Primeira Divisão

Os 17 maiores Judas do Futebol Argentino

A Páscoa 2017 é um bom gatilho para elencarmos os 17 maiores doblecamisetas do futebol argentino. Para enxugar uma lista extensa, fomos rigorosos no critério quantitativo: estar em ao menos dois lados de duas rivalidades argentinas clássicas. De forma objetiva, cada rivalidade conferiu dois pontos, com um ponto extra a rivalidades no exterior ou passagens por rivais secundários; pontos extras por camisa a quem saiu-se razoavelmente bem nela; e pontos dobrados aos ídolos por camisa. Só arredamos a matemática nos três primeiros lugares, onde o qualitativo tinha que falar mais alto.

De rivalidades clássicas, entenda-se um Dock Sud x San Telmo, mas não um Boca x San Lorenzo e afins, ou a lista ficaria intrincada demais. Por isso Luis Carranza, de transferências entre quatro gigantes no início dos anos 90, não aparece. No seleto grupo de quem esteve em quatro dos cinco grandes (até hoje ninguém esteve nos cinco), só lhe faltou o River: formado no Racing, teve brilharecos lá e no Boca, onde chegou à seleção. Lesões frearam a carreira no Independiente em 1995 (campeão da Supercopa, mas só jogou a primeira partida) e no San Lorenzo em 1996, onde só atuou seis vezes.

Faixa-bônus: Carranza foi o último a emendar grandes seguidos (Racing-Boca-Independiente-San Lorenzo), mas não cumpriu nossos requisitos

A única exceção (justificada) ao rigor quanto aos clássicos tradicionais ficou na última colocação, obviamente, mas não poderia ficar de fora. Salvo outras justificadas exceções, priorizamos também nomes mais recentes, de travessias desde os anos 70, quando a polêmica (e violência entre torcidas rivais) em torno cresceu, além de obviamente quem fez a diferença por ao menos um dos clubes – especialmente os de camisa mais pesada e/ou que dividem ao meio uma cidade.

Daí a ausência de quem teve um destaque no máximo relativo por uma única camisa, casos, curiosamente, de diversos goleiros: Juan Carlos Bertoldi no Rosario Central, de onde foi alçado a reserva campeão da Copa América de 1959 (seguiu para Huracán, para um único jogo oficial pelo San Lorenzo e depois Newell’s); Carlos Gay e Esteban Pogany, ambos ex-Independiente & Racing e Huracán & San Lorenzo, com Gay (ídolo rojo decisivo na Libertadores 1974, pegando até pênalti na final com o São Paulo) jogando ainda no River; e Pogany, do Sanloré semifinalista da Libertadores 1988 e ex-reserva de Gay naquele Independiente, no Boca; e Juan Carlos Delménico, reserva do Gimnasia LP rebaixado em 1979 que esteve no Estudiantes campeão de 1982.

Mas Delménico ficou mais famoso por ser o último vira-casaca rosarino, mas como ex-reserva no Newell’s no início dos anos 70 e, tal como no Gimnasia, rebaixado no Rosario Central, mas como titular em 1984. Este trauma parece ajudar que a rivalidade mais ferrenha do país não experimente desde então novas “travessias”. O goleiro, de todo modo, só teve reconhecimento na Colômbia, onde esteve nos primeiros títulos do Junior de Barranquilla, cuja conexão com o Estudiantes (Juan Ramón Verón era jogador-treinador do Junior) rendeu-lhe a passagem pelo Pincha.

Faixa-bônus: Delménico não é só o último vira-casaca de Newells & Rosario Central (em 1984): também defendeu Gimnasia LP e Estudiantes! Mas idolatria mesmo, só na Colômbia

José Varacka foi um volante-zagueiro ídolo de Independiente e River que treinou o Boca e também a dupla San Lorenzo e Huracán, mas ficou conhecido maldosamente como um pé-frio sem troféus em nenhum, todos entre os principais times do país. Mesmo seu bom trabalho no Huracán, na metade final da temporada 1985-86, não evitou o primeiro rebaixamento do clube.

Antes de mostrarmos os eleitos, vale ressaltar casos sui generis. Embora desde os anos 80 haja grande rivalidade do Argentinos Jrs com o Platense, o clássico tradicional do Tense é com o Tigre – enquanto que o mais perto que os bichos colorados chegaram de um clássico é com o All Boys, com duelos seguidos no amadorismo, na segundona pelos anos 30, 40 e 50 e na elite dos anos 70. Para o Albo, essa rivalidade é grande, mas um nível abaixo da que troca, em graus mútuos, com o Nueva Chicago – cuja torcida criou o famoso cântico “La concha de tu madre All Boys“.

Por isso, elegemos o 16º colocado, mas não Claudio Borghi, ex-jogador de River que treinou o Boca e que, a despeito de ser emblema do Argentinos Jrs (é o único presente em todos os títulos expressivos colorados: Metropolitano 1984, Nacional 1985 e Libertadores 1985 como jogador; e Clausura 2010 como técnico), passou no fim da carreira rapidamente pelo Platense.

Faixa-bônus: Pogany por Independiente & Racing, Huracán & San Lorenzo. E Boca!

Outra situação especial é a das rivalidades de Córdoba. Só consideramos quem fez a troca a partir de 1985, daí a ausência de vira-casacas antes desse tempo, como Pablo Comelles, ex-River & Boca (e San Lorenzo!) e ex-Talleres & Belgrano; ou de Alfio Basile, ex-jogador do Huracán que treinou o San Lorenzo bem como a dupla secundária cordobesa, Instituto & Racing (não confundir com o de Avellaneda). Explica-se: o campeonato argentino era restrito à Grande Buenos Aires, La Plata, Rosario e Santa Fe, apesar do nome. Clubes cordobeses se restringiam à liga cordobesa. Em 1967, foi criado então o Torneio Nacional, que reunia os melhores do campeonato argentino, renomeado Metropolitano, com os das ligas do interior.

Ruggeri no Vélez

Como as vagas do interior eram restritas, ficou comum o empréstimo entre rivais: quem jogaria se fortalecia e quem emprestava poderia valorizar seu jogador. Por se classificarem três vezes seguidas aos mata-matas do Torneio Nacional, os cordobeses Talleres (1980), Instituto (1981) e Racing (1982) foram incluídos no próprio Torneio Metropolitano, ficando indiferentes aos resultados na liga cordobesa, mas o Belgrano não. Em 1985, o Torneio Nacional foi encerrado, e em seu lugar a segunda divisão do Metropolitano se nacionalizou para a temporada 1985-86. Foi só aí que o Belgrano pôde entrar.

Vamos aos eleitos, mencionando desde já outros ausentes: Osvaldo Pérez (Boca & River, Racing & Independiente), José Albornoz (Racing & Independiente, Talleres & Belgrano), Alberto Dezorzi (Boca & River, Atlanta & Chacarita), Miguel Converti (Atlanta & Chacarita, Huracán & San Lorenzo, além de Millonarios & Santa Fe) e Jorge Trezeguet (Almagro & Estudiantes de Buenos Aires, Sportivo Italiano & Deportivo Español).

17. Oscar Ruggeri
Rivais: Boca & River (ambos jogador); Extras: Vélez (jogador), San Lorenzo (jogador e técnico) e Independiente (técnico).

El Cabezón, a rigor, só foi vira-casaca em um clássico, o Super. Mas o líbero não poderia ser nome ausente: é justamente ele quem mais defendeu a Argentina vindo de clubes diferentes; o único a vesti-la vindo dos três grandes portenhos (Boca, River e San Lorenzo); e também único campeão nos três. Vale a Ruggeri o desconto de que, ao chegar nos azulgranas, a rivalidade com outro ex-clube, o Vélez, não estava tão aflorada – El Fortín ainda não havia vencido a Libertadores.

Ruggeri não conseguira troféus no Vélez, mas também teve bom desempenho individual lá, sendo como jogador velezano capitão da seleção argentina campeã da Copa América após 32 anos, em 1991. Dos cinco grandes, só lhe faltou o Racing, pois esteve no Independiente como técnico, promovendo a estreia de Sergio Agüero, de 15 anos, no futebol adulto. Além de tudo isso, as circunstâncias de sua transferência direta do Boca (pelo qual torcia na infância e era ídolo em tempos dificílimos) ao River foram cruéis à torcida auriazul. Explicamos aqui.

16. Sergio Batista
Rivais: 
Argentinos Jrs (jogador e técnico) & All Boys (jogador); Nueva Chicago (jogador e técnico) & All Boys (jogador).

El Checho ganhou pontos extras por ser um dos maiores emblemas do Argentinos Jrs, onde ganhou quase tudo entre 1984 e 1985, só faltando um Mundial que por sete minutos não foi conquistado. O detalhe é que o volante na infância era torcedor do rival All Boys, o que não o impediu de consagrar-se no vizinho e em jogar no outro grande rival do Albo, o Nueva Chicago, em 1992 – tentava voltar a jogar futebol após um ano parado em função das drogas, vício que se entregara com a morte do pai. Após se desintoxicar no futebol japonês, foi enfim convidado a jogar no All Boys.

García Ameijenda por San Lorenzo e Estudiantes: teria passo breve nos rivais. Batista por Argentinos Jrs, All Boys e Nueva Chicago

Em duas temporadas, foi capitão pelo time do bairro da Floresta, que em ambas (1997-98 e 1998-99) chegou aos mata-matas do acesso à elite, de onde se ausentava desde 1980. Apesar do antigo coração alvinegro, Batista esteve nos dois rivais também como técnico. No Argentinos Jrs, foi rebaixado em 2002 mas conseguiu o acesso em 2004, dali voltando ao Chicago. No bairro de Mataderos, quase conseguiu o segundo acesso seguido, caindo nas semifinais da temporada 2004-05.

15. Antonio García Ameijenda
Rivais:
San Lorenzo (jogador e assistente técnico) & Huracán (jogador); Estudiantes & Gimnasia (ambos jogador).

Versátil como volante ou ponta, este espanhol de La Coruña vive desde os sete meses na Argentina e chegou a jogar nas seleções juvenis da Albiceleste. No San Lorenzo, clube associado à comunidade hispano-argentina desde os anos 30, formou-se e passou sete anos. Destacou-se especialmente no dourado ano de 1972 (ganhou-se tanto o Metropolitano como o Nacional, algo inédito), quando foi até capitão em alguns jogos. Também foi campeão nacional em 1974. Em 1975, foi vice, já pelo Estudiantes, marcando até três gols no “ex-rival” Huracán, onde foi jogar menos de dez partidas em 1978. Em 1979, esteve no rebaixamento do Gimnasia.

14. Julio César Toresani
Rivais: 
Unión (jogador) & Colón (jogador, treinador e auxiliar); River & Boca (ambos jogador). Extra: Independiente (jogador).

Toresani não foi apelidado de El Huevo (literalmente, “o ovo”, palavra que no jargão do futebol argentino tem sentido de culhões, raça e/ou gana) à toa. Foi extremamente vaiado em sua estreia pelo Boca em 1996, devido ao passado millonario e por um incidente de 1995: jogando no Colón, trocou vários bate-bocas com Maradona justo na reestreia de Dieguito em La Bombonera. “Pecados” que ele corrigiu com muito suor, comparações favoráveis à torcida auriazul no quesito calor humano e um gol no Superclásico na casa rival – no duelo histórico que seria despedida do próprio Maradona.

Toresani por Unión, Colón, River e Boca

Como se não bastasse, Toresani teve diversas passagens pela dupla de Santa Fe. Foram duas no Unión, onde se formou nos anos 80. No Tatengue, caiu em 1988 mas subiu em 1989 com o gosto de vitória sobre o rival Colón na decisão pela segunda vaga. Mas passou ainda mais vezes pelo vizinho. O ponta-direita ficou de 1991 a 1995 no River, com mais titularidade até o início de 1994, quando fez o gol do título do Apertura 1993 (finalizado em março do ano seguinte) de um elenco mais eficaz que vistoso. Reforçou o Colón, que recém-voltava da segundona, e revelou-se torcedor sabalero. Após uma boa temporada, foi passar outra por Boca e outra no Independiente, com dois retornos ao Colón.

13. Darío Gigena
Rivais: 
Belgrano & Talleres; Unión & Colón (todos como jogador). Extra: Racing de Córdoba (jogador).

A Ponte Preta, onde Gigena foi talismã em 2003, foi o time que melhor teve fidelidade dele (esteve nas arquibancadas em Lanús na torcida alvinegra na final da Sul-Americana 2013). Tiramos as palavras do En Una Baldosa, que só errou ao dizer que nada fez em Campinas: “o atacante é apelidado de El Topo, mas tranquilamente poderia ser El Traidor, El Vendido e demais”. Formado no Belgrano, fez bons 14 gols na segundona de 1996-97, onde o Pirata caiu nas semifinais do acesso. El Topo (“O Toupeira”) Gigena despertou interesse do River, mas preferiu o Rayo Vallecano, não se dando bem.

Voltou à Argentina para jogar no Unión, com onze gols importantes na temporada 1998-99, onde o Tatengue ficou a duas posições da queda. No segundo semestre de 1999, foi ao Talleres. Fez o gol que ressuscitou La T na final da Copa Conmebol, pondo 2-0 aos 30 do segundo tempo (na ida, o CSA havia vencido por 4-2); e outros treze na temporada 1999-2000, onde os alviazuis ficaram a uma posição da vaga na Libertadores. Fez gols em clássicos cordobeses pelas duas camisas. Para a temporada seguinte, foi ao Colón. Fez gol no clássico, mas os números gerais caíram, saindo para brigar (inutilmente) contra o rebaixamento pelo Huracán em 2002-03. Dali saiu para ter êxito em outra luta contra a queda, agora pela Ponte. Ainda passou pelo Racing cordobês depois.

Darío Gigena por Belgrano & Talleres (celebrando seu gol na final da Copa Conmebol), Unión & Colón

12. Pedro Dellacha
Rivais: 
Racing (jogador e técnico) & Independiente (técnico); San Lorenzo & Huracán (ambos técnico).

Don Pedro del Area foi um dos maiores zagueiros dos anos 50 (Pelé o rotulou de mais duro marcador que teve), defendendo o Racing por sete temporadas e ganhando um título. Era também o capitão da seleção argentina campeã da Copa América de 1957. Já como treinador, fez mais sucesso na grama vizinha: ganhou a primeira e a última Libertadores da recordista série de quatro seguidamente vencidas pelo Independiente, em 1972 (com o mérito de ser a única dessas quatro voltas olímpicas que pôde ser dada dentro de casa) e em 1975 (com o mérito de reverter com goleadas uma desclassificação quase assegurada), promovendo ainda a estreia do maior ídolo do Rojo, Ricardo Bochini.

Na nova carreira, teve passagens por outra dupla rival. Não foi ruim, mas não teve êxitos: seu San Lorenzo de 1969-70 bateu na trave nos mata-matas, na entressafra do título invicto de 1968 com os dobrados de 1972. Foi chamado de emergência pelo Huracán em 1986 nos últimos quatro meses da temporada 1985-86. O time, do mesmo jeito, foi pela primeira vez rebaixado, e a dor foi maior porque sob Dellacha houve um salto nos resultados, permitindo que a torcida acreditasse até o fim.

Dellacha por Racing e Independiente; Spinetto por Vélez e Ferro; Avallay por Independiente e Racing

11. Roque Avallay
Rivais: 
Independiente & Racing; Atlanta & Chacarita (todos como jogador).

Como jogador, Avallay identificou-se mais com o Huracán, onde foi uma das estrelas do vistoso título de 1973 – o último do clube e único desde 1928. Só não foi à Copa de 1974 por lesão. Já era um atacante experiente, que aos 20 anos foi campeão da segunda Libertadores do Independiente, marcando inclusive gol na finalíssima com o Peñarol, ainda que não tenha sido um matador no Rojo. Já trintão, desembarcou em 1976 no Atlanta, onde não foi tão bem. Recarregou a munição no rival: por um Chacarita que ficou a dois pontos de cair em 1977, foi 3º na artilharia do Metropolitano, cavando transferência ao Racing. Na Academia, foi vice-artilheiro do Nacional.

10. Victorio Spinetto
Rivais: 
Vélez (jogador e técnico) & Ferro Carril Oeste (técnico); Independiente (jogador) & Racing (técnico). Extra: Atlanta, Argentinos Jrs, Platense.

Don Victorio foi um dos maiores símbolos do Vélez. Volante artilheiro que o defendeu por oito anos, foi técnico seguidamente por mais de dez, tirando o Fortín pela última vez da segundona e sendo vice em 1953, o mais alto do pódio que o clube de Liniers alcançou até então. É o técnico com mais jogos seguidos e no geral lá e também no Atlanta, onde esteve na campanha do título mais expressivo do Bohemio, a Copa Suécia (travada entre 1958 e 1960). Teve ainda mais de uma passagem pelo Argentinos Jrs, com quem o Atlanta tem uma rivalidade secundária.

Ainda como jogador, Spinetto passou uma temporada no Independiente, em 1938, sendo campeão como reserva de Raúl Leguizamón. Foi discreto também do outro lado de Avellaneda, como um dos três técnicos do Racing de 1971. E o rico passado velezano não o impediu de fazer grande trabalho também no rival Ferro Carril Oeste. O livro oficial do centenário verdolaga considera-o o segundo maior técnico da equipe do bairro de Caballito, atrás só de Carlos Griguol (dos dois títulos do FCO na elite, em 1982 e 1984): armou o conjunto que em 1974 foi desclassificado nos critérios de desempate ao quadrangular final do Metropolitano e que disputou o octagonal final do Nacional.

 Ludueña foi de Belgrano & Talleres, Racing & Independiente. Tudo em travessias seguidas!

9. Miguel Ángel Ludueña
Rivais: Belgrano & Talleres; Racing & Independiente (todos como jogador).

Ser titular do primeiro título (internacional, ainda por cima) em mais de vinte anos por um gigante e em seguida ir ao rival requer coragem. El Negro Ludueña a teve em 1988 após emendar travessias: volante titular de um Belgrano recordista de vitórias em 1984 (incluindo-se jogos provinciais e nacionais), ficou no Pirata até o fim do Nacional de 1985. Para o campeonato argentino de 1985-86, passou ao Talleres, de onde rumou ao Racing. Ganhou na Academia a Supercopa Libertadores em 1988, mas, com problemas na renovação de contrato, foi ao Independiente para ser campeão da temporada 1988-89. A melhor fase foi mesmo no Rojo, capaz de fazer Ludueña estrear com 33 anos pela seleção, em 1991. Depois dele, só Hugo Pérez foi campeão nos rivais de Avellaneda.

8. Norberto Raffo
Rivais:
Independiente & Racing (ambos como jogador); Lanús (jogador e técnico) & Talleres de Escalada (técnico). Extras: Banfield (jogador e técnico); Altos Hornos Zapla (jogador e técnico) & Gimnasia Jujuy (técnico).

El Toro foi um raro campeão em comum tanto na rivalidade de Avellaneda como na do Sul. Reserva no título do Independiente de 1960, a quebrar o maior jejum do Rojo (doze anos), foi ao Banfield ser fundamental na segundona de 1962. Chegou à seleção como jogador do Taladro, indo ao Racing para ser o artilheiro da Libertadores do clube, em 1967. Fez gols na finalíssima dela e da segunda final do Mundial. Em 1971, já veterano, venceu a segundona, agora pelo Lanús, com direito a gol no clássico original do Granate, travado com o Talleres de Escalada – cuja decadência fez os grenás mutuamente direcionarem as rixas ao Banfield (cujo rival clássico era o Los Andes). Nem isso nem o coração lanusense o impediu de treinar os dois rivais, além do próprio Lanús.

Raffo também figurou nos dois lados do Clásico Jujueño, considerado só como “extra” por El Toro ter trabalhado na dupla principal da província de Jujuy naquele período do Torneio Nacional.

Norberto Raffo: um campeão por Independiente, Racing, Banfield e Lanús

7. Vladislao Cap
Rivais: Racing (jogador) & Independiente (treinador); River (jogador e treinador) & Boca; Vélez (jogador) & Ferro Carril Oeste (treinador).

O ex-volante é até hoje o único técnico a passar diretamente de um grande a outro na Argentina. Ainda por cima, isso foi do Boca ao River, em 1982. A dupla havia sido campeã em 1981 e de repente se via em situação turbulenta: em função da alta do dólar em 240% com os desmandos da ditadura, eles viam escoar ao futebol europeu Maradona, Kempes, Passarella e Ramón Díaz. No Boca, El Polaco Cap sucedeu o campeão Silvio Marzolini (outro a sair por fatores econômicos) e começou bem no Torneio Nacional de 1982, mas terminou eliminado na primeira fase e demitido. Em maio, sucedeu no River o campeão Alfredo Di Stéfano, mas foi fulminado por um câncer em setembro.

Como jogador, Cap foi duas vezes campeão no Racing nos anos 50 e uma na Copa América pela seleção. Esteve na Copa de 1962 como jogador de um River vistoso, mas que não saía do jejum. Parou no Vélez em 1966. Técnico da seleção na Copa de 1974, nessa função passou pelos clássicos rivais racinguista (Independiente, sendo campeão em 1971, taça que credenciou o time à série de Libertadores vencidas entre 1972-75) e velezano (Ferro Carril Oeste), além da dupla principal do país.

Vladislao Cap: campeão pelos dois de Avellaneda e presente em um mesmo ano na dupla Boca & River. Único a reunir as duas situações raríssimas, ainda trabalhou na dupla Vélez e Ferro

6. Juan Carlos Lorenzo
Rivais: 
Chacarita (jogador) & Atlanta (técnico); Boca (jogador e técnico) & River (técnico). Extra: Lazio & Roma (ambos técnico); San Lorenzo (técnico); Racing (técnico).

Um dos mais vitoriosos técnicos do futebol argentino, a comandar a seleção nas Copas de 1962 e 1966, entre elas passou diretamente da Lazio à Roma (em 1964)! Ex-meia e ponta comum em meio a tanto talento nos anos 40, rumou à Europa ainda como jogador em tempos nos quais a lei do passe e a menor desigualdade econômica tornavam mais difíceis a saída de astros do que de medianos. De lá voltou com um estilo mais pragmático e resultadista do que artístico. Credenciado pela boa Copa de 1966, chegou em 1967 a um River que entrava no décimo ano de jejum. Foi um desastre.

História diferente ocorreu no San Lorenzo, onde ganhou em um mesmo ano, em 1972, os dois principais troféus argentinos (Metropolitano e Nacional), algo inédito que o treinador repetiu em 1976 no Boca – onde levantou ainda as duas primeiras Libertadores e o primeiro Mundial. O ciclo acabou no vice na terceira final seguida de Libertadores, em 1979. Assumiu o Racing no ano seguinte, sem repetir a dose. Voltou ao San Lorenzo sob emergência em 1981, mas a reação foi tardia demais e o clube caiu. Foi na segundona que El Toto teve seu canto do cisne: o título de 1983 com o Atlanta, repondo o Bohemio (rival do Chacarita, onde se formara jogador…) pela última vez na elite.

Lorenzo, formado no Chacarita, é carregado no título do Atlanta na segundona de 1983. Maior técnico do Boca antes de Carlos Bianchi, esteve no River. E por Lazio & Roma!

5. Juan José López
Rivais: River (jogador e técnico) & Boca (jogador); Talleres (jogador e técnico) & Belgrano (jogador e auxiliar); Racing de Córdoba & Instituto (ambos como técnico).

Quando o River foi rebaixado em 2011, Jota Jota López era um dos alvos da fúria no vídeo-meme do Tano Pasman, que aos palavrões vociferou em dado momento o fato do passivo treinador millonario, outrora ídolo como jogador, ter vestido a camisa do Boca. Isso se deu em 1983 em vingança pessoal de quem havia sido expulso pelo ex-presidente do River em 1981, após mais de dez anos de história em Núñez. O classudo volante virou auriazul credenciado também pelo bom Talleres que integrara em 1982, semifinalista nacional. Do Boca, foi ser um reserva útil no grande Argentinos Jrs campeão de quase tudo entre 1984 e 1985, saindo no início de 1986 para o rival tallarin.

No Belgrano, foi titular na campanha campeã do torneio federal que dava vagas aos clubes do interior na segundona recém-nacionalizada do campeonato argentino. O que não o impediu de voltar ao Talleres como técnico da boa campanha de 2000. Nascido na província de Buenos Aires mas filho de cordobeses, ele ainda treinou a dupla secundária de Córdoba (Instituto e o Racing local). Não à toa, foi sondado pelo “quinto grande” de lá, o General Paz Juniors. Ainda assim, jurou em entrevista à El Gráfico que “jamais me gritaram ‘mercenário'”. Indagado como fazia para “sobreviver” em Córdoba, foi direto: “é que nunca tive uma identificação muito grande com nenhum”.

Juan José López foi ídolo no River, mas esteve no Boca. Ainda passou por Talleres, Belgrano e na outra dupla cordobesa (Instituto e o Racing local)

4. Ricardo Caruso Lombardi
Rivais: Atlanta & Chacarita (ambos jogador); Argentinos Jrs (jogador e técnico) & All Boys (técnico); Almagro (jogador) & Estudiantes de Buenos Aires (técnico); Platense & Tigre (ambos técnico); El Porvenir & Arsenal (ambos técnico); San Lorenzo & Huracán (ambos técnico). Extras: rivalidades interligadas do norte portenho.

Ex-volante inexpressivo, Caruso Lombardi virou uma verborrágica versão argentina de Joel Santana, com muito folclore e estrela para campanhas de emergência contra rebaixamentos: assim livrou duas vezes o Argentinos Jrs (2007 e 2013), Newell’s (2008), Racing (2009), San Lorenzo (2012), Quilmes (2014) e Sarmiento (2016), conseguindo milagre de levar o San Lorenzo à repescagem (a Promoción) quando a situação parecia condenada – o que a médio prazo seria capaz de impedir os títulos azulgranas na elite em 2013 e na Libertadores de 2014, já sob outros treinadores. Já seu Quilmes ficou na última posição que se salvava.

Ainda conseguiu acessos no Sportivo Italiano (como jogador à elite em 1986 e técnico à segundona em 1996) e Tigre, onde houve em 2007 o gosto especial de vencer nos mata-matas os dois principais rivais do Matador: o tradicional (Platense) e o moderno (Chacarita), ambos clubes em que trabalhara também. A trajetória de El Tano, por sinal, explica as diversas rivalidades difusas dos pequenos clubes do noroeste de Buenos Aires. Nesse ambiente em que desencontros de divisão por anos são comuns, elas se interligam: ele também trabalhou tanto no Argentinos Jrs como no seu rival clássico (All Boys) e no moderno (Platense). Seria o eleito se a análise fosse só quantitativa…

Caruso Lombardi por Chacarita (no estádio do Atlanta), Tigre, San Lorenzo e Huracán. Ao meio, torcida do Tigre festeja em 2007 com caixões marrom (cor do Platense) e tricolor (do Chaca)

3. Héctor Veira
Rivais: San Lorenzo (jogador e técnico) & Huracán (jogador); River & Boca (ambos técnico); Extras: Palmeiras & Corinthians (ambos jogador); Banfield (jogador e técnico) & Lanús (técnico); Vélez (técnico).

Exemplo de craque precoce sucumbido pela boemia, Veira tinha tanto carisma que se blindava das vaias e das “travessias”. Formado no San Lorenzo, declarou-se torcedor do Huracán ao ir ao rival em 1970. Afinal, era filho do bairro huracanense, o de Parque de los Patricios. Teve bom desempenho individual no Globo, mas ainda voltou aos azulgranas em 1973. Viraria o técnico com mais jogos e passagens pelo Sanloré. Levou um time recém-saído da segundona ao vice na elite em 1983; às semis da Libertadores de 1988; e à quebra do maior jejum sanlorencista, em 1995. El Bambino acabou eleito o maior ídolo do clube no centenário, em 2008. Idolatria que já existia a ponto de fazê-lo em 1982 ser carregado pela torcida na volta olímpica da segundona.

O detalhe é que em 1982 Veira era técnico do adversário Banfield! Ele, que treinou ainda o rival banfileño Lanús, faria história no River como técnico das primeiras Libertadores e Mundial em Núñez, em 1986. E conseguiu ser admirado também no Boca, onde em 1997 conduziu pontuação só superada sete vezes na história dos torneios curtos. Para seu azar, uma delas foi justamente ali, com o River somando uma unidade a mais. Quase virou o único técnico campeão nos três grandes de Buenos Aires. Esteve rapidamente no Vélez em 1991, lapidando o talismã Omar Asad. Em 1976, ainda como jogador, acertou com o Palmeiras, mas após alguns amistosos Vicente Matheus o atravessou ao Corinthians. Saiba mais sobre esse exímio contador de histórias.

Veira conseguiu ser admirado por San Lorenzo, Huracán, River (com Ruggeri) e Boca (com Maradona). E ainda passou por Banfield e Lanús, que fazem o “clássico do Sul”

2. César Menotti
Rivais: Rosario Central (jogador e técnico) & Newell’s (auxiliar); Racing (jogador) & Independiente (técnico); Boca (jogador e técnico) & River (técnico); Extras: Barcelona & Atlético de Madrid; achar Pelé superior a Maradona.

Menotti no Rosario Central

Menotti é simplesmente o único a trabalhar em ambos os lados das três principais rivalidades argentinas. E estaria nas quatro se passasse pelo San Lorenzo, o que faria dele também o único a trabalhar nos cinco grandes. Como jogador, El Flaco foi aquele tipo de armador classudo, mas criticado por suposta lentidão e falta de sacrifício. Teve seu melhor momento no Rosario Central, onde foi revelado, onde parou e onde foi convocado à seleção. Depois, passou sem êxito por Boca e Racing, mas esteve até no Santos de Pelé. Após parar, em 1970 começou como assistente no arquirrival canalla, o Newell’s.

Indagado em 2014 se não se sentia traindo o Central, saiu-se com essa: “sabes o que acontece? Sou muito rosarino. Para mim, Rosario é uma cidade diferente, como um bairro gigante de Buenos Aires. Se jogam Central-Newell’s, óbvio que quero que o Central ganhe, mas se jogam Newell’s-Boca, já me coloco meio rosarino”. Em 1971, assumiu o Huracán (daí só ter-lhe faltado o San Lorenzo), tirando-o em 1973 de um jejum de 45 anos no campeonato argentino, em título marcado pelo futebol vistoso, alçando o treinador à seleção.

Já consagrado como técnico, Menotti teve passagens pelo Boca nos anos 80 e nos 90, sem troféus – entre elas, uma no River no fim dos anos 80. Na nova função, identificou-se mais com o Independiente, onde teve mais de uma passagem, até como manager. Só foi campeão em torneios amistosos, mas seu Rojo teve um elogiado futebol na virada de 1996 para 1997. Além de tudo, reiterou em 2014 que acha Pelé (a quem entregou nos anos 80 o troféu de Atleta do Século) superior a Maradona e Messi.

Menotti ainda trabalhou em Rosario Central e Newell’s. Único nas três principais rivalidades do país.

1. Zoilo Canaveri
Rivais: Independiente (jogador e técnico) & Racing (jogador); Boca & River (ambos jogador); Extra: seleção argentina sendo uruguaio.

A rigor, quantitativamente houve mais vira-casacas que ele. Mas Canaveri fez isso no amadorismo. Ou seja, não trocou de camisas em nome do sustento próprio. Também foi o primeiro a jogar em tantos grandes do futebol argentino (ressalva-se que eram quase clubes de bairro na época): primeiramente em três, depois em quatro. Integrante do Independiente vice de 1912, passou ao River em 1913. Voltou a Avellaneda para ser bi em 1914-15 em meio ao recordista heptacampeonato do Racing. Reserva no primeiro título argentino do Boca em 1919, o ponta-direita voltou ao Independiente para estar nos primeiros títulos argentinos do Rojo, em 1922 e 1926.

Foi o primeiro técnico profissional do Independiente – que chegou a ser presidido nos anos 20 por seu primo Pedro Canaveri (em cuja gestão ergue-se a Doble Visera, antigo estádio do clube), depois presidente da AFA nos anos 40. Para arrematar, Zoilo Canaveri foi um uruguaio que jogou pela Argentina (só outro charrua foi Albiceleste, Horacio Vignoles, também daqueles tempos)! Foi ainda como racinguista. Foram duas vezes, em 1916. Ambas contra o Uruguai natal. Incluindo um 7-2…

Entre as passagens pelo Independiente, o uruguaio Canaveri jogou pela seleção argentina e foi campeão também por Racing e Boca. Mas não conseguiu registros fotográficos no River. Só lhe faltou o San Lorenzo!

Diversas dessas rivalidades e seus vira-casacas já merecerem Especiais. Confira:

Boca-River IBoca-River II, Boca-River III, Boca-River IVRacing-Independiente I, Racing-Independiente II, Racing-Independiente III, Racing-Independiente IVHuracán-San Lorenzo IHuracán-San Lorenzo II, Huracán-San Lorenzo IIINewell’s-Rosario Central I, Newell’s-Rosario Central IIEstudiantes-Gimnasia I, Estudiantes-Gimnasia II, Belgrano-TalleresVélez-Ferro Carril Oeste, Atlanta-ChacaritaColón-UniónBanfield-Lanús, Quilmes-Argentino, Platense-Tigre, Argentinos Jrs-All Boys, All Boys-Nueva Chicago, Dock Sud-San Telmo e Atlético Tucumán-San Martín.

Também já escrevemos sobre os vira-casacas interligados entre os cinco grandes, rivalidades nem sempre classificadas como clássicas: Boca-RacingRiver-IndependienteIndependiente-San LorenzoRacing-San Lorenzo,  River-Racing, Boca-IndependienteBoca-San Lorenzo River-San Lorenzo.

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

One thought on “Os 17 maiores Judas do Futebol Argentino

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