15 anos sem Federico Pizarro, técnico do Chacarita campeão argentino e ídolo também como jogador funebrero
Por Leandro Paulo Bernardo
O futebol mundial já apresentou diversos casos de ídolos que retornaram aos seus clubes de origem quando estes estavam amargando uma segunda divisão, outros voltaram para serem treinadores e campeões. Pois Federico Antonio Pizarro fez tudo isso pelo Chacarita Juniors. Nascido em dia 17 de janeiro de 1927, o técnico funebrero campeão da elite em 1969 faleceu há 15 anos.
Pizarro jogou nos juvenis tricolores até se profissionalizar em 1947. Logo ficou marcado pela força e capacidade de intimidar os adversários. Entre 1947 e 1952 formava com Carlos Spinelli a dupla segura para o mítico goleiro Isaac López, que se aposentou no final daquele ano após servir ao Chaca desde os anos 30. Pizarro chegou inclusive a excursionar com o clube pelo Brasil, na virada de 1951 para 1952, viagem detalhada neste Especial.
Após sete anos no Chacarita, Pizarro foi convocado para a seleção pela primeira vez, e acabou sendo negociado com o San Lorenzo para formar dupla de zaga com David Iñigo. Disputou algumas amistosos pela seleção na Europa em 1954, o Torneio Pan-Americano de 1956 e a Copa América de 1957, onde foi reserva de Pedro Dellacha; sua despedida da Albiceleste foi justamente no famoso 2-1 sobre o Brasil pela Copa Roca, jogo histórico por ter sido a estreia de Pelé pela canarinho.
No San Lorenzo, jogou 73 partidas. Em 1958, trocou de lado, saindo do bairro de Boedo para defender o rival do Ciclón. Pelo Huracán, jogou apenas 19 partidas pelo campeonato nacional e 13 jogos pela Copa Suécia (torneio criado pela AFA durante a Copa do Mundo, para manter os times ativos enquanto o campeonato se paralisava). No início de 1959, recebeu um convite de caráter bastante emotivo, pois o Chacarita havia sido rebaixado em 1956 e desde então tentava retornar à elite.
Embora o clube não contasse mais com o maior goleador de sua história, Francisco Campana, que estava no México, os funebreros ainda tinham o talento de José Coll e Enrique Esquide, remanescentes do início dos anos 50. Faltava um líder e Federico Pizarro deixou o Globo para jogar a segunda divisão no Chacarita. Formando uma zaga muito segura com o jovem Oscar Martín (futuro ídolo do Racing, sendo o capitão do elenco racinguista campeão mundial de 1967), conseguiu o título da segunda divisão e encerraria a sua passagem como jogador do Chacarita.
Ao total, foram 216 partidas e doze gols marcados pelo Chaca. Ainda jogaria o campeonato chileno de 1960 pelo Magallanes. La Academia terminou na nona colocação, mas pelo promedio acabou rebaixada, na primeira queda na história do primeiro campeão chileno da era profissional (em 1933). Dois anos depois de se aposentar como jogador, Pizarro iniciou uma longa carreira como treinador. Inicialmente, como comandante do Deportivo Flandria na terceira divisão. Em 1963, ainda pela terceirona, foi treinar o Estudiantes de Buenos Aires, que tinha acabado de inaugurar seu novo estádio, saindo da capital para jogar em Caseros.
No pincha alvinegro, passou o maior tempo consecutivo como treinador, conseguindo o título da terceira divisão em 1966 e treinando-o na segunda divisão em 1967. No ano seguinte chegaria ao Comunicaciones, da segunda divisão, até receber mais um chamado do Chacarita, para treinar a velha equipe no restante do campeonato metropolitano. Como religiosamente os jogos das outras divisões eram aos sábados e a primeira divisão aos domingos, Federico Pizarro durante o ano de 1969 pôde exercer jornada dupla, treinando Los Funebreros pela manhã e Los Carteros à tarde.
Argentino Geronazzo era o treinador do Chacarita no início daquele Metropolitano e teve o mérito de, com os mesmos jogadores que nos anos anteriores vinham amargando as últimas colocações (o time chegou a terminar na lanterna, mas beneficiado por não haver rebaixamento), proporcionar um salto de desempenho. Mas, após várias polêmicas com a direção, acabou demitido. Federico Pizarro substituiu Geronazzo no decorrer da campanha e manteve o esquema e a forma de jogar. Embora Pizarro fosse muito rígido com a disciplina, sua grande virtude eram nos treinos – durante os jogos, o capitão Ángel Marcos falava mais com os jogadores do que o treinador.
O Chacarita conseguiu de forma épica o campeonato metropolitano: detalhamos aqui. Na semifinal, destronou um Racing ainda imponente e que jogava pelo empate, marcando o único gol do jogo nos minutos finais. Na decisão, veio o inapelável 4-1 em outro gigante, o River. E Federico Pizarro ainda conseguiu em paralelo o título da terceira divisão com o Comunicaciones, ao fim do ano. Depois, seguiu perambulando por vários clubes, em todas as divisões. Voltou a vencer a terceirona com o Comunicaiones em 1969. Em 1970, esteve no Platense; em 1972. no Lanus e em 1974, no Quilmes pela segunda divisão. Em 1975, heresia: chegou para dirigir o Atlanta, grande rival do Chacarita, em um contexto cada vez mais violento do Clásico de Villa Crespo.
Nos quatro dérbis daquele ano foram duas vitórias para o Atlanta, um empate e uma vitória do Chacarita. Los Bohemios terminaram na 14° colocação, uma posição acima do rival. Pizarro teve uma rápida passagem pelo San Martin de Tucumán em 1976 e no ano seguinte voltou para o Atlanta – os rivais terminaram empatados na 16° colocação, com uma vitória para cada lado nos confrontos. Treinou o Deportivo Cuenca do Equador em 1978 e ficou dois anos sem clube. Retornou à Argentina para treinar o Gimnasia LP na segunda divisão; em 1981 dirigiu o Sarmiento na estreia do time de Junín na elite, assegurando a permanência.
Sua idolatria pela torcida do Chacarita seria recuperada na segunda divisão de 1982, ainda que o clube não tenha conseguido o acesso, terminando em terceiro – mas vencendo os dois clássicos. Alternou passagens pelo Sarmiento, Deportivo Español e All Boys. Em 1987, retornou ao Chacarita e no ano seguinte ao Atlanta; dessa vez, por estarem em divisões diferentes, não ocorreram clássicos. Sua última equipe como treinador foi o Gimnasia y Tiro de Salta em 1989, pela terceira divisão.
Federico Pizarro se afastou do futebol e seguiu morando na Villa Devoto, bairro que morou durante toda sua vida. Faleceu em 5 de Abril de 2003, aos 76 anos, em consequência de problemas cardiovasculares. Deixou um legado incrível ao futebol portenho, experimentando os dois lados de alguns dos clássicos mais aguerridos do país. Certa vez, ao ser perguntado sobre seu valor como treinador, deu a seguinte resposta: “eu não sei se sou caro. Se eu me comparo com pessoas que trabalham em outras coisas e são ideais como eu, talvez seja isso. Mas eu sei o quanto os outros técnicos ganham… e acabo achando que sou muito barato”.
Caio Brandão
Advogado desde 2012, rugbier (Oré Acemira!) e colaborador do Futebol Portenho desde 2011, admirador do futebol argentino desde 2010, natural de Belém desde 1989 e torcedor do Paysandu desde antes de nascer