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Prejudicado pela ditadura, San Lorenzo tenta recuperar Viejo Gasómetro

Mais de 15 mil torcedores fizeram uma passeata em favor da Legislatura argentina devolva ao San Lorenzo as terras de Boedo

Na tarde da última segunda-feira, uma multidão de 12 mil hinchas do San Lorenzo tomou conta das ruas de Buenos Aires. Mas não porque o Ciclón estivesse em campo. Na verdade o motivo era muito mais sério. A comunidade cuerva se mobilizava para obter de volta seu estádio do Viejo Gasometro, perdido há mais de 30 anos.

A história começa em 1979. Convencida de que eram necessárias mudanças na paisagem urbana da cidade, a prefeitura de Buenos Aires propôs ao clube comprar o terreno onde se localizava o antigo estádio. A direção do clube se viu encurralada. Dizer “não” a um governo em tempo de ditadura nunca é simples. Além disso, o clube vivia uma grave crise, atolado em dívidas. Pressionado pelas dívidas e pelos militares, a direção vendeu o estádio. Em 1979 se despediu do Viejo Gasometro em um empate com o Estudiantes por 0 a 0. Três anos depois o terreno foi vendido a um banco que o repassou à rede de supermercados Carrefour, que ali ergueu uma imponente loja. Era o fim de mais de 60 anos de história do Viejo Gasómetro, palco das glórias do clube, situado no bairro de Boedo, verdadeira casa do Ciclón.

Na última partida no Viejo Gasómetro, torcida não compareceu em massa. (Foto: SomosCuervos.com.ar)

Era o início da maldição. Em 1981 o clube caiu para a segunda divisão. Os títulos desapareceram. Sem seu estádio, a equipe jogava de local em várias canchas e perdia sua identidade. Até que em 1993 o clube finalmente conseguiu inaugurar seu novo estádio, o Nuevo Gasómetro. Dois anos depois, encerrou um jejum de 21 anos ao conquistar o Clausura 1995, com destacada participação do brasileiro Silas.

Mas a equipe havia perdido seu referencial histórico, ainda que Bajo Flores, onde se situa o estádio atual, não fique distante da antiga cancha. Na cultura do futebol argentino isso é inaceitável. Para os portenhos, um clube é inseparável de seu bairro. Viver fora dele é estar sempre fora de casa. Isso se evidencia no fato de que o clube hoje tem menos da metade dos sócios que tinha há 50 anos. E a maioria frequenta com muito mais assiduidade a pequena sede que restou em Boedo do que a Ciudad Desportiva, anexa ao novo estádio.

Para mudar essa história, dirigentes e torcedores têm lutado para reaver o velho terreno. Em 7 de dezembro de 2006 cerca de 2 mil torcedores foram até a Legislatura de Buenos Aires, que naquele dia votava a restituição da Praça Lorenzo Massa, local onde ficava o Viejo Gasómetro para o clube. Recentemente, Juan Carlos Temez, ex-secretário do San Lorenzo, confessou ao Diário Olé que os torcedores estão querendo provar que o clube nunca deixou de ser de Boedo. “O que os torcedores estão pedindo tem a ver com o compromisso com a cidadania do clube, que foi o mais prejudicado pela ditadura, que fez todo o possível para tirar-nos de Boeno, inclusive baseando-se em projetos que nunca foram concluídos, para logo vender as terras ao supermercado. Por isso, este é um pedido de justiça. Mas, não será muito fácil conseguir com êxito as terras, mas seguiremos insistindo, reclamando o que é nosso”.

No clássico contra o Boca, os jogadores exibiram uma faixa pedindo a restituição e o desejo de retornar a Boedo

Na terça-feira 15 mil torcedores foram a sede vizinha do supermercado, na Avenida La Plata com a Rua Peru, pedindo que o Governo Argentino desaproprie o terreno que ocupa o Carrefour, retomando ao clube. Algo complicado, mas que a Legislatura de Buenos Aires analisará com cuidado, segundo afirmou Laura García Tuñón. “Em novembro, estive com vocês, mas não eram tantos. Me comprometo com esse projeto em busca de um ato de justiça: San Lorenzo deve voltar as suas terras que foram roubadas pela ditadura militar. Há muitos projetos, mas poucos tem o apoio de tanta gente”, confessou a legisladora.

O fato, como já citado acima, não será tão fácil simples, pois depende do Governo e de um provável impasse envolvendo a rede de supermercados que é dona do terreno. Mas, como vem dizendo os torcedores do San Lorenzo nos últimos dias: ‘O momento é agora’. Até porque voltar a Boedo para os torcedores do Ciclón não é apenas uma obsessão e sim uma questão de identidade. Até porque quem é de bairro, nunca deixará de ser. Ao menos na Argentina.

Colaborou Thiago Henrique de Morais

Tiago de Melo Gomes

Tiago de Melo Gomes é bacharel, mestre e doutor em história pela Unicamp. Professor de História Contemporânea na UFRPE. Autor de diversos trabalhos na área de história da cultura, escreve no blog 171nalata e colunista do site Futebol Coletivo.

7 thoughts on “Prejudicado pela ditadura, San Lorenzo tenta recuperar Viejo Gasómetro

  • priscila

    muito bom, ver a gradiosidade que é o futebol argentino, com toda essa vontade de recuperar seu territorio e sua historia.
    parabens

  • Acho engraçado falarem que a ditadura roubou o terreno. Não ganharam dinheiro por isso? Então a ditadura não roubou, COMPROU. É diferente.

    Ora, a ditadura pode ter pressionado o San Lorenzo, ou a antiga diretoria pode ter feito um mau negocio. Essa história está mal contada. Me dá a impressão que o San Lorenzo está utilizando a ditadura como desculpa por um mau negócio de uma diretoria passada. Atitude bem mesquinha.

  • Ernesto

    Não conheço os detalhes deste caso, eu sempre ouvi dizer que San Lorenzo vendeu seu estadio porque estava endividado. Pode que Ruan esteja certo, mas existem casos bem documentados onde as vendas forçadas pela ditadura incluíam sequestros, torturas e até assassinatos e até de pessoas que não estavam envolvidas na luta politica. O caso bem conhecido é Papel Prensa. A única produtora de papel para jornal existente na Argentina foi vendida para três jornais (Clarin, La Nación e La Razón) sob pressão da ditadura, incluindo sequestros, estupros e torturas.
    Não conheço a verdade neste caso, mas tranquilamente pode ser verdade.

  • priscila

    Vendas forçadas era comum, assim como muitas casas da epoca foram vendidas por preços absurdos, apos os moradores serem torturados, e para preservar tiveram que negociar.
    Era um comprar, mas em preço injusto e de modo injusto.

    Mas pode ter rolado outras coisas por ai, mas se tão atras disso direitos eles devem ter, e por isso chamam de roubo talvez.

  • lucas

    Ruan estas muy equivocado…la dirigencia de san lorenzo fue forzada por parte del gobierno militar a mal vender esos terrenos por una ordenanza municipal que decia que se iban a abrir calles. Cosa que no se hizo y encima se le vendio a una empresa fantasma que depues de 3 años revendio ese mismo terreno por mas de 10 veces al valor que lo vendio el club. La ordenanza que le habian impuesto a san lorenzo para que tuviera que vender fue disuelta por el mismo gobierno.
    San lorenzo fue el club donde por primera vez se manifestaron las madres de plaza de mayo cosa que los militares tomaron como un ofensa
    sabias que fueron amenazados de muerte dirigentes de san lorenzo???que miembros de la comision directiva fueron secuestrados?
    todos estos mecanismos utilizaron los militares para presionar a san lorenzo para que vendiera su cancha y otros terrenos que poseia el club en ese entonces

  • Ola! Obrigado pela página, porem, gostaria fazer uma correção. Na foto onde diz ”Na última partida no Viejo Gasómetro, torcida não compareceu em massa”, a foto no corresponde a última partida. A última partida no Viejo Gasómetro o San Lorenzo jogou frente ao Boca Juniors num triste 0-0. A partida aconteceu o 2 de dezembro de 1979 ( e nem mesmo os jogadores, dirigentes, nem a torcida sabiam que esse seria o último jogo no ‘Wembley Porteño’ . Como detalhe importante, nesse jogo o goleiro Gatti (do Boca Juniors) defendeu um pênalti cobrado pelo Coscia. Grande abraço.

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