Exterior

Tévez faz história(s) na Juve, Zanetti & Trio encerram na Inter

Zanetti

O último fim de semana foi marcado por rodadas finais de campeonatos protagonizados por argentinos, além da rodada do título e do rebaixamento no próprio Argentinão. Na Espanha, Diego Simeone reforçou uma vez mais como seu Racing do coração é azarado. Na Itália, como deixamos previsto já duas vezes (clicando aqui e aqui), Tévez fez mesmo história na Juventus. Mas nada comparada à que Zanetti, Cambiasso, Samuel e Milito construíram na arquirrival Internazionale.

Inter em que Simeone já jogou, na época mais negra do que azul dos nerazurri. Zanetti já estava lá antes dele e durou muito tempo depois. Por outro lado, Simeone conseguiu como jogador mais títulos por clubes tradicionalmente mais fracos que o de Milão: Atlético de Madrid e Lazio. El Cholo esteve no período laziale mais dourado, na virada do século. No Atleti, integrara o último título espanhol rojiblanco, na temporada em que a equipe madrilenha se tornou a primeira na Espanha a vencer tanto o Espanholzão como a Copa do Rei, em 1996. Saiu da Lazio em 2003 voltando ao Atlético. E dali ao Racing.

Simeone veio ao Racing em 2005 para poder encerrar a carreira no clube que sempre havia amado e jamais jogado. Parou de jogar em 2006 e imediatamente teve ali mesmo sua primeira experiência como técnico. Não deu certo e no segundo semestre de 2006, foi treinar o Estudiantes, que não era campeão havia bem mais tempo, desde 1983. E em seu primeiro torneio pelos Pincharratas, esse tabu foi quebrado em histórica virada sobre o Boca, na tabela e no campo. Os auriazuis já eram bicampeões, mas nunca conseguiram um tri seguido, só logrado pelo arquirrival River e justo pelo Racing.

O título seria do Boca se empatasse pelo menos um dos seus últimos dois jogos. Perderam os dois e o Estudiantes os alcançou, forçando um jogo-desempate em que o Boca saiu na frente, mas levou de virada para 2-1. Simeone também venceu o Clausura 2008 pelo River, título que era até ontem o último dos Millonarios na elite. No início de 2011, foi novamente treinar o Racing. Não teve paciência da diretoria, foi dispensado, e, como em 2006, seis meses depois treinou um time campeão, o do Atlético de Madrid na Liga Europa. Anteontem, sagrou-se a maior figura da reconquista espanhola dos colchoneros, a primeira desde aquela de 1996.

Simeone Tévez
Simeone lidera festejos na Plaza Neptuno, Tévez se destaca no bololô dos juventinos campeões

Na Itália, Tévez vem dando muito certo na Juventus. A Vecchia Signora já era bi, vinha até de temporada invicta. Com o argentino infernal, dessa vez a Juve conseguiu: a) abocanhou a Serie A com um recorde de pontos, 102 (em 114 em jogo); b) conseguir seu primeiro tri seguido desde o penta que alcançara nos anos 30 no embalo de outros argentinos; c) alcançar o 30º título italiano do clube de Turim, que dessa forma será o primeiro a poder estampar três estrelas na Itália, sendo que já é o único que tem duas; d) o ineditismo de vencer o clássico contra o Torino seis vezes seguidas.

Pobre Torino, mesmo. Apesar de não vencer a Juve há 19 anos, nesse intervalo alcançava alguns empates, como um histórico em que pôs 3-3 no placar após estar perdendo por 3-0. Não só perdeu pela primeira vez seis clássicos seguidos, o último deles com gol de Tévez. Mesmo quando o Toro voltou a jogar bem, além de ser ofuscado por tudo o que o rival alcançou, ainda se desclassificou de vaga na Liga Europa graças a um pênalti perdido aos 49 do segundo tempo.

O outro (e há meio século maior) rival da Juventus, a Internazionale, também tinha o que lamentar. O fim da vitoriosa era de 2006-10 teve seu epílogo ontem, com a despedida conjunta do quarteto argentino que protagonizou especialmente justo a última temporada daquele ciclo. Em 2009-10, a Inter quebrou em alto estilo seu jejum na Liga dos Campeões: venceu também a Copa da Itália e, sobretudo, conseguiu um penta italiano, até então exclusividade daquela Juventus “argentina” dos anos 30 e do Grande Torino dos anos 40. Para completar, essa tríplice coroa era inédita na Itália.

Milito era um recém-chegado logo imortal após marcar gols em todos os jogos que garantiram os títulos da tríplice coroa. Cambiasso e Samuel estavam há mais tempo. O volante clássico teve em dez anos de serviços em Milão o brilho europeu que não conseguira no Real Madrid, de onde o zagueiro há nove anos também saíra pelos fundos para reerguer-se na Inter como “Muro”, apelido nos tempos de Boca. Tempo considerável, mas “só” a metade do de Zanetti. Numerosos outros hermanos passaram nesse tempo (veja aqui), mas esse quarteto foi quem ficou mais registrado na memória.

Inter
A despedida conjunta de Cambiasso, Zanetti, Milito e Samuel ontem. E Zanetti com as quatro equipes que defendeu: camisa da Inter, calça da Argentina, meiões de Banfield e Talleres de Escalada

Zanetti é quem mais vezes vestiu a camisa nerazurra, 1.114 vezes. E também quem mais jogou pela Argentina, 145. O capítulo na seleção durou de fins de 1994 a 2011, recordistas 17 anos que só Maradona e Ortega também tiveram. Foram só 4 gols, o mais recordado aquele em bela jogada ensaiada contra a Inglaterra pela Copa 1998, que não só empatou o jogo como salvou ao menos uma vida, de um policial polonês que lhe escreveu para agradecer. “Graças ao gol, o jogo foi à prorrogação e penais. Ele saía todos os dias na mesma hora, mas nesse dia ficou para ver o final. Conheciam seus movimentos e haviam lhe posto uma bomba. Mas o carro explodiu enquanto ele via a prorrogação. Uma coisa incrível”.

Já na Beneamata, curiosamente, chegou em 1995 menos festejado que outro compatriota, Sebastián Rambert, artilheiro da última fase bem consistente do gigante Independiente, enquanto os antecedentes do lateral eram o nanico Banfield e o obscuro Talleres de Remedios de Escalada. Dois times que não poderiam estar representados acima que não em seus meiões mesmo.

Nem os porteiros da Inter conheciam quem hoje é literalmente estátua no estádio de San Siro: “Não existia internet, não havia vídeos, nada. Me veio buscar uma caminhonete do clube e fomos à montanha, onde fazem a pré-temporada. (…). Havia um montão de gente aí como em uma praça, eu passei entre todos, pedindo licença; não me conhecia ninguém, jornalistas, torcedores, ninguém. Depois de um tempo me fazem sair por um balcão. E aí todos disseram: ‘mas é o que acabou de passar aqui!'”.

El Pulpi seguiu sempre com o mesmo rosto e penteado todos os altos e muitos baixos interistas: títulos perdidos sob polêmica ou outros dramas, quase sempre para a Juventus (o pênalti não marcado de Iuliano sobre Ronaldo em 1997, a perda da liderança na última rodada em 2002, os de 2005 e 2006 que a Juve só perdeu nos tribunais); a dor-de-cotovelo pelos sucessos do Milan na Liga dos Campeões, com direito a eliminar duas vezes a própria Inter; os dezessete anos de jejum na Serie A desde 1989 até ser encerrado só nos tribunais em 2006… perseverança premiada com a fantástica fase que veio depois, tão boa que a ausência de Zanetti nas Copas de 2006 e 2010 dificilmente será compreendida um dia.

Zanetti deu a carreira por encerrada. Os outros três, sem renovação de contrato, devem seguir jogando em outros lugares. Essa última rodada de futebol deve render outras aposentadorias, as sempre postergadas de Verón e Riquelme. Que, é claro, terão notas exclusivas. Será mesmo dessa vez, aliás?

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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