o justamente por Leeb, além de Carlos Cabrera) onde El Tucumano se consagraria. Esteve como azulgrana na Copa de 1966 e seria uma das figurantes do histórico título de 1968, na primeira vez em que um clube venceu de modo invicto um campeonato argentino no profissionalismo.

Roberto Telch: os cabelos cacheados lhe renderam o apelido de La Oveja (“A Ovelha”). Inicialmente um dos pontas do irreverente elenco do San Lorenzo apelidado de Los Carasucias (o outro era Narciso Doval, depois ídolo da dupla Fla-Flu), gradualmente foi recuado como um grande volante. Telch foi primeiramente o surpreendente talismã do título mais expressivo que a seleção teve até 1978, o da Copa das Nações em 1964, ao anotar dois gols em um 3-0 sobre Pelé & cia no Pacaembu. Depois, tornou-se um dos quatro profissionais com mais títulos pelo Ciclón, participando das quatro taças argentinas erguidas entre 1968 e 1974, ano em que esteve na Copa do Mundo da Alemanha. Também passaria pela dupla de Santa Fe no final da carreira, com brilho especial no Unión. Já dedicamos este Especial póstumo a Telch.

Rodolfo Fischer: colega dos dois acima naquele San Lorenzo de 1968, El Lobo era de fato filho de um teuto-brasileiro que possuía fazenda na fronteiriça província de Misiones, e o fenótipo indígena também escondia origem russo-polonesa pelo lado materno. Era o goleador daquele elenco apelidado de Los Matadores e também participou de parte do título do Metropolitano de 1972, antes de rumar ao Botafogo para anotar dois gols naqueles 6-0 no Flamengo pelo Brasileirão. Vendido aos cariocas durante a Taça Independência, tornou-se o primeiro utilizado pela seleção como jogador de uma equipe estrangeira. Mas a médio prazo isso tirou-lhe do radar e, apesar do brilho como botafoguense (e depois no Vitória), acabaria esquecido na convocação para a Copa de 1974. Segue como terceiro maior artilheiro do time do Papa, a apenas um gol do segundo, Rinaldo Martino. Já dedicamos este Especial a Fischer.

Antonio Rosl: grande ídolo no Gimnasia LP, elegemos esse zagueiro para o time dos sonhos do Lobo. Filho de um imigrante alemão, Rosl esteve na própria campanha que, ao lutar seriamente pelo título argentino de 1963, rendeu esse apelido ao clube. E o lateral soube chegar à Copa de 1966 mesmo passando a conviver com lutas contra o rebaixamento. Ainda como tripero, participou do vice na Copa América de 1967. Dali foi incorporado pelo San Lorenzo e de imediato cavou titularidade no histórico elenco de 1968. Também esteve em outro ano especialmente recordado, o de 1972, quando os cuervos se tornaram o primeiro time no país a faturar tanto o Torneio Metropolitano como o Nacional. Com a seleção, ele chegou a vencer a própria Alemanha Ocidental em Munique em fevereiro de 1973, mas foi esquecido nas eliminatórias e na convocação ao mundial de 1974.

Leeb pai no Quilmes e o San Lorenzo de 1968, com Albrecht (2º em pé), Rosl (4º), Telch (5º) e Fischer (2º agachado)

Enrique Wolff: revelado no Racing em 1967, ainda que sem integrar o elenco campeão da Libertadores e do Mundial, Quique brilharia em Avellaneda e também no River, a despeito de jamais se dar ao gosto de levantar troféus por algum. Capitão da Argentina na Copa de 1974, deixaria para ser campeão no Real Madrid, onde foi ídolo na metade final dos anos 70 antes de ser colega do jovem Maradona no Argentinos Jrs. Encerrada a carreira, graduou-se em jornalismo e virou um dos âncoras esportivos mais prestigiados da Argentina. Já dedicamos este Especial a Wolff.

Hugo Dreyer: queimado no River após uma expulsão precoce influenciar na goleada millonaria contra o nanico Chacarita na final do Metropolitano de 1969 (pois o time de Núñez chegava ao 12º ano de jejum, e seriam 18…), teve sua forra do futebol paranaense. Ídolo no Coritiba, cujo apelido de Coxa-Branca deve-se ao “quase-xará” Hans Breyer, ele rodaria pelo rival Athletico e também por Colorado e Londrina, dentre outros. Radicou-se no Estado.

Horacio Neumann: outro presente naquela final entre River e Chacarita, com desempenho diametralmente oposto. Afinal, não só esteve no lado campeão: foi em falta sobre ele que Dreyer foi expulso (ainda que a decisão da arbitragem tenha sido criticada com excessivamente rigorosa); e, sobretudo, foram de Neumann dois dos gols dos funebreros naquela goleada, incluindo os dois primeiros dos tricolores na decisão, abrindo a torneira. Viria a jogar no próprio futebol alemão quando a Bundesliga ainda era inóspita a argentinos, embora o ponta mal entrasse em campo pelo Colônia na estadia de 1972-75.

Mario Kempes: dispensa apresentações. El Matador tinha mais fenótipo italiano (seu outro sobrenome é Chiodi), mas deve o sobrenome, relacionado tanto ao campesinato como a um lutador (Kämpf, palavra alemã das mais conhecidas, ainda que por motivos sombrios, seria um cognato), a um antepassado alemão. Destacamos isso no Especial que dedicamos ao artilheiro do Mundial de 1978.

René Houseman: colega de Kempes na seleção em 1974 e 1978, El Loco seria neto de um alemão supostamente registrado na Argentina com grafia à inglesa – o sobrenome, pronunciado pelos hermanos do jeito castelhano mesmo (ele sempre foi “Ôusseman” nas locuções), teria em Hausmann seu equivalente no idioma de Goethe. Ponta endiabrado, já estreava na seleção seis meses após ser campeão da terceira divisão (pelo Defensores de Belgrano), reconhecimento meteórico jamais visto antes ou depois – afinal, àquela altura já brilhava no encantador Huracán campeão de 1973. Grande figura da Albiceleste na Copa de 1974, é quem mais a representou como huracanense. Daqueles jogadores cujo carisma o blindava até para torcedores adversários, já estava em etilicamente decadente quando deixou seu gol no polêmico 6-0 no Peru ou quando participou da última Libertadores vencida pelo Independiente, em 1984. Dedicamos este Especial póstumo a Houseman.

Wolff na seleção, Dreyer no Coritiba, Neumann no Chacarita e Kempes (à esquerda) com Houseman (à direita) na seleção

Oscar Regenhardt: um dos maiores ídolos do Unión. Afinal, o time alvirrubro de Santa Fe foi sua única equipe na Argentina. O aguerrido beque figurou no auge do time alvirrubro de Santa Fe, 4º colocado no Metropolitano de 1975 e vice no Nacional de 1979. Sua primeira passagem durou de 1975 a 1982, encerrada com uma importação pelo Málaga, onde chegou a ser eleito o melhor estrangeiro de La Liga em 1984. Ainda teve um breve retorno ao Tatengue na temporada 1986-87.

Ángel Tulio Zof: seus pais eram italianos, mas da região de Friuli (onde nasceu o quase xará Dino Zoff), vizinha à Áustria, a quem algumas áreas já pertenceram no passado. Ex-jogador sem maior relevo nacional pelo Rosario Central, começou a carreira de técnico justamente no rival Newell’s. Mas com o tempo virou a maior figura canalla na função. Afinal, era o comandante à frente das três últimas conquistas auriazuis no século XX: o Nacional de 1980, o campeonato de 1986-87 (deixando de vice o próprio Newell’s, ultrapassado por um elenco que acabava de vencer a segunda divisão) e a épica Copa Conmebol de 1995, devolvendo um 4-0 do Atlético Mineiro para superar nos pênaltis a disputa com Taffarel. Já dedicamos este Especial póstumo ao maior técnico do Central.

Rodolfo Zimmermann: após passar quase todos os anos 70 no Colón, chegou em 1979 ao Independiente, defendendo o Rojo até 1984 – embora já fosse mais uma opção de banco para os laterais Néstor Clausen (de origem suíça, El Negro Clausen já foi abordado nesse Especial referente aos helvéticos) e Carlos Enrique no elenco campeão de tudo entre 1983 e 1984. No período, foi cedido em 1982 para o Huracán e defendeu ainda o Blooming na Bolívia (1985-86) e o Ferro Carril Oeste de General Pico nas divisões inferiores.

Jorge Theiler: ídolo histórico no Newell’s, que o profissionalizou em 1983 para formar uma celebrada dupla de zaga com Jorge Pautasso. Não se limitava a defender, marcando volta a meia alguns gols. Foram 17 em 240 jogos, o suficiente para fazer dele o maior zagueiro-artilheiro da Lepra no século XX (era o maior até ser superado por Rolando Schiavi). Ficou até 1990, tendo papel especial no desafogo da conquista argentina de 1987-88, resposta imediata ao traumático vice para o arquirrival na temporada anterior, bem como na campanha finalista da Libertadores meses depois. Leproso fanático, inda teve uma segunda passagem em 1993 para encerrar a carreira.

Regenhardt no Unión antes de ser premiado na Espanha. O técnico Zof e os defensores Zimmermann e Theiler, campeões respectivamente no Rosario Central, Independiente e Newell’s

Carlos Leeb: filho de Félix Leeb, ex-jogador do Racing, Carlos profissionalizou-se justamente no Independiente, em 1987. El Gatito até participou do título argentino de 1988-90 mas nunca se firmou, rondando então por algumas outras camisas vestidas pelo pai: isso se deu no Estudiantes, no Chacarita, Banfield e Ferro Carril Oeste. Sua melhor fase se deu no Chaca e no Taladro: foram cinco anos em cada (1992-97 e 1997-2002, respectivamente), com média rondando o meio gol por jogo. Ganhou títulos de acesso em ambos e também no Ferro.

Gabriel Schürrer: revelado em 1989 no Atlético de Rafaela, tornou-se um símbolo no Lanús, que o contratou já no ano seguinte. Não evitou o rebaixamento na temporada de estreia, mas participou ativamente da ascensão sólida dos grenás. Calhou de sair em 1996 ainda antes da vitoriosa campanha na Copa Conmebol, sem deixar de vivenciar outras campanhas festejadas: após subir de imediato à elite em 1993, esteve nos bons Aperturas de 1993 (a dois pontos do título, ainda inédito para o clube àquela altura) e de 1995 e no Clausura 1996 (bronze em ambos), permeados com sua inclusão na seleção que participou da Copa América de 1995. Vendido ao futebol espanhol, ali esteve no único título do Deportivo La Coruña em La Liga, em 2000, e quase obteve a taça na temporada 2002-03 com a Real Sociedad. Teve um início promissor como técnico no seu Lanús, onde trabalhou de 2010-12, embora não decolasse em outros clubes posteriores.

Daniel Kesman: zagueiro de bom jogo aéreo, defensiva e ofensivamente, marcou época no Talleres, defendido entre 1989 e 1995. Embora não tenha evitado o primeiro rebaixamento da equipe cordobesa, em 1993, permaneceu para a glória imediata: marcou um gol decisivo no 3-1 para La T na segunda final pelo acesso da temporada seguinte, em pleno clássico local com o Instituto, devolvendo os alviazuis à elite.

Alejandro Kenig: atacante rápido e potente que foi colega de Kesman no Talleres, entre 1990 e 1993. Não foi a melhor fase do clube, a ponto de ele conseguir ser lembrado com destaque anotando 19 gols em 66 jogos oficiais.

Horacio Humoller: foram oito anos de Unión, divididos em duas passagens, de 1985-90 e 2002-03. O grande momento foi o acesso à elite na temporada 1988-89, garantindo em pleno Clásico Santafesino que serviu de duelo direto a ambos pela vaga, devolvendo o Tatengue à elite apenas uma temporada após o rebaixamento alvirrubro. El Alemán também se destacou no Talleres. Foram cinco anos em Córdoba, a incluir no currículo outro clássico convertido em final pela vaga na elite (contra o Belgrano, na temporada 1997-98), o título da Copa Conmebol de 1999 e o 4º lugar na tabela somada da temporada 2000-01 – que rendeu a La T sua primeira participação na Libertadores, para 2002.

Leeb filho no Banfield, Schürrer no Lanús e três do Talleres: Kesman (em pé), Kenig (agachado) e Humoller

Juan Esnáider: se Houseman teve o sobrenome grafado à inglesa na imigração, o antepassado desse atacante dos anos 90 teve à espanhola. Era Schneider (“alfaiate”) a grafia original. Juanito teve estatísticas curiosas: revelado no Ferro Carril Oeste, defendeu três vezes a Argentina, uma por cada clube diferente na Espanha – país onde brilhou primeiramente no Real Zaragoza campeão da Recopa Europeia de 1994-95, valendo-lhe uma transferência ao Real Madrid. Não vingou como merengue, mas através da capital estreou na Albiceleste. Rumou diretamente ao Atlético de Madrid, onde também ficou por uma só temporada, mas de melhor desempenho individual. Sua terceira aparição pela Argentina já se deu outra pelo Espanyol. Só faltou-lhe o Barcelona para “fechar o círculo”, mas não virou tanto a casaca. Ainda vestiu sem vingar as camisas do Porto, Juventus e River. A concorrência dura com Batistuta e Crespo e má fama quanto a seu temperamento o privaram de um lugar na Copa de 1998.

Federico Lussenhoff: raçudo lateral que sabia marcar e se projetar ao ataque, El Colorado (é ruivo), ao longo de uma carreira de quase vinte anos, chegou a passar por San Lorenzo e River. Mas destacou-se especialmente no Rosario Central, onde era titularíssimo na conquista da Copa Conmebol de 1995, no extinto Toros Neza que vivia no páreo da liga mexicana e no Real Mallorca vencedor da Copa do Rei em 2003. Mesmo a torcida do San Lorenzo lembra com carinho dele: além da entrega de sempre, marcou 9 gols em 61 jogos, ótimos números a um lateral (especialmente ao incluir entre as vítimas o rival Huracán), e sua venda ao Tenerife adicionou 5 milhões de dólares no cenário de crise nacional já sentida em 1998.

Patricio Graff: era o outro lateral daquele Rosario Central vencedor da Copa Conmebol. Foi logo importado pelo Feyenoord, onde sua estadia de quatro anos incluiu a última liga holandesa levantada em Roterdã até a temporada 2017-18, ainda que já não fosse peça-chave.

Víctor Müller: um ídolo do Colón noventista, daqueles atacantes apreciados no elenco mais pelo bom papel de pivô para um colega de área do que pela média de gols – foram 19 em 89 jogos pelo Sabalero. Ainda assim, deu-se ao gosto de vitimar tanto Boca como o River em vitórias na temporada 1995-96, que marcava o retorno do time de Santa Fe à elite após quatorze anos. Müller era um recém-chegado da terceira divisão do interior, onde se destacava no Patronato de Paraná, e não só ajudou ativamente a afastar os prognósticos de rebaixamento imediato como vivenciou a campanha que colocou os rubro-negros pela primeira vez em uma Libertadores (com o vice no Clausura 1997).

Claudio Graf: El Torito jogou em diversos clubes argentinos, sendo um atacante com bom número de gols por Colón (2000-02) e Lanús (2004-07), além de, ainda nos anos 90, defender em Avellaneda tanto o Racing como o Independiente. Também foi vira-casaca no Sul da Grande Buenos Aires, pois passara pelo Banfield (rival do Lanús) em 1995.

Esnáider, que jogou na dupla de Madrid. Graff e Lussenhoff em pé pelo Rosario Central antes da final da Conmebol de 1995. Müller no Colón e Graf, que jogou na dupla de Avellaneda

Gabriel Heinze: El Gringo (apelido que na Argentina tem mais sentido de camponês/interiorano do que de estrangeiro) foi um zagueiro notabilizado mais pela raça e entrega do que propriamente pela técnica. Mas o beque revelado no Newell’s soube ter um currículo respeitável de quem representou a Argentina como jogador de Manchester United, Real Madrid e da dupla rival francesa Paris Saint-Germain e Olympique de Marselha. Ainda deu-se ao gosto de vivenciar com seu Newell’s uma campanha quase finalista da Libertadores, em 2013. Outro exemplo de sobrenome pronunciado à espanhola, variando entre “Êinse” e “Rêinse” ao invés da leitura original em “Ráintz”.

Gabriel Loeschbor: lateral convertido em talismã na história do Racing, ao anotar o gol que encerrou sofrimento de 35 anos da Academia no campeonato argentino, no Apertura 2001. Poucos se lembram que vinha do Rosario Central e passaria ainda por San Lorenzo e River. Um irmão caçula, Emanuel Loeschbor, atua desde 2012 na liga mexicana, naturalizando-se.

Aldo Duscher: seus antepassados eram austríacos. Revelado juntamente com Heinze no Newell’s, esteve na reconquista portuguesa do Sporting Lisboa após dezoito anos (jejum que está para ser igualado pelo atual), em 2000. Mas foi pelos últimos anos de potência do Deportivo La Coruña que ele enfim chegou à seleção, embora seja mais lembrado por fraturar David Beckham e colocar em risco a participação do popstar inglês na Copa de 2002.

Germán Lux: formado na elogiada escola de goleiros do River, teve seu talento reconhecido pela seleção em 2005, quando foi o titular na Copa das Confederações após a campanha semifinalista da Libertadores. Em 2006, veio o inferno: suicídio de um irmão, ausência surpreendente na convocação à Copa do Mundo e perda da titularidade para Juan Pablo Carrizo. Ele voltou ao River após dez anos, em 2017 (após uma estadia particularmente longa no Deportivo La Coruña), mas foi precisamente um dos pontos falhos do Millo, dando lugar ao festejado Franco Armani no início de 2018.

Santiago Hirsig: ruína em um, glória no outro. Ponta ou meia, Hirsig viveu o rebaixamento do Huracán em 2003 e o título com o rival San Lorenzo no Clausura 2007 (único troféu azulgrana entre 2002 e 2013). Entre um e outro, destacou-se no Arsenal, ficando marcado pelo gol que atrapalhou as pretensões de título do Vélez no Apertura 2004.

O goleiro Lux e o camisa 6 Heinze em pé pela Argentina. Duscher ainda na seleção juvenil. Loeschbor comemora seu gol do título pelo Racing de 2001. Hirsig no San Lorenzo campeão de 2007

Matías Fritzler: meia com dez anos de Lanús, divididos em três passagens diferentes e com o primeiro título argentino do clube (Apertura 2007) no currículo.

Paolo Goltz: uma das promessas do belo Huracán quase campeão de 2009, chegando brevemente à seleção na época, sobressaiu-se também no Lanús campeão da Sul-Americana de 2013 antes de ser titular do Boca vice da Libertadores passada.

Sebastián Prediger: volante com momentos de brilhantismo no Colón na temporada 2008-09, rendendo transferência ao Porto e convocação à seleção de Maradona, embora não tenha dado o salto esperado. Isso incluiu uma passagem de poucos jogos também no Boca e com nenhum pelo Cruzeiro antes de recomeçar no Sabalero em 2011, sob empréstimo dos portugueses.

Walter Kannemann: dispensa apresentações no Brasil. Não são poucos os que consideram sua dupla com Geromel como a maior dupla de zaga da história do Grêmio. Foi como tricolor campeão da Libertadores de 2017 que ele tornou-se o primeiro jogador do clube a ser aproveitado pela seleção, embora já houvesse participado da histórica conquista inédita do San Lorenzo em La Copa, em 2014 – coroando a redenção de quem seguia no clube desde o quase-rebaixamento de 2012.

Matías Kranevitter: volante do River que reconquistou o continente após dezessete anos, participando da Sul-Americana de 2014 e da Libertadores de 2015 (terminando eleito para o time desse torneio), ano de sua estreia na seleção e de sua venda ao futebol europeu.

Marcelo Weigandt: lateral-direito profissionalizado pelo Boca nesse ano de 2019, ganhando sequência sobretudo a partir de julho.

Goltz e Fritzler (ambos em pé) no Lanús. Prediger no Colón. Kranevitter no River e Weigandt no Boca

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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