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Bombonera tem novo dono, o Independiente del Valle

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Jogo mal havia começado e a bagunça tática do Boca mostrava que a noite seria de horrores. Nem mesmo o gol logo nos primeiros minutos foi suficiente para os xeneizes abrirem caminho para a classificação. Prevalecia um excesso de vontade, além da aposta perigoa da força da camisa e da mística da Bombonera. Às vezes funcionam; às vezes, não. Não funcionou na noite de Libertadores em que o pequeno Del Valle se mostrou mais do que valente; se mostrou eficiente, equilibrado nos seus nervos, inteligente taticamente e assim por diante. Foi uma vitória incontestável; um cala-boca não tanto em Riquelme, mas na ausência de relativização Às suas palavras infelizes. O silêncio dos xeneizes às palavras do ídolo doeram muito nos jogadores equatorianos. Mas a vitória no futebol não vem só dessas coisas; vem do futebol jogado dentro de campo. E nisto, o Del Valle foi gigante na canhca do Boca, foi o dono da Bombonera.

Pressão do Boca era de uma intensidade típica de uma decisão na Bombonera. Com um minuto a pelota quase vai parar no arco de Azcona. Com menos de 4′, Pavón foi o nome de quem guardou a pelota nas redes: Boca 1×0. No lance, necessário dizer que Caicedo também ajudou: desatento no lance, deixou Pavón aparecer nas suas costas, deixando-o cara a cara com um atormentado e assustado Azcona.

Apenas com 20 minutos foi que o Del Valle chegou com perigo, Contudo foi um começo. Um sinal de que os equatorianos poderima sair de um esquema com duas linhas de quatro próximas, recuadas e apenas com a missão de proteger a entrada da área de Azcona. Três minutos depois, a Bombonera não se calou, mas por certo que a hinchada xeneize foi tomada pela surpresa: Caicedo teve a chance e não deu mole: 1×1. Foi a vingança do zagueirão, que havia falhado no gol de Pavón.

Do ponto de vista da distribuição das equipe em campo, o Boca tinha a cara de visitante, enquanto o Del Valle, de anfitrião. A equipe de Repetto apresentava um esquema de uma linha de quatro, dois volantes modernos mais à frente e Sornoza como enganche. No ataque, Julio e Tino Angulo, além de um desequilibrante Bryan Cabezas. Quando o Del Valle atacava, os volantes de projetavam até a linha de meio-campo, contribuindo e ampliando a armação de Sornoza. Também o lateral Núñez passava pela banda e por vezes se fazia de ala e por outras de uma espécie de terceiro volante. Tudo funcionava de forma organizada e deixava o recado: “nosso fracasso só vai ocorrer por erros individuais, não pela forma como taticamente estamos jogando”.

Já o Boca, atuava num 4-4-2 conservador, com um doble cinco de Pérez e Cubas e com Zuqui mais como volante do que como um meio-campista. No ataque, Pavón e Tévez esperavam pela bola. Ela só poderia partir de Lodeiro. Quando ele recebia forte marcação, nada acontecia. Era o máximo do mínimo; não se via uma equipe muito diferente daquela que era comandada por Arruabarrena. Em teoria, o Boca era medroso; na prática, o medo não se convertia em coragem porque o desenho tático não ajudava. O Boca era uma vergonha; uma bagunça só; um desenho descolorido do que era a equipe do Vasco.

Já a partir dos 20 minutos, o Del Valle deixava claro que a coragem pode derrotar a covardia. Na prática, em campo, isso ficou claro com o aumento da posse de bola dos equatorianos. A pelota rolava de pé em pé sem dificuldades, pois ela sempre sobrava em espaços do campo ocupados pelo visitante. Seu treinador estudou e treinou sua equipe não só para jogar nos erros do rival, como também para propor o jogo, sem que isto gerasse perigo para sua equipe. Ao fim do primeiro tempo, a posse de bola era computada como em 50% para cada uma das equipes.

Se os problemas do Del Valle eram de erros individuais, eles por certo que vinham também do nervosismo. Então, bastou uma conversa no intervalo para que os equatorianos se acalmassem. Sem grandes problemas individuais, o esquema tático engoliu o excesso de vontade do Boca, assim como a sua desorganização. E se este problema já acontecia no primeiro tempo, isto é prova e que o Mellizo foi mal também na orientação da equipe xeneize, no intervalo.

Logo aos 4′, a pelota foi roubana ainda no campo de defesa e de novo encontrou uma transição rápida e eficiente do campo de defesa para o ataque. Uma espécie de “Toco y me voy”, de cabeça, fez a redonda chegar aos pés de Bryan Cabezas. Ele penetrou na área mais veloz que a defesa do Boca e na saída de Orión, guardou a pelota no arco. Era a virada dos equatorianos. Um choque para muitos, mas algo absolutamente normal, nas circunstâncias da partida.

Um dos acertos de Repetto, nos vestiários, foi acertar também o posicionamento de Sornoza. O fato é que quando se defendia, o Del Valle colava sua linha de quatro e mais dois volantes em frente à área de Azcona. Sendo assim, em alguns momentos sobrava um espaço longo e muitas vezes pouco povoado entre o meio-campo e ataque. Repetto posicionou Cabezas e Julio Angulo como “volante interior”, ou seja, como volantes abertos, mas partindo sempre da linha do meio-campo. Também recuou Sornoza, colocando-o à frente de uma linha de seis defensores. Isto permitiria que quando a pelota fosse recuperada, ela poderia ser lançada diretamente para o ataque, buscando o Tino Angulo e também os dois extremos, que se despregariam rápidos do meio e partiriam em direção ao ataque. Não deu outra. Um minuto após o gol de Cabezas, Sornoza teve a bola nos seus pés, ainda no campo de defesa. Fez o quê? lançou. Ela ficou mais para o domínio de Orión, porém, pressionado por Julio Angulo, o “Pato” não conseguiu afastá-la do atacante equatoriano. Angulo robou a pelota e não teve dificuldades para guardar: 3×1.

Benedetto custou uma fortuna e foi contratado principalmente para reforçar a equipe na Libertadores. O mesmo serve para Walter Bou. Bastou o rival fazer o segundo gol e Schelotto levou “el Pipa” para o campo de jogo. Entrou aos oito minutos no lugar de Cubas; nove minutos depois, Bou apareceu no lugar de Pérez. Era o fim do infeliz doble 5. Assim que a partida começou o que mais a equipe precisava era que Tévez recuasse para ajudar Lodeiro a assistir jogadores como Pavón e Benedetto. Porém, quando o Pipa entrou, a equipe já não tinha nenhuma identidade em termos de organização tática. Carlitos já não sabia se era meia ou atacante. Na dúvida, se mantinha no campo de ataque. Isto pressionava ainda mais a Lodeiro, pois além de articular as jogadas precisava cuidar das passagens de Sornoza, pelo espaço vago, deixado pela saída de Cubas. Com a entrada de Bou a situação ficou ainda pior, ninguém marcava, meio-campo virou lugar de passagem e a equipe xeneize ficou com cinco atacantes. Contudo, vale registrar que individualmente Pavón se destoava de Tévez e Lodeiro. Isto foi visto em dois momentos.

O primeiro foi simbólico. Na hora que o pênalti apareceu, foi Lodeiro quem pegou a bola para cobrar. Quando, em situações assim, no passado, o Apache fugiria de tal responsabilidade? E como Lodeiro também não estava com nada, cobrou “daquele jeito” e facilitou a vida de Librado Azcona. Enquanto isso, Pavón tentava buscar a pelota que chegava ao meio-campo e partida com ela em alta velocidade. Dificilmente tentava passar, pois a marcação do Del Valle chegava fácil nos desesperados e mal posicionados jogadords do Boca. Um show de horrores. Pavón não salvou a equipe, mas salvou sua noite com uma brilhante atuação. Foi dele o gol de desconto já no final da partida: Um golaço.

O jogo foi fácil para o Del Valle. Sofreu nos primeiros minutos, mas logo a sua organização tática prevaleceu. Teve chances de ampliar o placar e decretar uma goleada histórica sobre o grande Boca Juniors. Mas não precisou. Com o apito final do ábrito, o pequeno “José Terán” fez história. Eliminou um gigante dentro de sua casa e diante de sua torcida. Pior, o gigante era o Boca, a casa era a Bombonera e a torcida era a mais gigantesca e uma das mais fiéis da Argentina. No cômputo, foi 5×2 para os equatorianos, algo incontestável e que leva o Del Valle à final da Libertadores. Foi a vitória da coragem sobre a covardia, do estudo, treino e perseverança contra a crença de que com a Bombonera e o peso da camisa o Boca passaria à final. Não passou e mereceu ficar pelo caminho. Parabéns ao Independiente del Valle, uma equipe pequena no Equador, mas que já se faz gigante na América do Sul.

Joza Novalis

Mestre em Teoria Literária e Lit. Comparada na USP. Formado em Educação e Letras pela USP, é jornalista por opção e divide o tempo vendo futebol em geral e estudando o esporte bretão, especialmente o da Argentina. Entende futebol como um fenômeno popular e das torcidas. Já colaborou com diversos veículos esportivos.

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