Rosario há 35 anos: Central (bi)campeão argentino, Newell’s vice
Originalmente publicado nos 30 anos, em 2017. Na imagem acima, Adelqui Cornaglia, Alejandro Lanari, Edgardo Bauza, Julio Pedernera, Ariel Cuffaro Russo e Hernán Díaz; Osvaldo Escudero, Roberto Gasparini, Fernando Lanzidei, Omar Palma e Hugo Galloni
Há exatamente 35 anos, o campeonato argentino chegou à última rodada disputado pelos arquirrivais rosarinos, algo que até hoje não se repetiu. Apenas os rivais do Superclásico, Boca e River, foram outros a terem disputado um torneio desses até o final. Quem pôde dormir eufórico em 2 de maio de 1987 foram os canallas, que tiveram assim o mais saboroso momento diante dos leprosos, em uma situação comparável apenas com o dia da palomita de Aldo Poy. Mesmo que ela tenha sido também a última vez que o Central tenha sagrado-se campeão da elite nacional – confirmando um raríssimo bicampeonato de segundona com primeira. Vale atualizar este Especial lançado no aniversário de 25 anos.
Para apimentar mais a situação, o campeão nacional da temporada 1986-87 era um recém-chegado da segunda divisão. O time fora duas vezes campeão argentino nos anos 70 e outra em 1980. Porém, depois de seguidas temporadas ruins após este último título, foi condenado por seus promedios ao fim de 1984- ano que marcou também aquela que por 35 anos foi a última ocasião de um jogador ter entrado para o grupo dos que defenderam a dupla de Rosario (amostra de como se trata de uma das rivalidades mais ferrenhas do mundo): o goleiro Juan Carlos Delménico, que passou também por Gimnasia LP e Estudiantes, fora rebaixado pelo Rosario Central onze anos depois de ter deixado a reserva do Newell’s.
Em uma segundona que continuava a ter o Racing, os auriazuis foram arrasadores, garantindo o título e a volta à primeira divisão a quatro rodadas do encerramento e terminando onze pontos à frente do segundo colocado, o pequeno San Miguel (quem ascendeu junto, porém, foi justamente o Racing, vencedor da repescagem que envolveu do segundo ao nono colocado pela outra vaga de acesso). A conquista da segunda divisão de 1985, ainda disputada ao longo do ano e não em um calendário europeu (como já se dava na primeira a partir do campeonato de 1985-86), seria bisada com a da elite pela única vez na Argentina. Técnico campeão, Pedro Marchetta iniciaria uma relação de amor com o clube, mas logo o deixou para assumir o Vélez – cujo então treinador, Alfio Basile, fora socorrer precisamente o Racing naquela repescagem.
Para repor Marchetta, um homem que já dispensava apresentações em Arroyito muito antes de faturar também a Copa Conmebol de 1995: é que Ángel Tulio Zof já havia treinado o time campeão em 1980. E teve quem participou do rebaixamento e desse raríssimo bicampeonato: Ariel Cuffaro Russo, Adelqui Cornaglia e Claudio Scalise estão entre os grandes ídolos centralistas. Scalise virou até folclore: entre o fim da segundona de 1985 e a volta à elite para a temporada 1986-87, alguns jogadores do Central foram emprestados para se manter em forma. Scalise passou o semestre no Boca e, vestindo por baixo uma camisa canalla, saboreou triunfo inacreditável sobre o Newell’s na final da liguilla da temporada 1985-86. Falamos aqui: o Ñuls havia derrotado o Boca na Bombonera por 2-0 e abriu o placar em Rosario, com o Boca ainda tendo um jogador expulso. Mas os auriazuis conseguiram no fim virar para 4-1. Prólogo para a decepção rubronegra na temporada que viria…
Mas a idolatria a eles, somada, não se compara à veneração ao meia Omar Palma, que entre idas e vindas ficou no clube entre 1979 e 1998. Kily González, fanático centralista, já declarou que foi mandado “à merda” por Maradona ao responder-lhe que seu ídolo máximo não era ele e sim El Negro Palma. Afinal, Palma marcara um dos gols na vitoriosa decisão nacional de 1980 frente ao Racing de Córdoba. Em 1985, fez outro na vitória sobre o Villa Dálmine que assegurou a volta à primeira divisão, dez anos antes de estar presente no épico título da Copa Conmebol frente ao Atlético Mineiro (quando os argentinos devolveram no Gigante de Arroyito o 0-4 que sofreram no Mineirão e, depois, acertaram mais pênaltis).
Na campanha inesquecível de 1986-87, El Negro foi o artilheiro da competição, com seu vigésimo e último gol sendo também o do título. O outro comandante foi Edgardo Bauza, colega de Palma no título de 1980. O recém-demitido treinador da seleção e ex-técnico do São Paulo é outro semideus canalla: ainda é o quarto maior zagueiro-artilheiro a nível mundial do futebol, com 82 gols só pelo Central (mais, por exemplo, do que o próprio Palma e em menos jogos que ele). Nove deles foram em clássicos rosarinos, dos quais é o segundo maior artilheiro auriazul, à frente até de Mario Kempes (e só está atrás de Daniel Passarella, antigo concorrente na seleção, e do holandês Ronald Koeman entre os defensores goleadores do futebol).
Patón também brilhou no clube como técnico, levando-o às semifinais de 2001 da Libertadores (torneio que venceria com a LDU em 2008 e o San Lorenzo em 2014) e ao título da Copa Argentina em 2018, primeiro troféu expressivo do clube desde 1995. Em 1986, ele estava retornando ao Central, após dois anos no Junior de Barranquilla, uma das colônia argentinas do forte narcofútbol colombiano da época, e um semestre no Independiente. Além de ajudar a evitar gols adversários, Bauza, que havia sido artilheiro do elenco campeão de 1980, marcou seis por seu time na temporada que se encerraria no ano seguinte. “Tinha uma segurança absoluta de que sairíamos campeões. Éramos uma equipe muito superior, muito bem postada”, declarou sobre a partida decisiva ante o Temperley.
Também teve destaque Roberto Gasparini, outro a ter saído do Junior. Por sinal, fora um dos jogadores derrotados do Racing de Córdoba em 1980 (nomeia um dos setores do atual estádio Mario Kempes). Conduziu o meio-campo com Palma e marcou dez vezes, três deles justamente sobre sua ex-equipe cordobesa. Outro especialmente lembrado pelo título é o goleiro Alejandro Lanari, equivalente argentino de Sócrates (apenas) no sentido de que igualmente desenvolveu a carreira futebolística enquanto graduava-se em medicina, não por acaso também sendo apelidado de Doctor.
O arqueiro também experimentara o acesso à primeira divisão em 1985, mas pelo Deportivo (atualmente, Sportivo) Italiano, coincidentemente o time que pegaria o Newell’s na rodada final de 1986-87. Foi contratado após a subida, mas só assumiria a titularidade já em 1987, suplantando uruguaio Jorge Fossati (que acabaria vendido ao Avaí na pausa natalina; no Brasil, também foi o técnico inicial do Internacional na vitoriosa Libertadores 2010). Lanari ficaria no Central até 1991, ano em que foi reserva de Sergio Goycochea na Argentina campeã da Copa América depois de 32 anos.
Os canallas nem haviam começado tão deslumbrantes assim o campeonato; na estreia, um San Lorenzo sem casa própria os recebeu no estádio do Boca e abriu o placar com três minutos, igualado só aos 43 do segundo tempo por Cornaglia. A 2ª rodada também ficou no 1-1 arrancando apenas no fim: mesmo no Gigante de Arroyito, um cascudo Deportivo Español (3º colocado no campeonato anterior mesmo mal contando com seu representante na seleção de 1986, o zagueiro José Luis Brown) abriu o marcador e somente aos 27 do segundo tempo é que Rubén Rojas empatou.
Até que a 3ª rodada foi promissora, embora a escalação reserva usada pelo River pudesse relativizar o 2-1 rosarino (era 2-0 até um desconto a seis minutos do fim) em pleno Monumental. Já desfalcado de Francescoli ao fim da temporada 1985-86, o Millo focava no ineditismo de sua campanha campeã na Libertadores, mas até saberia dividir as atenções inicialmente com o torneio doméstico, pois era um dos líderes após dez rodadas. Outro time no páreo, até o fim, foi o Independiente. Com três representantes na seleção de 1986, o Rojo acabara de contratar um quarto (o goleirão Luis Islas) e conseguiu um 4-2 em pleno Arroyito na 4ª rodada.
Contra o timaço de Avellaneda, Bauza até abriu o placar aos 20 minutos. Gerardo Reinoso, contudo, empatou logo aos 28 e uma inflexão veio aos 35, quando Bauza teve um pênalti defendido por Islas. No segundo tempo, um apagão rosarino de cinco minutos viu Néstor Clausen (um dos outros membros da seleção de 1986, junto a Ricardo Giusti, quem mais representou o clube na Albiceleste, e a lenda-mor Ricardo Bochini) virar aos 18, Franco Navarro anotar o 31 aos 21 e Cuffaro Russo ser expulso aos 23 – torneira aberta para o reserva Jorge Cartaman assinalar 4-1 aos 34, apenas sete minutos depois de entrar em campo. Só deu tempo para Hernán Díaz diminuir o vexame, aos 44.
Na 5ª rodada, Gasparini pareceu inspirar-se ao reencontrar o Instituto, mais tradicional rival do seu antigo Racing de Córdoba: abriu o placar aos 12 do segundo tempo, ainda que os cordobeses empatassem quatro minutos depois. O adversário Ernesto Corti chegou a ser expulso faltando oito minutos, tempo insuficiente para uma vitória fora de casa. A 6ª rodada rendeu um primeiro Clásico Rosarino, em 0-0 em Arroyito. Revés compensado de certo modo na 7ª: em La Plata, já se perdia por 1-0 quando Hernán Díaz foi expulso aos 21 minutos do segundo tempo. Mas os visitantes conseguiram um pênalti salvador que Palma converteu já aos 40.
Na 8ª, montanha-russa: com 35 minutos, um cabeceio de Lanzidei e dois gols de Urruti abriram 3-0 sobre o Racing de Córdoba, que descontou no último minuto do primeiro tempo. Aos 20 do segundo, Palma pareceu matar o jogo ao converter um pênalti. Mas os cordobeses conseguiram ser indigestos em Arroyito, descontando para 4-3 a dez minutos do fim – através de outro pênalti, convertido curiosamente pelo zagueiro José Serrizuela, ex-integrante do Central campeão da segunda divisão e que dali a poucos anos seria titular na final da Copa do Mundo de 1990. Aos 37, Palma tranquilizou o Gigante, em cobrança de falta que fechou o movimentado 5-3.
Na 9ª rodada, o Deportivo Italiano foi presa fácil, derrotado por 2-0 em Buenos Aires, no estádio do Atlanta, gols de Escudero e Bauza. Na 10ª, o Central encarou um antigo “inimigo”: Mario Zanabria era o camisa 10 do Newell’s campeão argentino pela primeira (e, até então, ainda única) vez, em 1974, conquista que um gol dele garantira em pleno dérbi e em pleno Arroyito. Zanabria depois virou um Riquelme das duas primeiras Libertadores do Boca, clube onde agora trabalhava como treinador. A história seria diferente naquele 14 de setembro: a cabeça de Landizei achou um gol no fim do primeiro tempo (aos 43) e outro logo no início do segundo (aos 7) para abrir uma vantagem que o Boca só pôde descontar (aos 15), e de pênalti.
As dez primeiras rodadas terminaram dando a tônica de uma das edições mais apaixonantes do campeonato argentino: na época, vitórias valiam dois pontos e não três, mas ainda assim era um espanto ver simplesmente quatro míseros pontos separarem os líderes do 15º colocado (!). River, Español e Central dividiam a ponta àquela altura, todos com 13 pontos. Na 11ª, Fossati precisou ser substituído logo aos 10 minutos e daria adeus à titularidade para Lanari, que soube segurar o 0-0 fora de casa com o Vélez – treinado por outro velho ícone do Newell’s, o midas José Yudica. O dever de casa foi feito na 12ª: 2-1 no Platense, que só no antepenúltimo minuto descontou o marcador aberto por um cabeceio de Urruti e ampliado por Palma ainda aos 44 do primeiro tempo.
O campeonato de 1986-87 também marcava o retorno do Racing à primeira divisão. Avellaneda viu um dos duelos mais malucos do certame: com 13 minutos, Walter Fernández e Ramón Medina Bello já haviam posto a Academia à frente por 2-0. Com 31, já estava empatado, graças a Cornaglia e a uma cobrança de falta de Palma – que virou ao converter um pênalti já aos 8 minutos do segundo tempo. Mas, aos 25, Miguel Ángel Colombatti reigualou tudo… e, aos 44, Walter Fernández anotou a segunda virada no placar, para La Acadé. Decepção aparentemente curada na 14ª rodada, a marcar o reencontro com o treinador Pedro Marchetta, agora no Talleres.
Mesmo em Arroyito, os cordobeses abriram o placar aos 7 minutos. Bauza tratou de empatar aos 26 e Lanari esfriou o ímpeto de La T ao pegar aos 37 um pênalti de Miguel Ángel Oviedo, antigo reserva da seleção de 1978. No contra-ataque, foi a vez de um pênalti ser concedido aos rosarinos e Palma não perdoou aos 38. Também de pênalti, El Negro ampliou aos 11. Aos 37, Escudero matou o jogo, dando ares de enganosa goleada. Na 15ª, porém, uma oportunidade se perdeu na visita ao Ferro Carril Oeste. É que os canallas abriram o placar com Urruti aos 34, mas tiveram o lateral José Di Leo expulso aos 20 do segundo tempo e até conseguiam segurar a vitória. Mas aos 39 tomaram o empate verdolaga.
Na 16ª, marcada pela fratura exposta de Islas no penúltimo minuto de um Independiente 0-1 Racing de Córdoba, o Gimnasia venceu em casa, encontrando um gol aos 44 minutos; e na 17ª terminou em uma terceira partida seguida sem vitória: Palma abriu o placar aos 41 minutos sobre um timaço do Argentinos Jrs, que tratou de empatar aos 3 do segundo tempo e soube segurar o 1-1 mesmo vendo seu ponta Mario Videla ser expulso aos 23. A vitória também não veio na 18ª, quando os auriazuis viajaram à capital Santa Fe para encarar o Unión, que já vencia aos 10 minutos graças a um jovem Alberto Acosta. Para piorar, Lanzidei foi expulso por reclamação aos 19 do segundo tempo. Mas, aos 34, Cornaglia usou bem a cabeça para arrancar um ponto já precioso.
A 19ª rodada fechou o primeiro turno, com suspense se limitando aos primeiros minutos da visita do Temperley: Escudero abriu o placar aos 9, mas os celestes acharam o empate já no minuto seguinte, com Rubén Tanucci. Mas a goleada veio: Cuffaro Russo (35) e Palma (23 do segundo tempo) anotaram uma boa vantagem e a torneira abriu-se de vez. Aos 36, o adversário José Rendón foi expulso e Palma pôde achar mais um gol aos 41. Na 20ª, El Negro até perdeu um pênalti já aos 45 do segundo tempo, mandando a bola para cima do travessão de José Luis Chilavert.
Mas o desperdício não fez falta: Bauza havia aberto o placar aos 9 e, mesmo que o San Lorenzo empatasse aos 9 – do segundo tempo -, também viu Darío Siviski ser expulso aos 23 da segunda etapa. Faltando dez minutos, a pressão rosarina surtiu efeito, com Hugo Galloni garantindo nova vitória centralista. Só que na 21ª rodada veio um banho frio, dos mais gelados: Deportivo Español 3-0, com direito a uma expulsão de Urruti. Como se não bastasse, um River cheio de reservas triunfou em seguida em Arroyito, em 5 de dezembro; os titulares estavam poupados para o jogo do Mundial Interclubes para dali a nove dias.
Até o treinador riverplatense era “reserva”, o assistente Fernando Areán, que escalou José Miguel, Rubén Gómez, Héctor Vittor, Pablo Erbín e Sergio Míguez, Mario Saralegui, Daniel Sperandío, Néstor Gorosito e Claudio Morresi, Patricio Hernández e Rubens Navarro. Morresi abriu o placar aos 12 e Néstor Piccoli, que o substituiu aos 8 do segundo tempo, ampliou sete minutos mais tarde. A normalidade parecia vir com um empate-relâmpago: aos 19, Hernán Díaz descontou para aos 21 um pênalti ser convertido por Palma. Mas, aos 33, Gorosito acertou uma bela falta.
Vieram mais dois jogos seguidos sem vitória. O 0-0 em Avellaneda contra o Independiente não foi de todo negativo, mas o Central vacilou em Arroyito contra o Instituto; um gol contra do próprio goleiro Lanari, ao sair desajeitado para cortar um cruzamento, pôs os cordobeses à frente aos 31 minutos, mas Palma (cobrando falta) e Galloni arrancaram uma virada rápida, aos 5 e aos 17 da segunda etapa. Mas logo aos 19 os visitantes deixaram tudo igual, em 21 de dezembro. O campeonato faria uma pausa de um mês, com a enxurrada de empates afastando o Central ligeiramente da ponta.
Quando o torneio foi recomeçado na 25ª rodada, em 25 de janeiro, a liderança era rosarina, mas para os 31 pontos do Newell’s. Independiente e San Lorenzo vinham logo atrás, com 30. A dupla Vélez e Ferro era quem parecia correr por fora, com 28. Em paralelo, um Boca na metade da tabela reagiu midiaticamente ao contratar o lendário César Menotti como novo treinador, logo colhendo resultados que o colocariam na briga pela taça. Mas as atenções do recomeço estavam em Rosario: afinal, a rodada teria nada menos que um Clásico Rosarino, agora no estádio rojinegro. O Central não se intimidou e conseguiu um pênalti aos 15 minutos… mas Palma mandou para cima do travessão. Ficaria em um 0-0 que à frente se mostraria favorável aos canallas.
Na 26ª, os auriazuis ainda mostravam que não podiam ser plenamente confiáveis. Quando, aos 2 minutos do segundo tempo, Escudero marcou, parecia matar o duelo em casa com o Estudiantes: era o 3-0 aberto com Gasparini cobrando falta aos 29 e ampliado por Palma aos 34. Mas, dois minutos depois dos 3-0, o veterano Enzo Trossero descontou. Miguel Ángel Russo até seria expulso aos 19, mas os platenses voltaram a diminuir: Trossero, de novo, aos 39. Mas ficou-se no 3-2. Na 27ª, então, Gasparini usou e abusou da lei do ex, em plena Córdoba. Víctor Ferreyra abriu o placar para o Racing local… e só.
Um tiro livre de Palma já empatava aos 35 minutos para o segundo tempo ver o show do Pato, autor de gols aos 8 (convertendo pênalti que ele mesmo sofrera), aos 17 e aos 25 na virada de 4-1. Já o herói da 28ª rodada foi o zagueiro-artilheiro Bauza, que arrancou no último minuto o único gol do duelo com o Deportivo Italiano. A rodada terminou com esse cenário na liderança: Independiente, Newell’s e San Lorenzo a dividiam com 35 pontos. Mas a série de vitórias do Boca de Menotti e do Central os colocavam no retrovisor, com 34. E a 29ª rodada viu justamente um Boca x Central, que parecia favorável aos visitantes na Bombonera: Gasparini abriu o placar aos 26 e aos 29 foi a vez de Lanari pegar um pênalti.
Mas o time auriazul vencedor foi o menottista: no segundo tempo, Claudio Tapia (um dos ilustres reservas de Maradona na seleção de 1986) empatou aos 9 e Alfredo Graciani duas vezes (aos 17 e aos 19) e Jorge Rinaldi (aos 40) anotaram o atropelamento. O Vélez pagou o pato: Escudero, uma falta de Palma e Gasparini construíram um 3-0 que Mario Lucca só veio a descontar já aos 44 do segundo tempo em Arroyito. Na 31ª rodada, um empate contra um Platense na briga para não cair não soaria bem, mas foi melhor digerido pois o Central começou perdendo e só achou a igualdade aos 44 do segundo tempo, graças à frieza de Gasparini na cobrança de um pênalti.
Na 32ª, os canallas obrigaram a lenda Ubaldo Fillol a recolher a bola por três vezes nas redes do Racing. Gasparini (14 minutos) abriu logo um placar que a expulsão de Carlos Olarán aos 39 ajudou a dilatar: Lanzidei, logo aos 8 do segundo tempo, e Scalise, aos 14, fecharam os 3-0. Na 33ª, foi preciso suar mais: com 5 minutos, o Talleres já vencia em Córdoba. Bauza (aos 15) e Lanzidei (aos 27) conseguiram virar relativamente cedo, mas Hernán Díaz desperdiçou aos 9 minutos do segundo tempo um pênalti que permitiria mais tranquilidade, que só veio quando o tallarin Claudio Chena foi expulso aos 40.
Àquela altura, a liderança já era dividida entre Newells e Central, ambos com 41 pontos. Boca e San Lorenzo tinham 40 e o Independiente, 39. E, ao fim da 34ª, a ponta era auriazul, duplamente auriazul: enquanto o Newell’s levou de 3-1 do Instituto, o Central somou um pontinho contra o Ferro, que soube segurar em Arroyito o 0-0. Passou a dividir a primeira colocação com os dois pontos que o Boca somou em confronto direto com o San Lorenzo, derrotado por 3-1 como mandante no estádio alugado do Vélez. Com um sonoro 5-1 no Estudiantes, o Independiente e seus 41 pontos se mantinham no páreo.
A liderança foi auriazul em dobro por mais uma rodada: Rosario Central 2-0 Gimnasia, gols de Lanzidei (44 minutos) e Hernán Díaz (23 do segundo tempo) e Boca 2-1 Deportivo Español fizeram os líderes irem a 44 pontos. O Newell’s não saiu do 1-1 com o Ferro fora de casa e estagnou nos 42, mesma pontuação do Independiente, a ficar no 2-2 com o Racing de Córdoba. O San Lorenzo, animicamente, ficava para trás de vez, derrotado pelo Vélez por 1-0, estacionando nos 40. Na 36ª, coube ao Central enfrentar Maradona, mas tratava-se do irmão caçula de Diego: Hugo entrou em campo quando seu Argentinos Jrs já perdia de 1-0, gol de falta de Palma aos 7 do segundo tempo. O próprio Palma deu números finais no estádio do Ferro, aos 34.
Foi ali que o Central enfim se isolou na ponta, com 46 pontos, beneficiado pelo Superclásico: no Monumental, o Boca no máximo buscou o empate em 1-1 e foi a 45 pontos, em jogo mais lembrado por expulsões (o xeneize Luis Abramovich aos 23 do segundo tempo, os millonarios Amérigo Gallego aos 34 e Antonio Alzamendi já aos 45). Já o Independiente chegou mais perto, somando 44 ao vencer facilmente o Deportivo Italiano por 2-0. O San Lorenzo até se engraçou com um 4-2 no Platense lhe significando 42 pontos, mas nada comparado ao Newell’s, a pintar um 7-1 sobre o Estudiantes. A Lepra estava viva, com os mesmos 44 do Independiente.
Boca e Independiente na 37ª e penúltima rodada então fizeram um jogaço-aço-aço, embora pouco valesse mais à frente. Parecia que morreriam abraçados quando, aos 42 do segundo tempo, Jorge Comas igualou em 2-2, mas no último minuto o talismã rojo José Percudani encontrou a vitória para os visitantes aos 45, mesmo em La Bombonera. O time de Avellaneda ia a 46, assim como o Newell’s, que conseguiu o placar mínimo a vinte minutos do fim de sua visita ao Racing de Córdoba. Já o outro Racing impôs uma virada de 3-1 sobre o San Lorenzo e tirou-o de vez da briga pela taça.
É que o Central venceu sem sustos o Unión por 2-1 e foi a 48, o que tirou também do páreo o Boca, estacionado com 45 e havendo apenas uma rodada restante – a vitória, repita-se, valia dois pontos e não três. No jogo do líder, a cabeça de Galloni abriu o placar logo aos 13 e Lanzidei ampliou aos 17 do segundo tempo. Os santafesinos já tinham um a menos em campo quando descontaram tarde demais, aos 43. O empate já serviria aos rosarinos na rodada final, quando tinham de visitar um Temperley na briga para não cair.
Ao Newell’s e ao Independiente, empatados com 46 cada, restavam vencer e torcer pela derrota do Central para forçar um tira-teima ou talvez um triangular. Outro concorrente do líder era a seleção olímpica, que tirou da reta final ninguém menos que o capitão do elenco, Jorge Balbis, ocupado com o pré-olímpico na Bolívia; um dia mais tarde, a Albiceleste se classificou mesmo derrotada pela Colômbia por 1-0, graças à vitória brasileira sobre os anfitriões por 2-1. Um dos reforços da seleção olímpica seria Islas, recuperado daquela fratura contra o Racing de Córdoba a ponto de ir à Copa América de 1987. Mas o treinador rojo José Omar Pastoriza preferia premiar o bom serviço do outrora Sergio Vargas e o manteve na titularidade pelo resto do campeonato.
Em Avellaneda, o Independiente iniciou seu jogo (contra o Vélez) com relativo atraso, mas sorriu primeiro: com três minutos, às 15h37, o lateral Clausen converteu um pênalti. Ainda não bastava, pois o 0-0 provisório no jogo do líder mantinha o Central na ponta, por um pontinho. Já o Newell’s não se ajudava, sofrendo 1-0 com sete minutos do seu jogo contra o rebaixado Deportivo Italiano, em cabeceio de Rubén Rojas – por sinal, ex-jogador do Central naquela mesma temporada, onde chegou a contabilizar sete partidas até receber passe livre em dezembro de 1986; logo, porém, o Independiente engoliu em seco, com o empate velezano saindo no minuto 24, com Pedro Larraquy. Quem também empatou, aos 31, foi o Newell’s, em pênalti convertido por Gustavo Dezotti.
Às 16h14, veio algum suspense. Foi quando um cabeceio certeiro de Ricardo Dabrowski contra o líder colocou o Temperley à frente aos 43 minutos do primeiro tempo, para o nervosismo da maioria presente no Estádio Alfredo Beranger: a multidão canalla havia tomado-o de assalto. Houvera quem, para conseguir entrar, tornou-se no próprio dia sócio do pequeno clube celeste para usufruir dos benefícios de um. Detalhe: o azarão jogava com um homem a menos desde os 26 minutos, após cartão vermelho punindo diretamente uma solada de Oscar Aguilar para cima de Roberto Gasparini – que rompeu os ligamentos do joelho no lance e precisou assim ser precocemente substituído por Juan José Urruti.
Mas, mesmo com a derrota provisória, os empates parciais de Independiente e Newell’s mantinham para o intervalo a liderança isolada no bairro de Arroyito. Eram 16h47, e 17 minutos do segundo tempo, quando o Central se aliviou mais: o zagueiro gasolero Orlando Ruiz usou a mão em cima da linha para evitar gol certo de Osvaldo Escudero (sim, pai do atacante que passou por diversos clubes brasileiros) e o pênalti foi convertido pelo artilheiro Palma – curiosamente, avaliado com apenas nota 6 pela revista El Gráfico, para quem os melhores auriazuis em campo teriam sido o goleiro Lanari, por sinal aniversariante na ocasião, e o lateral Hernán Díaz, ambos nota 7.
Os jogos da concorrência seguiam no 1-1 e até seriam logo movimentados, mas inutilmente. Aos 21 minutos do segundo tempo, Juan José Rossi virou para o Newell’s, que passava a ficar no aguardo de um golzinho do Temperley. Nove minutos depois, às 17h03, Dezotti acertou outro pênalti para assinalar Newell’s 3-1 Italiano. Mas, àquela altura, a montanha russa de emoções se voltava mais à definição dos últimos classificados à liguilla: os gigantes Racing e San Lorenzo, além do Ferro Carril Oeste, estavam no páreo por duas vagas finais e às 16h58 o Sanloré comemorava derrota provisória do Racing para o Deportivo Español, que abriu o placar aos 27 minutos; o time do Papa já vencia por 4-2 o Talleres e ainda fez o quinto quatro minutos depois. E teve a chance de um sexto outros três minutos mais tarde, quando o goleiro tallarin Ángel Comizzo espalmou um pênalti desferido por Norberto Ortega Sánchez.
Às 17h10, o Racing empatava sua partida, o que lhe bastava para retomar uma das vagas. Em Temperley, o drama se voltou à equipe da casa, cuja torcida até se permitia confraternizar junto dos visitantes. Mas às 17h14 chegou a impensável notícia de que o Platense, concorrente dos celestes contra o rebaixamento, virava um jogo que vinha perdendo de 2-0 para o River – dentro do Monumental. Para esses dois clubes, o campeonato se estenderia até 6 de maio, data do jogo-extra. O Tense venceria e o desengasgo dos rebaixados tardaria até uma revanche em 2014, quando levaram a melhor pela última vaga na segundona.
Às 17h17 de 2 de maio, terminava Argentinos Jrs 0-0 Ferro Carril Oeste, que assim se assegurava na liguilla às custas do San Lorenzo, que teria se classificado se acertasse aquele pênalti que valeria os 6-2 sobre o Talleres… ainda houve espaço para novos gols inúteis nos outros jogos do pódio: o Newell’s fez 4-1 com Julio Zamora, já aos 41 do seu segundo tempo, enquanto que os quinze minutos finais em Avellaneda viram o Independiente abrir 3-1 com gols-relâmpago (aos 30 e 32 do segundo tempo) para então ver o Vélez arrancar um 3-3 (aos 36 e aos 42). A igualdade velezana só serviu para confirmar que o vice-campeonato seria do Newell’s e reagrupar o calendário da liguilla. “Quando chegou a notícia de que já estava tudo feito no campo do Temperley, todos afrouxaram um pouco”, reconheceu o treinador rojo José Omar Pastoriza, que completou: “nós não perdemos, o Central é que ganhou”.
Nada que afetasse o campeão, cujo título era também a resposta ao que ocorrera treze anos antes – em que a Lepra, na casa centralista, levara a melhor no clássico que acabou decidindo o quadrangular final do Metropolitano de 1974 em favor dela (campeã argentina ali pela primeira vez). Em 1987, foi a vez de ela ter de se conformar (ou não) com um vice-campeonato dos mais doloridos e as consequentes gozações. O trauma, na época, foi tamanho que Solari teve que desligar-se do cargo, com até sua honra sendo questionada: embora ele fosse ex-jogador do Ñuls, seu irmão Eduardo (pai de Santiago, meia do Real Madrid na década passada; o Futebol Portenho falou dessa família aqui) era consagrado no Central.
Não ajudou muito El Indio ter proclamado aquele 2 de maio de 1987 como El Día del Pecho Frío (“Dia do Peito Frio”, em tradução literal de gíria que significa torcida pouco calorosa) ao rotular a própria barra do clube assim: “a este plantel jovem não se pode pedir mais. Há, sim, que pedir-se mais aos da arquibancada. São uns pecho fríos. E se eles tivessem mudado em vez de virem insultar, (…) o Newell’s teria sido campeão por seis ou sete pontos. Assim de decisivos foram”. A declaração “pegou”, rendendo até trocadilhos como Newell’s Cold Boys quando a equipe foi eliminada dramaticamente da Libertadores 2013.
O alento do Newell’s não demoraria a vir: o time logo entraria na melhor fase de sua história, que duraria até 1992, com três títulos argentinos – um, já na temporada seguinte; e dois vice-campeonatos na Libertadores, também no ano seguinte e em 1992, retrospecto que os lançou como postulante a “sexto grande” (cada vez mais incompatível com o Huracán) e ajudando a atrair para si Maradona em 1993. Ao passo de que o Central, desde então, vem enfrentou um jejum de títulos nacionais até aquela Copa Argentina de 2018 – a Copa Conmebol de 1995 foi exatamente a única taça levantada em todo aquele tempo, que incluiu ainda uma estadia na segundona entre 2010 e 2013.
Mas, 35 anos atrás, o mais sério desde o Estudiantes dos anos 60 e 80 a poder ser coroado com o tradicional rótulo do Huracán foi o Rosario Central. Era o quarto título argentino profissional da equipe de Arroyito, contra os então três dos pincharratas e um do rival citadino, do Globo e do outro (futuro) candidato ao posto, o Vélez. De fato, na ocasião, apenas os cinco grandes (Boca, River, Racing, Independiente e San Lorenzo) estavam à frente dos auriazuis no profissionalismo, enquanto hoje apenas o Huracán, destes nove, continua atrás.
Quem fez história há exatos 35 anos foi a escalação Alejandro Lanari (23 partidas); Hernán Díaz (35), Ariel Cuffaro Russo (17), Edgardo Bauza (37) e Julio Pedernera (37); Roberto Gasparini (28 e substituído por Juan José Urruti, de 31 jogos), Adelqui Cornaglia (33) e Omar Palma (38); Osvaldo Escudero (38 e substituído por Marcelo Toscanelli, de 12 jogos), Fernando Lanzidei (25) e Hugo Galloni (35), treinados pelo lendário Ángel Tulio Zof. O plantel ainda foi complementado com as 23 partidas do outrora capitão Jorge Balbis, zagueiro assim como Esteban Game, de uma só partida; pelos atacantes Pedro Argota (10), Claudio Scalise (8), Rubén Rojas (7) e Erasmo Doroni (1); pelos laterais José Di Leo (19) e Roque Caballero (6); e pelos goleiros Jorge Fossati (16, até ser liberado em dezembro de 1986) e Sergio Protti e Gustavo Ferlatti (ambos com zero jogos).
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