EspeciaisMundial de ClubesPrimeira DivisãoRacing

55 anos do primeiro título mundial do futebol argentino: o do Racing de 1967

“Ninguém pensou que ia pegar desde tão longe no Centenário. Maschio diz que gritou ‘chuta!’ para mim, mas eu nunca escutei”.

Se muito das cinco décadas passadas não ajudam muito, o Racing reforça seu orgulho no pioneirismo. Do primeiro campeão da elite argentina fundado fora da comunidade britânica, em 1913; do primeiro tetra, penta, hexa e hepta seguido no torneio (todos recordes ainda exclusivos), naquele mesmo ciclo de 1913-19; do primeiro tri seguido no profissionalismo (1949-51); do primeiro supercampeão sul-americano, em 1988. Nenhum comparado ao do primeiro time argentino campeão mundial. Façanha tamanha que rendeu aplausos e pompa até dos próprios rivais, em tempos de mais calmaria entre as torcidas. Alcançada naquele 4 de novembro de 1967 com um imortal chute de longa distância do autor da frase acima, falecido em março. Nos cumpre, assim, revisar, ampliar e atualizar esta nota, publicada originalmente no aniversário de 50 anos, em 2017.

Os anos 60 representaram o auge do Clásico de Avellaneda como um todo; somente o dérbi de Milão viu dois clubes de uma mesma cidade terem títulos internacionais. O Independiente venceu as primeiras Libertadores do futebol argentino, no bi de 1964-65. E naquele mesmo 1967, sob batuta do brasileiro Osvaldo Brandão, seria campeão argentino com um recorde de aproveitamento, em campanha encerrada com um 4-0 exatamente sobre aquele Racing recém-campeão mundial. Partida esta precedida com pompa inacreditável aos olhos de hoje: aplausos e desfile de mascotes carregados que seguravam os troféus internacionais que, na Argentina, eram até então exclusivos da dupla da cidadezinha de 300 mil habitantes. Veja abaixo:

Homenagens de River e até do Independiente após a conquista. Inimagináveis hoje.

Era nesse clima ainda cordial que os arquirrivais vinham trocando figurinhas. Em 1966, o Racing cedeu ao Independiente o volante José Omar Pastoriza, recebendo em troca Miguel Ángel Mori, bicampeão continental com os Rojos. Para Mori, era o destino: havia sido contratado pelo Independiente junto ao Sportivo Baradero, do interior. Ao chegar em Avellaneda, havia descido na frente do estádio racinguista até dar-se conta do engano e caminhar mais um quarteirão. Ele acabaria perdendo a partida de 50 anosa trás por um choque alérgico, mas declararia que o mundial “vale muito mais do que fiz no Independiente”.

Outro vira-casaca era brasileiro: João Cardoso havia chegado ao Independiente em 1966, mas uma lesão o afastou por meses. Acabou repassado ao vizinho. Em entrevista ao Futebol Portenho, Cardoso detalhou que “a transferência para o Racing foi discreta e tranquila, fui vendido normalmente, sem problema nenhum. Quando vieram falar comigo, já estavam acertados com o Independiente. Naquela época, até a rivalidade entre os clubes era normal. Quando a imprensa soube, eu já estava contratado pelo Racing”. Tampouco era incomum que torcedores de um deixassem em casa seu clubismo: o matador rojo Luis Artime, autor de dois gols naqueles 4-0, sempre foi assumido torcedor blanquiceleste, enquanto o treinador racinguista Juan José Pizzuti e seu caudilho Alfio Basile tinham coração bem vermelho em suas juventudes.

A “mãe postiça” dos jogadores, Tita, foi à Escócia após vaquinha entre eles: na foto, com Díaz e Basile. À direita, Basile na bronca em Glasgow, entre Lennox (n. 8), Wallace (9), Auld (10) e McNeill (5)

La Academia havia chegado em alto estilo ao cenário internacional, pois o título doméstico de 1966 foi fora do comum: foi no embalo de 39 jogos seguidamente invictos – um recorde só superado na Argentina em 1999, pelo Boca de Carlos Bianchi. Quem derrubou a invencibilidade foi o River, com quem La Acadé também cruzou no quadrangular-semifinal da Libertadores de 1967. Os de Núñez chegavam ao décimo ano de jejum e novamente levaram a pior. Adiante, a Libertadores foi vencida em agosto, com direito ao brasileiro Cardoso marcando um dos gols do título. E, assim como o futebol de Avellaneda, o escocês também estava em alta.

A seleção da Escócia, que até os anos 80 levava vantagem no seu clássico com a Inglaterra, havia mesmo vencido naquele ano dentro de Wembley os Three Lions recém-campeões mundiais, com direito a embaixadinhas de Jim Baxter – enquanto o Rangers foi naquela temporada 1966-67 finalista da Recopa Europeia, o segundo torneio europeu em importância. O rival Celtic, por sua vez, venceu a quádrupla coroa naquela temporada: em sua terra, o campeonato, a Copa e a Copa da Liga; e, no continente, a primeira Liga dos Campeões faturada por uma equipe do Reino Unido, que só dali a um ano veria um time inglês também conseguir o troféu. A quádrupla coroa (ou mesmo quíntupla, se considerada ainda a esquecida Copa de Glasgow) ofuscou outro pioneirismo dos alviverdes, que ali se tornaram também o primeiro time do continente a conseguir a tríplice, feito só igualado no século XX por outros três times antes de “banalizar-se” desde 2009, já na inflacionada era dos “superclubes”.

Jock Stein guiando Juan José Pizzuti nas instalações internas do Hampden Park. O cavalheirismo só voltaria ao apito final em Montevidéu

O oponente derrotado na final continental pelos chamados Lisbon Lions foi a Internazionale, exatamente o time que havia duas vezes derrotado o Independiente nos Mundiais de 1964 e 1965. Os Bhoys acabaram, inclusive, sendo os convidados de honra para o jogo festivo do aposentado Alfredo Di Stéfano, que acabara de pendurar no Espanyol as chuteiras e voltava por uma noite a vestir a camisa do Real Madrid para festejar à altura o fim da carreira – ele prontamente atendeu o pedido de Pizzuti por alguma informação sobre os escoceses (“antes de cada treino, José dava preleções de meia hora. Falava da vida e de nós. Do rival, nunca. A única vez que nos falou do rival em um treino foi antes do Celtic”, destacaria Maschio em 2017), rotulados como “imbatíveis” por Helenio Herrera, o lendário treinador argentino daquela Grande Inter. Tudo isso se entrelaçava na edição de 1967 do tira-teima.

A obsessão racinguista se fazia sentir: durante a Libertadores, La Academia soube manter gás paralelo no Torneio Metropolitano, do qual foi vice-campeão menos de duas semanas antes das decisões continentais. Mas no Torneio Nacional a história foi bem diferente; essa competição começara já em 10 de setembro e o misto de aparente desinteresse dos campeões da América com toda a energia do mundo de adversários sedentos em tirar casquinha se fazia sentir. Simplesmente as cinco rodadas inaugurais foram sem vitórias do campeão da América, mesmo contra equipes das mais modestas e mesmo usando os titulares: 1-1 em casa com o San Lorenzo de Mar del Plata; um magro 1-0 no Chaco For Ever em Resistencia (gol do brasileiro Cardoso) no dia 17; derrota no próprio Cilindro para o Ferro Carril Oeste no dia 22; derrotas de 1-0 em 5 de outubro e de 2-0 em 8 de outubro em visitas a Quilmes e Lanús, respectivamente. Ares de jogos-treino de luxo.

Em junho, o campeão europeu foi o convidado pelo Real Madrid para o jogo de despedida do argentino Di Stéfano. O capitão Billy McNeill, presente nas duas imagens, logo sentiu ao subir os degraus do Cilindro que o Mundial Interclubes não seria nada amistoso

Já da 6ª rodada em diante, a tônica foi a AFA adiar jogos. Não em algum tributo a Che Guevara, morto em 9 de outubro – como pária de um país governado pelo moralista ditador Juan Carlos Onganía. A sensibilidade era em prol do potencial campeão do mundo: enquanto o grosso dos outros clubes jogou em 15 de outubro a 6ª rodada, o Racing só encontrou o Platense já no dia 21 do mês seguinte. La Acadé, afinal, começaria a disputar em 19 de outubro o Mundial, dez dias depois da repercussão global da morte de Che. O jogo de ida seria na Grã-Bretanha. Para todos sentirem-se ambientados, houve quem levasse mate argentino e… provocasse acidentalmente no hotel um princípio de incêndio na hora de usar os fósforos, anedota atribuída a Mori.

Mais importante que trazer o mate para mais conforto, porém, era transportar a zeladora do clube e virtual “mãezona” para todos eles, em especial os que vinham de fora da Grande Buenos Aires: Tita Mattiussi, com passagens custeadas por uma vaquinha entre seus afilhados. Em provável referência a ela (visitada também pelos vizinhos do Independiente, tamanha a relação saudável que havia naquele período) é que o recordista de jogos pelo Racing, o zagueiro Gustavo Costas (dos anos 80 e 90), declararia sobre a passagem pela segunda divisão em 1984 e 1985: “com a história que tem esse clube, era terrível ter que ir jogar em Campana [cidade pouco glamourosa do interior da província da Buenos Aires] sabendo que na tribuna havia torcedores que haviam ido a Glasgow”.

A entrada do Racing no Cilindro e o espectador mais célebre do segundo jogo: o ex-piloto Fangio

Amostras de como a pompa era mútua iam desde à rivalidade dos ingleses fazendo John Lennon supostamente declarar torcida pelo Racing à presença do astro Sean Connery na plateia do Hampden Park; décadas antes de visitar Buenos Aires para filmagens de Highlander II, o ator escocês fazia naquele 1967 a primeira de suas despedidas do seu imortalizado papel de James Bond (no filme Com 007 Só Se Vive Duas Vezes, vindo depois a regressar pontualmente em 1971, com 007 Os Diamantes São Eternos, e em 1983, no não-oficial 007 Nunca Mais Outra Vez) e fez questão de conhecer os argentinos. Que se dedicaram a defender-se, com pontapés se necessário, e gastar tempo em prol de um empate. Tiveram somente duas chances de gol: uma cabeçada de Alfio Basile sobre o travessão e um chute no finzinho em que Juan José Rodríguez arrematou fraco diante de Ronnie Simpson.

Os britânicos venceram pelo placar mínimo, com Billy McNeill encobrindo todos em cabeceio em escanteio aos 24 minutos do segundo tempo. E, importando-se para valer com o título à espreita, requisitaram à sua federação o adiamento de compromissos domésticos, similarmente ao que a AFA já permitia ao adversário. Foram atendidos no campeonato escocês de 1967-68, mas tiveram de jogar a final da Copa da Liga ainda válida pela temporada 1966-67: em 28 de outubro, bateram o Dundee por 5-3, chegando então àquela quádrupla coroa. O Celtic saiu daquela partida ao aeroporto para a revanche em Avellaneda, mimados com um voo da Aerolíneas Argentinas empregado apenas para apanha-los.

Comemorações dos gols racinguistas no Cilindro: à esquerda, o brasileiro Cardoso, Raffo e Cárdenas celebram o empate. À direita, o camisa 9 Cárdenas vibra a virada para um lado, Maschio (ao meio) e Cardoso vão pelo outro

Em paralelo, a 7ª rodada do Torneio Nacional se dava em 22 de outubro, mas o Racing pôde enfrentar apenas em 6 de dezembro o Central Córdoba de Santiago del Estero; a 8ª rodada, travada quase toda em 29 de outubro, seria concluída apenas em 29 de novembro, quando a equipe de Avellaneda enfim recebeu o San Martín de Mendoza. Depois da partida em Glasgow, o campeão da América só voltou a campo já mesmo para a revanche diante dos escoceses, em 1º de novembro. Dentre as 120 mil pessoas estimadas no Cilindro, um recorde nacional de público não superado nem na Copa do Mundo de 1978, uma personalidade mundial da Argentina equivalente à de Connery, o piloto Juan Manuel Fangio.

A boa notícia aos europeus: a comissão organizadora concluiu que uma suspensão doméstica do astro Jimmy Johnstone não valia para jogos internacionais. A má: o goleiro Simpson, no aquecimento, teria sido atingido por um projétil (ou garrafa, ou pedra, conforme a versão…) e precisou dar lugar a seu reserva John Fallon – quarenta anos depois, o diretor Jorge Portella tratou de contestar tamanha selvageria, declarando que Fallon já havia se aquecido muito mais intensamente que Simpson, que teria recusado ser levado a algum hospital, jamais sendo encontrado o objeto ou algum sangue. Fato é que do lado argentino Mori se lesionara em um treino, ao chocar-se com o colega Raffo, dando então seu lugar ao brasileiro Cardoso, enquanto o lateral Rubén Díaz seria reposto pelo curinga uruguaio Nelson Chabay em função de uma distensão muscular.

Para fãs de “cenas lamentáveis” irem à loucura. Basile chama Clark para a briga e, à direita, é expulso sob agressões policiais

Johnstone fez valer a mobilização. Derrubado pelo futuro ídolo santista Agustín Cejas, originou o pênalti convertido por Tommy Gemmell aos 24 minutos de jogo. O empate veio doze minutos depois, assinado pelo artilheiro da campanha campeã da Libertadores: Norberto Raffo, que teleguiou um peixinho descrito pelo Evening Times como “brilhante”. El Toro Raffo, por sinal, era outro ex-jogador do Independiente. No início do segundo tempo, El Chango Cárdenas deu a vitória aos donos da casa, recebendo pelo passe de Juan Carlos Rulli para, livre, bater Fallon com tranquilidade em um rasteiro chute diagonal pela esquerda. Foi o grande presente a Alfio Basile: El Coco completava 24 anos de idade naquele mesmo 1º de novembro. Sem critério do gol fora de casa, estava forçado um jogo-desempate.

Como o jogo-desempate anterior do Mundial se dera na Europa (entre Independiente e Internazionale, em 1964), dessa vez o palco da finalíssima seria na América do Sul, sujeitando os postulantes a atravessar o Rio da Prata para o embate definitivo dali a 72 horas. Tempo para o técnico adversário Jock Stein seguir resmungando; para reconhecer que os adversários haviam sido superiores no Cilindro, protestava contra o jogo áspero com declarações como: “eles não precisavam disso. Eles foram os melhores hoje”. Stein também tachava de “índios”, em pejorativo sentido de faroeste, a recepção das arquibancadas argentinas, ao mesmo tempo em que elogiava uma hospitalidade uruguaia.

Primeiras expulsões do Celtic: Lennox (junto de Basile) e Johnstone

O palco foi a “neutra” Montevidéu: ao lado da Argentina, mas com um estádio lotado de uruguaios a torcer pelos oponentes dos rivais históricos. A raposa Pizzuti, ciente disso, levou pugilistas amadores disfarçados de fotógrafos para a eventualidade de proteger seus jogadores, hospedados no hotel Hermitage no bairro montevideano de Pocitos. Chegaram a ser visitados por colegas argentinos que atuavam no futebol uruguaio, notadamente o folclórico goleiro Néstor Errea, então no Peñarol. Já entre a torcida, a incluir muita gente hinchas de outros clubes mas unidos pelo apoio a um representante da pátria, houve mostras de amizade ao nível de quem fora em três horários distintos aplicar a vacina exigida pela alfândega uruguaia, uma vez por si e nas outras usando a identidade de dois amigos que não tinham tempo para buscar o posto médico, a fim de garantir-lhes o embarque naval; houve quem se assustasse com o ingresso: a federação uruguaia, sem tempo hábil de imprimir de acordo com a demanda, reutilizou bilhetes de jogos antigos, orientando a portaria do Centenário a aceita-los…

No início da partida, Bobby Lennox entrou duro em Basile aos 4 minutos, após um início de jogo que já contabilizava cinco outras faltas sancionadas. Os dois lados entraram nervosos, com Cardoso e Cárdenas chegando a perderem gol na cara de Fallon aos 8. E também exaltados: aos 13, o capitão Oscar Martín (protagonista na imagem que abre essa matéria, ao lado de McNeill e do trio de arbitragem formado pelos paraguaios Salvador Valenzuela, o juiz Rodolfo Pérez Osorio e Isidro Ramírez) foi ao chão com uma solada de Willie Wallace. Nesse momento, o juiz já pedia serenidade. O jogo ficou truncado no meio-campo, e somente aos 19 minutos o Celtic apareceu com perigo na área de Cejas, com Basile mandando para escanteio.

El Toro Raffo, Yaya Rodríguez e El Mariscal Perfumo exibindo firmezas

Aos 23, após Chabay entrar em Johnstone, Pérez Osorio buscou reforçar o pedido de calma, reunindo os dois capitães. Pouco depois, Cardoso cruzou para Cárdenas, que chutou desviado.Mas o jogo voltou a se travar no meio-campo. Os times passaram a usar dos expedientes do chute de longa distância e do bate e revida: aos 21, outra vez a arbitragem interrompeu o jogo para advertências, com direito a uso de intérprete; o lance mais claro é do Celtic, aos 30: bola cruzada, Wallace ajeita de cabeça a Lennox, que manda sozinho por cima do travessão.

Aos 37, então, o jogo se paralisou outra vez, após Rulli derrubar violentamente Johnstone. Os expulsos? Basile e Lennox, após cinco minutos de interrupção. El Coco na verdade lutava com John Clark, mas “já que eu ia embora, levei o melhor deles, que era Lennox e não Clark”. Lennox ficou desconsolado à beira-campo enquanto Basile (“Clark veio reprovar Rulli na falta e eu lhe parei no seco, pondo o peito à frente. Me deu um chute e eu lhe dei um empurrão no rosto. Tudo foi muito rápido, muito breve”) foi direto ao vestiário, colocando o paletó para acompanhar junto aos reservas embarcados – os goleiros Luis Carrizo e Antonio Spilinga, o zagueiro Rodolfo Vilanoba, o lateral-esquerdo Antonio Manilo, o meia Oscar Cáceres, os pontas Fernando Parenti e Néstor Rambert, além dos lesionados Mori e Panadero Díaz.

Vale transcrever a seguir, em três parágrafos, a análise da revista El Gráfico sobre o primeiro tempo:

O lance tantas vezes repetido. Ao lado, os campeões com a taça do mundial: Rodríguez, Raffo e Cejas em pé, Cárdenas e Perfumo abaixo

“Pouco futebol. Menos que em Avellaneda. Muitos nervos. Muita fricção. Muita perna forte. E por ambas as partes. Com esta diferença: o Racing pegou duro na zona de disputa da bola; os escoceses pegaram sem bola… Muita imprecisão. Mais por parte do Celtic do que pelo lado do Racing. Pouca claridade ofensiva. Pouca construção razoada do jogo. Pouca chegada ao gol. Pouca presença gravitante dos homens inspirados ou luxuosos. Uma equipe superior. Do início ao fim: o Racing. Melhor plantado sobre o campo. Com maior mando sobre a bola, com melhores recursos para consegui-la e administra-la. Com maior firmeza na marcação. Com maior domínio da iniciativa. Onze contra onze ou dez contra dez, impressionou melhor o campeão da América. Sem chegar à excelência dos momentos de bom futebol, fluido e consistente, que chegou a nos oferecer em Avellaneda. Mas impondo maior presença no campo”.

“Somente na meia hora de jogo apareceram no campo o campeão da Europa e sua máxima esperança: o aceso Johnstone, submetido até esse momento à sóbria e firme custódia combinada de Chabay-Basile. Ali, no duplo drible do ruivo camisa 7 e seu passe ao meio, esteve o primeiro toque de alerta para o Racing. Dois minutos mais tarde, houve necessidade de reagrupamento em massa e falta de J.J. Rodríguez a um metro da área para frear Johnstone. O Racing já não era o proprietário exclusivo da bola como na primeira meia hora da partida. Mas o Celtic não lograva armar-se como bloco. Só mostrava a mecânica de seus toques ao clarão pré-fabricado e a aparição do destinatário que chegava na corrida. Mas sem criação. Sem vigor. Sem consistência. Johnstone tinha pouco a bola. E com a saída Johnstone controlada e Johnstone mais dedicado a correr gente e meter solas (igual a Gemmell e Wallace) que a fabricar futebol ofensivo, o Celtic mostrava suas falências na zona central, tanto defendendo como criando”.

A comemoração, em dois ângulos, de Cárdenas com o técnico Pizzuti – e Basile, já de terno após a expulsão. O camisa 11 Raffo também se junta

“Duas figuras enchiam a partida: Basile no primeiro término. Ganhando todas. Dando confiança. Solidificando todo o Racing desde o fundo. Logo, incansável destrutor-abastecedor do meio-campo, Rulli. Uma falta forte de Rulli contra Johnstone, perto da área do Celtic, quando o 7 escocês tentava sair em contra-ataque desde o fundo, provocou a violenta reação de Clark, a saída de Basile em defesa de Rulli, o primeiro incidente forte e a primeira decisão drástica do juiz: expulsão de Basile e Lennox. Ali, o Racing perdeu UM PULMÃO. E quando tudo parecia indicar que essa ausência vital freava o Racing, a generosa a inteligente gestão de Rulli compensou o déficit”.

O primeiro tempo, assim, se encerrou sem maiores chances claras de gol. E o segundo começou da forma como o primeiro terminara: com confusão. Martín fez falta em Johnstone para brecar-lhe, e o ponta revidou fazendo o racinguista sangrar. Ou, em novas palavras da El Gráfico, “com o arranque do segundo tempo uma agressão de Johnstone em Martín (sem bola) custou ao quadro escocês a perda de uma peça vital. Se compensava assim, em nível de importância, da gravitação pessoal para suas respectivas equipes, a perda de Basile. E o Celtic ficava com um homem a menos”. Em 2007, Martín relataria que na realidade teria simulado sofrer aquele golpe precisamente para cavar a expulsão do melhor oponente.

Pouco após o gol, o próprio herói Cárdenas perdeu esse chance clara de matar o jogo ao se atrapalhar sozinho com a bola. Em seguida, Hughes foi expulso por chutar Cejas no chão – Perfumo, claro, correu para tirar satisfação (foto inferior)

Mas, mesmo contra nove, os argentinos não conseguiam aproveitar espaços, e ainda viram Cejas ser atingido por um projétil no minuto seguinte à saída de Johnstone. Mas logo no décimo minuto vem o lance do jogo: Rulli passa a bola ao Yaya Rodríguez, que tenta, sem sucesso, habilitar de calcanhar o brasileiro Cardoso – Gemmell interceptou o passe. Mas seu rechaço fez a bola voltar à direção de Rulli – que ganhou a dispusta com Murdoch e então repassou finalmente a Cárdenas. Raffo e Maschio se perfilaram como se imaginassem um passe, que jamais se produziria: apenas Murdoch pareceu antever o que El Chango faria, mas não chegou a tempo de prensar o arremate. Que seria repetido à exaustão pela torcida alviceleste. Tanto que originou até gozações contra si: a de que, de tanto se prender àquela nostalgia, uma hora aquela bola iria para fora…

Cárdenas admitiria dali a quarenta anos que só arriscou para não perder a posse de bola, que estava pingando à sua frente além do que gostaria – relembrando então que Pizzuti não era de comemorar efusivamente os gols do pupilos, mas permitiu-se explodir naquele. O ponta fez cerca de uma centena de gols pelo Racing, mas aquela bomba de canhota, em um jogo de atuação sua até avaliada no geral como apagada, bastou para eterniza-lo (e também para lhe render sua única partida pela seleção argentina, dali a apenas três dias). E não apenas para a torcida racinguista: em tempos mais sadios das rivalidades, o país inteiro comemorou aquele gol, como muitos grisalhos recordaram nas homenagens póstumas ao Chango em março. Em 2007, uma testemunha já havia relatado: “quem mais gritou esse gol foi meu amigo torcedor do Independiente. Dizia que era um triunfo do futebol argentino e nos abraçamos”.

Auld também merecia expulsão, mas permaneceu. Nas outras imagens, Perfumo celebra com Raffo e troca de camisas com McNeill

Já na primeira despedida divulgada pelo Racing ao ídolo, alguém comentou que o histórico gol de Cárdenas estaria entre os cinco mais importantes do país – no que foi respondido com um “sendo torcedor do Rojo eu te digo que, a nível de clubes, é um dos três gols mais importantes”. Já alguém do San Lorenzo jurou que “em 1967, tinha seis anos e já começava a ser cuervo. Meu pai já era. Mas nesse sábado, não podíamos estar longe do sentimento argentino com o Racing. Teu gol, Chango, nos fez gritar”. De fato, o espírito da época fez torcidas rivais se unirem pela causa. A nota de pesar prestada pelo rival Independiente no twitter não recebeu apenas os comentários normais de trégua diante de falecimentos. Viu-se bem mais que cordialidades.

Nela, é possível ver respostas rivais que variam de um “para além da rivalidade, foi um dos caras que pôs o futebol argentino no mais alto. Que em paz descanses, Chango” para um “Chango! Vi teu golaço! E o desfrutei como torcedor do Rojo! Em nossa época, sempre queríamos que ganhasse um argentino! Beijos ao céu! Grande jogador, melhor pessoa”. Também um “sou um doente pelo Independiente… mas que viva o futebol. Obrigado, Chango, o futebol bem jogado tem que ser reconhecido” ou ainda um “o homem era e será parte da história do futebol argentino, embora seja de outra rua. Que em paz descanse”.

Basile, já de terno após a expulsão no 1º tempo e que torcia na infância pelo rival Independiente, e o herói Cárdenas (com camisa trocada do Celtic) às lágrimas: futebol argentino enfim campeão mundial,

Três minutos depois do golaço de Cárdenas, o Celtic teve sua grande chance, “quando um cruzamento pela direita sobrou a Perfumo e Hughes baixou a bola dentro da área, isolando-a sobre o travessão”. Aos 19, uma bicicleta de Perfumo na própria área foi sancionada como jogo perigoso, mas o tiro livre indireto dentro da área, embora bem trabalhado em toques pelos europeus, terminou salvo por Cejas. Dos poucos chances mais claros após o 1-0, destaque maior a um gol feito perdido aos 24 minutos por Cárdenas, “quando um passe exato de Raffo o deixou sozinho na área escocesa”: ele, longe da marcação de Craig, não soube dominar uma bola fácil.

Então, aos 29 minutos, foi a vez de John Hughes ir curtir o chuveiro adoidado, após um pontapé “policial” em um goleiro Cejas caído após dividida aérea com Hughes. O Celtic estava com oito, e deveria ter ficado com sete se a arbitragem não punisse também “Gemmell em várias agressões. No caso do camisa 3 celta, o juiz esteve muito tolerante”. Mesmo com tamanha desvantagem europeia, os lances de perigo subsequentes foram bem poucos; aos 35, Fallon até mostrou serviço em cabeceio de Raffo, após bola cruzada por Martín. Mas, a partir dali, a revista El Gráfico assinalou que os argentinos já estavam “sem pernas”.

Volta olímpica, com os argentinos usando camisas do Celtic: da esquerda para a direita, Cárdenas, Cejas (ambos de perfil), Oscar Martín (de braço estendido) e o brasileiro Cardoso (sem camisa) mesclados a simpatizantes

A oito minutos do fim, um Gemmell irritadíssimo com um Cárdenas estirado no chão agarrou El Chango por um pé para arrasta-lo para fora de campo. O troco veio quatro minutos mais tarde, quando Rulli fez a chamada “falta técnica” para obstruir Gemmell, cujo soco ao revidar recebeu nova vista grossa do juiz – que, por outro lado, “optou por ‘compensar’ a inferioridade numérica dos campeões da Europa, expulsando Rulli sem razão lógica aparente”, em outras palavras da El Gráfico. Rulli não se inibiu em responder as vaias da plateia uruguaia com gestos de braços ao alto.

Bertie Auld também teria sua expulsão anunciada, mas simplesmente peitou a arbitragem e permaneceu em campo. “Mas ao Celtic já não sobravam forças nem resto de inspiração para impedir o que já estava flutuando no ambiente desde o momento em que Cárdenas cravou seu estupendo canhotaço alto desde quase 25 metros”, minimizou a El Gráfico. Aos 45 minutos, Bobby Murdoch entrou forte em Cárdenas. Com o novo tumulto gerado (na confusão, o onipresente Gemmell chegou a chutar o joelho de Raffo, que após a partida denunciara ter sido atingido também no estômago: “como não o expulsaram?”, ainda chiava), o árbitro encerrou a partida. Que teve as seguintes análises frias da El Gráfico:

CEJAS – Menos trabalho que em Glasgow e menos que em Avellaneda. Não teve grandes exigências, mas mostrou a importância de sua presença habitual. Bem na jogada perigosa dentro da área, onde foi tapar no primeiro pau. Cada vez transmite mais segurança.

Elogiado como melhor jogador da final, Rulli posa à direita com o troféu em 2019, no embalo do último título do clube

PERFUMO – Melhor na primeira etapa do que na segunda, sobretudo na entrega de bola. Chutou muitas vezes longe e sem destino. No segundo tempo, em sociedade com Martín, ‘se comeram’ em um cruzamento por cima que provocou a situação mais clara do Celtic para empatar. Hughes dominou entre os dois e atirou acima do travessão. Bem no geral. Só sua grande qualidade torna maior a exigência… embora neste tipo de ‘finais’ a qualidade já seja um luxo.

CHABAY – Outro que andou bem na primeira etapa. Se Johnstone o superou um par de vezes, isso só é imputável à grande qualidade do ponta escocês. Mas não foi ‘baile’. Marcou-o acima, por momentos bem. Na segunda parte, perdeu algumas bolas na entrega

MARTÍN – Lhe custa voltar a encontrar seu nível. Foi superado em velocidade e em drible por Hughes. E mal nesse fechamento, que pôde ter custado o empate, na costa de Perfumo. Sem propor, conseguiu fazer Johnstone ser expulso…

Maschio com os cartolas e Perfumo: a taça praticamente só foi entregue no vestiário

RULLI – Desta vez, correspondeu. A figura do Racing. A esta espécie de SOLDADO DESCONHECIDO, que dispõe da generosa humildade de seus poros milionários… Rulli é o grande símbolo do anônimo. Nunca vai encher os olhos, nunca pretenderá que você repare nele… é você quem terá que identifica-lo, é você que terá que aprender a valorizar a comovente filantropia de sua fadiga… como nesta final com sabor de batalha, onde quem ‘não mete’ forte corre o risco de merecer um adjetivo com uma acepção muito duvidosa…

BASILE – Até a expulsão, o melhor jogador da equipe. Em temperamento, presença e eficácia. Muito bem dominando todo o setor esquerdo da equipe. Inclusive trabalhando em sociedade com Chabay. É possível que se exceda em suas reações temperamentais, mas desta vez foi mal expulso. O que cometeu a falta em Johnstone foi Rulli. E quem quis brigar com Basile foi Clark…

CARDOSO – Sem alcançar sua produção na partida de Avellaneda. Muita generosidade para buscar a partida. Mas sem prosperar ofensivamente. Cota de temperamento no mesmo nível geral. O mesmo que sua transpiração.

Os europeus claramente “não se importaram” com o Mundial…

MASCHIO – Em frente lhe tocou o melhor jogador escocês, Murdoch, que lhe pôs mais marcação que em Avellaneda. El Bocha correu os noventa minutos, buscou o desmarque, tratou de ordenar a ofensiva, mas não alcançou a mesma grande dimensão da última partida. Talvez não bastaram as 72 horas para sua total recuperação despois daquele notável esforço.

CÁRDENAS – Como todos os homens da frente, lhe faltou potência e clareza. Perdeu muitas bolas. E não buscou os laterais, tal como é sua melhor aptidão. Mas tudo fica postergado pela façanha desse canhotaço que trouxe a taça. Grande gol. Pela distância da trajetória, pelo espetacular e pelo que apresenta.

RODRÍGUEZ – Voltou a destacar mais sua transpiração e seu espírito de luta do que sua produção no ataque. Correu gente, em todos os setores do campo, principalmente a Auld no começo. Nisso, ressuscitou espiritualmente.

RAFFO – No discreto nível dos companheiros de ataque. Foi aos laterais. Se desmarcou sem bola. Mas faltava toque e encontro e também faltou o chutão para seus piques. A mesma importância que todos em brigar a partida. E essa virtude foi a mais importante da equipe, e a que possibilitou o triunfo.

Reencontro de campeões em 1991, ainda pelos 25 anos do título argentino de 1966: Néstor Rambert, Agustín Cejas, Rubén Díaz, Oscar Martín, Juan Carlos Rulli, Humberto Maschio, Alfio Basile, Norberto Raffo, Juan Carlos Cárdenas e o técnico Juan José Pizzuti

FALLON – Sem muita atividade. O Racing não buscou acima como no último confronto. No gol, estava desarado. Ela foi acima e à sua direita.

McNEILL – Muito mal no manejo. Só pôde ir ao ataque a cabecear nos tiros livres. Mal nas saídas.

GEMMELL – É o homem que insinua muitas qualidades. Mas que nas três partidas com o Racing as manteve muito ocultadas. É goleador e com sua equipe em desvantagem, não arrisca. Nem em Avellaneda e nem em Montevidéu. Só demonstrou que pega bem na bola.

CRAIG – Melhor em Avellaneda que nesta oportunidade. Sem gravitar.

MURDOCH– O melhor da equipe escocesa. E o melhor jogador por aptidões técnicas; continuidade e talento. E também bateu sem bola com muito má intenção. É completo…

Festa dos 40 anos, em 2007: Néstor Rambert, Fernando Parenti, Miguel Ángel Mori, Humberto Maschio, Antonio Spilinga, o brasileiro João Cardoso e o técnico Juan José Pizzuti; Jaime Martinoli, Juan Carlos Rulli, Rodolfo Vicente, Oscar Martín e Juan Carlos Cárdenas. À direita, na mesma época, Cárdenas e o brasileiro Cardoso

CLARK – É o judicioso da equipe. O segundo beque central que esperava no fundo. Junto com McNeill, muita ingenuidade para sair a enfrentar.

JOHNSTONE – Ele e Murdoch são o capital humano resgatável que fica desta equipe escocesa que em Glasgow ia ao ataque com sete homens. E que aqui não vimos… importante na ofensiva. Duas grandes jogadas na primeira etapa.

LENNOX – Voltou a ser o camisa 8 da ponta. É bom jogador, mas muito desapegado do resto. Sabe se mover sem a bola. Foi expulso injustamente.

WALLACE – Sem importância. Lá, é homem agressivo. Aqui, nem isso. E como lhe falta habilidade para resolver, não pesou.

AULD – Outro dos jogadores destacados, mas jogando muito atrás. Junto com Murdoch, foram as duas peças de arranque, mas com pouca chegada. Não o vimos na meia distância, embora seja um dos que melhor pega na bola.

O eterno talismã Cárdenas – à direita, revisitando o estádio Centenário na semana dos 50 anos da façanha, em outubro de 2017

HUGHES – Foi dos mais que mais pesaram ofensivamente. Mas sempre por esforço individual. Ganhando de Martín em potência e velocidade, chegou ao arremate e ao fundo. A falta em Cejas, melhor dito o pontapé traiçoeiro em Cejas, no chão, não era para expulsão. Era para Villa Devoto…”

A Villa Devoto referida acima trata-se do bairro portenho em que se situa a mais famosa penitenciária de Buenos Aires. Mas o apito final também encerrou junto as fricções: os dois times trocaram camisas pacificamente – a El Gráfico até listou que Gemmell pediu a de Martín, Cárdenas trocou com Wallace e Perfumo com McNeill. Essa última troca também mereceu na época parágrafos na revista britânica World Soccer, a registrar declarações de um Perfumo que assumia alguma hesitação inicial seguida de comoção ao escutar o adversário lhe desejar buena suerte em perfeito espanhol. A primeira volta olímpica mundial da Argentina (ou meia-volta, pois alguns uruguaios furiosos atiravam objetos e inviabilizavam a conclusão da rota…) foi dada com as camisas alviverdes estranhamente misturadas aos calções e meias azuis.

Curiosamente, foi preciso ir aos vestiários para erguer a taça, entregue naquela ocasião aos cartolas: Baldomero Pico e Santiago Saccol levaram-na conjuntamente. Um dia depois, foi disputada a 9ª rodada do Torneio Nacional, mas os campeões do mundo tiveram nova folga: só em 13 de dezembro enfrentariam o Vélez. Voltaram a campo enfim na 10ª, em 12 de novembro, recebidos por um corredor de aplausos do River – em gesto retribuído ao fim, após vitória millonaria por 4-2 no Monumental, como salientado na segunda imagem dessa matéria.

Festa dos 50 anos, em 2017: Nelson Chabay, Alfio Basile, Humberto Maschio, Fernando Parenti (dessa foto, apenas esses três seguem vivos), o técnico Juan José Pizzuti, Juan Carlos Cárdenas, Rubén Díaz e Oscar Martín

Além da primazia mundial, La Academia era o segundo time argentino mais vezes campeão local e tinha mais vitórias no Clásico de Avellaneda. Mas, sem saber, também dava adeus à sua era de glórias. El Equipo de José gradualmente foi envelhecendo (o capitão Oscar Martín penduraria mesmo as chuteiras dali a um mês, na rodada final do Torneio Nacional). Enquanto não se desmanchava também, ainda pôde chegar, em 1968, aos troféus amistosos espanhóis da Costa do Sol e do Conde de Fenosa, este sobre o Flamengo, além do triangular final que decidiu o Torneio Nacional; e, em 1969, às semifinais do Metropolitano, já no embalo do reforço brasileiro Silva Batuta. Pizzuti então assumiu a seleção recém-desclassificada à Copa do Mundo do México. E a fez vencer dentro do Beira-Rio o próprio Brasil de 1970 antes do embarque canarinho ao tricampeonato, ao passo que o ex-clube sucumbia à sua característica desorganização institucional: os cartolas chegaram ao cúmulo de pedir que o cheque dado como bicho antes da partida de 55 anos atrás não fosse sacado, por não haver fundos…

Ao Racing, vieram desde ali um rebaixamento (em 1983) seguido de dois anos de segunda divisão (que sequer foi conquistada, vencida em 1984 pelo Deportivo Español e em 1985 pelo Rosario Central…) e por uma declaração de falência em 1999 só não efetivada mediante mobilização social – e só mais um punhado de títulos: Supercopa 1988, Apertura 2001, Transição 2014, Superliga e Troféu de Campeões em 2019. Mas esses “detalhes” já fogem do propósito dessa nota, sendo objeto deste outro Especial. “Detalhes tão pequenos” ou que ficam mesmo tão pequenos desde 1967, a cada dia 4 de novembro. Palavras do próprio Pizzuti, na festa dos quarenta anos: “chegamos em Buenos Aires às 1h da manhã e havia tanta gente no campo do Racing que tivemos que ir lá dar outra volta olímpica. Nessa madrugada, vi bandeiras do Racing, Estudiantes, Boca, Independiente… havíamos feito uma campanha que nunca mais vai se repetir. E não exagero: nunca mais”.

Agustín Cejas, Alfio Basile, Roberto Perfumo, Oscar Martín, Nelson Chabay e Juan Carlos Rulli; João Cardoso, Humberto Maschio, Juan Carlos Cárdenas, Juan José Rodríguez e Norberto Raffo, com a bandeira uruguaia

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

6 thoughts on “55 anos do primeiro título mundial do futebol argentino: o do Racing de 1967

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

doze − três =

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.