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Eleito presidente da Argentina, Macri foi o mais vitorioso presidente do Boca

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Com Palermo, contratado por ele, após a primeira taça internacional: a Libertadores de 2000

Os anos Kirchner se encerram sem fazer o sucessor desejado. Candidato da oposição, o prefeito de Buenos Aires, segundo colocado no primeiro turno, levou ineditamente as eleições ao segundo e ganhou-o. Mais do que a prefeitura da capital federal, seu grande trampolim eleitoral foi outro cargo executivo: o de presidente do Boca, função desempenhada entre meados dos anos 90 e meados dos anos 2000. Precisamente na época mais dourada de um clube riquíssimo.

Veja também, em nossa coluna de opinião: O que esperar do novo governo argentino no futebol?

A primeira vitória de Macri nas eleições boquenses está perto de fazer vinte anos. Ironicamente, foi na mesma data em que o clube foi goleado em casa. Era a antepenúltima rodada do Apertura 1995. Recém-reforçado com Maradona e Caniggia, o Boca era líder invicto, mas em uma única tarde levou a mesma quantidade de gols sofridos no campeonato inteiro até então. Perdeu de 6-4, desgringolou e ficaria apenas em quarto.

A contratação de Maradona e Caniggia fora nova tentativa do Boca de voltar às glórias. Os anos 80 foram uma década perdida também para ele, endividado estratosfericamente em razão exatamente de Maradona em plena campanha campeã de 1981. O empréstimo de Dieguito fora em dólares, e os ditadores não sustentavam uma economia exatamente melhor que a atual. Em 1984, o clube quase quebrou, até tendo a Bombonera fechada. Não à toa, só voltaria em 1992 a ser campeão nacional.

Essas histórias já foram contadas em outros especiais recentes: clique aqui, aqui e aqui. Macri, dono da empresa familiar de engenharia, mirou-se no rival, que colhia muitos frutos das divisões de base (coordenadas por um brasileiro, o ídolo Delém). O novo presidente contratou um especialista em 1996: Jorge Griffa, que desde os anos 70 semeara revelações no Newell’s. O time rubronegro de Rosario havia vivido recentemente o auge, entre 1988 e 1992. Foi com um elenco formado inteiramente na base, revelando Sensini, Balbo e Batistuta, três homens que iriam cada um a três Copas do Mundo, além de Dezotti, Scoponi, Pochettino e o técnico Bielsa (todos foram a um mundial também).

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Palermo veio em 1997, assim como os gêmeos Barros Schelotto e a última volta de Maradona

A contratação seria certeira. O Boca é que passou a ter diversas revelações. Que, campeãs, chegaram à seleção e/ou em grandes clubes europeus: Carlos Tévez, Nicolás Burdisso, Fernando Gago, Nicolás Gaitán, Éver Banega, Jesús Dátolo… no embalo desses nomes, o time teve seu último grande momento internacional, entre 2003 e 2008. Mas a exigente torcida xeneize estava impaciente. Era preciso ganhar em curto prazo. Macri então contratou o técnico argentino mais celebrado possível: Carlos Bilardo.

1996 também seria o ano em que o clube pinçou Juan Román Riquelme da base do Argentinos Jrs, mas foi esquecível. Maradona (sucumbido às drogas) e Caniggia (sofrendo com o suicídio da mãe), por motivos pessoais, saíram. O River venceu a Libertadores com Francescoli liderando os garotos de Delém. Já o Boca chegou a levar de 6-0 em casa para o Gimnasia LP. Justo no dia da inauguração de uma das primeiras obras de Macri: o setor VIP da Bombonera, reinaugurada na ocasião. Guillermo Barros Schelotto foi o autor de três gols naquela tarde. Ele, o gêmeo Gustavo e Martín Palermo vieram em 1997.

Também contratou-se Héctor Veira, técnico de bons trabalhos em um San Lorenzo paupérrimo e quem treinara o River vencedor pela primeira vez da Libertadores e do Mundial, em 1986. Maradona e Caniggia, após um ano sabático para cada, voltaram. Mas ainda haveria uma última decepção: o River, mesmo perdendo rotineiramente os clássicos, foi tri nacional seguido e a última volta de Maradona não se livrou de escândalos e lesões.

Foi no segundo semestre de 1998 que o jogo enfim virou, com a chegada de Carlos Bianchi. Quem desdenha de Macri credita ao Virrey os sucessos internacionais xeneizes: meia querido da torcida no início dos anos 90, Alberto Márcico (que vestia a camisa do Gimnasia naqueles 6-0) já proferiu que “é claro que o Boca ganhou tudo com Macri, mas é óbvio que não há de esquecer que estava Bianchi. Com ele começou tudo. Para mim, Bianchi é o pai da criatura. Não esqueçamos que antes de Bianchi, Boca teve outros técnicos importantes. (…) Bianchi salvou Macri, sem nenhuma dúvida”.

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Com Carlos Bianchi. À esquerda, outro cabo eleitoral: Alfredo Rojas, ídolo nos anos 60 (foi às Copas de 1958 e 1966)

Quem não queria Macri presidente nacional teme, no mínimo, arrocho neoliberal. E nisso também pode usar o Boca como parâmetro: o empresário, mesmo com o clube já superavitário, diminuiu o soldo de diversos profissionais por lá e bateu o pé contra ídolos. Riquelme não teria perdoado-o após ter o salário divulgado na imprensa em plena crise econômica de 2001. Foi para desafiá-lo que criou a célebre comemoração de pôr as duas mãos atrás das orelhas – a cena ocorreu em um 3-0 no River. O meia “explicou” que tudo teria sido uma referência ao desenho Topo Gigio, um dos “preferidos da filha”. Virou a comemoração característica do camisa 10 (e chegou a ser imitada por Daniel Scioli, adversário de Macri nas eleições presidenciais).

Román fez o segundo gol, em rebote de pênalti que perdera. Fugiu em silêncio dos abraços dos companheiros e parou diante do camarote presidencial (Macri nem estava lá na verdade, e sim em seu camarote pessoal) para ouvir a torcida aplaudir-lhe e não ao presidente – que o venderia meses depois ao Barcelona. A relação se apaziguaria com o tempo. A ponto de, jogando para escanteio o decoro entre interesse público contra privados, a prefeitura Macri ter perdoado multas de trânsito de Riquelme.

Já o ex-volante Antonio Rattín é um nome histórico pró-Macri, tendo sido cabo eleitoral dele já na campanha de 1995. Para ele, o presidente de 1960-80, Alberto Jacinto Armando (que passou a batizar oficialmente a Bombonera justamente na gestão Macri), foi superado: “Don Alberto não entendima nada de futebol, mas era rápido para os números. Mauricio sempre soube escutar e com ele ganhamos muitíssimos títulos internacionais. Para mim, foi o presidente mais importante do Boca”.

Os pró-Macri também observam que o Boca deu uma decaída justamente após Macri deixar o clube para assumir a prefeitura de Buenos Aires (por ordem judicial, chegou a acumular os dois cargos, mesmo contra a lei). Que seu marketing foi projetado como nunca antes no exterior – o museu, o primeiro do gênero na Argentina e ponto turístico até para quem não acompanha futebol, foi inaugurado em 2001. E que não vive só de futebol (o basquete voltou a ser campeão em 1996-97 após mais de vinte anos e teve seu melhor período até 2007, precisamente; o vôlei, especialmente o feminino, começou a disputar finais em série). De qualquer forma, que a Argentina não tenha um Silvio Berlusconi local. Boa sorte ao novo presidente e ao povo que governará.

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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