EspeciaisIndependienteLibertadores

Elementos em comum entre Santos e Independiente

Os efervescentes anos 60 marcaram a história de Santos e Independiente, que se seguiram um bicampeonatos nos (dois) primeiros títulos de seus países na Libertadores. Se o Rojo se gaba de ser o Rey de Copas, por muito tempo os praianos foram recordistas absolutos no Brasil pela competição na qual se enfrentam amanhã, nas primeiras oitavas-de-final que toda uma geração de torcedores do time argentino (ausente dessa fase desde a edição 1995) presenciará. Hora de lembrar os pontos em comum entre o clube de Avellaneda e o da Baixada.

Os anos de troféus para ambos reflete a potência que foram particularmente nos anos 60 e 70, com o ano de 1984 sendo um marco: os brasileiros adentrando em um largo jejum de títulos que prestigiassem e os argentinos conseguindo pela última vez a coroa máxima no continente (e no mundo). O ano de 2002 também revigorou ambos de jejuns consideráveis em nível doméstico – no caso do Independiente, oito anos, consideráveis a um time tão frequentemente campeão até os anos 80.

Eis os anos de glórias conjuntas: 1960 (Santos no Estadual; Independiente no Argentino), 1963 (Rio-São Paulo, Brasileiro, Libertadores e Mundial; Argentino), 1964 (Estadual, Rio-São Paulo e Brasileiro; Libertadores), 1965 (Estadual e Brasileiro; Libertadores), 1967 (Estadual; Argentino), 1973 (Estadual; Libertadores e Mundial), 1978 (Estadual; Argentino), 1984 (Estadual; Libertadores e Mundial), 2002 (Brasileiro; Argentino) e 2010 (Estadual e Copa do Brasil; Sul-Americana). Tantos troféus tornaram as duas torcidas exigentes por um futebol vistoso, que na Argentina é referido pelo jargão paladar negro.

Duelos diretos, porém, foram mais raros. Mas trazem bom agouro ao lado argentino, que sempre chegou no mínimo na final continental quando cruzou com os alvinegros. Os primeiros foram os mais importantes e os únicos até então pela Libertadores, válidos pela semifinal da edição de 1964. Nela, o Rojo conseguiu uma impensável virada de 2-0 para 3-2 em pleno Maracanã sobre o detentor dos últimos dois títulos.

Cenas do primeiro Maracanazo da Libertadores: Independiente 3-2 Santos, de virada, em 1964

O feito foi tamanho que foi a imagem dos argentinos nos vestiários cariocas (muito usados pelo Santos para mandar partidas na época) que estampou a capa pós-título da revista El Gráfico, e não alguma da decisão propriamente. Capa, aliás, histórica: foi a primeira capa dupla da revista. Escolhemos essa partida como a maior virada do futebol argentino. O jogo recentemente voltou à baila, após divulgações em que Julio Grondona gaba-se de ter influenciado a arbitragem.

Não é nada improvável, porém, que o chefão da AFA no mínimo estivesse confundindo datas: sequer era cartola do Independiente na época, quando ainda estava restrito nas divisões inferiores no seu Arsenal, muito longe do poderio que viria a adquirir no trânsito da AFA (quanto mais na Conmebol). Relatamos aqui que a imprensa brasileira e o técnico santista Lula admitiram na época que os argentinos jogaram melhor e que o alvinegro foi “medíocre” (palavra do Jornal do Brasil). O Santos jogou sem Pelé, condição que não o impedira de, igualmente sem Ele, ter vencido o Mundial em 1963. Mas, com o Rei em campo, levara do Rey um 5-1 naquele mesmo 1964, em amistoso que inaugurara a nova iluminação noturna do campo do Rojo.

Os outros seis encontros continentais seguintes foram todos válidos pela Supercopa, a competição que entre 1988 e 1997 existiu para reunir só campeões da Libertadores. Curiosamente, todos foram válidos pelo primeiro mata-mata. Na edição 1989, que o Independiente ficaria de vice do Boca, começou vencendo tanto na Vila (2-1) como na velha Doble Visera (2-0). No bi rojo de 1994-1995, o Santos esteve presente nas duas campanhas. Na primeira, a derrota de 1-0 no Brasil foi revertida com um impiedoso 4-0 em Avellaneda.

Já os jogos de 1995 exigiram pênaltis, após o 1-1 na Argentina ser seguido por 2-2 no Brasil. Filho do Rei, Edinho pegou as cobranças de Daniel Garnero e Diego Cagna, enquanto Faryd Mondragón só defendeu a de Jamelli. Porém, os santistas Robert e Capixaba também erraram e os argentinos avançaram dentro da Vila para uma campanha acidentada, mas certeira, que projetaria Mondragón mais vezes como herói.

O treinador brasileiro Osvaldo Brandão: adorado em Avellaneda, à direita

Muita gente renomada defendeu Santos e Independiente, mas nenhum conseguiu ser ídolo em ambos. Vamos aos nomes:

Vicente Rojas: obscuro nos dois times. Na Argentina, esse ponta-direita jogou no Independiente somente pelo time B, assim como no rival Racing. Isso não impediu que em outubro de 1939 já estreasse pelo Santos, mas já em março de 1940 teve sua inscrição cancelada pelos praianos.

Mario Evaristo: ele na realidade se chamava Marino, mas ficou mais conhecido pela grafia equivocada. Foi um dos maiores ponta-esquerdas do Boca, defendendo-o seguidamente de 1926 e 1931 e logrando no período três títulos argentinos, incluindo a última volta olímpica amadora (1930), emendada com a do primeiro torneio oficialmente profissional, em 1931; embalo que o fez ser titular da Argentina vice da Copa do Mundo de 1930. Mas, naquele título de 1931, já foi relegado a apenas seis partidas. Após passar inicialmente pelo Sportivo Barracas na liga amadora, voltou à profissional contratado em 1933 pelo Independiente. Só que Evaristo não se firmou em Avellaneda; foram só treze partidas na soma de duas temporadas, ainda que seu currículo cavasse uma transferência ao Genoa (então o maior campeão italiano) em 1935.

No fim de 1938, ele então apareceu na Vila ao lado de outros dois argentinos, o lateral Enrique Vernieres e o atacante Américo Menutti. Foram testados em um 2-2 amistoso contra o Flamengo em 3 de novembro. Evaristo precisou sair mais cedo por uma distensão, mas o trio teria agradado o treinador Fernando Giudicelli, que propôs um contrato inicial de três meses. Tudo parecia certo para seguirem na Baixada, mas a notícia de que Evaristo e Vernieres vieram a solicitar posteriores ajustes desagradou Fernando, que interpretou a atitude como descumprimento de palavra (algo mais sério naqueles tempos) e baixou o polegar à permanência da dupla (Menutti até permaneceu, mas acabou indo ao Vasco).

Osvaldo Brandão: o treinador conseguiu títulos outros três grandes paulistas, sendo raro ídolo em comum por Palmeiras e Corinthians, além de também ser benquisto na Portuguesa. Se a história não foi tão gloriosa no Santos, ainda distante da Era Pelé no fim dos anos 40, Brandão conseguiu no Peixe o vice-campeonato estadual de 1948, muito para o porte do time na época. No Independiente, foram duas passagens, em 1962 e em 1967. É glorificado especialmente pela segunda: adorado por seus jogadores, foi campeão com um belo futebol, com recorde de aproveitamento no profissionalismo argentino (87%) e com direito a um 4-0 na rodada final sobre o rival Racing recém-campeão mundial. Falamos aqui.

O anjo (ou pombo) caído Usuriaga: atrapalhado pelos cartolas no Brasil

Alveiro Usuriaga: El Palomo (“O Pombo”) foi um dos mais carismáticos jogadores para a torcida roja. Após diversas polêmicas na sua Colômbia e na Europa, chegou em 1993 ao Independiente, arrebentando nas conquistas do Clausura e da Supercopa no ano seguinte – na qual foi carrasco dos brasileiros, abatendo o próprio Santos naqueles 4-0, além de Grêmio (2-0) e Cruzeiro (dois em outro 4-0). Ainda venceu a Recopa em 1995, mas esteve no desmanche daquele timaço. Foi emprestado ao Barcelona equatoriano, que por sua vez o emprestou ao Santos sem consultar os argentinos em julho de 1996.

A Vila esperava um substituto para Giovanni e o colombiano, que inicialmente havia sido especulado no Botafogo, parecia promissor nos amistosos. Mas a irregularidade do empréstimo o fez ser usado só na estreia do Brasileirão: o Santos temia perder pontos e o meia-atacante foi devolvido ao Rojo. Voltou a tempo de, ainda no segundo semestre de 1996, ser vice no Apertura, e de sentir o cheiro do título no Clausura 1997. Mas não era o mesmo, somando sete gols em toda a temporada argentina de 1996-97. Se perdeu nas drogas e foi assassinado em 2004.

César Menotti: El Flaco era aquele clássico meia argentino de armação refinada, ainda que visto como lento. Chegou a defender a seleção como jogador. No fim dos anos 60, já estava em fim de carreira quando foi testado pelo Santos em 1968, após impressionar enfrentando-o pelo New York Generals em 12 de julho (portanto, já após o Estadual que algumas fontes errôneas indicam que Menotti teria ganho como santista), na partida de despedida do ídolo alvinegro Geraldino; o argentino, marcando gol, esteve na zebra vencedora por 5-3 no Yankee Stadium. Não foi aprovado (rumando ao Juventus da Mooca), limitando-se a participar apenas de um amistoso no interior paranaense contra o Cianorte – partida por vezes considerada como mero jogo-treino. Mas foi o suficiente para ele virar um argentino que vê Pelé superior a Maradona e Messi.

No Independiente, Sérgio Manoel foi visto poucas vezes com uniforme de jogo – a imagem central é sua figurinha em álbum da temporada 2004-05

Menotti não teve carreira muito campeã após treinar a Argentina na Copa de 1978, mas o bom futebol pregado convenceu o Independiente a contrata-lo em agosto de 1996. Embora ex-jogador do Racing, ficaria mais associado ao Rojo. O jogo bonito o fez ser adorado mesmo sem títulos (só troféus amistosos), vide imagem que abre a matéria, entre José Luis Calderón e Jorge Burruchaga. Teve três passagens como treinador, com dois vices argentinos, em 1996 e 1999, e um enganoso 4º lugar em 1997, no qual liderava a quatro rodadas do fim (quando deixou o clube para treinar a Sampdoria, após o 6-0, com gol de Usuriaga, sobre o então líder Colón que pôs o Rojo na dianteira). Também foi manager.

Sérgio Manoel: nascido em Santos e proveniente da base em 1989, o meia teve duas passagens como profissional pelos praianos, ainda no início da carreira. Como santista, defendeu as seleções de base, mas não chegou a ser um herói de época de vacas magras, longe do prestígio que conseguiria no Botafogo em meados dos anos 90. Em fim de carreira, veio do Figueirense para ser em 2004. Era uma aposta pessoal do maior técnico do clube de Avellaneda, José Omar Pastoriza. Porém, Pastoriza faleceu pouco depois e o brasileiro só ficou naquele segundo semestre, sendo pouquíssimo aproveitado pelo interino Daniel Bertoni (cujo cargo, aliás, seria ocupado por Menotti). A anedota mais contada é que se prejudicou também ao não saber quem é Ricardo Bochini.

Patricio Rodríguez: nos dois clubes, foi uma promessa ofensiva que não vingou. No Independiente, El Patito foi profissionalizado em 2008 e seguiu até 2012, não chegando a ser grande figura em uma Sul-Americana 2010 que ofuscou as campanhas ruins domésticas – que resultariam no rebaixamento do Rojo em 2013. Rodríguez já estava no Santos desde 2012. Um gol na estreia empolgou, mas o hype durou pouco. Prejudicado por Neymar tanto como concorrente de posição como impossível substituto à altura, foi repetidamente emprestado a partir de 2013 até o contrato acabar (incluindo pelo futebol da Malásia), em 2016. Hoje está na Austrália.

Clique aqui para relembrar os argentinos do Santos

Usuriaga e Menotti juntos no Rojo e o flop “Patito” Rodríguez

https://twitter.com/DaleRojoMAD/status/1028630554810503168

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

um × 2 =

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.