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15 anos sem o maior artilheiro da Copa América

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No Huracán, em 1944, quando se consolidava como craque

Ele tinha nome e sobrenome comuns, mas como Tucho, foi único. Há 15 anos, em meio à Copa do Mundo – torneio que nunca o viu em campo -, o futebol perdia Norberto Doroteo Méndez, expoente da geração dourada que a Argentina teve nos anos 40, grande ídolo de Huracán, Racing e seleção. E, como diz o título, maior artilheiro das Copas América.

Nascido em 5 de janeiro de 1923, em Buenos Aires, sua primeira equipe foi o Miriñaque, de onde saiu em 1936 para as inferiores do Huracán, clube do coração. No Globo, profissionalizou-se em 1941. Ao seu lado, dois mitos quemeros: Herminio Masantonio, outro goleador histórico da seleção – com 21 gols em 19 jogos, tem a melhor média dentre os que atuaram mais de dez vezes por ela (“jogar ao lado de Herminio te faz sentir mais forte”, declarou); e Emilio Baldonedo, que, pela Argentina, marcou sete vezes no Brasil em 1940.

Era uma época em que o clube do bairro de Parque Patricios fazia unânime jus ao seu simbólico rótulo de “sexto grande”, acompanhando o rival San Lorenzo e Boca, River, Racing e Independiente, oficialmente os “cinco grandes”. Até por estar acostumado a infiltrar-se entre eles nas colocações finais dos campeonatos argentinos: 5º no primeiro de Méndez, 3º em 1942, 4º em 1943, 5º em 1945… neste ano, por sinal, a instituição tinha 23 mil sócios, apenas quinhentos a menos que o Boca.

Normalmente, o clube arrancava bem mas logo passava por resultados instáveis e terminava aquém do que poderia, apesar do “bélico” ataque que o Huracán teve naqueles anos: Masantonio, que parou em 1945, era o “Morteiro de Ensenada”, cidade onde nasceu. Em 1946, o clube tinha Llamil Simes (“A Flecha”), o jovem Alfredo Di Stéfano (“A Flecha Loira”) e Méndez, que era El Tucho, “O Cartucho”.

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À esquerda em ambas, com Baldonedo, Masantonio e Di Stéfano, no bom ataque do Huracán dos anos 40

Só que a defesa destoava: em 1944, o Boca foi campeão e teve o melhor ataque, com 82 gols. O Globo, que marcou 80, ficou em 7º: a defesa levou 72, menos pior apenas que a do rebaixado Banfield (77). Em 1945, o 5º colocado teve o melhor ataque do campeonato, com 76 gols, dez a mais que a festejada La Máquina do campeão River Plate. Mas levou 61 contra 34 do River.

Os títulos do Huracán com Méndez se resumiram a copas de prestígio na época, mas de importância desbotada no presente: em 1942 (sobre o River) e em 1944 (sobre o Plantense), a Copa Adrián Escobar, que reunia os 7 melhores do campeonato. Em 1945, a Copa Británica (sobre o Boca), oferecida pelo embaixador do Reino Unido. Nas duas últimas, o clube se deu ao gosto de dar a volta olímpica no estádio do vizinho e rival San Lorenzo: o estádio quemero, Tomás Adolfo Ducó, começara a ser construído em 1943 e seria finalizado em 1947.

Outro festejo foi um 5-1 no San Lorenzo em 1944, maior goleada do clássico até o rival fazer 5-0 mais de meio século depois. Méndez, já sem Masantonio e Baldonedo, vinha se consolidando como craque e em janeiro de 1945 estreou pela seleção, levado pelo técnico Guillermo Stábile (artilheiro da Copa de 1930 e outro antigo ídolo do Huracán) à Copa América. Saiu como campeão e, com 6 gols, artilheiro. Três, todos fora de área, foram no Brasil, vice.

No ano seguinte, a receita se repetiu: Copa América em janeiro, Argentina campeã, Brasil vice e Méndez marcando nele, desta vez duas vezes. A edição seguinte ocorreu quase dois anos depois, em dezembro de 1947. José Manuel Moreno, craque do River e tido pelos mais antigos como mais habilidoso que Maradona, voltara de dois anos no México, e logo foi campeão nacional. Jogava na mesma posição de Méndez, no flanco direito do ataque, entre o centroavante e o ponta-direita. Para manter Tucho, Stábile colocou Moreno no outro flanco… e a Argentina foi campeã mais uma vez.

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A Argentina campeã de 1946. Méndez, autor dos gols do título, é o segundo jogador em pé

Até hoje, nenhuma outra seleção venceu três vezes seguidas a Copa América. Foi o melhor registro de uma geração impedida por fatores extracampo de disputar uma Copa do Mundo. Falamos aqui. O detalhe é que ela só usou cinco jogadores em todo o tri, Méndez dentre os quais, e apenas Félix Loustau, do River, foi titular absoluto. Tucho Méndez esteve em 17 dos 18 jogos da campanha, invicto. E marcou 17 vezes. Assim, é o maior artilheiro da competição, sendo posteriormente igualado por Zizinho.

Após o tri, ele e os colegas quemeros Juan Carlos Salvini e Llamil Simes foram ao Racing, que em troca repassou cinco jogadores. Se o Huracán não era campeão desde 1928, o clube de Avellaneda não era desde 1925… jejum que quase acabou naquele ano, em que La Academia liderava até o sindicato de jogadores, fundado exatamente por Tucho, realizar greve. O Racing teve que jogar com reservas e isso, na época, valeu uma punição de 4 pontos. O título ficou exatamente com o rival Independiente. A quebra ficou para o ano seguinte e se consumaria em alto estilo. Méndez, já tricampeão pela seleção, também o seria com outra camisa alviceleste.

Embalado pelo ataque Mario Boyé, Méndez, Rubén Bravo, Simes e Ezra Sued, seu novo time emendou 1949, 1950 e 1951, fazendo do Blanquiceleste o primeiro tricampeão seguido na era profissional, e igualando de uma vez as três taças profissionais já levantadas pelo Independiente. Méndez, presente na inauguração em 1947 do estádio do Huracán, cenário de cena antológica (curiosamente, envolvendo Globo e Racing) do Oscar de melhor filme estrangeiro em 2010, O Segredo dos seus Olhos, participou também da inauguração do estádio Juan Domingo Perón: o campo racinguista foi palco dos primeiros Pan-Americanos, em 1951.

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Racing de 1949, que quebrou um jejum e iniciou uma marca. Méndez é o segundo agachado

Considerado “a magia do tri”, a boa fase o manteve na seleção. Ainda hoje, ele é o único que Huracán e Racing, seus dois amores, enviaram juntos a ela: “sempre disse que se o Huracán é minha mãe, o Racing é minha mulher”. Mas as lesões nele, que já tinha pernas arqueadas, ficaram mais frequentes. Em 1954, foi repassado ao nanico Tigre. Ainda jogou pela Argentina vindo da equipe de Victoria, em 1956, convocado de emergência para o Pan-Americano. Em 1957, voltou a seu Huracán. Naquele ano, ainda jogou pela Argentina amistoso contra o Bangu que marcou a despedida justo de Zizinho (com quem comparte o recorde goleador na Copa América) do clube de Moça Bonita.

Méndez parou de jogar em 1958. O atacante que “chuta com mais gana porque fuma Caravanas negros”, segundo peça publicitária da época, “tinha arte para iludir rivais, potência e efeito para pegar com precisão desde fora da área, elasticidade para fazer de bicicleta, salto elegante e cabeceio certeiro”, conforme relatou sobre ele uma El Gráfico especial que elegeu em 2011 os cem maiores ídolos da seleção argentina. Além de um oportunista atacante, também era hábil para armar jogo.

Internado em um geriátrico, morreu de ataque cardíaco em 22 de junho de 1998, curiosamente quatro dias depois da morte de um amigo do rival Independiente e também grande ídolo da seleção, Ernesto Grillo (ver aqui), que sempre frisava a participação de Méndez (saído do banco) naquela histórica vitória sobre a Inglaterra, em 1953, protagonizada por Grillo. Falamos aqui.

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Anos 50: subindo o Cilindro para jogar pelo Racing (que, como campeão, ostentava o escudo da AFA), e no Tigre e na volta ao Huracán

Caio Brandão

Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer

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