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50 anos de Beto Acosta, o Martín Palermo do San Lorenzo

Falar de Beto Acosta no Brasil remete aos mais jovens (alguns nem mais tão jovens) ao uruguaio de brilho fugaz em 2007 pelo Náutico. Mas na Argentina e em Portugal, falar em Beto Acosta é referir-se a uma entidade. É abordar Alberto Federico Acosta, filho pródigo do San Lorenzo em tempos complicados dos cuervos. Tosco, sem virtuosimo com a bola, mas artilheiro efetivo, brigador com os zagueiros, predestinado e carismático, é fácil compara-lo a Martín Palermo. A rigor, Palermo é quem seria o Acosta do Boca, pois o Beto surgiu antes. Conseguiu ser vitorioso ainda no decadente Sporting Lisboa e encerrou a carreira marcando seu 300º gol. Hoje ele faz 50 anos. Boa hora para relembra-lo.

Nascido em Barrancas e criado em Arocena, ambas cidades do interior da província de Santa Fe, iniciou-se no Sportivo Belgrano de Coronda. Em 1982, chegou a um dos principais clubes provinciais, o Unión, da capital Santa Fe, após precisar ajudar a família levando bicadas de galinhas que retirava engaioladas de caminhões para o negócio de abate administrado pela mãe. Estreou entre os adultos aos 20 anos incompletos, em 1986, promovido por um antigo ídolo do Tatengue: o técnico Leopoldo Luque, ex-atacante do clube e campeão da Copa de 1978, treinava os juvenis. E quem lhe ensinou a comemorar gols de braços abertos para “abraçar” a plateia.

Acosta havia ganho as manchetes em 1986 em um torneio juvenil de boa audiência e televisionado; o time chegou à final contra o River, que tinha Claudio Caniggia. Beto indignou-se com o terceiro gol da derrota por 3-1, disparando que o bandeirinha tirasse “o sutiã dos olhos” pois a jogada começara após um meia adversário evitar um gol com a mão. Foi expulso e o jogo, suspenso. Pelo time adulto, foram só quinze gols (dois deles, no clássico com o Colón) em 71 partidas, números baixos para um matador, mas suficientes para ele ser o artilheiro alvirrubro nas temporadas 1986-87 e 1987-88.

Não foi mesmo fácil. Marcou apenas na sexta partida, contra o Independiente, quando o técnico indicara-lhe que aquela era a última chance. Indicativos de como o time ia mal, também – o Unión foi rebaixado ao fim da temporada 1987-88. Mas o desempenho individual do atacante levou-o pela primeira vez ao San Lorenzo. Não que a torcida azulgrana tenha recebido-o exatamente empolgada. Estreou em 6 de julho de 1988 contra o Newell’s, pela primeira fase da Libertadores.

Sem saber, os cuervos recebiam de uma vez uma verdadeira dupla dinâmica, tendo trazido quase ao mesmo tempo do River a promessa mal lapidada Néstor Gorosito – justamente aquele adversário que usara irregularmente a mão naquela final juvenil. Na Libertadores, Acosta só marcou uma vez, nas oitavas-de-final, onde fez o único gol da vitória e classificação sobre o Guarani em Campinas. Mas seu time cairia nas semifinais, para o Newell’s, ainda assim o mais perto do título até 2014. Foi na temporada 1988-89 que ele e Pipo Gorosito (técnico daquele Tigre vice-campeão da Sul-Americana 2012 em tumultuada final com o São Paulo) se acertariam, marcando juntos 43 gols em 70 jogos.

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Gorosito e Acosta, dupla que o San Lorenzo teve no fim dos anos 80, no início e no fim dos 90, nas três outras passagens do Beto pelo clube

O sucesso da dupla cobrou preço europeu: Gorosito foi vendido ainda em 1989 ao Tirol Innsbruck, da Áustria. Acosta saiu no início da temporada 1989-90, ao Toulouse, após negócio quase acertado com o clube do coração: o River, onde outro Beto, Norberto Alonso, ídolo de infância, era o técnico e com quem chegara a almoçar (“estive muito nervoso toda a comida, quando terminou o almoço pedi um autógrafo, com vergonha”). Já em 1991, sem brilho na França, voltou ao Ciclón, que foi terceiro colocado do Apertura – vale relembrar que o clube chegava ao 13º ano seguido sem ter uma casa própria, desde a venda forçada do estádio Gasómetro em 1979.

Em maio de 1992, Acosta estreava pela seleção no embalo da boa campanha sanlorencista na Libertadores. Gorosito também havia voltado. Acosta chegou a marcar três vezes em um 6-0 sobre o Newell’s de Marcelo Bielsa em plena Rosario. Mas, assim como em 1988, os rubronegros levaram a melhor no reencontro, no mata-mata, dessa vez nas quartas-de-final. Ainda em 1992, Acosta foi artilheiro do Apertura, onde o San Lorenzo teve a mesma pontuação do vice River.

O campeão foi o Boca, que para se incrementar comprou por 2,6 milhões de dólares o goleador do campeonato, apesar da torcida que Acosta e família tinham pelo rival (o negócio fez o pai “romper relações” por duas semanas e a mãe recusar a falar com o atacante ao telefone…). O Beto agora passava a receber insultos azulgranas. Mas foi graças à sua venda que o ex-clube financiou boa parte da construção do Nuevo Gasómetro, voltando a ter um estádio próprio.

Como xeneize, Acosta somou seis gols em cinco clássicos com o River entre jogos oficiais e amistosos e manteve-se na seleção, ganhando a Copa América de 1993. Mas também nos tumultuados 5-0 sofridos em casa contra a Colômbia nas eliminatórias. Era seu 15º jogo pela Argentina e só tinha um gol marcado. Foi esquecido após a goleada e ficou de fora da Copa do Mundo (assim como Gorosito), com o papelão do Boca na Libertadores de 1994 (eliminado na primeira fase) também não ajudando. Com a eliminação consumada, foi a seu outro lar: a Universidad Católica, reerguendo-se como máximo artilheiro do futebol sul-americano em 1994, com 33 gols só pelos cruzados – e em 26 jogos.

O desempenho na Católica o fez voltar brevemente à seleção, uma raridade: Beto é só o terceiro e último que a Albiceleste importou do futebol chileno. Somou mais quatro jogos (e outro gol), integrando o elenco da Copa América de 1995. Em Santiago, reeditou pela terceira vez a dupla com Gorosito, importada ainda em 1995 pelo Yokohama Marinos após Acosta estar perto de fechar outra vez com o River – “conversei com Ramón Díaz, estava tudo combinado, mas quando voltei da Copa se suicidou Raimundo Tupper, um dos meus melhores amigos do plantel. Me sentia muito próximo de sua família, e por isso decidi ficar no Chile”, declarou.

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As outras camisas argentinas de Acosta: Unión, Boca e seleção (comemorando com Gorosito a Copa América de 1993, último título da seleção principal)

Em 1996, ele e Gorosito voltavam à Universidad Católica, que com eles encerrou em 1997 um jejum de dez anos sem ganhar o campeonato chileno. Nesse mesmo 1997, vieram pela terceira vez ao San Lorenzo. Ainda sem Libertadores, o clube levava a sério a Copa Mercosul, chegando às semifinais de 1998. Acosta contribuiu com 21 gols em 38 partidas nessa terceira passagem. E, mesmo aos 33 anos e precocemente grisalho, foi novamente exportado à Europa. Jogaria pelo Sporting Lisboa.

Se o Sporting hoje vive jejum de quatorze anos, na época suportava o maior de sua história, dezoito. Pendência logo resolvida naquela temporada 1999-2000, com Beto sendo o artilheiro da “equipa” alviverde, que tinha de argentinos também Aldo Duscher, Facundo Quiroga e Gabriel Heinze. Foram 22 “golos” do veterano em 33 jogos pela liga portuguesa, incluindo um nos 2-0 em clássico com o Porto. E isso que no início Acosta era boicotado pelo técnico Giuseppe Materazzi (pai do ex-zagueiro), demitido após um início turbulento… o time ainda foi vice da Copa de Portugal.

A Copa foi perdida para o Porto, mas rendeu o gosto de eliminar o Benfica com Acosta marcando dois em vitória por 3-1 no clássico lisboeta. Foi em Portugal que criou outra comemoração característica, os quatro dedos erguidos como dedicatória à esposa, filho e duas filhas. Após outra temporada, pretendia voltar ao Unión “para encerrar o ciclo e porque havia jogado só dois anos e quase não havia desfrutado. No San Lorenzo, já havia tido três ciclos e estava um pouco esquentado pelos insultos da última vez, via que as pessoas não me valorizavam”. Mas acertou mesmo com o Sanloré, que acabara de ser campeão argentino. E era essa a pendência de Acosta, ídolo ainda sem taças pelo Ciclón.

Essa outra seca também não demoraria muito. Júlio César defenderia a cobrança do veterano na decisão por pênaltis (“eu errei o primeiro, eles acertaram e Serrizuela também errou o segundo, eu queria me matar”), mas o San Lorenzo conseguiu bater o Flamengo e levantar a última edição da Copa Mercosul de 2001, o primeiro título continental dos cuervos. Foi erguido já em janeiro de 2002 e ao fim daquele mesmo ano viria nova conquista continental, pelo torneio sucessor, a Copa Sul-Americana. Apesar do breve espaço de tempo, o elenco reformulou-se bastante, com Acosta sendo um dos quatro titulares das duas glórias internacionais. Na “Sula”, chegou a marcar de bicicleta, contra o Monaguas, e dois sobre o Racing. No meio de tudo isso, superou os cem gols pelo San Lorenzo.

Ao todo, foram 123 gols (quatro deles, no clássico com o Huracán) em 276 jogos pelo clube do Papa. 21 deles o fazem o maior artilheiro da equipe em competições internacionais. Outros dez, os últimos, foram no Apertura 2003. O San Lorenzo revivia uma vez mais a parceira do atacante com Gorosito, agora técnico – quem lhe servia agora era o jovem Walter Montillo. Por três pontos, foram vices, chegando à última rodada com chances mais matemáticas do que realistas. Acosta tinha ao todo 299 gols na carreira e a expectativa no Nuevo Gasómetro voltou-se para a despedida em alto estilo do ídolo. O oponente era um novo rival, o Vélez. Beto, de pênalti, cumpriu as expectativas fechando a goleada de 4-1 em um dos domingos mais emotivos do Nuevo Gasómetro que ajudara a erguer.

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Onde fez sucesso fora das fronteiras: na Universidad Católica (de novo, com Gorosito!) e no Sporting Lisboa, foi campeão nacional encerrando longos jejuns

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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