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11 jogadores para os 110 anos do Ferro Carril Oeste

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Griguol, Márcico, Rocchia, Conte e Cortijo

Um dos maiores clubes argentinos chega hoje às onze décadas de existência. Embora sumido da elite desde 2000 e decadente há mais tempo, o Club Ferro Carril Oeste tem sucesso poliesportivo como poucas instituições do planeta, tamanho que as demais modalidades ofuscavam o futebol – por vezes por deliberado foco da diretoria verdolaga. De outra forma, o FCO não teria um reconhecimento mundial único para um clube de futebol, ou melhor, um clube “com” futebol: em 1988, foi premiado pela UNESCO. As mais expressivas dessas glórias foram refletidas na imagem acima, alusiva aos 110 anos.

O homem de cavanhaque é Hugo Conte, ponta do vôlei do Ferro, sete vezes campeão argentino no masculino e quatro no feminino naquela década, em que seus homens foram três vezes campeões sul-americanos e as mulheres, uma vez vices. Conte foi ícone também na seleção argentina, historicamente não tão forte: por ela foi bronze nas Olimpíadas de 1988 e disputou até as de 2000. Ao lado dele, erguendo um seus vários troféus, o meia-armador Miguel Cortijo, cinco vezes eleito o melhor jogador de basquete argentino, três vezes campeão nacional e três na América do Sul na década. Abaixo, o palco em que eles brilhavam, o Ginásio Héctor Etchart (chamado de Microestadio), ao invés do Estádio Arquitecto Ricardo Etcheverry, palco do time de futebol.

Mas o sucesso do Ferro foi muito maior, em vários outros esportes, da ginástica à pelota basca, do atletismo ao beisebol. Tentamos resumir em outros especiais dedicados ao clube, o dos 25 anos do reconhecimento da UNESCO (leia aqui) e o dos 30 anos do primeiro título no futebol de elite, o de 1982 (aqui). Pois a bola no pé na instituição do bairro de Caballito não deixou de ter belas páginas. Do contrário, não teria para si a outra metade da imagem acima, pois os três homens à esquerda são ícones dos dois títulos do clube na elite, em 1982 e 1984 (sobre ele, aqui). Naturalmente, fazem parte da nossa escalação ideal do Ferro. Uma tentativa que, obviamente, também incorrerá em heresias. Vamos a ela:

Goleiro: a escalação óbvia seria por Carlos Barisio ou Eduardo Basigalup, arqueiros das taças e 1982 e 1984. Barisio tem até o recorde de invencibilidade no país, 1.075 minutos sem gols. Mas a concorrência é feroz. O segundo homem do Ferro mais vezes presente na seleção é Sebastián Gualco (12 vezes nos anos 40), outro na posição, que já teve Fabián Cancelarich, reserva na Copa de 1990, e onde revelou-se Germán Burgos, figura carimbada nos anos 90. Outro de destaque entre as balizas foi Atilio Patrignani, nos anos 30. O brasileiro Jurandir, ex-Flamengo, chegou a ser capa da principal revista esportiva argentina, a El Gráfico. Roque Marrapodi chegou à seleção nos anos 50. Mas optamos por Antonio Roma.

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Roma, “melhor que Carrizo”. Ayala e Cúper, de prestígio também na Europa

El Tarzán não fez inovações como goleiro mas conseguiu o feito de, jogando na mesma época do mito Amadeo Carrizo, sobressair-se mais que ele na seleção. A estreia na Albiceleste veio um ano após começar a carreira no FCO. Embora rebaixado em 1957, deu a volta por cima nos anos seguintes: jogou 32 dos 34 jogos da segundona de 1958, vencida na antepenúltima rodada e emendou com um 3º lugar na elite em 1959, até então o mais perto que o Oeste chegou da taça. Rumou em seguida ao Boca, onde fez ainda mais história, a ponto de ser o boquense com mais jogos na seleção. Foi titular dela nas Copas de 1962 e 1966. Já dedicamos a Roma um especial: clique aqui.

Lateral-direito: Roberto Ayala jogava mais de zagueiro central mas sabia ser improvisado, mexida obrigatória pelo que representam os dois escolhidos no miolo da defesa. El Ratón foi um defensor fenomenal de meados dos anos 90 para os dos anos 2000. Começou a aparecer na última grande campanha do Ferro na elite, em 1992. Sem maiores incorporações, os verdolagas jogaram com os titulares todos formados nas categorias de base. O goleiro Burgos também estava ali, na defesa menos vazada do Apertura: 9 gols em 19 jogos, menos de meio gol por jogo. O time ficou em 4º. Ayala foi o último que a seleção convocou do Ferro, em 1993, mas só estreou nela já como jogador do River.

Nem o mais pessimista imaginaria que no ano seguinte, com a saída do presidente Santiago Leyden (no cargo desde 1963), tudo evaporaria tão rápido – a começar com o arquirrival Vélez (sim, eles faziam um clássico) voltando já em 1993 a ser campeão após 25 anos e igualando-se aos dois títulos do Oeste na elite, após nove anos atrás do FCO (sim, isso já existiu). Leyden ainda foi reposto de emergência em 1999, ano do canto do cisne: contra o Independiente em Avellaneda, o time soube empatar em 3-3 após estar perdendo de 3-0. Mas emendou dois rebaixamentos depois, parando na terceirona em 2001, algo que teria acentuado a deterioração da saúde do lendário dirigente, falecido em 2002.

Zagueiros: dificílimo outros que não a dupla de 1982, formada por Héctor Cúper e Juan Rocchia. Cúper, segundo homem que mais jogou pelo Ferro (463 vezes de 1976-88) era um defensor seguro e bom no jogo aéreo, além de uma grande visão tática que lhe tornava quase um técnico em campo. Tanto que após parar tornou-se um treinador respeitado: na Argentina, na penúltima vez que outro nobre decadente, o Huracán, quase foi campeão, em 1994, e com o Lanús campeão da Copa Conmebol de 1996 (leia aqui); no exterior, pela melhor fase do Real Mallorca, na virada do século e pelo Valencia vice na Liga dos Campeões. Esteve até na Internazionale de Ronaldo.

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Rocchia, 10º maior zagueiro-artilheiro do mundo. Marzolini, melhor lateral-esquerdo da Copa 1966. Saccardi em sua imagem mais lembrada

Já Rocchia compensava a lentidão no mano-a-mano com bom senso de colocação. E, mais ainda, pelos gols: 86, que lhe fazem simplesmente o décimo maior defensor-artilheiro do mundo em campeonatos nacionais de elite. E ele é o quarto maior goleador do Ferro. Jogou de 1973 a 1983, vivenciando de tudo: o grande ano de 1974, em que um time pouco badalado foi semifinalista no Nacional e perdeu a vaga no quadrangular final do Metropolitano por 1-0 para o Boca, cuja temida barrabrava La 12 ovacionou a entrega dos homens de Caballito; ao rebaixamento de 1977, título da segundona logo em 1978 (Rocchia foi o artilheiro com 15 gols) e a taça inaugural de 1982. Aparece ao meio no primeira imagem.

Lateral-esquerdo: a grande heresia da lista. Oscar Garré, salvo a temporada 1988-89, quando esteve no Huracán, jogou de 1974 a 1994 no Ferro, vinte anos. Vivenciou o mesmo que Rocchia e algo mais, pois esteve no bi de 1984, na honrosa Libertadores 1985 (não perdeu para Vasco e Fluminense no Rio e só foi eliminado pelo campeão Argentinos Jrs) e naquela campanha de 1992. E, talvez mais do que isso, é o único verdolaga campeão do mundo com a seleção, pois esteve na Copa de 1986. Mas o que sobrava em dedicação faltava em maior técnica e foi justamente um dos mais questionados na convocação de 1986, onde perdeu a titularidade na reta final. Ficamos com Silvio Marzolini.

O craque-galã Marzolini foi colega de Roma naquele Ferro 3º colocado de 1959, ano em que estreou profissionalmente. Meses depois, estreava também na seleção e se mudava com Roma para o Boca, onde passou toda a década seguinte. É um dos maiores ídolos auriazuis, com cinco títulos argentinos em que o River foi deixado de vice em três. Marzolini jogou as Copas de 1962 e 1966 como o colega, e no mundial da Inglaterra obteve fama mundial, ao ser eleito o melhor da posição no torneio. Menção honrosa ao brasileiro Rodrigues Neto, que ficou de 1978-81 (chegou após defender o Brasil na Copa da Argentina) e até a defendeu a seleção de Buenos Aires, chegando a marcar um gol em um 5-4 no Racing em 1980 após o clube estar perdendo de 4-1. Como muitos, foi ao Boca depois.

Volantes: Carlos Arregui e Gerónimo Saccardi, dois batalhadores voluntariosos. Arregui tinha bom tato tático, Saccardi tinha melhor técnica. Arregui é o terceiro com mais jogos pelo Ferro, 422 entre 1973 e 1986, estando quase que no mesmo ciclo dos mencionados Rocchia e Garré. Saccardi esteve desde antes: estreou em 1969, com o clube precisando vencer duas vezes seguidas a segundona para subir (terminou líder em 1969 mas não superou a repescagem contra os últimos da elite, venceu de novo em 1970 e enfim pôde ser promovido, goleando-se o Quilmes do jovem Ubaldo Fillol por 4-0), e parou de jogar em 1983. Saccardi teve estrela também como técnico, como em um 3-3 com o Vélez em 1997 empatando no último minuto jogo que perdia por 3-0 e na última vitória sobre o rival, um 2-1 em 1998. Seu aniversário virou o dia internacional do torcedor do clube.

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Trio do meio de campo bi em 1982 e 1984: o veterano Arregui e os habilidosos Cañete e Márcico

Meias: Pedro Suárez, já no Boca, foi vice da Copa 1930. Rubén Berón foi um filho pródigo em Caballito, chamado de volta quando o time caiu em 1958 (estava no Newell’s) e em 1962 (no Racing) para imediatamente reconduzi-lo à elite. Já José Manuel Moreno é tido como maior craque da primeira metade do século XX (entenda) e mesmo já veterano ajudou o time a se safar em 1953. Mas ficamos com Adolfino Cañete e Alberto Márcico, ambos bi em 1982 e 1984. Cañete foi um dos mais talentosos paraguaios dos anos 80. Esteve no elenco que devolveu a Blanquirroja às Copas em 1986, onde três gols vieram de passes seus. Os argentinos o conheciam bem pela sua passagem de 1980 a 1984.

1980-84 foi exatamente quando o Ferro emergiu. Após dois honrosos vices em 1981, para o Boca de Maradona no Metropolitano por um mísero ponto e o River de Kempes no Nacional, veio o título inédito do Nacional de 1982, invicto (só a terceira das cinco vezes que isso ocorreu no profissionalismo); um 3º lugar em 1983; e outra taça em 1984, com o paraguaio abrindo na final o placar nos 3-0 sobre o River de Francescoli em pleno Monumental. Cañete também marcou o único gol do jogo da volta, em Caballito. Márcico, que conquistara a posição de outro que poderia estar aqui, o uruguaio Julio Jiménez (raro homem de bom desempenho por Vélez e Ferro), era sua dupla na inventividade verdolaga.

Os três gols no River vieram de jogadas do Beto, que deu o passe para Cañete no primeiro, para Hugo Noremberg no segundo e acertou o pênalti do terceiro, tudo isso antes dos 35 minutos do primeiro tempo na casa adversária. Foi eleito o melhor jogador do país naquele 1984. É ele o jogador do Oeste com mais jogos pela Argentina, 16, mas ficou de fora da Copa 1986 pela dura concorrência com Maradona e Burruchaga. Jogou pelo clube de 1980 a 1985 e foi justamente o maestro do Boca que levou a melhor sobre o FCO no Apertura 1992, encerrando o maior jejum nacional auriazul, onze anos desde o maradoniano Metropolitano 1981. Na primeira imagem, é o segundo da esquerda à direita.

Atacantes: Enrique Gainzarain foi prata nas Olimpíadas de 1928. Dante Lugo e Antonio Garabal, dos anos 50, foram juntos ao Atlético de Madrid e voltaram para jogar a segundona em 1961. Carlos Vidal e Héctor Arregui (irmão de Carlos) formaram boa dupla entre 1967 e 1980, mais ou menos o ciclo de ambos, convivendo com os bons e ruins momentos experimentados por outros já mencionados. São respectivamente o maior e segundo maior goleadores do clube, com 106 e 100 gols. Mas a média foi baixa: Vidal jogou 354 vezes e Arregui, 407 (quarto com mais jogos pelo Oeste, inclusive). Daí que o ataque estaria mais efetivamente servido com Bernardo Gandulla e Miguel Juárez. Gandulla é conhecido no Brasil: o Vasco o comprou do Ferro em 1939, mas entraves o impediam de jogar e ele se notabilizou por, para ajudar de alguma forma o time, procurar repor as bolas que saíam de campo.

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Gandulla, muito mais o homem que originou a palavra “gandula” no Brasil. Juárez, artilheiro e campeão do Nacional 82. E o técnico que emergiu o clube, Griguol.

Assim, Gandulla fez a função que exercia passar a ser chamada de “gandula” por aqui. Mas El Nano era mais que um jogador educado: era hábil, forte, bom nos dribles e cabeceio. Em menos tempo de Ferro (dois ciclos, entre 1935-38 e 1944-46), chegou aos 90 gols, que faziam dele o maior artilheiro do clube até as trajetórias bem mais longevas de Vidal e Arregui o superarem e não por muito. Destacava-se em um time fraco, cujo 8º lugar em 1935 chegou a ser por um tempo a melhor colocação que o clube já tivera. Sem ele em 1939, o FCO foi penúltimo. Como outros verdolagas, fez sucesso depois no Boca (para onde foi com Raúl Emeal e Jaime Sarlanga, outros destaques do Ferro em um ataque chamado de La Pandilla), de onde voltou veterano em 1944 para ser o artilheiro de um 13º lugar entre 16 times.

Já Juárez fez 39 gols em 105 jogos pelo Ferro, onde esteve de 1981-83. Está aqui especialmente pelos 22 que marcou no Nacional de 1982, o primeiro campeonato de elite ganho pelo clube. Um deles, nos 4-0 no clássico com o Vélez em pleno estádio rival do Fortín de Liniers. Além de campeão, El Gitano, um raro reforço de um time montado quase todo nas inferiores de Caballito (vinha do Platense), foi também o artilheiro da competição. E só outro do Oeste também conseguiu a artilharia – Gustavo Reggi, em 1996. Menção honrosa a Esteban Gallego González, maior artilheiro do clube na Libertadores. O problema é que fez ainda mais sucesso no Vélez depois (entenda).

Técnico: Fácil. Victorio Spinetto conduziu o bom ano de 1974 e é tido como o segundo técnico com mais transcedência em Caballito. Porque o primeiro foi inegavelmente Carlos Griguol, homem mais à esquerda na primeira imagem: treinador das duas taças de 1982 e 1984, estava lá de novo naquela boa campanha de 1992. Três campanhas caracterizadas por sua valorização dos jogadores da base e pelo futebol mais ou menos como o dos times de Muricy Ramalho (marcação forte, gols de bola parada…) que chegou a ser criticado pela chatice mas que era eficiente para o porte do time. “Dizem que somos um time chatíssimo/que especulamos, que jogamos para trás/me chupa um testículo, todo o jornalismo/a Caballito cada vez eu quero mais” era o grito da torcida.

A resposta aos críticos veio na hora mais propícia: 3-0 no River dentro do Monumental pela final de 1984. Griguol ficou de 1980 a 1994, com um breve intervalo em 1987 no próprio River, que escolhera-o para suceder o histórico Héctor Veira (treinador das primeiras Libertadores e Intercontinental vencidas pelos Millonarios, em 1986). Também fez sucesso em outro clube historicamente fraco, o Gimnasia LP, bivice em 1995-96 sob Griguol à beira do campo e o veterano Beto Márcico lá dentro com os gêmeos Barros Schelotto. Além disso, Spinetto tem uma história ainda maior, desde os tempos de jogador, justamente no rival Vélez, conforme mostramos aqui.

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Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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