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Racing perde o capitão do time campeão do mundo em 1967: Oscar Martín

Nem Roberto Perfumo e nem Alfio Basile, a famosa dupla de xerifes, mas ainda jovens na casa dos 25 anos. E nem o veterano ídolo regressado, Humberto Maschio, quase dez anos mais velho. O capitão da Equipo de José, o elenco do técnico Juan José Pizzuti, o Racing que em 1967 deu ao futebol argentino um primeiro título mundial, era Oscar Raimundo Martín, falecido ontem. Em menos de um ano, é a quarta baixa que aquele time perde para outros planos alvicelestes.

Nascido em 23 de junho de 1934, Martín era só um ano mais novo do que Maschio, que por sinal fez 85 anos no último dia 10. El Cacho iniciou-se como meia-direita, mas sua entrega e capacidade de marcação foram melhor explorados na lateral-direita. Seu primeiro clube foi o Argentinos Jrs, em 1953, mas só começou a ser renomado no Chacarita, para onde foi em 1958. Os funebreros estavam na segunda divisão desde 1956 e, contando com um Martín que já se desempenhava como defensor, conquistaram-na em 1959.

O Chaca fez então campanhas seguras de meio de tabela até conseguir um ótimo quinto lugar em 1962. No ano seguinte, houve Copa América e a AFA decidiu, tal como o Brasil, levar uma virtual seleção C à Bolívia, no que representou uma oportunidade a peças daquele elenco tricolor. A Argentina terminou em terceiro, mas três jogadores convocados do Chacarita terminaram o torneio negociados para Avellaneda – sem eles, o clube despencaria para um último lugar ao fim do ano, livrando-se do rebaixamento apenas porque o descenso fora cancelado.

Enquanto os atacantes Mario Rodríguez e Raúl Savoy foram ao Independiente consagrarem-se ainda naquele ano campeões argentinos e das duas primeiras Libertadores do país em 1964 (foi de Rodríguez o gol do título) e 1965, Martín foi ao vizinho. Onde de início sofreu, conforme detalhou em novembro passado, quando a conquista mundial completou meio século. Para se ter uma ideia, um elenco praticamente igual ao que seria campeão do mundo ocupava a lanterna do campeonato argentino à altura de setembro de 1965, com 13 pontos somados em 18 rodadas. Assim Martín recordou à revista El Gráfico:

Chacarita campeão da segunda divisão em 1959. Martín é o último em pé

“Foi um momento bastante feio. Havia um montão de problemas institucionais, econômicos, de organização, e também no futebolístico. Um montão de coisas que se quer esquecer rápido. A situação começou a melhorar quando Pizzuti tomou a equipe. Ele e o professor Rufino Ojeda, preparador físico, foram os artífices de uma grande melhora que arrancou no futebolístico, porque não havia condução e o barco estava à deriva, mas a partir deles o clube começou a se organizar, começamos a tomar consciência do que podíamos ser”.

A tal arrancada foi mesmo fulminante: o Racing conseguiu terminar aquele campeonato em quinto, com só duas derrotas nos 58 jogos seguintes. Incluindo uma sequência invicta de 39 partidas, um recorde superado no torneio somente pelo Boca de Carlos Bianchi, a acumular em 1999 um triunfo a mais (parou nos 40). Embalo que fez o time ser com folga o campeão de 1966.

Martín também lembrou quando a derrota que encerrou a sua série veio: “poucos sabem, mas na única partida que perdemos em 1966, contra o River, o ônibus nos deixou a 15 quadras do campo deles, porque não podia entrar. Tivemos que caminhar pelas beirando os trilhos do trem, e chegamos no último instante ao vestiário”.

Foi em 1966 que Maschio chegou, mas a capitania que Martín forjou nos tempos complicados (que permaneciam na esfera financeira: na mesma reportagem, o colega Juan Carlos Cárdenas, autor do gol do título mundial, ressalvou que “o Racing estava nesse momento como esteve durante 40 anos: embora ganhássemos tudo, embora fôssemos primeiros, sempre nos deviam grana. Uma vez nos cansamos, fomos alguns à sede e agarramos o tesoureiro. Ele dizia: ‘não há grana, não há grana’. O Racing tinha uma caixa forte imensa e a teve que abrir para nos mostrar que não havia nada”) não seria questionada.

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Cejas, Basile, Perfumo, Martín, Chabay e Rulli; Cardoso, Maschio, Cárdenas, Rodríguez e Raffo antes da finalíssima mundial com o Celtic, em Montevidéu

Martín pendurou as chuteiras exatamente ao fim de 1967, ano em que a Academia superou-se para obter sua única Libertadores e também aquele Mundial. Pois houve ameaça de greve antes daqueles duelos contra o Celtic, no que os dirigentes entregaram um cheque, repassado ao capitão para ser sacado após a decisão e compartilhado entre os jogadores, como lembrou na mesma reportagem o colega Juan Carlos Rulli: “ganhamos aqui, ganhamos em Montevidéu e, quando voltávamos no avião, veio Raúl Prieto, excelente dirigente, e nos disse: ‘perdão, muchachos, mas não poderão sacar o cheque, porque não colocamos nenhum valor”.

A reportagem, que além de Martín, Rulli e Cárdenas também reuniu Maschio e os reservas Antonio Spilinga e Fernando Parenti, já havia ressalvado que, por questões de saúde e idade, Nelson Chabay e Jaime Martinoli não puderam se fazer presentes. Em julho, já havia se despedido o reserva Néstor Rambert, que também esteve no rival, onde foi o primeiro treinador de Sergio Agüero. Martinoli, artilheiro do elenco campeão argentino de 1966 que acabou na reserva em 1967 em função de uma lesão, faleceu exatamente em novembro.

No mês passado, foi a vez de outro lateral, Rubén Díaz, morto no mesmo dia em que a própria El Gráfico anunciou à beira do centenário o fechamento da revista impressa. Ao todo, entre 1963 e 1967 Oscar Martín deixou 172 partidas oficiais pelo Racing, sem gols.

Naturalmente, nem só de amargura foi aquela reportagem. No desfecho, Martín declarou que “a melhor coisa para mim é ter tido tantos anos os companheiros que tive. Não havia estrelas, não havia um Maradona, um Messi. Éramos todos nota 7 e, então, dávamos tudo. O que estava fora fazia mais força do que os que estávamos na titularidade. Passam os anos e a gente mais velha explica aos mais jovens quem fomos nós: essa é uma das maiores satisfações que há”.

Chabay, Basile, Maschio, Parenti, o nonagenário técnico Pizzuti, Cárdenas, Rubén Díaz (falecido mês passado) e Martín no festejo dos 50 anos do título mundial, no Cilindro, em novembro

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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