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Adeus a “Chango” Cárdenas, o símbolo maior do título mundial do Racing

Originalmente publicado no aniversário de 70 anos de Cárdenas, em 2015, e revisto, ampliado e atualizado

A estatística apontou para sempre Racing 1-0 Celtic como resultado do mundial de 1967, mas quase meio século depois tanto poderia ser 700-0 ou mesmo 0-0. Explica-se: a decadência que atingiu em cheio La Academia em seguida a seu auge fez a torcida ficar décadas presa na nostalgia e apegadíssima às reprises daquele tiro de canhão desferido pela canhota do centroavante Juan Carlos Cárdenas. Os rivais zombavam que de tanto os racinguistas quererem repetir o lance, uma hora a bola deixaria de entrar…

Falecido no fim da noite de 30 de março de 2022, Cárdenas nascera em 25 de julho de 1945 no meio do norte argentino, em Santiago del Estero. O codinome Chango tem diversos significados, desde garoto indígena a pessoa atrevida e brincalhona. E foi o atrevimento que gerou mesmo aquele gol: já era a terceira partida entre Racing e Celtic para a definição do campeão mundial de 1967. Mas ele, mesmo mais talismã do que matador, esteve mesmo longe de ser homem de um gol só: é quarto profissional com mais gols pelo clube, 92, desconsiderando-se amistosos – quase o dobro dos marcados por Diego Milito, por exemplo.

Aliás, Milito deve a carreira à lenda, que interveio para que El Príncipe, ainda anônimo nos anos 90 (época em que Cárdenas seguia figura ativa no Cilindro, participando da romaria de fiéis que brecou a anunciada extinção do clube em 1999) e desanimado, tivesse melhores oportunidades nas categorias de base racinguistas. Seis daqueles 92 gols gols saíram no clássico contra o Independiente. E ainda impediu outro: em 1971, contra o Rosario Central, foi improvisado entre as traves após o goleiro Rubén Guibaudo ser expulso; havia se adiantado para defender um pênalti, o árbitro ordenou nova cobrança e Guibaudo a defendera novamente mas insistindo na irregularidade. A terceira tentativa foi impedida pelo Chango, que nem luvas usou – curiosamente, o cobrador também era outro apelidado de Chango, Rubén Gramajo.

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O Racing na finalíssima mundial de 1967: Cejas, Basile, Perfumo, Martín, Chabay e Rulli; Cardoso, Maschio, Cárdenas, Rodríguez e Raffo

Ele estreara ainda com 17 anos incompletos, em 1962, após destacar-se no ano anterior com 5 gols em 3 jogos pela seleção de Santiago del Estero na Copa Beccar Varela, torneio de seleções provinciais. River, Independiente e San Lorenzo mandaram emissários ao Unión, clube santiagueño onde jogava (e onde seu pai havia sido campeão provincial em 1933), mas só o do Racing (alertado por Eduardo Álvarez, ex-zagueiro do clube nos anos 30 e então presidente da torcida organizada do clube em Bahía Blanca, sede daquela decisão da Beccar Varela) quis conhecê-lo na própria casa de Cárdenas. “Chegou no meu bairro nos subúrbios e, ao verem um carro – ali quase não existiam – os vizinhos se perguntavam que havia ido (…). Eu jogava bola no campinho. (…) Duas irmãos foram me buscar e foi uma que me anunciou que vinham me ver desde Buenos Aires. Não acreditei e respondi que não me enchesse o saco, que me deixasse jogar”.

“Depois veio me avisar outro amigo. Decidi ir para casa e me seguiram 20 garotos. Entrei e vi o cara sentado no meio das galinhas e cachorros, suando numa camisa branca  Entrei com todos os garotos e, então, o cara começou a olhar. Estávamos todos imundos, cheios de terra porque no campo não tinha pasto. Olhou o todos e perguntou quem era o garoto. ‘É ele’, anunciaram todos me apontando. Eu estava todo sujo. Me agarrou, me sentou na sua perna e me disse que ia ser jogador do Racing”. Vale dizer que o clube havia sido campeão no ano anterior. Também era isso que a transferência significava.

No primeiro treino, indagado em qual posição preferia jogar, respondeu “gosto de fazer gols”. “Então vais ser o centroavante”, respondeu o técnico Saúl Ongaro. E Cárdenas marcou dois no goleiro titular Osvaldo Negri, o mesmo enaltecido décadas depois no cinema no oscarizado O Segredo dos Seus Olhos. Foi imediatamente chamado para jogar com os adultos um amistoso em Mar del Plata e também marcou ali. Em 3 de fevereiro, deixou outro gol, em amistoso histórico contra o Santos: Pelé e colegas abriram 3-0 com onze minutos no Monumental e fecharam o primeiro tempo em 4-0. Com doze minutos de segundo tempo, já estava um perigoso 4-3, com Cárdenas anotando o segundo da reação argentina. Mas os praianos responderam com tudo, finalizando em 8-3.

O lance tantas vezes repetido. Ao lado, os campeões com a taça do mundial: Rodríguez, Raffo e Cejas em pé, Cárdenas e Perfumo abaixo

Seu primeiro gol competitivo viria na Libertadores, no 2-2 com o Nacional em 27 de fevereiro, sem evitar uma queda precoce. Aquele ainda é o gol mais jovem de um argentino na Libertadores – Cárdenas tinha 16 anos, 7 meses e dois dias. Tão jovem que o atacante, ainda verde, só viria a estrear no próprio campeonato argentino já pela 27ª rodada da edição de 1962. Mas em pleno Clásico de Avellaneda, um 0-0 na casa rival. O adolescente foi titular ali e nas três rodadas que restavam, ainda sem marcar gols. Terminou repassado por um ano ao Nueva Chicago para ganhar experiência.

Não foi exatamente um artilheiro no bairro portenho de Mataderos, marcando em três partidas da segunda divisão: na derrota de 2-1 para o Deportivo Español, na terceira rodada, e depois já nas duas rodadas finais, quando ressurgiu por uma equipe que só ficou à frente de outras três naquele certame. Cárdenas então anotou cinco gols em uma só partida, nos 7-2 sobre o Quilmes pela penúltima rodada, e então outro em 2-2 na visita ao Newell’s – que, curiosamente, marcou um através do brasileiro João Cardoso, futuro colega no Cilindro. Logo voltou a Avellaneda, que naquele 1963 celebrara um título, mas através do Independiente.

O Racing reagiu gastando o que tinha e o que não tinha em 1964, notadamente com o elegante meia César Menotti e o astro santista Dorval. Mas o goleador do elenco foi mesmo Cárdenas, com quinze gols, a dois da artilharia. Treinado pelo ex-zagueiro José Della Torre, remanescente da primeira Copa do Mundo, o clube teve o segundo melhor ataque, mas ficou apenas em sexto lugar. E viu o Independiente se tornar o primeiro time argentino a vencer a Libertadores. Em 1965, o rival foi bicampeão continental seguido enquanto a conta da dinheirama de 1964 era cobrada na Academia: Dorval foi devolvido ao Santos justamente pelos argentinos não conseguirem quitar o negócio, enquanto Menotti e o ídolo Federico Sacchi rumaram ao Boca.

Cárdenas em busca do técnico Juan José Pizzuti

Esse contexto que fez o Racing começar a liga nos últimos lugares e o próprio Cárdenas demorou até a sexta rodada para marcar, em jornada agridoce: marcou pela primeira vez no Clásico de Avellaneda para pôr um 2-0 no placar no estádio rival, mas o vizinho, bicampeão da Libertadores quatro semanas antes, buscou o empate. Empate que veio contra o próprio Cárdenas: com o jogo em parcial 2-1, ele teve que calçar as luvas após a expulsão do goleiro Luis Carrizo, em tempos onde não se permitiam substituições. Depois dali, El Chango voltou a encarar um jejum de gols. Dos grandes.

Segundo maior artilheiro profissional do clube, Juan José Pizzuti havia saído brigado de lá na pré-temporada de 1962 e, com chuteiras recém-penduradas, aceitou voltar como um treinador bombeiro. Foi o quarto técnico racinguista em 1965 e estreou na 19ª rodada, após ter enfrentado o próprio Racing na 18ª, a serviço do Chacarita. O líder River foi vencido por 3-1. E a partir da 21ª rodada o improviso começou a dar certo demais. Gradualmente, o Racing emendaria uma série invicta inédita no profissionalismo, em embalo que permitiu-lhe primeiramente saltar para quinto lugar.

Cárdenas, do seu lado, encerrou seu jejum na 25ª rodada e nas quatro rodadas finais já era outro: foram três gols, três assistências e um pênalti cavado. A série invicta se estendeu em 1966 e ficou em 39 jogos, quinze a mais do que a marca anterior. Em 1966, o River, em meio a seu jejum de títulos vivido entre 1957-75, fez pontuação suficiente para ser campeão em qualquer outro campeonato argentino na década, menos naquele, onde La Acadé foi derrotada uma única vez (para o próprio River, aliás).

Lágrimas pelo primeiro mundial do futebol argentino: Cárdenas, com camisa do Celtic no pescoço, abraça Alfio Basile, já de paletó pois havia sido expulso cedo

El Chango foi melhor na assistências, dez, pois seus gols foram seis. Mas um deles serviu para praticamente assegurar a conquista, anotando a dois minutos do fim um 3-2 sobre o Boca. A taça veio na rodada seguinte e na subsequente, Cárdenas ainda deixou o dele nos 3-3 sobre o Independiente – um clássico que serviu para entrega festiva e sorridente da faixa pelos próprios rivais, em tempos sadios nas arquibancadas, antes de Cárdenas também marcar nos 3-2 sobre o Bayern Munique em amistoso ainda naquele 1966. O título daquele ano já nascia histórico, mas ganharia ainda mais relevo depois.

É que simplesmente seria a última taça nacional do Racing até 2001. Quando o jejum de 35 anos ainda não se fazia sentir, o adicional histórico à conquista de 1966 foi mais imediato. Sabendo manter foco no torneio argentino (no chamado Metropolitano) de 1967 e na Libertadores, El Equipo de José, a equipe do técnico Juan José Pizzuti, foi vice-campeã do primeiro e dez dias depois assegurou La Copa. A única taça racinguista na Libertadores até hoje fez Avellaneda se tornar a primeira cidade sul-americana a ter duas equipes campeãs do torneio.

Mitologia à parte, Cárdenas não era um goleador nato. Podia tanto fazer três gols em um só jogo, como nos 6-0 sobre o Bolívar pela fase de grupos da Libertadores, como passar todo aquele Torneio Metropolitano sem marcar nenhum – na Libertadores, deixou o dele em outras duas partidas, ambas também da fase de grupos (4-1 no Santa Fe e dois no 6-0 sobre o 31 de Octubre). Embora já fosse um xodó, não era capaz de competir por um lugar de centroavante na seleção com artilheiros como José Sanfilippo ou Luis Artime., ambos matadores dos anos 60 e que ocupavam a liderança e vice-liderança da artilharia histórica da Albiceleste por muito tempo.

Contra o Bayern Munique, vencido com gol dele ainda em 1966. E no time vice argentino de 1972, é o último agachado. O goleiro é o jovem Ubaldo Fillol

Mas então veio o Mundial, contra o Celtic. Os escoceses haviam vencido em 1967 a liga, a copa e a copa da liga nacionais e, sobretudo, ganharam a Liga dos Campeões derrotando justamente a Internazionale – é que o clube de Milão havia sido duas vezes o carrasco do Independiente, ganhando do Rojo as edições de 1964 e 1965. O futebol argentino ainda estava carente de uma conquista mundial e, em Glasgow, não tiveram muita chance. Cárdenas começou a se imortalizar na partida de volta: em Avellaneda, foi dele o gol da vitória de virada que forçou um jogo-extra, em Montevidéu. As equipes, desgastadas, se renderam aos nervos no Estádio Centenário: Alfio Basile e Bobby Lennox já haviam sido convidados pelo árbitro a descerem aos chuveiros no primeiro tempo por pugilato mútuo, e no início do segundo os alviverdes perderam também Jimmy Johnstone, que agrediu um oponente sem bola.

Segundo a análise fria da época pela revista El Gráfico, o próprio Cárdenas não teria feito uma partida brilhante: “lhe faltou potência e clareza. Perdeu muitas bolas. E não buscou os laterais”, mas a própria corneta admitia já ali que aquele desempenho estaria para sempre ofuscado pelo que houve aos dez minutos da segunda etapa. Foi quando El Chango recebeu a bola de Juan Carlos Rulli. Dominou-a com a perna esquerda, preparou com a direita, a bola pingou e ele tornou a usar a canhota para disparar de fora da área aquela bomba que surpreendeu o goleiro John Fallon. A declaração de Cárdenas sobre o lance faz lembrar aquelas cenas de drama nas quais para realçar o tremendo foco do personagem em algo, os ruídos ao redor se distorcem ou emudecem: “ninguém pensou que eu ia pegar desde tão longe no Centenário. [Humberto] Maschio diz que me gritou ‘chuta’, mas eu nunca o escutei”.

Quatro dias depois, ele voltava a campo com uma camisa alviceleste, mas dessa vez – finalmente – a da seleção. Mas também seria a única partida dele pela Argentina. Na ressaca da sua maior glória, não foi bem: jogou 75 minutos em derrota amistosa para o Chile por 3-1 em Santiago. Mas o clima de festa ainda permeava no último compromisso do ano, um Clásico de Avellaneda com toda pompa: o título mundial fez o Independiente providenciar aplausos e homenagens solenes em sua casa.

O gol eterno. Cárdenas, para o delírio dos saudosistas, às vezes ainda entrava mesmo em campo. A foto do meio se deu nas festas do centenário do Racing, em 2003, após novo golaço seu encobrindo o goleiro!

Na primeira homenagem que o Racing divulgou hoje, alguém comentou que o histórico gol de Cárdenas estaria entre os cinco mais importantes do país – no que foi respondido com um “sendo torcedor do Rojo eu te digo que, a nível de clubes, é um dos três gols mais importantes”. E alguém do San Lorenzo jurou que “em 1967, tinha seis anos e já começava a ser cuervo. Meu pai já era. Mas nesse sábado, não podíamos estar longe do sentimento argentino com o Racing. Teu gol, Chango, nos fez gritar”. De fato, o espírito da época fez torcidas rivais se unirem pela causa. A nota de pesar prestada hoje pelo Independiente no twitter não recebeu apenas os comentários normais de trégua diante de falecimentos.

Ali, é possível ver respostas rivais que variam de um “para além da rivalidade, foi um dos caras que pôs o futebol argentino no mais alto. Que em paz descanses, Chango” para um “Chango! Vi teu golaço! E o desfrutei como torcedor do Rojo! Em nossa época, sempre queríamos que ganhasse um argentino! Beijos ao céu! Grande jogador, melhor pessoa”. Também um “sou um doente pelo Independiente… mas que viva o futebol. Obrigado, Chango, o futebol bem jogado tem que ser reconhecido” ou ainda um “o homem era e será parte da história do futebol argentino, embora seja de outra rua. Que em paz descanse”.

Em 1967, Avellaneda terminou unida também em títulos, pois o Independiente, após aquelas homenagens, carimbou impiedosamente a faixa mundial com um 4-0 que lhe valeu o título do Torneio Nacional de 1967, campeonato em que Cárdenas deixou quatro gols. Nos cinquenta anos daquele momento, ele relembrou ao La Nación aqueles tempos mais pacíficos: “deixávamos os carros no estádio do Racing e íamos caminhando até o do Independiente, em meio a seus torcedores. Nos abraçavam e nos felicitavam. Hoje as pessoas acham que uma partida é a morte. Não posso entender. Nós fomos muito felizes com o futebol. Nos anos 70, quando o Independiente chegou a várias finais seguidas, eu ia ao estádio deles também, porque queria vê-los, era um momento histórico ter uma equipe argentina na final da Libertadores. E podia pagar meu ingresso, mas quando me viam não me deixavam, o pessoal do Independiente sempre se preocupava em me dar o melhor lugar que tinham disponível. Não estou dizendo nada raro, é o mais normal do mundo”.

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Homenagens quarenta anos depois, em 2007: Rambert, Parenti, Mori, Maschio, Spilinga, o brasileiro Cardoso e o técnico Pizzuti; Martinoli, Rulli, Rodolfo Vicente, Oscar Martín e Cárdenas

Em 1968, o campeão da América teve o benefício de começar a Libertadores já nas semifinais. O time inicialmente fez 2-0 no Estudiantes, mas em La Plata tomou de 3-0. Pelo regulamento, estava forçado um terceiro jogo, onde o saldo de gols favorável aos platenses lhes dava vantagem do empate se ele persistisse ao fim dos 90 minutos e prorrogação. Cárdenas marcou, mas o 1-1 favoreceu o oponente, que adiante também seria campeão sul-americano e mundial. Em paralelo, naquele 1968 El Chango fez cinco gols no Metropolitano… e apenas dois no Nacional. Mas foi justamente o Nacional que esteve mais ao alcance da Equipo de José.

O Racing, que voltava de uma vitoriosa excursão em agosto pela Espanha (venceu os Troféus Costa del Sol, sobre o Anderlecht, e o Conde de Fenosa, sobre o Flamengo), fez contra o River um duelo direto pela taça na rodada final, mas ninguém terminou campeão; empataram e foram igualados na liderança pelo Vélez, forçando-se um triangular que premiaria os velezanos, campeões pela primeira vez da primeira divisão. Em paralelo, de novembro até maio de 1969 o Racing disputou a primeira das duas edições da Recopa, então o torneio que reunia os times sul-americanos campeões mundiais – até então, eram apenas La Acadé, o cascudo Peñarol da época e um Santos que dispensa comentários. Também em 1969, a Academia buscou um novo artilheiro no brasileiro Silva Batuta, com Cárdenas sendo deslocado à ponta-direita.

Silva foi mesmo o goleador do Torneio Metropolitano enquanto o ídolo, enfrentando a reserva em alguns jogos, deixou um único gol em campanha agridoce: melhor time da primeira fase, o Racing jogou pelo empate sua semifinal, contra o modesto Chacarita. Só que a quatro minutos do fim o Chaca marcou o único gol e, adiante, também foi campeão argentino pela primeira vez. No segundo semestre, Cárdenas recobrou alguma artilharia, com seis gols no Nacional (3-1 no Independiente incluso) e até um 2-0 dentro da Vila Belmiro sobre aquele Santos – na penúltima rodada da segunda edição daquela Recopa. Mas, na última rodada, o Estudiantes garantiu outro caneco a escapar do Cilindro. E o ciclo Pizzuti chegou ao fim: o treinador rumou à seleção, em reação da AFA à não-classificação argentina à Copa do Mundo de 1970.

Cárdenas no estádio Centenário em 2017, em foto na semana dos 50 anos do Mundial do Racing

A amargura dos títulos que escapavam nos detalhes daria lugar à amargura por vexames rotundos. No Metropolitano de 1970, El Chango marcou cinco vezes por um time agora 11º colocado enquanto o Independiente voltava a ser campeão em pleno clássico. No Nacional, o ídolo foi usado quatorze vezes e já não marcou nenhuma. Individualmente, ele até se recuperou no Metropolitano de 1971, com onze gols. O clube, não: novo 11º lugar enquanto o título, novamente, ia ao vizinho. No Nacional de 1971, a produção diminuiu para um gol enquanto o time não ia muito melhor, em campanha de meio de tabela. O canto do cisne veio no Metropolitano de 1972.

Naquele Metro, Cárdenas contribuiu com doze gols (incluindo no clássico, embora o Independiente, novamente campeão da América, vencesse por 2-1) na campanha vice-campeã, embora longe de briga série contra um San Lorenzo arrasador. No Nacional de 1972, foram três gols do talismã, incluindo um troco em Avellaneda no triunfo racinguista por 2-1. Mas o meio da tabela foi novamente a posição da AcademiaEl Chango buscou nos anos seguintes um pé de meia no México. Ainda voltou rapidamente em 1976 ao Cilindro, reestreando em setembro, na rodada inicial do Torneio Nacional. Pudera: já em paródia de si mesma, La Acadé, com um Cárdenas no elenco (Pablo, com quem não tinha parentesco e que até tinha lá sua qualidade a ponto de ter defendido seis vezes a seleção, mais do que o próprio Juan Carlos), havia no Metropolitano brigado pela primeira vez para não ser rebaixada.

Quando saíra pela primeira vez, em 1972, o ídolo já era justamente o último titular de 1967 a deixar o Racing. Voltou para mais nove partidas, com uma tarde de glória final nos 4-2 sobre o River, anotando dois gols relâmpago aos 22 e aos 24 minutos para abrir o marcador. Foram seus únicos gols no regresso antes de pendurar as chuteiras, ao menos fisicamente. Até tentou uma carreira de técnico, sem muito relevo: no máximo, conseguiu um acesso da quarta à terceira divisão em 1983, com o General Lamadrid. Para muitos que nem nascidos eram em 1967, ele continua jogando. E continua sempre vencendo o inútil voo de Fallon ao colocar-lhe a bola no ângulo direito em Montevidéu.

A mistura de passado e presente foi uma rotina à torcida do Racing na maior parte dos 50 anos seguintes. Mas o chute de Cárdenas sempre entrou

https://twitter.com/RacingClub/status/1509546078659510286

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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