FP 10 Anos: Quem defendeu Boca, River e Vélez, o trio dos anos 90?
Esse Especial é para quem tem nostalgia pelos anos 90, onde não há muita margem para dúvida: Boca, River e Vélez formaram o trio de ferro da década no futebol argentino, dominando o campeonato e obtendo cada um mais de um título internacional. A quem não conhecia o contexto de “cinco grandes” que deixava o Vélez de fora (com a dupla principal acompanhada só de Racing, Independiente e San Lorenzo), havia de fato a ilusão de haver só três grandes, impressão corroborada por em dado momento o trio receber um patrocínio que a Cerveja Quilmes só estendida também ao time homônimo. Hora de relembrar quem foi xeneize, millonario e fortinero.
Essa matéria encerra o arco de Especiais diários que desde a terça-feira celebram os dez anos do Futebol Portenho. No dia do aniversário, relembramos quem esteve nas duas principais duplas do país (Boca & River e Racing & Independiente). Na quarta-feira, foi a vez de listar quem defendeu o trio de ferro da capital (Boca, River e San Lorenzo), e ontem resgatamos os que passaram pelo San Lorenzo e a grande dupla de Avellaneda – com bônus de incluir secundariamente todos os demais que trabalharam em pelo menos três grandes, exceto os já recordados ainda no mês passado, onde houve um Especial sobre Boca, River & Independiente e outro sobre Boca, River & Racing.
A listagem de hoje, por sua vez, permite constatar o seguinte dado: desde que o Vélez deixou de ser a partir da Era Carlos Bianchi (1993-96) um “clube simpático” de um único título argentino (ainda nos idos de 1968), somente dois estiveram no trio. Afinal, Boca x Vélez e Boca x River receberam mesmo aura de dérbis nos anos 90, com destaque especial às partidas de 1996 em que José Luis Chilavert marcou na dupla, em um gol do meio-campo contra as gallinas e dois em um 5-1 nos bosteros. Rivalidade que reconhecia a grandeza adquirida pelo time do bairro de Liniers, ainda que minimizada pelos puristas.
Foram ao todo naquela década oito títulos argentinos (1991, 1993, 1994, 1996, dois em 1997, 1999 e 2000), uma Libertadores (1996) e uma Supercopa (1997) para La Banda Roja; quatro títulos argentinos (1992, 1998, 1999 e 2000), uma Copa Master (1992) e uma Copa Ouro (1993), uma Libertadores e um Mundial (ambos em 2000) para a La Azul y Oro; e quatro títulos argentinos (1993, 1995, 1996 e 1998), uma Libertadores, um Mundial (ambos em 1994), uma Supercopa (1996) e uma Recopa (1997, sobre o River) para La V Azulada. Apenas o Independiente deu algum combate, com um título argentino e uma Supercopa em 1994 e uma Recopa e outra Supercopa em 1995, mas passando na mesma década a ter mais derrotas do que vitórias no retrospecto com o Vélez. Racing e o outrora “sexto grande” Huracán seguiam seus jejuns; o tradicional Estudiantes mostrava-se inferior ao vizinho Gimnasia, sendo até rebaixado em 1994; e só o Newell’s conseguia mais de uma taça (nos argentinos de 1991 e 1992).
As três torcidas puderam comemorar, além de 1993 (Copa Ouro ao Boca, Clausura ao Vélez, Apertura ao River), também em 2012 (Copa Argentina, Torneio Inicial e segunda divisão, respectivamente). Enfim, vamos aos nomes:
Alfredo Garasini: “um boquense alma e vida, um grande em todas as eras”, no resumo de seu perfil no site Historia de Boca. Prata-da-casa, foi de quase tudo: goleiro improvisado, zagueiro (seu primeiro posto), meia, atacante e ponta entre 1916 e 1929, além de bandeirinha (tempos em que cada time oferecia um), treinador (entre 1943-46) e assistente técnico – posto que ocupava quando faleceu em plena pré-temporada em 1950. A estadia de 1916-29 não foi contínua: começou em 1919 disputando a segunda divisão pelo Vélez, voltando à casa no cisma que criou dois campeonatos paralelos. O Fortín, que liderava a segundona, esteve entre os dissidentes e acabou repescado diretamente à elite para o torneio “pirata” (e justificou o acesso via escritório, ficando no vice-campeonato do primeiro torneio de elite que disputou) que, contando com River, Racing, Independiente e San Lorenzo, foi convalidado como oficial na reunificação das ligas, em 1927. O Boca permaneceu na liga da associação argentina reconhecida pela FIFA, sendo a grande força junto ao Huracán ao longo do cisma.
Garasa tratou de voltar para casa em grande estilo, sendo o artilheiro do elenco que obteve exatamente pelo campeonato “oficial” de 1919 (reiniciado do zero) o primeiro título argentino do clube. Ficar em ligas separadas não atenuou a rivalidade com o River, que tratou de obter já em 1920 também o seu primeiro título. Garasini começou aquele ano integrando o início do bicampeonato seguido dos auriazuis na sua liga, mas passou bem brevemente pelo Millo na campanha paralela – só figurou em uma única partida, uma derrota fora de casa para o Gimnasia por 1-0. O suficiente para não só ser o primeiro campeão argentino por ambos, mas também o único campeão pela dupla num mesmo ano. Voltou ao Boca em 1922 e esteve em todo nos seis primeiros títulos xeneizes na elite, ganhando como treinador os de 1943 e 1944 sobre a celebrada La Máquina do grande rival: seus 70% de aproveitamento no cargo ainda não foram superados por nenhum treinador efetivo no clube.
Joaquín Martínez: sua família é um raro exemplo de três gerações de integrantes da elite do futebol argentino. Dois sobrinhos dele, Carlos Martínez e outro também chamado Joaquín Martínez, defenderam o River nos anos 70. Já Juan Manuel Martínez, filho de Carlos e sobrinho-neto do primeiro Joaquín, formou-se no Vélez. Apesar de a influência familiar em El Burrito (que inclui o tio materno César Laraignée, colega dos irmãos Martínez no River) fazer dele um torcedor millonario, não hesitou em deixar a reserva do Corinthians para tentar mais vitrine na seleção argentina defendendo o Boca de 2012 a 2015. Seu tio-avô Joaquín uniu os três clubes no currículo. Primeiramente, o River, onde o patriarca dos Martínez tinha a concorrência descomunal no ataque da lendária La Máquina. Assim, só apareceu esporadicamente no time principal, que defendeu de 1943 a 1947, integrando o elenco campeão em 1945 e 1947.
Em 1948, Martínez passou ao Gimnasia LP, onde ganhou continuidade, acabando por ser contratado na metade do torneio de 1949 pelo Boca, que simplesmente lutava contra o rebaixamento. O atacante teve sua importância, marcando sete gols nessa luta, só encerrada na última rodada, em que ele deixou o seu no 5-1 sobre o concorrente direto Lanús. Porém, não rendeu tanto nos anos seguintes e em 1952 desembarcou no Vélez. Em Liniers, Martínez foi muito bem inicialmente, com dez gols em 1952 por um time que ficou a três pontos do pódio – uma enormidade para o contexto velezano na época. Mas murchou, com um só gol na grande campanha do vice-campeonato de 1953, a melhor do time até então. Ainda esteve em 1954 antes de voltar ao River para defender o time B do Millo, pendurando as chuteiras no Atlanta em 1957.
Vale citar ainda outra família numerosa que une Boca, River e Vélez – ou não. Trata-se dos irmãos Zárate: Sergio, Ariel, Rolando e Mauro defenderam o Fortín (Ariel, apenas como juvenil, profissionalizando-se no exterior antes de destacar-se em fim de carreira na Argentina defendendo o All Boys), com Roly tendo uma passagem millonaria e Maurito polemizando ao trai-lo pelo Boca no ano passado.
José Luis Luna: ponta-direita que também defendeu o Racing, mas brilhou bem mais sob a pouca pressão de times não grandes. Luna estava nos Bichos Colorados do Argentinos Jrs que brigou pela primeira vez pelo título argentino, em 1960, na campanha mais próxima da taça até consegui-la pela primeira vez (já em 1984). Embora a equipe do bairro de La Paternal tenha ficado em terceiro, esteve mais perto do campeão do que no vice logrado com Maradona em 1980. Foi então contratado pelo River, sem vingar: em 1962 já estava no Atlanta, que vivia sua fase mais forte, seguidamente se intrometendo entre os cinco primeiros. Como jogador do time do bairro de Villa Crespo, inclusive defendeu a seleção nas eliminatórias à Copa de 1966.
Em 1965, trocou o Atlanta pelo Boca e até foi campeão, mas não transcendeu como xeneize, rumando em 1968 ao Vélez. O time do bairro de Liniers não tinha ainda títulos na elite, pendência resolvida já no Nacional de 1968, com Luna titularíssimo e com cinco gols fundamentais: o do 1-1 com o River no triangular final, impedindo um provável título por antecipação do Millo, e os quatro nos 11-0 sobre o Huracán de Bahía Blanca, uma goleada a princípio exagerada que foi vital para adiante o Fortín ser campeão pelo melhor saldo de gols.
Rogelio Domínguez: goleirão formado no Racing, após vencer como titular a Copa América de 1957 (a última da Argentina até 1991) foi contratado pelo Real Madrid de Di Stéfano. Esteve na sequência de conquistas na Liga dos Campeões, mas na época jogar fora do país privava os jogadores da seleção e acabou de fora da Copa de 1958. Ele voltou à Argentina em 1962 para defender o River (onde já estivera nas divisões de base), sob a expectativa de que o clube se desfalcaria da lenda Amadeo Carrizo para a Copa do Mundo. Mas Carrizo, traumatizado como bode expiatório de 1958, negou a convocação e em seu lugar foi o próprio reserva. Assim, Domínguez jogou pouquíssimo no River, onde permaneceu até o fim de 1963.
Parecia estar no ocaso da carreira quando chegou em seguida ao Vélez, alternando-se com José Miguel Marín pela posição em seus dois anos como fortinero. Mas, tendo atuações elogiadas, reforçou o Nacional e com os uruguaios chegou à final da Libertadores de 1967 (justamente contra o Racing) antes de pendurar as luvas no Flamengo em 1969. Logo engatou uma carreira de técnico, fazendo o estilo boleiro, sendo benquisto por seus jogadores. Pouco apegado à aplicação tática, empregava um futebol ofensivo. Nessa função, chegou ao Boca em 1973 e durou no cargo até 1975, sendo reconhecido pelo futebol vistoso e elogiado, mas a falta de pragmatismo quando necessário impedia títulos: foi vice do Metropolitano em 1973 e terceiro em 1974 e 1975. Dos treinadores sem títulos no time, o ex-goleiro é que durou mais jogos (106) e tempo.
José D’Amico: criador em 1958 da Escola Técnica da AFA, era um prestigiado estudioso da preparação física e tática que ocasionalmente assumia o time principal, de modo normalmente interino. Nessa situação, comandou também a seleção, em 1961 e em 1963. No Boca, assumiu o cargo primeiramente por alguns jogos em 1960 após a queda de Carlos Sosa, voltando a ser preparador nas comissões de Mario Boyé e Vicente Feola, até substituir o brasileiro em 1962 e se dar bem: efetivado, foi o técnico do time campeão após expressivos oito anos, superando uma corrida acirrada contra o River, com direito a vitória histórica em Superclásico na penúltima rodada para isolar-se na liderança, e ainda foi campeão também nos torneios de times B e sub-19. Era D’Amico o técnico no início da campanha vice da Libertadores de 1963, quando pediu licença (Aristóbulo Deambrossi era o técnico nas finais com o Santos), renunciando de vez em 1964.
Em 1967, apareceu no River enquanto o Millo não arranjava um substituto definitivo à passagem ruim de Juan Carlos Lorenzo. Em 1968, já reaparecia no Boca como técnico principal de um ano sem títulos. No Vélez, foi técnico oficial por seis jogos em 1969 (com duas vitórias) até o Fortín efetivar um substituto para Manuel Giúdice, seu técnico do histórico título de 1968.
Carlos López: meia revelado pelo Excursionistas, apareceu no River em 1972. Teve continuidade no elenco vice-campeão, mas não firmou-se em Núñez e já em 1973 seguia carreira no Argentinos Jrs. Veio a deslanchar no Estudiantes vice nacional de 1975, quando os platenses acariciariam pela primeira vez algum título desde a Libertadores de 1970. Foi pincharrata até 1978, quando chegou ao Racing. Não virou ídolo, mas como racinguista recebeu oportunidades na seleção, incluindo na Copa América de 1979, concorrendo covardemente com Diego Maradona e Ricardo Bochini. Após vencer a segunda divisão com o Sarmiento em 1981, foi contratado pelo Vélez, jogando pelo Fortín os Nacionais de 1981 (semifinalista) e 1982. Depois de passar também pelo Millonarios de Bogotá, López foi contratado em 1984 pelo Boca, justamente no pior ano que o clube já teve. Só atuou treze vezes, sem marcar, reencontrando o sucesso no futebol boliviano.
Juan Carlos Lorenzo: antigo atacante sem maior transcendência no Boca, onde esteve de 1945 a 1947, El Toto Lorenzo virou um dos maiores técnicos do futebol argentino. Técnico da seleção nas Copas de 1962, chegou a passar depois pelas rivais Lazio e Roma. Voltou a treinar a Argentina em cima da hora para a Copa de 1966, e a boa campanha valeu-lhe um teste no River em 1967. Como tantos, falhou em tirar o time do jejum pendente desde 1957, em passagem esquecível. Começou a fazer história no San Lorenzo que em 1972 tornou-se o primeiro time argentino a faturar os dois campeonatos anuais (Metropolitano e Nacional).
Após boas campanhas no Unión de Santa Fe, Lorenzo chegou ao Boca em 1976 para, primeiramente, repetir ali a mesma façanha que tivera no Sanloré: títulos do Metropolitano e do Nacional no mesmo ano, com direito a final vencida sobre o River, a única em que os dois principais clubes do país travaram até 2018. Lorenzo foi depois o comandante dos dois primeiros títulos xeneizes na Libertadores e no primeiro no Mundial, entre 1977 e 1978. Após perder a Libertadores de 1979, encerrou seu ciclo e tentou vida nova no Racing em 1980. Foi apenas 10º, mas engatou um bom trabalho no Vélez. Ficou de 1981 a 1983, com 28 vitórias em 60 jogos e a presença nas semifinais de 1981 e no quinto lugar de 1982 e nas oitavas de 1983. Chegou a voltar ao Boca em fins de 1987, sem o mesmo sucesso de outrora.
Vladislao Cap: de origem romena e polonesa, o defensor figurou tanto na dupla Boca e River como na dupla de Avellaneda. Seu primeiro grande foi exatamente o Racing, de 1964 a 1960 (sendo campeão em 1958). Chegou ao River em 1962, indo à Copa do Mundo mas vivenciando nada menos que três vices para o Boca até sair em 1965, em meio ao terrível jejum suportado em Núñez entre 1957-75. Em 1966, rumou ao Vélez para disputar as últimas quatorze partidas da carreira, ficando a dois pontos do pódio por um clube ainda visto como pequeno no futebol.
Um dos três técnicos da Argentina na Copa de 1974 e com um título argentino pelo Independiente nessa função (em 1971), El Polaco conseguiria uma marca única anos mais tarde: virar como técnico a casaca diretamente entre Boca e River. Foi em 1982, quando trabalhou no primeiro semestre em um Boca à deriva sem Maradona, emendando um trabalho no River encerrado tragicamente: um infarto fulminante o matou em 14 de setembro de 1982, com ele recém-chegado.
Ricardo Gareca: já dedicamos este Especial à carreira de jogador de El Tigre. O atual técnico do Peru surgiu no Boca em 1978, mas tardou até o segundo semestre de 1981 para firmar-se. Em um time em crise, destacava-se como seguido carrasco do River a ponto de integrar a seleção, inclusive encerrando jejum de treze anos sem vitórias contra o Brasil. A crise, porém, já era crítica em 1984, quando o clube brigou não só para não cair como também para não fechar as portas. Gareca então forçou uma transferência ao River, virando para sempre persona non grata nos xeneizes. Ficou só um semestre em Núñez, suficiente para integrar o início da campanha campeã de 1985-86. Foi ganhar dinheiro no narcofútbol colombiano como artilheiro do América de Cali trivice da Libertadores.
No fim da carreira, acertou em 1989 com o clube do coração: o Vélez, deixando seus gols em campanhas boas que germinavam o elenco cascudo que venceria tudo a partir de 1993. O atacante não ficou para participar dos louros, saindo logo antes da primeira conquista da série, o Clausura de 1993, para integrar o Independiente. Em Liniers, o maior destaque viria como o técnico que devolveu a sequência de títulos só semelhante à da Era Bianchi: chegou em 2009 e de imediato levantou o Clausura em batalha direta contra o Huracán que tanto traumatizara ele e outros fortineros em 1971.
Na sequência, vieram novos títulos nacionais em 2011 (junto com uma semifinal de Libertadores), 2012 e 2013, até hoje o último troféu de La V Azulada. O resto é a história conhecida de quem fracassou no Palmeiras antes de reconhecimento total em retornar a seleção peruana à Copa do Mundo.
Oscar Ruggeri: já dedicamos esse outro Especial a El Cabezón. O zagueiro formou-se no Boca e de imediato conseguiu titularidade na zaga campeã do maradoniano Metropolitano de 1981. Porém, o clube logo foi afetado pela severa crise econômica do fim da ditadura, em parte pela valorização repentina do dólar (moeda usada na contratação de Diego) em mais de 200%. Campanhas cada vez piores se sucederam e os xeneizes ficaram muito próximos do rebaixamento e da extinção em 1984. Em meio à crise, Ruggeri e o Ricardo Gareca eram um oásis de bom desempenho, seguindo como jogadores da seleção. Mas o basta chegou e no início de 1985 ambos forçaram uma transferência ao River. Ruggeri não tardou a ser protagonista na histórica tríplice coroa lograda em Núñez em 1986, ano em que ganhou também a Copa do Mundo com a seleção.
Em 1988, ele transferiu-se ao futebol espanhol, com uma lesão tirando-lhe espaço do Real Madrid em 1990. Ruggeri seguiu carreira no Vélez, onde reencontrou o técnico Veira e o amigo Gareca. Como fortinero, foi o capitão da seleção argentina na ausência de Maradona, suspenso por cocaína e depois por opção técnica entre 1991 e 1993. Mas o estrelismo fez Ruggeri ser afastado em 1993 por Carlos Bianchi logo antes do vitorioso Clausura, acertando então com o San Lorenzo para fazer história: é o único a jogar pela seleção vindo de Boca, River e Sanloré e também o único campeão nesses três, participando do elenco treinado por Veira campeão em 1995. El Cabezón também é um dos dois únicos a defenderem a Argentina vindos de Vélez e San Lorenzo – o outro é o ex-flamenguista Agustín Cosso, dos anos 30, quando a rivalidade não havia.
Claudio Cabrera: formado no River em 1982, não emplacou em Núñez. Após só 24 jogos, um gol e campanha digna de rebaixamento em 1983, floresceu no Huracán como um oásis de talento na temporada que rendeu o primeiro rebaixamento desse clube, em 1986. Assim, El Chacho foi contratado pelo Vélez, pelo qual chegou à seleção olímpica em tempos de mais proeminência desse significado – os Jogos de 1988 só barravam quem já houvesse entrado em campo em uma Copa do Mundo. Porém, naquele mesmo ano, uma infeliz ruptura nos joelhos brecou uma ascensão maior. Após o bom campeonato de 1989-90, teve ainda uma boa temporada 1990-91 no Argentinos Jrs, a ponto de rumar em seguida ao Boca. Mas já estava bichado: contando amistosos, foram só dez partidas, ao longo do segundo semestre de 1991, todas sob infiltração. Ele logo estendeu às divisões inferiores uma carreira pontuada por 15 cirurgias.
Héctor Veira: além de ex-jogador de Palmeiras e Corinthians (ambos em 1976), El Bambino é querido exatamente em dois outros times que desenvolveram rixas particulares com o Vélez, o San Lorenzo (onde é o técnico com mais jogos e passagens, eleito oficialmente o maior ídolo da história azulgrana, no centenário em 2008) e o Huracán. Após ser vice-campeão em 1983 com um San Lorenzo que recém-voltava da segunda divisão, interessou ao River e fez história: era o jovem treinador da primeira tríplice coroa do futebol argentino, com os títulos em 1986 na liga nacional, que encerrava jejum millonario de cinco anos, na primeira Libertadores e do único Mundial do time de Núñez. Apesar da história, ele foi desligado em 1987 e voltou ao San Lorenzo para leva-lo às semifinais da Libertadores de 1988.
Veira então apareceu em 1989 no Vélez, treinando o time que unia os veteranos Ubaldo Fillol, Carlos Ischia e Ricardo Gareca aos jovens Alejandro Mancuso e Raúl Cardozo rumo a um quinto lugar a quatro pontos do vice. O trabalho rendeu-lhe uma oportunidade na liga espanhola com o Cádiz, mas já em 1991 voltava ao Vélez, tendo o mérito de promover dos juvenis o histórico Omar Asad. Com nove vitórias em dezessete jogos ao todo, foi interrompido por fatores extracampo, ao ter prisão decretada sob acusação de estupro (sempre negado) de um menor. Foi reabilitado pelo San Lorenzo em 1992, tirando o time em 1995 de um jejum de 21 anos na elite e seguindo até 1996 para então chegar ao Boca que, mesmo estrelado, não era campeão havia cinco anos.
Bambino Veira foi o último técnico de Maradona e, mesmo desfalcado de Dieguito na metade final do Apertura 1997, fez grande campanha, só superada por outras seis na era dos torneios curtos. Para seu azar, uma dessas vezes foi exatamente ali: o River, derrotado em casa no Superclásico, somou um ponto a mais. Uma sequência ruim em 1998 o afastou do cargo e Veira seguiu carreira na seleção boliviana. Já dedicamos ao Bambino esse outro Especial.
Jesús Méndez: ele também é o último a ter defendido o trio Boca, River e Independiente. Volante surgido no Millo em 2004, calhou de viver a entressafra sem títulos que vigorou dali até 2008, em quatro anos multiplicados por dois campeonatos anuais. Dispensado em 2006, Méndez se reencontrou no Rosario Central. No início de 2010 apareceu no Boca, mas nunca se consolidou: preferiu ser seguidamente emprestado ao Central mesmo com os canallas na segunda divisão, vencida enfim em 2013. Após o acesso com os rosarinos, parecia voltar em definitivo ao Boca, defendendo-o em um punhado de jogos no segundo semestre de 2013. Mas já em 2014 estava de volta à segundona, agora para defender o Independiente. Esteve no acesso e na boa campanha imediata no retorno à elite, ainda que a taça ficasse com o rival Racing – chegou a deixar seu gol em 3-0 no Clásico de Avellaneda. Ficou no Rojo até 2016 e seguia no Vélez que vem brigando contra o rebaixamento nas temporadas recentes. No mês passado, anunciou a aposentadoria.
Lucas Pratto: nascido em La Plata, torcia na infância pelo Boca, sendo captado por outro homem platense para o clube do coração – o ídolo xeneize Martín Palermo. No time principal, porém, Pratto se desencantou, somando somente 23 minutos ao longo de duas partidas pelo Apertura 2009, em dezembro (derrota de 2-1 para o Independiente e um 0-0 com o Huracán). Passou a ser sucessivamente emprestado, do Tigre ao futebol norueguês até apurar o faro de gol pelo Unión e pela Universidad Católica entre 2010-11. Já sem aceitar ser reserva no Boca, foi então vendido ao Genoa, onde também não se firmou. O time italiano preferiu empresta-lo ao Vélez, onde Pratto enfim explodiu de vez: foi o goleador dos últimos títulos argentinos do Fortín, em 2012 e 2013. Pratto seguiu em Liniers até 2015, e embora o clube já decaísse o atacante cavou transferência ao Atlético Mineiro.
O resto é a história conhecida dos brasileiros: o atacante destacou-se no Galo a ponto de enfim passar a receber oportunidades na seleção, sendo o primeiro atleticano e depois o primeiro são-paulino na Albiceleste adulta. Sem render tanto assim pelo São Paulo, acertou em janeiro de 2018 com o River visando recolocar-se no radar por uma vaga na Copa do Mundo. Chegou como a contratação mais cara da história millonaria e inicialmente não rendeu o investimento pago, não sendo cogitado para a Rússia. Mas teve revanche no momento mais importante, participando ativamente dos três gols que igualaram o placar aberto e ampliado pelo Boca nos Superclásicos que decidiram a Libertadores – anotando o primeiro na Bombonera e o primeiro no Bernabéu, além de forçar o gol-contra que empatou na casa rival, permitindo-se sair comemorando como “autor moral” do lance.
Faixas-bônus: formado no futebol do interior, Juan Gilberto Funes foi o talismã do River campeão pela primeira vez da Libertadores, reforçando a equipe já na fase semifinal para então marcar gols nas duas finais contra o América de Cali – ele já havia brilhado na Colômbia a serviço do Millonarios e o técnico Héctor Veira bancava esse fator psicológico. El Búfalo não precisava fazer mais nada, e os números frios contradizem a imagem que deixou no inconsciente millonario: foram só cinco gols em 29 jogos, embora até conseguisse testes na seleção já em 1987. Após passagem pela Grécia, soube ter números mais artilheiros no Vélez quinto colocado (e a quatro pontos do vice) da temporada 1989-90, doze gols em 25 partidas.
O bom momento em Liniers rendeu a Funes uma oferta do Nice, mas os franceses detectaram o problema cardíaco que levaria precocemente o atacante no início de 1992. Antes de partir, ele chegou a fazer pelo Boca um jogo-treino (daí não o termos considerado na cronologia regular), contra o Banfield, mas a doença impediu que a negociação avançasse. Sua longa agonia hospitalar foi acompanhada de perto até mesmo por Maradona, a bancar-lhe, comovido, o funeral. Contamos aqui.
Outro a trabalhar nos três foi Nery Pumpido. Já um goleiro de seleção desde os tempos de Unión, pelo qual fora vice para o próprio River no Nacional 1979, Pumpido foi contratado pelo Vélez no início de 1982. Mas não se juntou de imediato: embora fosse à Copa do Mundo como velezano, ocupou-se exclusivamente com a seleção junto com os demais convocados ao longo do primeiro semestre (a ideia de uma longa concentração havia funcionado em 1978 e foi reaproveitada). Fez somente em julho o primeiro de seus 78 jogos oficiais com o Fortín.
Em uma década de seca em Liniers, participou de algumas das campanhas mais razoáveis do clube – um 5º lugar no Metropolitano 1982 e um 4º no de 1983. O River, em paralelo, fora vice-lanterna desse torneio, salvando-se pelo promedio. E contratou Pumpido imediatamente. Saltou para o vice no Nacional 1984 e, sobretudo, para a tríplice coroa de 1986, ano em que Pumpido também foi titular da seleção na Copa do Mundo. Com missão cumprida, se permitiu ir à Europa em 1987. Com as luvas penduradas e fiel ao técnico que lhe dera titularidade na seleção, Carlos Bilardo, aceitou chamado dele para ser treinador de goleiros na passagem de Bilardo pelo Boca, em 1996 (“ninguém me dava trabalho. E Bilardo me chamou, não o Boca”, justificaria). Já lhe dedicamos este Especial.
Outros Especiais do tipo foram lançados entre 2012-15. Confira: Huracán-San Lorenzo, Boca-Racing, River-Independiente, Independiente-San Lorenzo, Racing-San Lorenzo, Racing-Independiente, River-Racing, Boca-Independiente, Boca-San Lorenzo, River-San Lorenzo, Boca-River I, Boca-River II, Boca-River III, Boca-River IV, Vélez-San Lorenzo e Boca-Vélez.
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